Economia de Serviços

um espaço para debate

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Acordos de comércio de serviços de fato liberalizam o mercado?

A importância crescente do setor de serviços na participação do PIB e na criação de emprego é uma das grandes tendências da economia mundial. Não surpreendentemente, acordos comerciais de serviços também têm ganhado um aumento expressivo de importância e interesse por parte dos países. Esses acordos buscam a expansão do comércio de serviços e do desenvolvimento econômico por meio da progressiva liberalização comercial. No entanto, uma questão que a princípio parece tautológica, permeia toda essa discussão: os acordos comerciais de serviços de fato promovem a liberalização do mercado de serviços?

O GATS, criado em 1995 durante a Rodada Uruguai, estabeleceu muitas bases sobre as quais hoje são negociados os acordos internacionais de comércio de serviços: a classificação em 4 modos de prestação; o reconhecimento de 12 categorias de setores e 155 subsetores; e as cláusulas de não discriminação: tratamento nacional[1] e acesso a mercados[2]. As negociações do GATS tiveram êxito no estabelecimento da estrutura e dos princípios do Acordo.

Diante da paralisação da Rodada Doha, os países, em especial os desenvolvidos, têm aumentado o nível de importância de acordos regionais em suas políticas comerciais. De acordo com a OMC, em 2011 já haviam sido notificados 87 acordos regionais com compromissos em serviços. Ademais, há os que ainda não estão em vigor, dentre os quais merecem destaque o TPP (que ontem teve sua continuidade posta em dúvida, por conta de decisão dos EUA de sair das negociações), a Aliança do Pacífico e o TiSA.

Alguns trabalhos acadêmicos têm sido feitos com o intuito de analisar se houve liberalização de mercado nas negociações do GATS e de acordos regionais/preferenciais de serviços. Hoekman (1996) fez um esforço empírico e calculou índices que representariam a liberalização de fato de países da União Europeia no GATS. A sua conclusão foi de que a Rodada Uruguai não entregou nenhuma liberalização do setor de serviços[3], apesar de ter gerado algum benefício associado ao travamento das condições de acesso a mercado.

Com relação aos acordos regionais/preferenciais, Sauvé e Shingal (2011) e Mattoo e Sauvé (2010) chegam a conclusões similares: ao invés da entrega de liberalização do setor de serviços, o benefício gerado por esses acordos decorre principalmente do travamento do marco regulatório existente no país. O que de fato os acordos regionais/preferenciais têm logrado em atingir além do GATS é uma consolidação mais atualizada do marco regulatório dos países, decorrente de recentes reformas unilaterais promovidas.

Dada a importância do setor de serviços, por que os acordos comerciais, tanto o GATS quanto os acordos regionais/preferenciais, falham em entregar a liberalização de mercado a que se propõem? A explicação reside em uma característica intrínseca dos serviços: enquanto na negociação de acordos de comércio de bens a moeda de troca são tarifas de importação, em negociações de acordos de comércio de serviços a moeda de troca é a regulação doméstica.

Não obstante, muitos economistas acreditam que acordos de serviços liberalizam o mercado de serviços. Argumentam que, ao ficar de fora dessa nova grande rede de acordos regionais/preferenciais de liberalização do setor de serviços, o Brasil estaria perdendo um grande potencial de inserção no comércio internacional. Na teoria, esse argumento parece fazer sentido: assim como é possível estabelecer diferentes alíquotas do imposto de importação para produtos de origens distintas, por que não seria possível também estabelecer diferentes exigências com relação a prestadores de serviços de acordo com sua origem?

No entanto, quando se pensa na aplicabilidade prática desse argumento, percebe-se como seria difícil (ou até mesmo impraticável) a liberalização do mercado de serviços para apenas algumas origens. Para discriminar prestadores de serviços conforme a origem, seria necessário fazê-lo em sua regulamentação nacional. Tomemos como exemplo a participação de capital estrangeiro em companhias aéreas, hoje em no máximo 20% no Brasil, estabelecido por Lei Ordinária nº 7.565, de 1986. Um eventual compromisso de liberalização do setor aéreo brasileiro em acordo preferencial de serviços exigiria modificação do texto dessa Lei Ordinária. E esse seria apenas um dos muitos compromissos feitos pelo Brasil no acordo. Imaginemos quantos mais compromissos seriam feitos e que gerariam necessidade de alteração da legislação nacional, algumas restrições ainda mais difíceis de mudar, como as constitucionais de propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora (artigo 222 da CF) e de participação de empresas de capital estrangeiro na assistência à saúde (artigo 199 da CF).

A partir do argumento acima se percebe a dificuldade em se liberalizar o mercado de serviços a partir de acordos comerciais, em especial bilaterais/preferenciais. É nesse sentido que a maior parte dos países que fizeram importantes liberalizações no seu setor de serviços o fizeram unilateralmente[4].

Contudo, se por um lado acordos de serviços não liberalizam o mercado de serviços, por outro lado há importantes benefícios que decorrem da negociação desses acordos. Três benefícios imediatos decorrem da assinatura de um acordo de serviços.

O primeiro é o travamento (lock-in) do marco regulatório daquele país. Isto quer dizer que, a partir do momento da assinatura do acordo, aquele país não poderá adotar medidas mais discriminatórias com prestadores de serviços estrangeiros do que aquelas já existentes e inscritas em suas listas. O segundo é o ganho de transparência e segurança jurídica que decorre da adoção de listas negativas. A consolidação do marco regulatório dos países em uma lista padronizada em muito facilita a vida de prestadores de serviços e investidores estrangeiros. Um terceiro benefício que decorre da negociação de um acordo de serviços advém da adoção de um “marco geral”, que estabelece padrões internacionais de conduta para os participantes, além de servir como um “guarda-chuva” para potenciais acordos posteriores de cooperação, facilitação, reconhecimento mútuo, etc.

O Brasil, por exemplo, atualmente ainda negocia acordos de serviços em listas positivas. Um importante próximo passo seria a adoção de listas negativas para negociação, visto que essas são dotadas de maior transparência e segurança jurídica. Ademais, a elaboração da lista negativa brasileira seria uma boa oportunidade para o governo, em contato com seus órgãos reguladores e setor privado, rever todo o seu marco regulatório doméstico, podendo identificar possíveis oportunidades e pontos para liberalização unilateral. Afinal, por que não negociar?

 

*Este post é baseado em texto da mesma autora, publicado no site Brasil, Economia e Governo, que pode ser acessado aqui.

Daniela Ferreira de Matos é Mestre em Economia pela Unb e Analista de Comércio Exterior no Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).

Referências

Francois, Joseph, and Bernard Hoekman. “Services trade and policy.” Journal of Economic Literature 48.3 (2010): 642-692.

Hoekman, Bernard. “Assessing the general agreement on trade in services.” The Uruguay Round and the developing countries 996.1 (1996): 89-90.

Mattoo, Aaditya and Pierre Sauvé. “The Preferential Liberalization of Services Trade”, NCCR Working Paper No 2010/13 (May), Bern: World Trade Institute. (2010), http://www.nccr-trade.org/publication/the-preferential-liberalization-of-services-trade-lessons-from-practice/

Sauvé, Pierre and Shingal Anirudh. “Reflections on the Preferential Liberalization of Services Trade”. World Trade Institute. (2011), https://mpra.ub.uni-muenchen.de/32816/

[1] Tratamento nacional: um compromisso em tratamento nacional implica que um membro não pode adotar medidas discriminatórias que beneficiem prestadores de serviços domésticos frente aos estrangeiros.

[2] Acesso a mercados: o compromisso de acesso a mercados está relacionado a um compromisso de não criar certos tipos de medidas que dificultem ou impeçam o acesso de um prestador de serviço estrangeiro ao mercado doméstico. Os tipos de medidas que os países se comprometem a não adotar estão listadas no inciso 2 do Artigo XVI do GATS.

[3] Aqui é importante deixar clara a exceção de países que aderiram tardiamente a OMC (latecomers). Esses países tiveram que assumir compromissos determinados pelos países integrantes, de maneira que de fato fizeram compromissos de liberalização.

[4] Uma importante exceção à essa regra é a Costa Rica, que aproveitou a assinatura de acordo comercial de serviços para comover o seu congresso e implementar importantes iniciativas liberalizantes no setor de serviços. Maiores detalhes desse caso podem ficar para um próximo post.

Brasil e Peru – novas perspectivas para o comércio bilateral de serviços

Embora seja comum aos governos que os consensos sobre a gestão econômica e a política comercial não sejam alcançados com a velocidade necessária à implementação de políticas públicas, a realidade da economia do conhecimento e do crescente peso dos serviços na economia mundial impõem que o Brasil acelere o debate acerca dessas importantes questões para delinear suas políticas e estratégias de inserção internacional. É fato que a atual tendência do comércio mundial é mais complexa, orientada muito mais pelas barreiras não tarifárias e regulatórias aos negócios, e menos pelas tarifas aplicadas pelos países no intercâmbio de bens simplesmente.

Diante disso, Brasil e Peru iniciaram conversas com o objetivo de aprofundar suas relações econômico-comerciais, que resultaram no Acordo de Ampliação Econômico-Comercial entre os dois países, considerado “o mais amplo acordo temático bilateral já concluído pelo Brasil”, contendo compromissos em matéria de investimentos, serviços e compras governamentais. Para além das complementaridades industriais a serem exploradas entre as duas economias, que já dispõem de acordo tarifário abrangente (Acordo de Complementação Econômica nº 58, da ALADI), o novo acordo estabelece e consolida as regras que potencializarão e balizarão os negócios entre Brasil e Peru, criando novas oportunidades de integração, facilitando investimentos recíprocos e diversificando a natureza do comércio bilateral, etc.

O setor de serviços é importante para ambos os países, correspondendo a 62,3% do Produto Interno Bruto peruano (2015), tendo essa participação apresentado crescimento contínuo desde 2001. No Brasil, a participação dos serviços no PIB é de 72%, embora a economia do setor venha apresentando queda desde 2015, por conta da crise pela qual o país tem passado.

 

Em particular, o capítulo 3 do acordo, que versa sobre os compromissos referentes ao comércio de serviços, incluiu disposições normativas em matéria de Tratamento de Nação Mais Favorecida, Tratamento Nacional, Acesso a Mercados, Regulamentação Doméstica, entre outros, que são compatíveis com aquelas que constam no Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) da Organização Mundial do Comércio (OMC) e em outros acordos de Serviços dos quais o Brasil faz parte, revelando certo conservadorismo nesse aspecto.

A Lista de Compromissos Específicos (cobertura) do Brasil apresenta as condições aplicáveis à atuação de prestadores peruanos no mercado brasileiro, os quais não excedem os compromissos já firmados pelo Brasil com os parceiros do MERCOSUL e representam consolidação parcial dos marcos regulatórios vigentes para quaisquer prestadores estrangeiros. A Lista de Compromissos do Peru, no entanto, representa uma maior abertura relativa aos compromissos consolidados pelo Peru no GATS, estendendo, a prestadores brasileiros, acesso e condições de tratamento similares àqueles concedidos pelo Peru, em acordos recentes, a empresas dos países da Aliança do Pacífico e da Parceria Transpacífico (TPP). Assim, as ofertas brasileira e peruana abrangem setores importantes da atividade econômica para os dois países, como, por exemplo, os serviços de Arquitetura, Engenharia e Construção e de Tecnologia da Informação.

Além disso, o acordo aponta para novos desdobramentos, uma vez que prevê negociações futuras entre as duas partes para incluir disciplinas e aprofundar compromissos, inclusive em serviços financeiros, telecomunicações e comércio eletrônico, setores não contemplados neste momento. O Capítulo de Serviços do acordo com o Peru inova, ainda, ao prever futuras negociações em formato de listas negativas, contrastando com as negociações anteriores do Brasil, que seguiram o formato GATS, com listas positivas de compromissos. A partir deste acordo, o país se aproxima dos formatos dos principais acordos internacionais recentemente celebrados em matéria de Serviços.

Ainda que seus benefícios econômicos não se concretizem de imediato, o Acordo de Ampliação Econômico-Comercial entre o Brasil e o Peru reposiciona a relação entre os dois países na região, dando-lhe novo relevo. É importante, ainda, registrar a importância do Acordo como marco na política comercial brasileira recente, inaugurando um caminho de maior abertura e de integração com outros países da região como Chile, Colômbia e México, além dos países do próprio Mercosul, e permitindo maior dinamismo econômico na região, com potenciais efeitos de aumento de produtividade, competitividade e desenvolvimento.

José Carlos Cavalcanti de Araujo Filho é Especialista em Relações Internacionais pela UnB e Coordenador-Geral de Comércio Exterior na Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. 

Um ano de Blog

Neste mês de julho, completamos um ano do lançamento do Blog. Nosso intuito, desde o início, foi de dar mais atenção ao setor de serviços, que, apesar de representar mais de dois terços da economia, ainda é relativamente pouco debatido. Desde o lançamento, publicamos 117 posts de 15 colaboradores e recebemos mais de 30 mil visitas. Por esses números, acreditamos que estamos, aos poucos, conseguindo alcançar nosso objetivo inicial.

Gostaríamos de agradecer aos nossos leitores, assinantes e colaboradores e aproveitar o momento para dar destaque a alguns dos posts mais lidos e outros que acreditamos tratar de temas extremamente importantes para entender as temáticas debatidas aqui no blog. (Re)leia-os clicando nos links abaixo:

O que o TiSA significa para o Brasil?

Conforme exposto em posts anteriores, o Acordo de Comércio de Serviços (TiSA, sigla em inglês), refere-se ao abrangente acordo plurilateral atualmente em negociação entre 23 membros da Organização Mundial do Comércio (totalizando 50 países). No comunicado da Comissão Europeia em 2013, são colocadas as motivações-chave do acordo, entre elas, a frustração com o impasse no avanço das negociações na Rodada Doha e a necessidade de um acordo que consiga refletir o atual cenário do comércio mundial de serviços.

A negociação já conta com mais de dezessete grupos de trabalho temáticos e dezoito rodadas de negociação, com uma lista abrangente de capítulos, conforme o quadro abaixo. Apesar de o acordo contemplar diversos setores tradicionais, ele também avança na discussão de temas ainda recentes, como a economia digital e a questão da restrição aos fluxos de dados entre fronteiras, que tem papel relevante para a oferta de serviços pela internet.

Temas em negociação no âmbito do TiSA

Comércio eletrônico Compras públicas
Empresas estatais Movimento de pessoas naturais
Regulação doméstica Serviços ambientais
Serviços de entrega competitivos Serviços financeiros
Serviços profissionais Serviços relacionados à energia
Telecomunicações Transparência
Transporte aéreo Transporte Marítimo
Transporte rodoviário e serviços de logística relacionados

Elaboração própria. Fonte: Wikileaks

Por englobar países que, conjuntamente, respondem por 70% do comércio de serviços e dois terços do PIB mundial, o acordo terá impactos significativos para participantes e não participantes. Tendo em vista a relevância dos serviços para a dinâmica de competitividade dos demais setores da economia, como indústria, agricultura e mineração, as implicações do TiSA claramente irão além do setor de serviços. Entre as possíveis implicações do Acordo estão mudanças em padrões regulatórios, nos fluxos de investimento direto (IED), na dinâmica e no posicionamento em cadeias globais de valor, bem como desvios de comércio entre não-participantes para participantes.

Em relação à estrutura do acordo, ele está sendo elaborado para ser compatível ao Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços (GATS) da OMC, e incorpora alguns artigos centrais deste, como definições, escopo, acesso a mercados e tratamento nacional. Isso demonstra o desejo de expansão do acordo para demais membros, i.e., uma posterior “multilateralização” do acordo. Em função disso, o TiSA acaba por ser considerado com uma atualização do Acordo GATS.

O acordo também caminha próximo ao grandes acordos megarregionais, como o Acordo Transpacífico (TPP) e Parceria Transatlântica (TTIP). O TiSA tende, todavia, a ser o maior dentre eles por focar inteiramente no setor de serviços, cujo comércio tem crescido muito mais do que o comércio de bens. Quando se observa o crescimento no fluxo de dados entre fronteiras, todavia, é que se tem a real noção do que um acordo como o TiSA representa para o futuro do comércio.

Implicações para o Brasil

Recentemente o Ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços anunciou que o Brasil buscará entrada nas negociações do TiSA. Apesar de a União Europeia afirmar que aceitaria a participação de qualquer país membro da OMC nas negociações a qualquer momento, como as discussões já estão bastante avançadas, isso pode ser difícil, já que os EUA já mostraram interesse em concluir a “fase um” da negociação até novembro, ainda durante o Governo Obama. Nesse contexto, a abertura para entrada do Brasil poderia gerar a demanda de entrada por outros países, com possíveis atrasos no andamento das negociações.

A entrada brasileira no Acordo é bem vista pelo mercado e pelo setor privado (ou parte dele, pelo menos). Há, todavia, um longo caminho a se percorrer até que a entrada no TiSA ocorra. Como já se sabe, o Brasil mantém um déficit significativo na balança de serviços – o qual chegou a US$ 36,9 bilhões em 2015, de acordo com dados do Banco Central. Informações computadas pelo Sistema Integrado de Comércio Exterior de Serviços – Siscoserv mostram um resultado similar. Pelos dados do Siscoserv observa-se que as exportações de serviços brasileiros estão muito concentradas em poucos parceiros comerciais. Seus cinco principais destinos – Estados Unidos, Holanda, Alemanha, Reino Unido e Suíça – são todos participantes do TiSA.

A entrada no acordo tem como potenciais benefícios a diversificação da pauta e dos destinos de exportações, bem como a melhoria da competitividade da indústria, que utiliza extensamente diversos serviços no processo produtivo. Além disso, as mudanças regulatórias a serem realizadas para entrada no Acordo poderiam contribuir não apenas para dinamizar serviços exportados, como também para fomentar o próprio mercado interno de serviços, já que parte das restrições ao comércio de serviços também são restrições no mercado interno (OCDE, 2013). Esse é o caso, por exemplo, dos setores de telecomunicações, bancário, transporte (em particular aéreo e marítimo) e logística, que possuem índice de restrição ao comércio (SRTI, sigla em inglês) superiores à média dos demais países (OCDE, 2015) e que são também intensamente demandados pela indústria.

Existem poucos estudos quantitativos acerca dos impactos do TiSA sobre a economia brasileira. Estudo de Ferraz (2016) baseia-se nos cálculos de equivalente-tarifário de barreiras regulatórias estimadas pelo Peterson Institute (2010) para estimar o impacto da redução de 50% no valor dessas barreiras entre os países membros do TiSA para a economia brasileira. Por essas estimativas, a adesão brasileira geraria impacto de 0,6% sobre o PIB, 2,8% sobre as exportações de manufaturas, 3,4% sobre exportações totais e 8% em exportação de serviços. Em relação aos setores da economia, a indústria teria a maior expansão relativa no PIB.

É importante que a discussão técnica que o Brasil travará não se limite apenas à adesão ou não do Brasil ao TiSA e que leve em conta, principalmente, os termos dessa adesão. Muito se argumenta que a entrada de futuros participantes será no esquema ‘take-it or leave-it’, apesar de muitos pesquisadores e governos advogarem em prol de uma agenda mais amigável para a entrada de países em desenvolvimento. Também é importante destacar, tal como já foi apontado diversas vezes neste blog, que a melhoria em setores como infraestrutura, logística e telecomunicações, apesar de terem papel relevante para a melhoria da competitividade do País, ajudarão a colocar o Brasil no jogo do comércio, mas isso não será suficiente para ganhar esse jogo. A análise dos textos dos mega-acordos regionais, bem como o atual cenário de altos fluxos de dados e da revolução digital por qual passa a economia mostram fortes indícios de que, para ganhar esse jogo, a agenda da economia digital é, de fato, a agenda que importa.

Um Mercado Global de Serviços?

Temos discutido neste espaço que o setor de serviços já é, de longe, a atividade predominante na economia mundial, tal como atestam indicadores de participação no PIB, no emprego, no comércio internacional, quando medido em valor adicionado, e no investimento direto estrangeiro.

Mas uma nova etapa já está se descortinando, a qual dará ao setor participação ainda maior e mais preponderante. E causas para isso não faltam.

Diferentemente do passado recente, os serviços estão se tornando cada vez mais comercializáveis como se fossem bens manufaturados. Pense nos serviços de compras de varejo, como o e-commerce, nos de entretenimento, como o Netflix e o Spotfy, nos de transporte local, como o Uber, nos de hospedagem e passagens, como o Airbnb e Decolar.com, nas atividades internas e externas de TI das organizações, como o AWS, nos de telefonia, de localização geográfica, de compartilhamento de dados, de educação, de saúde, de seguros e de tantos outros que fazem cada vez mais parte do nosso dia-a-dia.

De fato, os mercados de serviços estão se expandindo tão rapidamente que o impensável já começa a acontecer: empresas start-ups com poucos ativos e  receitas relativamente modestas já valem mais que as suas concorrentes há muito estabelecidas e até que lideram seus respectivos mercados – o Airbnb, por exemplo, vale mais que a Accor, maior operadora de hotéis do mundo!

Dentre as razões para a explosão dos serviços incluem-se a mudança do padrão de consumo das pessoas em favor do consumo de funcionalidades digitais e de novas soluções e a mudança dos modelos de negócios das empresas em favor da terceirização e da servicificação da produção – a GE, por exemplo, já não mais vende as suas turbinas de aviões, mas as disponibiliza como parte de um pacote de serviços.

Mas o grande salto ainda está por vir, que é a constituição do mercado global de serviços.

A semente para o mesmo já foi semeada e é provável que em breve já se colham seus frutos. A semente são os acordos plurilaterais ora em discussão, como o Trans-Pacific Partnership (TPP), o Trans-Atlantic Trade and Investment Partnership (TTIP) e o Trade and Investment Agreement (TISA), que transformarão a economia mundial para sempre.

Uma vez em vigor, os acordos deixarão a Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e o General Agreement on Trade in Services (GATS) para trás e novos padrões serão estabelecidos pelas vias da harmonização dos marcos regulatórios e técnicos e da remoção de muitos dos demais obstáculos que ainda restam para a formação de um amplo mercado de global de serviços.

Nesta etapa, que deverá decorrer algo em torno de cinco a dez anos, o comércio e os investimentos em serviços crescerão rapidamente e criarão milhões de empregos e trilhões de dólares em valor. Os países mais competitivos e os mais inovadores em serviços serão aqueles que mais se beneficiarão desse mercado.

Testemunharemos, desta forma, aquela que será uma das mais importantes transformações da história da economia mundial recente, com impactos sem precedentes e muito mais contundentes que a da globalização, tal como a conhecemos hoje.

 

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Serviços, Investimento Direto Estrangeiro e Abertura Econômica

Como mostrado anteriormente no blog, o setor de serviços já é o maior receptor de investimento direto estrangeiro (IDE), tendo respondido por 59% do total em 2014. Em 2015, essa participação segue alta, tendo alcançado 56% entre janeiro e agosto.

Os gráficos abaixo, retirados do Boletim de Serviços de outubro, mostram que há uma concentração dos ingressos de IDE em serviços de custo, modernos, profissionais e voltados principalmente para empresas. Destacam-se, sobretudo, os investimentos nos segmentos de telecomunicação (US$ 4,3 bi. de janeiro a agosto de 2015), comércio (US$ 3,5 bi.), atividades imobiliárias (US$ 1,2 bi.), e saúde (US$ 1,1 bi.).

Este último é especialmente emblemático pelo seu crescimento de 2014 para 2015, quando os ingressos passaram de US$ 16 milhões para mais de US$ 1 bi. até agosto. Esse resultado se deve à mudança da legislação ocorrida com a aprovação da Lei 13.097/2015 que, entre outros assuntos, permitiu a participação direta e indireta de capital estrangeiro em empresas do setor de serviços à saúde.

Com o avanço das negociações de acordos multilaterais como o Tratado Trans-Pacífico e o aumento da importância dos serviços, tanto direta, quanto indiretamente, para o comércio internacional, é provável que haja maior pressão para a abertura dos mercados do setor. Com isso, serviços deverão continuar sendo uma importante fonte de IDE e o que ocorreu com o segmento de saúde poderá se repetir em outros setores atualmente protegidos.

Uma maior abertura poderá, em princípio, trazer benefícios para o setor e para os consumidores, sejam eles famílias ou empresas, que poderão ter acesso a uma maior e melhor oferta de serviços. No entanto, há que se considerar que a abertura de mercado deve ser acompanhada de marcos regulatórios que, ao mesmo tempo, fomentem a competição e também a qualidade dos serviços ofertados, a segurança da oferta, investimentos e respeito às leis do país.

Nesse cenário, torna-se ainda mais importante trabalhar para o aumento da competitividade das empresas prestadoras de serviços brasileiras.

 

Um mês de blog

Hoje, o blog completa um mês de lançamento. Neste período, o site teve mais de 5000 visualizações. Muito obrigado a todos que leem e compartilham nossos textos.

Para aqueles que desejam receber as publicações do site, basta incluir o seu endereço de email no campo à direita. Também é possível acompanhar nossas atualizações pelo Facebook e Twitter.

Mais uma vez, agradecemos pelas visitas e convidamos a todos a participar do debate, seja comentando, seja escrevendo um post como convidado (caso tenha interesse, escreva-nos).
Abaixo, fazemos uma espécie de retrospectiva dos posts publicados até aqui, caso tenham perdido algum texto:

na imprensa

Nesta seção, incluímos algumas de nossas participações na imprensa, falando sobre serviços.

TV CNS – Combate (entrevista com Jorge Arbache).

 

Colunas de jornal:

Por que o TPP é da nossa conta? Valor Econômico. 1 de jul. 2015.

Serviços e crescimento econômico. Valor Econômico, 10 jun. 2015.

Indústria ou serviços? Valor Econômico, 1 abr. 2015.

Serviços e prosperidade. Valor Econômico, 12 dez. 2014.

Made in the USA. Valor Econômico, 3 de jul. 2014.

Importação de serviços e crescimento. Valor Econômico. 5 jun. 2014.

Indústria ou densidade industrial? Valor Econômico, 23 out. 2013.

Serviços e competitividade. Valor Econômico, 2 out. 2013.

Matérias e entrevistas em meios impressos:

Valor Econômico – 27/10/2015  Serviços ‘perdem’ disputa pela renda das famílias

Valor Econômico – 27/10/2015 – Consumo de serviços recua, mas preços seguem em alta Serviços ‘perdem’ disputa pela renda das famílias

Valor Econômico – 26/10/2015 – Recuo no déficit de serviços é mais lento que o ajuste externo

Gazeta do Povo – 24/08/2015 – Baixa tecnologia da indústria se alastra para o setor de serviços

Valor Econômico – 17/06/2015 – Reversão de déficit requer investimento em tecnologia

Valor Econômico – 18/05/2015 – Mazelas da indústria reúnem economistas liberais e desenvolvimentistas

O Globo – 27/04/2015 -Brasil fica para trás em ranking de produtividade de serviços

Valor Econômico – 25/03/2015 – Automação pode recuperar empregos para americanos

Valor Econômico – 19/01/2015 – Peso maior de serviço alavanca pouco a economia

Valor Econômico – 27/11/2014 – Pré-sal e obras elevam déficit de serviços

Valor Econômico – 13/10/2014 – Sem inovação, produtividade do país sobe só 6%

Folha de São Paulo – 11/09/2014 – Exportação de serviços [paywall]

Valor Econômico – 30/07/2014 – Serviço ganha peso na indústria sem agregar valor, aponta estudo

Valor Econômico – 25/06/2014 – Plataformas puxam déficit mais elevado em serviços neste ano

Valor Econômico – 25/06/2014 – Saldo negativo no setor é a nova ‘dor de cabeça’ na área externa

Valor Econômico – 28/05/2014 – Futuro está nos serviços, diz Arbache

Valor Econômico – 14/06/2013 – Tributar importação de serviços “atrasa” indústria

Folha de São Paulo – 10/07/2011 – Inflação de serviços é a maior em 14 anos [paywall]

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