Economia de Serviços

um espaço para debate

Month: março 2019

Entendendo aspectos do setor de energia elétrica e sua (bem) provável reforma (Setor de energia elétrica brasileiro 101, bem-vindos)

Esse é o resumo para quem tem pressa: antes, no início do século XX, a geração de energia era principalmente privada, com atendimentos isolados e nada integrado. Diante do crescimento do país, e o nacionalismo inconfundível de Getúlio Vargas, todas as águas do país se tornaram propriedades da União. A Eletrobrás foi criada para organizar a casa. A ditadura exige o crescimento do setor, principalmente depois do choque de 73, e assim muitas das hidroelétricas que conhecemos foram fundadas. Crise de uma década inteira nos anos 80, e depois o governo FHC corre contra o tempo para privatizar o setor para evitar mais prejuízos para as contas do governo. Juntou-se uma série de fatores e o Brasil viveu com os apagões. Governo Lula tenta restaurar as empresas do setor como estatais e estabelece um novo modelo, em 2004, que tem em sua base os leilões e a regulamentação da Agência Nacional de Energia Elétrica, a ANEEL.

Historicamente, este novo modelo cumpriu seu papel de transição entre o que era no período ditatorial e os dias atuais, passando por aperfeiçoamentos. Porém, à medida que as necessidades do mercado foram mudando nos últimos anos, gargalos ficaram mais evidentes e o sistema ficou mais carente de uma reestruturação. Isso fica claro, por exemplo, quando o sistema elétrico atual procura nos leilões as vantagens de um mercado competitivo, mas se valendo de políticas públicas fortes para funcionar. Mais detalhes podem ser encontrados aqui.

O atual modelo implica em dois ambientes de contratação de energia, um regulado (ACR – Ambiente de Contratação Regulado) e outro livre (ACL – Ambiente de Contratação Livre). Os consumidores de baixa tensão, chamados de consumidores cativos, que para todos os efeitos são, em sua maioria, consumidores residenciais e ligados ao comércio de pequeno e médio porte, não conseguem negociar diretamente sua aquisição de energia elétrica e fazem parte do ACR, sendo submetidos à decisão de todos os outros agentes do setor. A estrutura institucional do setor elétrico brasileiro pode ser vista abaixo:

Fonte: Mercedes, Rico e Pozzo (2015).

Não podemos negar, claro, as vantagens que o modelo tem em si. Podemos enumerar algumas. A profunda regulação do sistema permite, se for da agenda governamental, políticas de universalização do acesso à energia elétrica e de incentivos a uma matriz com maior variedade de fontes renováveis. Nesse quesito, o Brasil, por ser um país de tamanho continental e de imensa diversidade de fontes energéticas, tem uma certa vantagem comparativa na geração de energia, que se incentivada com maior entusiasmo, tem capacidade de ampliar não só ganhos sociais, mas também econômicos. A título de exemplo, poderiam ser exploradas tecnologias de impacto ambiental menor do que de uma fonte tradicional de geração hidroelétrica e, ao mesmo tempo, com maior eficiência tanto na geração quanto na transmissão de energia.

Outra vantagem da regulamentação é o amortecimento da variação de preços para os agentes participantes do sistema – em especial no ACR – além de toda a transparência, previsibilidade e accountability proporcionados.

Por outro lado, as desvantagens são atreladas à rigidez proporcionada pela forte burocracia do modelo. Os investimentos do setor são reféns de políticas públicas para esse fim. Esse obstáculo pode impedir avanços tecnológicos, por exemplo, afastando as empresas de oportunidade de diminuição de custos. O sistema blindado e complexo, e a existência de um Ambiente de Contratação Regulada (ACR), dificultam o interesse da sociedade em geral de compreender o setor, afastando a sociedade de uma comunicação eficaz entre agentes econômicos. Comunicação que é vital para manutenção da qualidade dos serviços prestados.

Ainda relacionado à rigidez: muitas entidades e agentes causam sobreposição de papéis que podem causar divergência de informações e ações; excesso de intervenções provoca insegurança jurídica nos agentes investidores; e os intervalos de preço estabelecido no ACR têm sido, nos últimos anos, excessivamente baixos para os custos de geração e transmissão. Vale também ressaltar a periodicidade da liquidação das operações do mercado spot, que são dadas mensalmente, não acompanhando a velocidade de reação do mercado aberto, criando uma distorção e defasagens nas contas das empresas do setor.

Agora que temos uma melhor noção do modelo vigente, vamos entender o que uma reforma no setor poderia acarretar. E aqui, tomamos como base algumas consultas públicas lançadas pela ANEEL, o movimento “Quero energia livre” da Abraceel e o projeto de lei n° 1.917/2015.

As propostas de reforma possuem alguns pontos de convergência. Um deles é a desejabilidade da expansão do mercado livre de energia (ACL). Todos os agentes econômicos ligados ao Sistema Interligado Nacional (SIN) teriam potencialmente o direito de negociar todos os aspectos da contratação de energia. Virtualmente, os consumidores cativos (do ACR) passariam a comprar o serviço no varejo de forma similar à de telefonia e internet, podendo escolher quantidade, fonte, pacotes, empresas de preferência e etc. Todos os consumidores seriam capazes de escolher seu fornecedor. Isso causaria, para os potenciais novos consumidores livres, uma mudança de costumes, pois não mais ficariam restritos a apenas pagarem a conta de luz e gerenciarem a quantidade usada. Com a reforma, o consumidor passaria a se inteirar mais com o processo de fornecimento de energia, somando a responsabilidade de escolha da origem da energia e a seleção dos termos de contratação. Veja mais sobre isso na Cartilha da Abraceel.

Entretanto, ao mesmo tempo que essa liberdade pode gerar benefícios e maior conhecimento e atuação dos consumidores no setor elétrico brasileiro, entender os meandros do setor e suas características não é nada fácil. Será que os consumidores estarão preparados para tamanha mudança? Será que terão condições efetivas de fazerem uma transição para o ACL? Mesmo as empresas de pequeno e médio porte, elas não teriam que ter um corpo jurídico especializado para avaliar e assessorar os contratos de energia assinados? Isso, certamente, demandaria tempo e outros demais custos. Por fim, quais as consequências de ampliação do ACL para o agente regulador? De que forma a ANEEL seria impactada por tal mudança?

As expectativas com a reforma são de fomentar a concorrência do setor, expandir a geração distribuída, ter mais produtores independentes fornecendo energia na rede, aprofundar os incentivos às fontes alternativas de energia, entre outros. Tudo isso poderia ampliar a oferta de energia e promover, via mercado, preços relativamente mais baixos para os novos consumidores livres, incentivando investimentos maiores em P&D no setor e melhoria dos serviços prestados ao consumidor final. Tudo isso num cenário atual de investimentos interrompidos devido à crise fiscal do Estado. Não seria, então, uma grande jogada, a reforma? Por que essa discussão não está avançando rápido?

Como sempre, é preciso ponderar os dois lados da moeda quando uma decisão importante está prestes a ser tomada. Mesmo com todas essas esperadas vantagens, na média, os contratos assinados no ACR são de prazo mais longo que os contratos atualmente assinados no ACL. Se a expansão da oferta de energia elétrica depende da estabilidade oferecida por contratos de mais longo prazo, uma vez que os grandes projetos de expansão da oferta energética levam vários anos para ficarem prontos e iniciarem, de fato, a geração de energia, como uma migração de mais e mais consumidores para o ACL afetaria a sustentabilidade da expansão da oferta energética brasileira? Essa é uma pergunta difícil de responder, e talvez seja por isso que reformas amplas de setores tão essenciais como o de energia devam ser levadas com calma, para que estudos e análises técnicas sejam feitas com acuidade e divulgadas para avaliação e contribuições dos demais agentes envolvidos.

Bom, finalmente, como tudo isso se torna relevante agora em 2019 e nos próximos anos? O governo Bolsonaro, nos seus primeiros meses, tem sido inconstante a respeito de quais políticas e ações tomar, o que também é valido, em particular, para o setor de energia elétrica. Porém, ainda que sem avançar de forma objetiva no setor, é visível a intenção privatizadora de empresas estatais, num viés claramente pró-mercado e com menor intervenção do Estado. A dúvida, portanto, parece residir em quão fortemente vão tornar o setor aberto e quais os novos papéis assumidos por cada parte: setor privado e governo. Por enquanto, o plano é seguir o Programa de Parcerias de Investimento (PPI), que já diminuiu a quantidade de estatais no setor nos últimos dois anos. Assim, essa reforma deve ganhar mais força e discussões esse ano. Que Bolsonaro e sua equipe sejam iluminados nesse longo caminho.

Autoras:

 Ana Carolina Miranda Lima Nogueira é formada em Ciências Econômicas pela Universidade de Brasília. Ex-estagiária da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. Atual consultora de Business Intelligence da KPMG Brasil.

Geovana Lorena Bertussi é Professora Adjunta IV do Departamento de Economia da Universidade de Brasília. Ministra disciplinas nas áreas de Economia Brasileira, Macroeconomia e Economia da Infraestrutura, com ênfase nos setores de transportes e energia elétrica.

Dados: Câmara se organiza por bancadas, não partidos

Um debate sobre governabilidade marca o início do novo governo: o Presidente deve priorizar os partidos tradicionais nas negociações, ou continuar investindo nas chamadas bancadas?

Há muito, observadores do Congresso apontam que essas bancadas temáticas vão ganhando protagonismo à custa da fragmentação partidária. O problema é que elas são organizações informais, difíceis de definir.

Um esforço inédito de identificar essas bancadas é apresentado na imagem acima. Ela é uma rede com os deputados da última legislatura, isto é, os deputados que atuaram entre 2015 e 2018. Cada ponto é um deputado.

Um deputado aparece conectado a outro se tiverem apresentado juntos alguma proposta, como um projeto de lei. Essa colaboração é opcional: deputados podem apresentar sozinhos uma proposta, ou podem se juntar como coautores para fortalece-la ou por qualquer outra razão.

Por exemplo, Jair Bolsonaro apresentou mais propostas junto com Eduardo Bolsonaro. A conexão entre Jair e Eduardo é uma. No total desta rede são mais de 30 mil conexões!

Deputados mais conectados aparecem em tamanhos maiores. O mais importante é a divisão da rede. Os deputados estão divididos em “comunidades”. Cada comunidade é um grupo de deputados que possui mais conexões entre si do que com os demais.

Ou seja, são deputados que trabalham mais juntos. Como grandes panelinhas de parlamentares.

Nos Estados Unidos, uma rede como essa gera duas comunidades principais: democratas e republicanos. Em diversos outros países em que essa metodologia foi empregada, a divisão da rede de coautores de projetos (cosponsors) se dá de acordo com partidos.

Isto é, as panelinhas de deputados nesses países são simplesmente os próprios partidos. Clique aqui para ver a compilação do pesquisador François Briatte.

Não funciona assim na Câmara dos Deputados do Brasil.

As centenas de deputados se organizaram entre 2015 e 2018 principalmente em grupos que não traduzem os partidos. São as bancadas.

Na imagem acima, apresentamos as bancadas em verde. Algumas comunidades têm base em partidos, elas são apresentadas em azul.

A maior bancada é a bancada evangélica. Esta comunidade é maior do que qualquer partido e é “densa”. Isso quer dizer que a bancada é coesa: seus parlamentares têm muitos laços entre si.

Por exemplo, mais de 40 deputados desse grupo apresentaram juntos um projeto para sustar ato do governo contra a discriminação de travestis e transexuais em estabelecimentos de ensino. Orientação sexual e aborto são alguns dos temas que juntaram vários deputados dessa bancada. Um dos mais importantes é o projeto que pode tornar crime de responsabilidade ministros do STF “usurparem” competências do Congresso em temas como aborto ou descriminalização das drogas.

Jair Bolsonaro foi um dos 5 parlamentares mais “centrais” desta bancada, isto é, está entre os mais conectados. Na imagem abaixo, que mostra apenas a bancada evangélica, Bolsonaro é o ponto destacado.

Bancada evangélica e Bolsonaro

Assim, enquanto boa parte da opinião pública via o deputado como um parlamentar desimportante de um partido pequeno, ele era na verdade um dos deputados mais centrais do principal grupo da Câmara.

Há uma segunda bancada importante: a ruralista, que também se destaca pelo seu tamanho e coesão. Um dos casos mais interessantes é a “bancada do Rio”, o único estado a formar uma, tipicamente exigindo recursos federais para o Estado.

Chama também a atenção a bancada da bala. Apesar de toda a ênfase dada pela opinião pública, ela é na prática uma bancada pequena. Talvez até faça barulho, mas se mobiliza pouco para apresentar projetos ou requerimentos. Ela não deve ser comparada, como frequentemente é, com a evangélica e a ruralista, que são muito mais organizadas.

Quanto aos partidos, existem 5 comunidades na rede que, embora não se confundam com partidos, são baseadas neles. São grupos compostos por vários deputados de um mesmo partido, mas não exclusivamente. Além disso vários dos deputados deste partido pertencem a comunidade.

É o que ocorre com PT, PSB, PSDB e DEM. É como se neles houvesse um núcleo duro com pautas mais definidas, normalmente trabalhando com alguns membros de outros partidos. É isso que as comunidades em azul na imagem representam.

O PSOL é uma exceção: todos os seus membros de fato estão no mesmo grupo. Ele seria o partido mais orgânico da Casa, aquele que tem os deputados que mais “jogam juntos”.

Veja que vários partidos grandes não aparecem na rede, como MDB, PR, PP ou PSD. Seus membros tiveram poucas atividades em conjunto.

Além das bancadas e dos grupos baseados em partidos, há ainda 2 tipos de comunidade na rede. Os em amarelo são grupos de líderes de diferentes partidos, que por conta do regimento interno da Câmara devem cooperar para que algumas soluções sejam encaminhadas. Por isso, líderes partidários tendem a trabalhar formalmente mais com outros líderes partidários do que com seus próprios correligionários.

Por fim, na cor cinza, estão grupos de deputados de origem partidária heterogênea, e que não se especializam em um tema, e por isso não podem ser chamados de bancadas (como a evangélica ou a ruralista). Eles atuam juntos em pautas diversas. Chamo eles de “Centrão”.

Apesar da importância das bancadas na organização da atuação dos membros da Câmara, em contraste com dezenas de países em que a organização da rede de coautorias de propostas se dá por partido, não é óbvio que elas garantam a governabilidade.

Isso tanto porque os líderes partidários têm monopólio para enquadrar os parlamentares quanto porque é possível que as bancadas apenas organizem a apresentação de propostas, mas não sua votação. Na hora do plenário, o “sim” ou “não” pode reduzir a Câmara a dimensões partidárias, a partir do eixo governo-oposição.

Apesar da renovação da Câmara, há muitos reeleitos em várias das bancadas, o que sugerem que a estrutura da imagem acima permanece. Mas novas comunidades vão inevitavelmente se formar, especialmente com a chegada do PSL e do Novo na Câmara.

Pedro Fernando Nery é Doutor e Mestre em economia pela Universidade de Brasília (UnB).

O Fim do Mundo como o Conhecemos?

Vivemos em tempos sombrios. Pelo menos é isto que se é levado a crer pelo zeitgeist atual, conforme refletido em uma série de livros, artigos, blog posts, podcasts e outros meios de expressão. Aparentemente, algumas das realizações e expressões mais estimadas da humanidade (ocidental) estão a perigo ou efetivamente mortas. O caso mais saliente é a democracia. Há tantos livros sobre a morte da democracia, que a resenha no Washignton Post sobre o livro How Democracies Die por Steven Levitsky e Daniel Ziblat (2018) o classifica como sendo: “The best death-of-democracy book I read in 2018.” O tema também tem feito aparições assíduas em podcasts recentes, como o episódio The Death of Democracy no podcast Start the Week da BBC4, ou então o episódio Is Democracy Dead? no podcast Please Explain. Variações em torno do tema anunciam a morte do discurso político civilizado (Washignton Post), e o fim do consenso (The Guardian).

Da mesma forma, tem-se ouvido muito a respeito da morte do liberalismo, entendido como a situação onde uma maioria pode de facto e de jure violar os direitos de minorias, mas opta por não fazê-lo. A chegada recente ao poder de uma série de líderes populistas e autoritários, mesmo em países onde este tipo de coisa não costumava acontecer, seria evidência do fim da ordem liberal mundial. Vide, por exemplo, o artigo Liberal World Order R.I.P. Segundo um debate recente na London School of Economics com o título Crisis of the Liberal World Order, or is the West in Decline?, estaríamos vendo o declínio do senso compartilhado de sucesso, dentro de países e entre grupos de países. É este senso compartilhado de sucesso que garantia o mínimo de terreno comum para que se pudesse resolver ou atenuar conflitos e permitir a continuada geração de prosperidade. Segundo trabalho recente de Dani Rodrik há uma diferença crucial entre democracias eleitorais, que escolhem seus líderes através de eleições, e democracias liberais, que asseguram igualdade perante a lei para minorias. E pelo que se lê e ouve recentemente teremos cada vez mais eleições, mas cada vez menos igualdade e respeito aos direitos de minorias raciais, religiosas, de gênero, de classe, de origem geográfica, etc.

Há alguns anos atrás já havíamos sido informados por Larry Summers que vivemos em uma Estagnação Secular, e por Tyler Cowen que já colhemos os frutos mais baixos e estamos fadados a passar por uma Grande Estagnação. Isto quer dizer que não devemos esperar, como no passado, que crescimento econômico eventualmente retorne e resolva todos os problemas. A expectativa que cada geração terá uma qualidade de vida melhor que a anterior, supostamente não vale mais. Produtividade segue enigmaticamente em queda contínua, apesar de todo avanço tecnológico que parece estar à nossa volta, um fenômeno cunhado de Paradoxo da Produtividade por Robert Solow. E se você acha que pesquisa e inovação vai virar o jogo, pense novamente: a taxa global de inovação já vem arrefecendo a algum tempo. E se você tem esperança que globalização e maior interação entre os países possa ser a solução, a revista The Economist recentemente trouxe uma capa sobre Slowbalization, a morte da globalização.

Anuncia-se também a morte do sonho de um mundo menos desigual, a medida que aumenta o fosso entre os mais ricos e os mais pobres em diversos países do mundo, conforme documentado por Thomas Piketty. Isto, por sua vez, está relacionado com a morte da classe média: a NPR (Radio Nacional Pública dos EUA) noticiou em 2016 que pela primeira vez desde 1970 a classe média não era o principal estrato populacional nos EUA. Isto, por sua vez, vem acompanhado da morte do emprego fixo (the end of work) e carreiras imersas na incerteza da gig economy.

Uma vez que se começa a prestar atenção, passa-se a encontrar cada vez mais notícias da morte de algo que antes parecia eterno, incluindo algumas coisas que supostamente já morreram há algum tempo, como o fim das religiões, o fim do futebol arte, e, como nos avisou The Who lá atrás em 1972, a morte do rock’n roll (dê uma olhada no The Hot 100 da Billboard e veja quantos grupos de rock você consegue encontrar. Reposta: nenhum! Experimente comparar com o Hot 100 de qualquer semana quinze anos ou mais atrás.) Já se anunciou até que estamos vivendo em uma era pós-verdade e não podemos acreditar em que nos dizem. Caso eu tenha omitido a morte de alguma realização humana importante, peço que os leitores incluam nos comentários.

Tudo isto é muito alarmante e desestabilizante. Mas, como afirmou Mark Twain: “The rumours of my death have been greatly exaggerated.” Basta pensar bem sobre qualquer um destes casos e provavelmente a tranquilidade se reestabelece. Não é de hoje que ‘a morte de X’ vem sendo anunciada, e no mais das vezes o futuro se recusa a cooperar. A figura de profetas vestindo um cartaz “O Fim é Eminente” (The End is Nigh) é um estereótipo, mas vários cultos autênticos já passaram pelo vexame de chamar a atenção do mundo para o dia do juízo final, e depois ter que explicar por que a profecia falhou. O termo ‘dissonância cognitiva’ foi criado por Leon Festinger da New School for Social Research, justamente para retratar a insistência de membros de tais grupos em continuar acreditando, apesar das reiteradas evidências em contrário (vide o livro When Prophecies Fail). Um exemplo acadêmico dos riscos de se profetizar ‘o fim de X’ é o best-seller de Francis Fukuyama The End of History de 1992, onde sugeriu que com a queda do Muro de Berlim, a última alternativa ao liberalismo havia morrido e com isto o mundo entraria em uma nova e última fase onde veríamos o triunfo do Ocidente. Outro exemplo é a previsão Marxista de que o capitalismo continha dentro de si sua própria destruição, que levaria necessariamente ao socialismo.

É interessante que previsões alarmantes e pessimistas parecem atrair muito mais atenção do que analises otimistas e baseadas mais rigorosamente em evidências que mostram o quanto as coisas tem melhorado ao longo do tempo, como o livro The Better Angels of Our Nature: Why Violence has Declined, de Steven Pinker (2011) e o trabalho de Hans Rosling com seu projeto Gapminder que visa disseminar o uso intensivo de estatísticas para melhor se compreender o mundo.

Então, não há motivos para pânico e podemos dormir tranquilos.

Mas será que realmente podemos? Recentemente tenho visto em diferentes lugares uma nova previsão que me parece um pouco mais preocupante do que as outras: o fim da competição, e com isto o fim do capitalismo como o conhecemos. O que mais me chamou a atenção foram as fontes que têm feito este alerta, pois são fontes explicitamente liberais, pro-mercado e não afeitas a sensacionalismo ou teorias de conspiração. A primeira foi um special report na The Economist com o título The Age of Giants, no qual alertam que um grupo de empresas têm se tornado excessivamente poderosas e que governos e antitruste tradicional estão cada vez mais incapazes de regulá-las ou impedir as consequências nefastas que sua atuação vêm cada vez mais trazendo à luz. As pessoas costumam colocar a culpa do estado das coisas em banqueiros, políticos, especialistas, burocratas, estrangeiros, na China, entre outros. Mas segundo este artigo a verdadeira ameaça pode estar justamente naquelas empresas que nos provêm, muitas vezes de graça, os produtos e serviços que mais gostamos. Onde antes competição via mercado ou imposta por autoridades antitruste seriam capazes de limitar o abuso do poder destas grandes empresas, hoje, com efeitos de rede e outras características de mercados digitais, não haveria forças capazes de contê-las (vide o post de João Pedro Arbache neste mesmo blog em 31/01/2019 sobre as características destes novos mercados). Segundo a revista o aparato antitruste desenvolvido para a velha economia de cimento e tijolo está em um perigoso estado de decadência intelectual que favorece uma perigosa falta de ação em um mundo que está rapidamente mudando.

Recentemente o Departamento de Justiça Americano tentou impedir uma fusão entre a AT&T e a Time Warner, mas foi revertida por um juiz que chancelou o acordo de US$85 bilhões. Uma fusão posterior entre a Walt Disney e a Twenty-First Century Fox valendo US$71, 3 bilhões não foi contestada nos EUA, e está sendo acompanhada pelo CADE assim como autoridades antitruste na Europa e até na China. Em outro caso recente a American Express ganhou na Suprema Corte Americana um caso em que o governo a acusava de abusar sua posição como mercado de lados. Eu não quero sugerir que necessariamente estes casos em particular sejam evidência de erros na área de competição, mas sim que ilustram a natureza cada vez mais complexa das situações que envolvem muitas grandes empresas atualmente. É justamente a incapacidade do aparato antitruste teórico e prático atual de nos ajudar a entender a fundo estes casos que é o problema.

A segunda fonte com uma mensagem semelhante foi o podcast Econtalk (25/02/2015) que entrevistou Mike Munger (Duke University) sobre um texto recente com o título The Road to Crony Capitalism. Em 1944 Hayek avisou do perigo da intervenção governamental em The Road to Serfdom ao prevenir que mesmo um pouco de planejamento central tendia a gerar distorções que requerem cada vez mais planejamento, até que não há mais volta de uma economia ineficiente e atrasada. Em The Road to Crony Capitalism o argumento é que a medida que as empresas crescem e se tornam cada vez mais poderosas, elas estão cada vez mais em posição de usar o Estado, via lobby, tarifas, concessões, regulamentação, etc., para atingir seus fins, fazendo com que fiquem ainda mais poderosas e dominantes, levando também a uma economia desigual e ineficiente. No novo cenário de economias de rede, as empresas tenderiam cada vez mais a se encontrar em tal situação, e mesmo aquelas que preferissem optar por não jogar o jogo do capitalismo de compadrio, não teriam esta opção, pois seriam forçadas a participar pelos seus próprios acionistas que esperam lucros, ou por investidores hostis sem tais escrúpulos. Bill Gates, por exemplo, tentou evitar que a Microsoft lançasse mão de lobistas e outras estratégias semelhantes. Para ele a Microsoft seria uma empresa diferente. Mas após o traumático caso antitruste do governo Americano contra a inclusão do Internet Explorer no Windows 95, ficou claro que esta não era uma opção viável. Da mesma forma, a Google, que provavelmente vislumbrava algo semelhante quando escolheu em 2000 o motto Do No Evil, optou recentemente por remover esta menção em seu código de conduta oficial.

O que é mais alarmante diante destas perspectivas é que, se realmente forem verdadeiras estas ameaças, o que pode ser feito? A primeira linha de defesa deveria ser a competição. Normalmente o próprio mercado daria um jeito à medida que lucros altos fizessem com que novos entrantes criassem novos produtos e novas firmas que corroeriam as vantagens adquiridas pelas grandes empresas. Quando isto falhava, havia sempre antitruste, que é uma forma de competição artificial, quando a coisa real não emerge por conta própria. Mas, conforme argumentado acima, e conforme um novo livro por Tim Wu (que cunhou o termo ‘neutralidade de rede’) The Curse of Bigness: Antitrust in the New Gilded Age, o estado atual do estabelecimento antitruste não é capaz de nos proteger. A situação é de tal forma desesperadora, que no episódio de Econtalk mencionado acima, os interlocutores se veem forçados, com embaraço confessado, a sugerir que o que precisamos é de pessoas boas e morais. Nenhum sistema pode funcionar se as pessoas não tiverem um mínimo de escrúpulos, princípio e normas. Se os donos e dirigentes das empresas se recusarem a jogar o jogo do capitalismo de compadrios a situação poderia ser atenuada.

Este argumento parece incrivelmente ingênuo e vazio, especialmente vindo de dois economistas libertários e adeptos à Public Choice. Economistas tendem a ser mais maquiavélicos e defender que um bom sistema tem de ser desenhado para funcionar até com pessoas com as piores intenções. Ou, como colocou Milton Friedman:

It’s nice to elect the right people, but that isn’t the way you solve things. The way you solve things is by making it politically profitable for the wrong people to do the right things.

No entanto, o argumento que uma Economia funcional não pode prescindir de boas pessoas vêm ganhando força, mesmo dentro da profissão dos economistas, onde considerações de valores morais e virtudes nunca foram bem vistas. O título do livro de 2016 de Samuel Bowles, The Moral Economy: Why Good Incentives Are No Substitute for Good Citizens expressa bem esta noção. Diedre McCloskey não só lançou uma trilogia sobre o papel de valores e ética no crescimento econômico, mas seu próximo livro, a ser lançado este ano, se chama How to be a Humane Libertarian: Essays for a New Liberalism. Há também o livro de Timothy Besley (2007) Principled Agents? The Political Economy of Good Government que enfatiza a importância de ter um sistema que escolha bons dirigentes.

Com as fragilidades da teoria econômica atual expostas pela crise econômica global, o clima está mais propício do que nunca para a consideração de moralidade e virtude. O problema principal agora é como implementar essas ideias.

Bernardo Mueller é professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília e autor dos livros Brazil in Transition: Beliefs, Leadership and Institutional Change (2016) e Institutional and Organizational Analysis: Concepts and Applications (2018).

Políticas Públicas e Eficiência Alocativa na Educação

Nas últimas décadas, a educação foi sendo paulatinamente assumida como um verdadeiro mantra em termos de políticas públicas e prioridades. Melhores níveis de educação da população em geral e da força de trabalho em particular ampliariam as possibilidades de crescimento (ver, a título de exemplo da extensa literatura, Gemmell (1996), Toppel (1999), Lucas (1988)), seriam cruciais para combater a pobreza, constituiria uma variável chave para explicar o perfil distributivo das sociedades (ver, por exemplo, Mincer (1958), Langoni (1972), Acemoglou (2012), (2002), etc.) e ajudaria a explicar os indicadores de felicidade auto-declarados dos indivíduos. Esses nexos teóricos e empíricos parecem bem sedimentados na literatura, ainda que não possam deixar de ser considerados argumentos que relativizem essa importância, especialmente no tocante à relevância da suposta relação de causalidade entre educação e crescimento e aos diferenciais de níveis auto-declarados de felicidade entre indivíduos e sua relação com os patamares de escolaridade atingidos.

Em geral, a educação, seguindo a tradição inaugurada por Becker, Mincer, etc., é identificada com a acumulação de conhecimentos, habilidades, etc. que tem impacto sobre a produtividade e, na medida em que esta está associada ao crescimento e aos salários, acaba tendo desdobramentos positivos sobre os níveis de renda da sociedade e dos indivíduos.

Se, diferentemente desta perspectiva, a educação é assumida como sendo a acumulação de sinais ou credenciais para se diferenciar dos concorrentes na disputa por vagas (posicionamento relativo no mercado de trabalho), os ganhos sociais (não individuais) dos investimentos em educação podem ser questionados. Neste caso, o Estado deveria prescindir de alocar recursos públicos na área, uma vez que as credenciais não teriam uma correspondente contrapartida em conhecimentos/competências/habilidades sócio-emocionais. Logicamente, a dicotomia acumulação de capital humano/acumulação de sinais pode não ser bipolar no conjunto. Existem fortes elementos teóricos e empíricos que induzem a pensar que a educação pode ser uma mistura (em diferentes proporções, segundo os países, períodos históricos ou segmentos do sistema educativo) de acumulação de conhecimentos/habilidades e da procura por agregação de credenciais.

Uma vez que o nosso objetivo consiste em refletir sobre uma suposta conveniência de intervenção estatal a fim de tornar os investimentos públicos e privados na acumulação de capital humano mais eficientes, vamos admitir que a educação, na sua totalidade ou parcialmente, consiste em atividades que contribuem para acrescentar conhecimentos/habilidades/competências, sejam eles cognitivos ou sócio-emocionais.

Dada a hipótese da educação pós-compulsória ser identificada como uma atividade que, no futuro, vai se traduzir em maior produtividade/salários, acompanhando princípios básicos da Teoria do Capital Humano, a freqüência escolar deve ser reconhecida como um investimento e não pode fugir dos banais critérios que determinam se uma aplicação financeira deve ou não ser realizada: o valor presente do fluxo de benefícios (objetivos, como salários, ou subjetivos, como status social) devem ser superiores aos custos (financeiros diretos, de oportunidades, de sacrifício por abrir mão de lazer, etc.). O balanço dessa relação depende de diversos fatores (taxa de desconto, por exemplo) e a sua concretização pode estar em função da existência ou não de restrições de crédito. Além de olhares meramente econômicos, a intervenção pública associada a essas duas variáveis (taxa de desconto e restrições de crédito) podem dizer respeito a aspectos de justiça ou igualdade de oportunidades.

Contudo, associando a educação a um investimento (abrimos mão do consumo hoje para elevar o valor presente do fluxo de renda futura), a utilização dos habituais instrumentos metodológicos que pautam a viabilidade de uma aplicação financeira é cabível. Mais especificamente, é incontornável estar familiarizado com dados sobre o presente e tentar esboçar o porvir. Observemos que o investimento em educação é uma atividade que deve levar em consideração horizontes temporais que podem se aproximar ao meio século. A quase trivial escolha de um curso em uma universidade pauta custos futuros (por exemplo, a probabilidade de ficar desempregado por longos períodos na sua vida ativa) e retornos vindouros (evolução dos rendimentos nos próximos quarenta anos) que, ex-post, quer seja desde uma perspectiva individual ou social, podem não ter sido as melhores escolhas.

Concretamente, os critérios econômicos para a escolha de um investimento em educação (um curso) exige conhecer os salários relativos de cada uma das alternativas factíveis, as possibilidades de emprego, as eventuais trajetórias profissionais, os possíveis cenários em termos de demanda futura devido, por exemplo, a choques tecnológicos, etc.. Os gostos e as facilidades de cada indivíduo em cada área devem logicamente ser variáveis levadas em consideração, especialmente no tocante aos custos individuais. Contudo, os gostos, vocações, etc. deveriam ser somente um dos aspectos a entrarem no cálculo, que podem ou não ser compensados pelas outras variáveis (futuros rendimentos, por exemplo).

Se imaginarmos um processo no qual o mercado alocaria de forma eficiente os recursos investidos na educação, além dos usuais supostos sobre a racionalidade do “agente” (neste caso o processo de escolha entre estudar ou não e o quê e o quanto estudar), o arranjo ótimo requereria (como no modelo de Arrow-Debreu) que o indivíduo tenha à sua disposição um conjunto amplo de informações sobre o presente (salários relativos, taxas de ocupação, taxas de desemprego, etc..), os cenários futuros e a flexibilidade ou graus de liberdade que cada escolha lhe proporcionará amanhã. Mesmo deixando de lado externalidades (que podem determinar que os custos/benefícios individuais sejam diferentes dos sociais) ou a pouco crível hipótese da “probabilização” das alternativas nas próximas décadas, não existem elementos que nos permitam concluir que, em cada momento do tempo, as pessoas possuam ou estimem esses parâmetros e, mesmo estando dispostos a pagar por eles, que exista um mercado específico para esses dados.

Logicamente, se poderia arguir que “mercado”, em cada momento do tempo, proporciona livremente (sem custos) parte desses sinais. Os salários relativos podem estar sugerindo que profissões estão sendo mais demandas que outras. As taxas de desemprego podem revelar com que conhecimentos/habilidades/competências é mais fácil encontrar emprego ou, em outros termos, os conhecimentos/habilidades/competências requeridas pelas vagas que são abertas e a quantidade de vagas vis-à-vis a oferta. Mas mesmo na suposição otimista que um indivíduo antes de sua decisão de escolher seu curso esteja de posse dessas informações, dificilmente a mesma configuração vá prevalecer pelos próximos 40/50 anos. Ele teria que ser capaz de prospectar (e, se somos mais sofisticados, “probabilizar” possibilidades).

Nada garante que todo esse conjunto de hipóteses se cumpra. Aliás, realisticamente podemos supor que muito poucas delas prevalecem no dia-a-dia. A tomada de decisões talvez obedeça a outros parâmetros: expectativas e tradição familiar, informações de amigos/colegas, disponibilidade de cursos, gostos, capacidades inatas, valores do entorno social, etc.. Parte desses parâmetros podem ser considerados como fazendo parte do modelo canônico. Os gostos e as habilidades inatas podem reduzir os custos (objetivos e subjetivos) do projeto de investimento em educação. Contudo, em outros casos (ambiente familiar/social, amigos, etc.) a fonte de informações pode não ser robusta ou estar viesada ou simplesmente não existir.

Essas limitações, nos processos individuais que pautam as escolhas de investimento em capital humano, tem custos, tanto privados quanto sociais. Por exemplo, a falta de aderência entre o perfil profissional requerido pelas vagas disponíveis e o contorno das habilidades/competências da oferta de trabalho tem como corolário uma alocação ineficiente da mão-de-obra e/ou sua subutilização (desemprego). Em termos técnicos, essa disfunção (mismatching) é usualmente mesurada através da posição da denominada Curva de Beveridge. Uma conseqüência seria, por exemplo, a sobrequalificação dos empregados, um fenômeno usual nas economias maduras.

Uma situação análoga à que estamos descrevendo pode ser observada no caso das políticas de emprego. O Sistema Público de Emprego proporciona aos beneficiários do seguro-desemprego informações sobre profissões/setores/áreas geográficas nas quais ele tem maiores possibilidades de ser contratado e, nesse sentido, pauta as ações (cursos oferecidos, intermediação, etc.) que tem como alvo cada desocupado. Ou seja, assume-se que os sinais de mercado (salários relativos, diferenciais geográficos nas taxas de desemprego, etc.) demoram ou sua disseminação é imperfeita. Nesse sentido, a intervenção pública ajudaria (“azeitaria”) o matching entre oferta e demanda.

Na educação, diversos passos foram dados nessa direção nas últimas décadas, especialmente a implementação e ampla divulgação de sistemas de avaliação, que proporcionaria informações sobre a qualidade dos cursos. Teoricamente, a qualidade de um curso teria impacto sobre o capital humano dos alunos e, via produtividade, nos salários no transcurso de sua vida profissional. Existem evidências que dão robustez empírica a essa suposta correlação. Ou seja, os alunos teriam informações sobre a qualidade do curso de um estabelecimento, referência que ajudaria na tomada de decisões.

Contudo, ganhos de eficiência macro seriam dilatados e frustrações individuais seriam reduzidas no caso de outros arranjos legais ampliarem o leque de informações públicas de fácil acesso. Por exemplo, os estabelecimentos poderiam divulgar os salários de seus egressos, as taxas de desemprego, as firmas/instituições nos quais foram empregados, etc.. Se o processo educativo é reduzido à dimensão econômica, sendo a educação assumida como investimento com custos e retornos, nada mais próximo a essa perspectiva que os MBA’s, cursos identificados como sendo um trampolim para melhores empregos ou para turbinar a progressão funcional. Geralmente pagos e muito caros, muitas instituições divulgam salários e tipos de ocupação de seus antigos alunos como forma de “vender” seu produto no mercado (ver, por exemplo, aqui, aqui ou aqui).

Essa maior disponibilidade de informações poderia ser crucial na hora da tomada de decisões, redundando em maior eficiência alocativa macro e maiores retornos individuais. Se a educação é definida como um investimento, as escolhas devem estar pautadas pelos usuais critérios que norteiam qualquer investimento e, nesse sentido, a disponibilidade de informações é vital. Nesse contexto, o Estado deveria assegurar esses referenciais, obrigando ou induzindo às instituições a divulgarem dados (salários de seus egressos, firmas ou setores onde foram empregados, tempo para encontrar uma ocupação, etc.) que subsidiem as escolhas. Seria conveniente que a eleição de um curso deixe de ser, exclusivamente, pautada por informações subjetivas de amigos/parentes, tradições, supostas vocações, etc.. Em um ambiente no qual o objetivo em elevar a produtividade parece ter se tornado prioridade absoluta, avanços nesse sentido complementariam outras iniciativas.

Carlos Alberto Ramos é Professor do Departamento de Economia, UnB. Graduação Universidad de Buenos Aires, Mestrado na Universidade de Brasília, Doutorado na Université Paris-Nord.