Economia de Serviços

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O Ensino a Distância pode melhorar o desempenho educacional do país?

Em um post anterior, Tiago Xavier abordou a relação entre o setor de tecnologia da informação e comunicação e o desenvolvimento econômico. E quanto à educação? É possível utilizar tecnologias de informação para melhorar o desempenho educacional do país? A resposta parece ser positiva, e um dos caminhos para obter essa melhoria é a modalidade de educação a distância (EaD).

Para as empresas que adotam a EaD, para os estudantes e também para os educadores, essa modalidade apresenta diversos benefícios, como, por exemplo, a flexibilidade nos horários das aulas, a autonomia para os estudos, e a redução dos custos com deslocamento. O Canadá foi o pioneiro na educação a distância e hoje é membro global do Conselho Internacional de Educação Aberta e a Distância. Das 56 universidades canadenses existentes, 53 oferecem cursos a distância.

No Brasil, a EaD permitiu a ampliação no número de alunos que podem obter o nível superior sem que estes necessariamente precisem abrir mão de outras atividades que os impedem de comparecer às aulas presenciais, dada a possibilidade de adaptar as aulas aos seus horários disponíveis. Além disso, essa modalidade permite que estudantes tenham aulas com professores qualificados, em qualquer lugar do mundo, sem a necessidade de deslocamento. As empresas que adotam a EaD também economizam, visto que não há a necessidade de um espaço físico com estrutura para aulas presenciais.

Apesar dos benefícios, o ensino a distância traz alguns desafios. De acordo com o Censo realizado pela Associação Brasileira de Ensino a Distância, a evasão é o maior obstáculo enfrentado por instituições que oferecem cursos remotos, seguida da resistência dos educadores quanto à modalidade de EaD. Portanto, por parte das instituições de ensino, presar pela motivação dos alunos e contratar professores qualificados e atenciosos é condição essencial para o sucesso de cursos desse tipo.

Assim, os investimentos em EaD devem ser realizados com cuidado. É necessário que haja um contínuo monitoramento das atividades. Universidades como Harvard e MIT estão estudando como o big-data pode melhorar a atuação de seus professores em cursos online.

Presente em diversas áreas do conhecimento (ver Gráfico 1), o ensino a distância ainda recebe relativamente pouco investimento público. A maior parte dos investimentos realizados nessa área são privados e isso parece gerar disparidades regionais (ver Censo EaD 2014). No Brasil, 41% das instituições que oferecem cursos EaD estão no Sudeste; 25%, na Região Sul; 15%, no Nordeste; e 10%, no Distrito Federal. A menor quantidade de instituições encontra-se nas regiões Norte e Centro-Oeste (excluindo-se o DF), que, juntas, somam 9% do total.

O caso da EaD é apenas um exemplo de como uma economia globalizada e com trocas de informações e serviços pode melhorar e promover o crescimento de alguns setores. Economias que possuem excesso de mão de obra qualificada, ou aquelas que conseguem desenvolver melhores pesquisas em determinadas áreas, podem auxiliar os países menos desenvolvidos nessas áreas. Nesse contexto, a profusão de cursos online abertos do tipo MOOCS (Massive open online course), bem como a iniciativa MIT OpenCourseWare (que disponibiliza online o conteúdo dos cursos do MIT), são interessantes exemplos.

Gráfico 1. Percentual de cursos regulamentados e totalmente a distância: ofertados em 2014, por área do conhecimento

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Fonte: Censo da Associação Brasileira de Ensino a Distância (2014/2015)

Conheça as fintechs: as startups que já deveriam estar no seu celular

Silicon Valley is coming.

Com a frase acima, o CEO da JP Morgan Chase Jamie Dimon referia-se às fintechs, novas empresas de tecnologia financeira que estão revolucionando o sistema financeiro. Essas startups exploram a revolução digital para prover serviços financeiros com flexibilidade e com a comodidade de um atendimento que tem como único intermediário o smartphone. A ausência de uma estrutura física de atendimento possibilita o fornecimento de recursos com taxas inferiores aquelas cobradas por intermediários tradicionais.

Essas empresas têm conseguido atrair de forma massiva os jovens, que são seu público-alvo justamente por sua aversão à burocracia das agências e bancos. O resultado desse fenômeno é o assustador crescimento das fintechs: em 2014, os aportes nessas empresas foram superiores a US$ 12 bilhões, o triplo do volume registrado no ano anterior.

Gráfico 1: Investimentos globais em fintechs

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                        Fonte: Accenture, 2015.

As fintechs vão muito além do tradicional mercado bancário, com o fornecimento de recursos em diversas modalidades, como o empréstimo para pequenos negócios (OnDeck), peer-to-peer (Venmo) e crowdfunding (Kickstarter). Entre os destaques brasileiros está o Nubank: criada em 2014, a startup oferece o serviço de cartão de crédito internacional sem anuidade, com todo o controle e relacionamento feito por meio de seu aplicativo. A empresa recebeu mais de US$ 200 milhões em seu quarto aporte e já tem mais de 1,5 milhão de pessoas em lista de espera para receber o cartão.

Ainda não se sabe, todavia, se os serviços prestados pelas fintechs como o Nubank serão complementares ou substitutos aos tradicionais serviços financeiros. No grupo dos mais jovens, que costumam enfrentar questões financeiras menos complexas , o desempenho é expressivo. Iniciativas recentemente anunciadas, como a possível estruturação de um programa de milhas, sinalizam o interesse em ganhar espaço entre clientes de renda mais elevada. Mas ainda não se pode afirmar se a startup conseguirá satisfazer as demandas mais sofisticadas e mais intensivas em recursos também desses clientes. Ao que tudo indica, a própria experiência com os usuários mais jovens poderá gerar insumos suficientes para um avanço mais forte na direção de clientes mais maduros no futuro.

Permanecem em aberto, no Brasil e no mundo, questões importantes sobre como regular e supervisionar essas empresas, que também carregam consigo os riscos inerentes à qualquer atividade financeira. Além disso, mesmo com um mercado ainda em crescimento, algumas startups já iniciaram o caminho inverso, com vendas totais ou em participação para bancos.

A união, todavia, parece mutuamente benéfica, já que implica em aportes robustos e em acesso a informações sobre perfis de clientes para as startups. Do lado dos bancos, crescem as possibilidades de inovação no provimento de serviços prestados por dispositivos móveis. Para os usuários, a própria existência das fintechs em um sistema bancário concentrado como o brasileiro pode trazer benefícios, como uma corrida para prestar serviços mais baratos e de melhor qualidade.

Serviços de valor e serviços de custo

O setor de serviços é heterogêneo em praticamente todos os aspectos, englobando desde ramos como bares até atividades de P&D. Uma classificação bastante utilizada é entre serviços de consumo final e serviços para empresas. Apesar de a maior parte da literatura sobre o setor se concentrar no primeiro grupo, é o segundo que tem mais ramificações e impactos na economia, conforme discutido em post anterior.

Porém, mesmo dentro desses grupos, há, ainda, grande heterogeneidade. Arbache (2014)  propõe a classificação dos serviços para empresas em dois grupos: aqueles que contribuem principalmente para a agregação de valor e os serviços de custo, ou seja, aqueles que são itens básicos de produção. Esta divisão é necessária, pois os grupos de serviços participam de forma distinta do processo produtivo e parecem impactá-lo de maneira diferente.

O primeiro grupo é formado por atividades que contribuem mais para a customização e a diferenciação dos produtos. Por consequência, esses serviços tornam os produtos menos facilmente substituíveis e podem promover maior competitividade, produtividade e retorno do capital. Neste grupo incluem-se serviços que normalmente requerem mais capital humano, como P&D, design, consultorias de gestão, projetos de engenharia e arquitetura, produção de softwares, branding e marketing. Essas atividades são mais importantes em mercados de produtos mais sofisticados, nos quais a diferenciação é mais necessária.

Já o segundo grupo é composto por serviços que afetam principalmente os custos de produção sem necessariamente contribuir para a geração de valor, como logística e transportes, infraestrutura, reparos e manutenção, serviços financeiros, viagens e acomodação. Naturalmente, serviços de custo melhores ou mais baratos podem contribuir para aumentar a competitividade, mas normalmente pouco contribuirão para diferenciar produto. Quanto mais homogêneo ou “commoditizado” for um bem, mais importantes serão os serviços de custo para lhe garantir competitividade.

Não por acaso, as atividades de serviços de agregação de valor nas cadeias globais de valor estão concentradas nos países desenvolvidos, enquanto montagem e serviços de custo estão normalmente em países em desenvolvimento (UNCTAD, 2013).

Em recente artigo, Arbache e Moreira (2015) apresentam evidências de que ramos industriais que usam mais intensivamente serviços de agregação de valor têm produtividade do trabalho maior do que ramos que usam mais intensivamente serviços de custo.

Tornar nossos serviços de custo mais competitivos certamente trará ganhos para toda a economia. Mas, para aumentar a produtividade agregada e gerar mais riqueza e bons empregos, será preciso investir mais nos serviços de agregação de valor.

 

Por que a Apple vale mais que todas as empresas na Bovespa?

O Jornal O Estado de São Paulo de hoje informa que o valor de mercado da Apple fechou, ontem, 24/7/2015, a US$ 714 bilhões, US$ 29 bilhões a mais que todas as empresas de capital aberto na Bovespa.

Como isto é possível? Claro, são muitas as explicações, as quais incluem as condições atuais da economia americana e brasileira, taxa de câmbio, dentre outras. Mas tem um aspecto que merece destaque. Trata-se da natureza das empresas em questão.

A Apple nasceu essencialmente uma empresa de hardware. Por anos, seguiu o caminho de tantas outras empresas americanas em busca dos louros do mercado de computadores. Mas, com o passar do tempo, a Apple aprendeu que, muito mais que produzir equipamentos, o que cria mesmo valor adicionado são os serviços embutidos nesses equipamentos e as funcionalidades dos mesmos. Não por acaso, a empresa é, hoje, acima de tudo, uma vendedora de serviços.

A Google também teve a mesma compreensão, mas seguiu o sentido oposto. Nasceu essencialmente uma empresa de serviços, desenvolvendo e fornecendo os mais diversos tipos de funcionalidades, muitos delas gratuitamente. Mas, com o tempo, entendeu que a verdadeira agregação de valor está em vender esses serviços e funcionalidades embutidos em equipamentos. Claro, ao invés de produzirem funcionalidades para, digamos, a GM oferecê-los em seus carros, porque não ela mesma não faria isto? Bingo! A empresa é, cada vez mais, sócia e desenvolvedora de hardwares, como os carros inteligentes, os quais serão, acima de tudo, passaportes para os serviços e funcionalidades que ela cria.

No século XXI, a criação de valor e de bons empregos já está, mas estará cada vez mais associada ao conhecimento e à capacidade de fomentar a relação sinergética e simbiótica entre bens e serviços para se criar um terceiro bem que nem são serviços nem tampouco bens convencionais, mas um mix entre os dois. Por aqui passa uma das principais razões da Apple valer tanto.

E aqui entre nós? Bem, uma inspeção nas empresas listadas na Bovespa mostraria larga predominância de empresas de commodities ou fortemente dependentes de commodities, como siderúrgicas, empresas de consumo, empresas de serviços de baixo valor adicionado e empresas de ramos industriais de médio ou baixo conteúdo tecnológico. Ou seja, um rol de empresas que é a cara do século XX, se muito.

Claro que produzir commodities não é um problema. O problema é não agregar valor e não desenvolver conhecimentos e tecnologias que façam dessa vantagem comparativa um passaporte para o século XXI e para a geração de valor e de empregos de qualidade.

Como se dá a moderna relação entre bens e serviços?

O aumento da participação do setor de serviços na economia é um fato estilizado. Mas o aumento desta participação e a forma como ela evolui dependem do estágio de desenvolvimento do país.

Análise da trajetória do desenvolvimento industrial ajuda no exame do crescimento e da dinâmica dos serviços.[1] Os países iniciam as suas respectivas jornadas de desenvolvimento industrial, cada um ao seu tempo e ao seu modo, na região R1 do gráfico 1 abaixo. Nessa região, a participação da agricultura no PIB ainda é elevada. Mas à medida que as economias se urbanizam, cresce a demanda por produtos industriais básicos como ferro, aço, cimento e produtos químicos. A região R2 caracteriza a fase do desenvolvimento em que expandem a indústria de base, manufaturas de baixo valor adicionado e serviços gerais.

Tudo o mais constante, quanto mais as indústrias básicas e leves expandem, menor será a sua contribuição marginal para o crescimento do PIB, o que decorre do aumento da diversificação da demanda em favor de bens e serviços mais sofisticados.

espaco industria

As economias eventualmente atingem um ponto de inflexão e entram num outro estágio da dinâmica do desenvolvimento industrial, este, muito mais sofisticado que R2. A região R3 é caracterizada pela fase em que crescem os investimentos em atividades industriais que requerem mais serviços de logística, serviços financeiros, projetos de engenharia, marketing, dentre tantos outros de apoio ao desenvolvimento industrial, ao comércio e à terceirização da produção. Nesta fase, a densidade industrial passa a crescer rapidamente e vir acompanhada do aumento da participação dos serviços comerciais na economia, ao tempo em que declina a participação relativa da indústria no PIB.

A passagem de R2 para R3 normalmente caracteriza o rompimento da armadilha da renda média. Neste estágio, a demanda das famílias por serviços mais sofisticados de saúde, educação, previdência, lazer, mobilidade urbana, segurança e conectividade crescem rapidamente.

A região R4 é caracterizada pelo estágio mais avançado do desenvolvimento industrial. A densidade industrial continua a expandir e vem acompanhada de demanda mais que proporcional de serviços comerciais, enquanto a participação relativa da indústria continua a declinar. Esse estágio também é caracterizado pela intensa participação da indústria no desenvolvimento de inovações e soluções do setor de serviços com vistas a se produzir bens cada vez mais sofisticados e com mais funcionalidades. Serviços avançados nas áreas de telecomunicações, serviços de Internet, big data, internet das coisas, cloud computing e desenho de sistemas de computadores, por exemplo, estão na mira dos investimentos em P&D da indústria.

O declínio da participação relativa da indústria no PIB não implica dizer que a indústria perdeu relevância. Na verdade, o aumento da densidade industrial caracteriza uma fase muito mais sofisticada e influente da indústria, a qual é marcada pela mudança da natureza dos bens, da forma como são produzidos e da sua relação com os serviços. A indústria passa a ocupar papel catalisador de geração de riquezas e de P&D, mas num nível muito mais complexo e sofisticado.

As regiões R3 e R4 caracterizam estágios do desenvolvimento industrial em que se desenvolve relação simbiótica e sinergética entre a indústria e os serviços para criar valor. O valor do bem industrial será maior quando combinado com serviços para formar um terceiro produto que não é propriamente um bem industrial nem tampouco um serviço. Trata-se de bens industriais com elevada participação de serviços no seu valor agregado, como é o caso dos iPads e de produtos vendidos em “pacotes”, como computadores de grande porte ou turbinas de aviões – a comercialização de turbinas, por exemplo, é acompanhada de serviços de leasing, seguros, treinamento, engenharia, manutenção e outros serviços pós-venda e B2B. Mas produtos com elevado componente de serviços, como aqueles em que design e branding têm grande contribuição no valor final, também não se enquadram nas rígidas classificações convencionais de bens e serviços.

O gráfico 2 mostra o espaço-indústria em 2011. Brasil e Estados Unidos tinham participação parecida da indústria no PIB. No entanto, a densidade industrial americana era oito vezes maior que a brasileira, a qual se devia, em boa parte, à criação de valor conjunta e complementar entre a indústria e os serviços. No século XXI, o setor de serviços é crucial e determinante para o desempenho da indústria e para a geração de riquezas.

Espaço Indústria

[1] A densidade industrial de um país é calculada como o valor adicionado da indústria de transformação dividido pela sua população total. A densidade industrial reflete a disponibilidade de recursos que contribuem para a agregação de valor, incluindo capital humano, C&T, P&D, instituições e infraestrutura. A densidade industrial captura a disposição, tácita ou explicitamente, da sociedade de disponibilizar recursos para o avanço do desenvolvimento industrial (Arbache 2012). O espaço-indústria tem três dimensões: participação da indústria no valor adicionado (D1), densidade industrial (D2), e participação dos serviços comerciais no PIB (D3).

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