Economia de Serviços

um espaço para debate

Category: Competitividade (page 4 of 9)

Serviços de logística e competitividade

Um dos argumentos mais populares para se explicar a baixa competitividade da economia brasileira é a infraestrutura defasada. De fato, a infraestrutura brasileira tem sido apontada como um dos principais obstáculos para a baixa competitividade das empresas. O indicador de competitividade do Fórum Econômico Mundial aponta o Brasil na 77ª posição dentre 140 países. No caso específico de indicadores de serviços de logística, o relatório mostra o Brasil na 111ª posição em infraestrutura de rodovias; 114ª posição em portos; e 93ª posição em transporte ferroviário. O relatório Doing Business do Banco Mundial mostra que a infraestrutura deficiente é um dos maiores empecilhos para se fazer negócios no Brasil.

As evidências empíricas sugerem que um dos principais problemas é o baixo investimento no setor. McKinsey (2013) mostra que enquanto o Brasil investe 2,2% do PIB em infraestrutura, os países em desenvolvimento investem, em média, 5,1% e a China 8,5%.  Mussolini e Teles (2010) mostram evidências de que uma das causas da baixa produtividade total dos fatores no Brasil desde a década de 1970 é o baixo investimento público em infraestrutura.

Todos os setores padecem da infraestrutura deficiente. Porém, os impactos diferem. De um lado, serviços de logística têm grandes impactos nas atividades com cadeias de produção mais longas e que requerem muita articulação e movimentação de cargas – este é o caso de muitos segmentos industriais. De outro lado, serviços de logística são importantes para atividades commoditizadas, como soja e ferro gusa, cuja competitividade é muito dependente de custos baixos.

Arbache (2014) mostra que as despesas com transportes e fretes respondem por 16% do total de serviços intermediários consumidos pela indústria manufatureira, o terceiro maior item, ficando atrás somente de serviços financeiros e serviços industriais e de manutenção prestados por terceiros. Despesas com transportes e fretes no Brasil perfazem quase o dobro do que se observa internacionalmente a partir de matrizes de insumo-produto comparáveis.

São múltiplas as explicações dos elevados gastos com serviços de logística. Uma são as condições deficientes das infraestruturas, que elevam os custos operacionais das transportadoras e armadores. Mas há outras razões que também contribuem, incluindo a elevada carga tributária de 24% incidente sobre os serviços de transporte e a estrutura de mercado que, de um lado, é oligopolizada, quando se tratam de serviços mais sofisticados e, de outro, pulverizada, quando se tratam de serviços de cargas gerais.

De fato, Arbache (2015) mostra que as firmas de transporte rodoviário de cargas têm, em média, apenas 5,3 funcionários, sendo que 51,6% das firmas têm entre 0 e 2 funcionários, e que o setor é dominado por microempresas ou negócios individuais com pouco ou nenhum acesso a crédito e tecnologia. O setor de logística também padece de regulamentações que dificultam a competição em diversos segmentos do setor, o que reduz o espaço para inovações e aumento da eficiência.

Como resultado da limitação de oferta de infraestrutura e das características do setor de serviços de logística, os preços dos serviços são elevados, inflando a sua participação no consumo intermediário dos demais setores – no período 2007-2013, o custo do transporte de carga subiu pelo menos 50% mais que a inflação oficial.

Banco Mundial (2017) destaca que as deficiências de infraestrutura também se explicam pela baixa capacidade institucional e de planejamento, dificuldades de alocação de recursos orçamentários e problemas de execução e implementação de projetos.

A esta altura, como não é possível dar conta do enorme estoque de investimentos em infraestrutura não realizados no passado, será preciso priorizar. E a priorização deverá se basear tanto no modelo de intervenção pública no setor como nos objetivos econômicos e sociais que se quer atingir. A intervenção também deverá levar em conta a identificação dos maiores beneficiários diretos da infraestrutura e a capacidade deles pagarem pelos serviços (problema de ganhos públicos vs privados), de tal forma que haja uso mais eficiente dos recursos públicos e da participação privada na oferta e na operação.

A despeito da elevada importância, os serviços de logística servem primordialmente para reduzir custos e não para agregar valor e diferenciar produtos. Por isto, a melhoria desses serviços não deve ser vista como panaceia, mas sim como um dos requisitos para qualificar o país para entrar na competição global, e não para ganhar a competição.

Terceirização e seus possíveis efeitos na produtividade

Com a aprovação da Lei da Terceirização (Lei 13.429/2017), haverá menos barreiras para a terceirização de atividades. A Lei dispõe sobre a prestação de serviços de fornecimento de mão-de-obra temporária e sobre a prestação de serviços a terceiros. O ponto mais polêmico da Lei é que ela abre a possibilidade de terceirizar a chamada atividade-fim, ao estabelecer que “[n]ão se configura vínculo empregatício entre os trabalhadores, ou sócios das empresas prestadoras de serviços, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.” Sem entrar no mérito da polêmica em si, relacionada ao possível aumento da “pejotização” do mercado de trabalho, discorremos sobre os possíveis efeitos da terceirização excessiva na produtividade.

Não há registro na história econômica de países que conseguiram aumentar, de maneira sustentável, a qualidade de vida da sua população sem ter aumentado a sua produtividade do trabalho. Como amplamente discutido aqui no blog, a baixa (e estanque) produtividade é o maior desafio da economia brasileira, em especial considerando o rápido envelhecimento da nossa população.

Portanto, cabe perguntar o que a literatura econômica tem encontrado a respeito das possíveis consequências do aumento da terceirização de atividades na produtividade de um país. A economia está crescentemente mais descentralizada e, como consequência, têm surgido empresas cada vez mais especializadas em algum nicho das cadeias de produção. Em países em que há menos restrições, o processo de terceirização cresceu especialmente a partir dos anos 80 e a literatura traz achados mistos com relação ao seu efeito na produtividade.

Raa e Wolff (2001), por exemplo, creditam a recuperação da indústria americana nos anos 1980 e 1990 à prática de terceirização. Os produtores teriam evitado a “doença de custos de Baumol” substituindo os serviços improdutivos internos por serviços externos.

Acemoglu, Zilibotti e Aghion (2003) argumentam que o efeito da terceirização na produtividade depende do ramo da empresa. Para eles, quanto mais uma economia se aproxima da fronteira tecnológica, mais a inovação torna-se importante. Um gestor em uma empresa verticalizada teria que dividir seu tempo em atividades de produção e atividades que promovessem a inovação. Logo, terceirizar a produção poderia ser vantajoso, mesmo com possíveis custos decorrentes de rent-seeking por parte dos contratados e de contratos imperfeitos, pois sobraria tempo para que os gestores focassem em promover inovações. Os autores concluem, então, que atividades mais próximas da fronteira tecnológica teriam mais incentivos para terceirizar; já aquelas distantes se beneficiariam de se verticalizar. Nesse sentido, Francois e Woerz (2008) encontram resultados que mostram que empresas de maior intensidade tecnológica tendem a se beneficiar mais da terceirização do que firmas em setores mais tradicionais.

Berlingieri (2013) encontra resultados que mostram um aumento da competitividade das empresas industriais francesas que contratam serviços antes de exportar. Em argumento similar ao de Coase (1937), o autor teoriza que, ao aumentar sua produção, principalmente aquela voltada para exportação, uma empresa se depara com custos crescentes de coordenação. Isso se daria porque, quanto mais mercados externos uma empresa quiser alcançar, mais insumos serão necessários para a produção. Com isso, a coordenação da produção fica mais complexa e custosa. A contratação de serviços serviria, então, como uma forma de atenuar esses custos.

Por fim,  há estudos que mostram efeitos negativos de um excesso de terceirização. Atalay, Hortaçsu e Syverson (2014) demonstram que empresas que detêm suas cadeias de fornecedores tendem a ser mais produtivas que aquelas menos verticalizadas. Os autores encontram que o maior ganho em possuir uma cadeia de fornecedores não é facilitar o transporte de insumos físicos e sim a troca mais fácil de “insumos intangíveis”, como capacidades organizacionais de uma firma, monitoramento da produção, planejamento, know-how, propriedade intelectual, etc. Depreende-se disso que empresas que terceirizam demais a sua produção poderiam incorrer em perdas dessas capacidades.

Esse resultado corrobora a hipótese de Windrum, Reinstaller e Bull (2009), construída a partir da constatação de que empresas que terceirizam intensamente sua produção observam ganhos de produtividade iniciais, mas diminuem seu crescimento de produtividade de longo prazo. Na visão desses autores, a empresa ganha eficiência no curto prazo por diminuir custos mas, ao longo do tempo, o não gerenciamento direto do processo produtivo faz com que a firma perca capacidade de promover inovações organizacionais.

Em suma, não há consenso sobre os efeitos da terceirização na produtividade. A terceirização parece trazer efeitos benéficos em empresas de alta tecnologia ou que precisam de serviços mais sofisticados para realizar da melhor forma a sua produção. Também parece haver risco para o excesso da terceirização, que seria a perda de know-how específico e possíveis problemas de coordenação de uma cadeia mais descentralizada por parte da empresa contratante (veja o exemplo da Boeing).

Considerando que a maior parte das empresas brasileiras está longe da fronteira tecnológica e tende a inovar pouco, somado à grande heterogeneidade de produtividade que existe entre as firmas no Brasil, é possível que um crescimento elevado da terceirização possa trazer efeitos negativos para a produtividade agregada. Ao mesmo tempo, para se chegar à fronteira tecnológica, as empresas brasileiras precisarão ter acesso mais fácil a serviços especializados. Além disso, nesse mundo dinâmico, as linhas estão cada vez mais tênues entre atividades-fim e atividades-meio. Sob esse aspecto,  facilitar a terceirização talvez possa trazer benefícios.

Em suma, a nova legislação dará mais liberdade para que as empresas escolham o quê e o quanto terceirizar, mas a soma dos efeitos disso para a economia ainda está em aberto. Só nos resta esperar e observar.

Doença de custos de Baumol no Brasil?

Quase ¾ do corpo humano é composto de H2O. Se a água que ingerimos estiver contaminada, haveria possibilidade de boa saúde? Provavelmente, não. Agora, note que quase ¾ da economia brasileira é composta por serviços, incluindo o comércio, e que os trabalhadores e empresas desse setor são, em geral, pouco produtivos e relativamente caros para padrões internacionais. Haveria possibilidade de boa saúde econômica? Provavelmente, não.

De fato, o setor de serviços brasileiro é composto por uma vastidão de micro e pequenas empresas pouco produtivas e competitivas, voltadas para o consumo final e distanciadas do mundo das novas tecnologias e do crédito (Arbache 2015). As empresas formais do setor têm, em média, apenas 5,3 empregados que recebem salário mínimo ou salários que são majoritariamente influenciados pelo salário mínimo — a correlação entre a remuneração média real nesse segmento e o salário mínimo real é de 70%. Se, de um lado, o setor de serviços ajudou o país a fazer a transição do emprego do campo para a cidade, com elevação da produtividade média, por outro lado, aqueles empregos se concentraram em atividades pouco dinâmicas e de baixo crescimento da produtividade (Timmer et al 2014), o que viria a caracterizar o mercado de trabalho brasileiro.

O setor de serviços mostrou enorme capacidade de geração de empregos desde meados dos anos 2000. Seja em razão das políticas fiscais expansionistas, boom das commodities, expansão do crédito, ampliação dos programas sociais e estímulos ao consumo, o fato é que o setor gerou empregos de forma desproporcional à sua contribuição no PIB. Em vários anos, para cada 100 novos empregos formais gerados, 82 ou mais estavam nos serviços. O que resta saber é se aquela capacidade de gerar empregos era sustentada.

De 2012 a 2016, período que já considera a recessão, foram criadas, de acordo com a PNAD Contínua Trimestral, aproximadamente 5,1 milhões de postos formais e informais de trabalho nos serviços, com aumento praticamente contínuo do estoque. No mesmo período, porém, o CAGED apontou a criação líquida de apenas 700 mil postos de trabalho com carteira assinada. Esse número chegou a quase 2 milhões no 4º trimestre de 2014. Mas, de lá para cá, todos os trimestres registraram destruição de postos formais de trabalho. O setor de serviços seguiu gerando postos de trabalho no período, mas o fez majoritariamente via empregos informais ou precários.

Como explicar essa perda de dinamismo? Claro, as explicações possíveis são muitas, incluindo a própria crise econômica. Mas o descolamento entre produtividade e custos do trabalho deve, no mínimo, ter potencializado aquele movimento de destruição de empregos formais e de precarização. Num setor intensivo em trabalho que combina baixa produtividade com elevado e crescente custo relativo do trabalho — o custo da folha salarial por trabalhador perfaz mais de um terço do valor adicionado médio por trabalhador (Arbache 2015) – aquele descolamento pode ter sido especialmente impactante num contexto de desaceleração econômica. Temos, aqui, um provável quadro de doença de custos de Baumol.

A bem-vinda política de recomposição real do salário mínimo iniciada na década passada combinada com a crescente escassez de trabalhadores observada em fins dos anos 2000 e início dos anos 2010 certamente pressionaram os custos do trabalho no setor de serviços, vulnerabilizando as empresas do setor e, consequentemente, o próprio emprego.

Que solução haveria? O dinamismo e a sustentabilidade do emprego neste que é, de longe, a principal fonte de postos de trabalho do país, requer políticas que elevem a produtividade das empresas e, consequentemente, a produtividade dos trabalhadores. Acesso à tecnologia, acesso a mercados, fomento à competição, acesso a crédito e acesso a treinamento e qualificação são requisitos mínimos básicos para o fortalecimento das empresas do setor e para a criação sustentada de empregos.

O papel dos serviços na diversificação econômica: o caso dos Emirados Árabes Unidos

[Ver nota do editor]

Em 1971, quando os Emirados Árabes Unidos (EAU) se tornaram independentes, pela confederação de sete emirados que formavam o protetorado britânico dos Estados da Trégua, o Golfo Árabe era escassamente povoado, com atividade econômica concentrada na pesca e no comércio de pérolas. Com a ascensão da economia petrolífera, a região alterou-se substancialmente. Cerca de 10% das reservas mundiais de petróleo bruto atualmente conhecidas estão localizadas nos Emirados. Nos 40 anos após a independência do país, essas reservas permitiram a expansão real do PIB na ordem de 5,5% por ano.

Desde a década de 1990, o governo dos EAU tem buscado diversificar sua economia e reduzir sua dependência de petróleo. Atualmente, os Emirados são considerados um grande centro econômico no Golfo Árabe, e os investimentos de seus fundos soberanos destacam-se no mundo. A proporção do PIB gerada por setores não petrolíferos superou 69% em 2016, contra 53% em 2000. Embora a participação de setores não relacionada a hidrocarbonetos tenha aumentado no PIB, as receitas de exportação e do governo continuam concentradas em óleo e gás.

Figura: Crescimento do PIB dos EAU – Setor de Petróleo, Outros e Total

Fonte: UAE National Bureau of Statistics

Segundo estudo do FMI, há uma forte correlação entre diversificação e crescimento econômico sustentável, uma vez que economias baseadas em várias fontes de renda são menos vulneráveis a choques e ciclos econômicos. Evidências empíricas, no entanto, também atestam que a maioria das estratégias de diversificação para reduzir dependência do petróleo não foi bem-sucedida, com exceção dos casos da Noruega e do Canadá.

Obstáculos relacionados à “doença holandesa” dificultam a busca de fontes alternativas de renda, em decorrência de fatores como a volatilidade econômica induzida pela instabilidade das receitas do petróleo; efeitos acomodatícios das receitas do petróleo sobre instituições nacionais; e os riscos de as exportações de petróleo ocasionarem taxas de câmbio sobrevalorizadas. Como consequência, o êxito ou o fracasso de uma estratégia de diversificação depende de políticas econômicas que antecipem o futuro declínio nas receitas do petróleo.

O governo emirático tem buscado alcançar a diversificação sustentável pela implementação da UAE Vision 2021, que considera a inovação e o conhecimento como os principais motores da economia no futuro. De acordo com essa estratégia, os Emirados pretendem reduzir a participação das receitas do petróleo no PIB para apenas 5% em 2021, sobretudo por meio de investimentos em alta tecnologia e em serviços com elevado potencial de crescimento.

Significativos investimentos têm sido feitos em áreas como energia solar e logística portuária. Por conta de sua posição geográfica estratégica, entre a Europa e os principais mercados da  Ásia, os EAU também têm se destacado no setor de aviação, que já responde por 15% do PIB do país.

Lançada em 2016, a estratégia de impressão 3D da Dubai Future Foundation visa posicionar o emirado como um dos principais centros de tecnologia de impressão 3D em medicina; bens de consumo; e, especialmente, construção. Novas regulamentações municipais e diversas agências públicas, a exemplo da Dubai Electricity and Water Authority, devem contribuir para que, a partir de 2019,  2% dos edifícios de Dubai sejam total- ou parcialmente construídos por impressoras 3D. Segundo as metas propostas, esse número pode chegar a 25% em 2030, por meio de incentivos públicos e da esperada adesão da iniciativa privada.

Além dos desafios da “doença holandesa” para a diversificação econômica do país, os Emirados precisam superar problemas de produtividade. Apesar das altas taxas de crescimento desde os anos 2000, a produtividade do capital investido não tem crescido, e a produtividade do trabalho tem diminuído no mesmo período. Ainda que as exportações de serviços dos EAU venham aumentando, o saldo líquido de serviços é deficitário desde 1990. O país tem oportunidades e potencial para superar seus desafios pelo emprego de novas tecnologias.

É provável que a economia dos EAU continuará a depender do setor de hidrocarbonetos para impulsionar o crescimento e a diversificação nos próximos anos, mas os setores não petrolíferos poderão ganhar mais destaque, dado que, de fato, os projetos da UAE Vision 2021 deem os resultados esperados. A agregação de valor desses setores, sobretudo dos serviços, dependerá de fatores cuja eficiência se baseia crescentemente em ativos intangíveis, como conhecimento e infraestrutura.

O governo emirático deverá considerar que o conhecimento não é apenas produzido, mas também exportado. Como enfatizado em outros textos neste blog, a exportação de conhecimento decorre de serviços embutidos em produtos tangíveis, como design, royalties, marcas, e outros serviços profissionais e técnicos que agregam valor a bens. Para ter êxito, a estratégia de diversificação dos EAU, consequentemente, deve antecipar-se a tendências futuras e concentrar-se em setores inovadores e serviços que promovem o adensamento de valor nos bens.

Nota do editor: O autor é secretário executivo do Gabinete da Embaixada dos Emirados Árabes Unidos em Brasília.

Os serviços em 2016

Saíram na última semana os dados do produto interno bruto (PIB) do Brasil de 2016. Os resultados são, sem exagero, catastróficos. A economia brasileira registrou queda de 3,6% no ano, ligeiramente menos pior do que em 2015, quando a variação foi de -3,8%. Em dois anos, o PIB do país encolheu em 7,3%, voltando aos níveis de 2010. Se levado em conta o PIB per capita, mais adequado para medir a riqueza de um país, o cenário é ainda mais preocupante: queda de 9% desde 2013 e volta aos níveis de 2009. Em palavras simples, nos últimos anos, a economia brasileira voltou quase uma década no tempo.

Esse cenário crítico ainda demonstra poucos sinais claros e consistentes de melhora. É provável, porém, que o pior já tenha passado. Como discutido continuamente no blog, o setor de serviços responde por mais de 70% da economia, pelo maior número de empregos formais, está fortemente presente nas cadeias produtivas e, em geral, não é comercializável para além de fronteiras (um serviço de cabeleireiro, por exemplo, não pode ser ofertado a distância). Por todos esses motivos, e pelo fato de seu consumo ser muito sensível à renda e ao desempenho da atividade econômica, os serviços são altamente pró-cíclicos: quando a economia como um todo vai bem, eles vão bem; quando vai mal, eles também vão mal. Logo, o resultado dos serviços nas contas nacionais de 2016 não poderia ser diferente: queda de 2,7% na sua produção, voltando a níveis de 2011.

Com a exceção honrosa das atividades imobiliárias, que apresentaram ligeiro crescimento de 0,2%, todos os demais segmentos do setor de serviços encolheram em 2016 (ver gráfico abaixo). Os segmentos de comércio e de transporte, armazenagem e correios foram os mais afetados pela crise no setor: queda na atividade de 6,3% e 7,1% cada, respectivamente. Mesmo com resultados tão negativos, o setor de serviços como um todo apresentou resultados um pouco melhores (ou menos piores) que os setores da agropecuária (-6,6%) e indústria (-3,8%).

Com as mudanças no perfil de consumo e os avanços tecnológicos em curso, está claro que o crescimento dos países no século XXI dependerá, em grande parte, da capacidade de se produzir bens e serviços com cada vez mais conhecimento e tecnologias “embarcados”. Para isso, é preciso desenvolver um setor de serviços qualificado e mais integrado às cadeias de produção, em especial naquelas nas quais o Brasil apresenta vantagens comparativas estáticas e dinâmicas já reveladas.

É preciso colocar essa agenda como prioridade, ou correremos o risco de seguirmos eternamente suscetíveis aos custosos “voos de galinha”.

O Boeing Dreamliner e os riscos da descentralização da produção

A partir da década de 80, empresas multinacionais, com o objetivo de cortar custos e ganhar mais eficiência, passaram a decentralizar fortemente sua produção.[1] Uma empresa como a Nike, por exemplo, passou a concentrar as suas atividades de pesquisa, design, marketing, etc, na sua sede, nos Estados Unidos, enquanto que a fabricação e montagem dos produtos passaram a ser feitas em países em desenvolvimento, onde custos como os trabalhistas e tributários costumam ser mais atrativos.

A ideia por trás desse movimento era, além de economizar custos, obter ganhos com a especialização. Se no começo do século XX uma empresa como a Ford produzia desde a borracha dos pneus até a montagem final dos automóveis, no fim do século XX as empresas perceberam que algumas partes do processo de produção poderiam ser terceirizadas para empresas mais especializadas na parte específica do processo, seja ela a produção dos pneus ou a assessoria legal.

Dado esse contexto e o ambiente extremamente competitivo do mercado, a Boeing resolveu aplicar ao extremo esse conceito de descentralização da produção. Nascia a experiência produtiva do Boeing 787 Dreamliner. Segundo a empresa, o Dreamliner seria duplamente revolucionário: seria o primeiro avião comercial feito majoritariamente de fibra de carbono, o que o tornaria consideravelmente mais leve e econômico; e seria produzido de maneira “parceirizada”, em um modelo no qual os principais elos da cadeia de produção seriam “sócios” da Boeing, e não meros fornecedores.

Com o intuito de reduzir seu risco e tirar proveito de empresas especializadas, a Boeing decidiu fabricar o avião utilizando um “modelo de parceria global”, no qual algo entre 70% e 80% da produção seria terceirizada para empresas de ponta em diversos países[2] (TANG & ZIMMERMAN, 2009; MCKINSEY, 2012).

Em processos produtivos anteriores, a Boeing fazia todo o detalhamento das partes da aeronave, fabricava algumas delas internamente e encomendava outras dos seus fornecedores. Estes produziam-nas exatamente como desenhado pela Boeing que, por fim, montava o avião na sua fábrica. O Dreamliner, por sua vez, foi desenhado de maneira modular. Nesse sistema, grandes partes poderiam ser produzidas de forma independente e depois acopladas à aeronave (KOTHA & SRIKANTH, 2013).

Nesse modelo, a Boeing se limitava a determinar índices de performance que as partes deveriam atingir e os “parceiros” seriam responsáveis por todo o processo de pesquisa e desenvolvimento, financiamento, detalhamento do design, compra de matérias-primas e demais ferramentas necessárias para atingir a performance desejada pela Boeing. Esses parceiros estratégicos – cerca de 50 – gerenciariam suas próprias cadeias de fornecedores. Isso facilitaria e aceleraria a produção, pois os parceiros trabalhariam simultaneamente, e o processo de montagem teria seu tempo reduzido de 30 para 3 dias (TANG & ZIMMERMAN, 2009).

Figura 1 – Principais parceiros da Boeing na fabricação do Dreamliner, por país da empresa e parte da aeronave.

Fonte: Nolan e Kotha (2005), com base em dados da Boeing

Desde o início, o Dreamliner foi um sucesso de encomendas. Porém, no processo de produção, tamanha desverticalização começou a causar problemas. Atrasos e problemas diversos com os parceiros responsáveis pelos módulos da aeronave e seus fornecedores postergaram o lançamento do Dreamliner diversas vezes. O avião, que deveria fazer seu primeiro voo em agosto de 2007, acabou por fazê-lo somente em outubro de 2011 (FERREIRA, 2012).

Os atrasos ocorreram por motivos diversos: a empresa que produzia um software não conseguia programá-lo corretamente para o sistema de controle de voo produzido por outra companhia; algumas das partes, feitas por empresas distintas, não se encaixavam corretamente umas nas outras; alguns dos parceiros não conseguiam lidar com a maior independência e tiveram problemas com suas próprias cadeias de fornecedores. Para acelerar o processo, a Boeing acabou por comprar alguns desses parceiros e a acompanhar mais de perto os demais membros da cadeia, efetivamente “reverticalizando” parte da produção (FERREIRA, 2012; KOTHA & SRIKANTH, 2013).

Como se não bastassem os diversos problemas na produção, após ser lançado, o Dreamliner apresentou sérios defeitos, como vazamentos de combustível, incêndios e problemas diversos com baterias, turbinas, fuselagem, sistema elétrico e trem de pouso. Com tantos problemas, o Dreamliner ficou proibido de voar em todo o mundo por três meses em 2013. Esta foi a primeira vez desde 1979 que a FAA (órgão americano que regula e fiscaliza o mercado aéreo no país) proibiu um avião comercial de voar em todo o território norte-americano.

A bateria, principal fonte de problemas pós-lançamento e causa central da proibição de voo em 2013, foi encomendada pela Boeing a um de seus parceiros, a empresa francesa Thales. Esta, por sua vez, terceirizou o desenvolvimento e a produção da bateria para a empresa japonesa GS Yuasa. Já o carregador da bateria foi encomendado pela Thales à empresa americana Securaplane. Por fim, o sistema que monitora a bateria foi fabricado pela empresa japonesa Kanto. O distanciamento e o pouco controle da Boeing no processo de produção da bateria pode ter contribuído para as falhas.

No fundo, a história do Dreamliner é um exemplo dos riscos da descentralização excessiva. Por mais que o modelo totalmente verticalizado seja menos factível, eficiente ou desejável, o modelo excessivamente descentralizado também parece apresentar problemas, em especial no que concerne a dificuldades de coordenação.

Além disso, o Dreamliner é um exemplo claro de como a performance de uma empresa é afetada e, em certa medida, depende da performance de seus fornecedores e demais empresas com as quais ela interage. Assim, por mais eficiente e produtiva que seja uma empresa internamente, ela sempre dependerá parcialmente da performance de outras empresas.[3]

Não por acaso, algumas grandes multinacionais têm revisto seu modelo de produção nos últimos anos. A GE, por exemplo, retornou algumas linhas de produção da China para os EUA (muito antes de Trump ser eleito) por perceber que manter seus centros de pesquisa próximos à linha de produção é vantajoso para observar mais claramente erros, possibilidades de melhoria e adaptação às mudanças nas preferências do mercado. Além disso, em um mundo em que a diferenciação tem se tornado cada vez mais relevante para a competitividade, custos trabalhistas e tributários, por exemplo, estão perdendo importância.

Esse caso é importante para o Brasil, primeiramente porque aqui, também, a descentralização da produção é elevada e cresce e o aumento do consumo de serviços no processo de produção da indústria é parcialmente explicado por isto. Mas o caso é especialmente relevante porque a economia brasileira é desigual em diversos aspectos, inclusive na performance das empresas (MOREIRA, 2014; PORCILE & CATELA, 2012). Segundo dados da CEPAL & OCDE (2012), em média, no Brasil, microempresas têm produtividade do trabalho 10 vezes menor do que a de grandes empresas.

Com tamanha heterogeneidade de produtividade, mesmo as empresas de melhor performance podem estar sendo negativamente afetadas pelos elos menos produtivos de suas cadeias. Em suma, o aumento da produtividade brasileira passará, cada vez mais, por enfrentar a questão da heterogeneidade de performance de nossas empresas.

 

[1] Este post é baseado em um capítulo da dissertação do autor, “Descentralização da produção e produtividade no Brasil” (MOREIRA, 2015). An English version of this post can be found here.

[2] O nível de terceirização da produção dos aviões Boeing 737, modelo anterior ao Dreamliner, variava entre 35% e 55% (TANG & ZIMMERMAN, 2009).

[3] Essa hipótese é explorada por Moreira (2015).

 

Referências bibliográficas

CEPAL; OCDE. Perspectivas económicas de América Latina 2013 – Políticas de PYMES para el cambio estrutural. Santiago de Chile, 2012.

FERREIRA, M. J. B. Competências empresariais e políticas governamentais de apoio ao desenvolvimento aeroespacial: caso dos EUA. ABDI. Campinas-SP, 2012.

KOTHA, S.; SRIKANTH, K. Managing a global partnership model: lessons from the Boeing 787 ‘Dreamliner’ Program. Global Strategy Journal, vol. 3 (1), p. 41-66, fev. 2013.

MCKINSEY. Manufacturing the future: the next era of growth and innovation. Nov, 2012.

MOREIRA, R. F. C. A disparidade da produtividade das empresas brasileiras: possíveis determinantes, seu impacto nas cadeias de valor e na economia. In: SANTOS, C. A. (Org.). Pequenos Negócios: Desafios e Perspectivas – Encadeamento Produtivo. vol. 6, p. 52-67. Sebrae. Brasília-DF, 2014.

MOREIRA, R.F.C. Descentralização da produção e produtividade no Brasil. 2015. 103f. Dissertação (Mestrado em Economia) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.

NOLAN, R. L.; KOTHA, S. Boeing 787: The Dreamliner. Harvard Business School Compilation 305-101. Boston, abril de 2005.

PORCILE, G.; CATELA, E. Y. A. S. Heterogeneidade estrutural na produtividade das firmas brasileiras: uma análise para o período 2000-2008. Anais do XL Encontro Nacional de Economia. ANPEC, 2012.

TANG, C. S.; ZIMMERMAN, J. D. Managing new product development and supply chain risks: the Boeing 787 case. Supply Chain Forum – an International Journal. v. 10, n. 2, 2009.

 

Medidas alternativas do tamanho do setor de serviços

Este blog tem discutido diversas métricas — participação no PIB e no emprego total, contribuição para o valor adicionado da indústria manufatureira, destino dos investimentos diretos estrangeiros, entre outras – que comprovam que o setor de serviços se tornou o maior e o mais influente setor da economia. Tem discutido, ainda, que isto estaria ocorrendo não apenas nos países avançados, mas, também, em praticamente todos os países, incluindo até os mais pobres da África Subsaariana.

Mas variáveis menos convencionais também estão apontando evidências naquela mesma direção. Considere o caso das marcas. O mais recente ranking das marcas mais valiosas mostra que bancos, seguros, logística, comércio, entretenimento, sistemas de pagamento, tecnologia e telecom representavam 74% do valor total das 100 marcas mais valiosas do mundo em 2016. Das 10 marcas globais mais valiosas, nove eram dos setores de tecnologia e telecom — Google, Apple, Microsoft, AT&T, Facebook, Visa, Amazon, Verizon e IBM. McDonald’s quebrou a regra. Mas nem sempre foi assim (ver figura abaixo). Em 2006, aquelas mesmas categorias de serviços respondiam por 55% do valor das marcas mais valiosas.

Se, de um lado, marcas dos setores com a “cara” do século XXI estão ganhando relevância, de outro lado, setores convencionais e com a “cara” do século XX estão perdendo relevância. Em 2006, 13 marcas de carros listavam entre as 100 mais valiosas do mundo e respondiam por 11,6% do valor total. Em 2016, apenas seis marcas de carros figuravam dentre as mais valiosas e respondiam por apenas 3,5% do total.

Em 2006, as 100 marcas mais valiosas valiam US$ 1,44 trilhão. Em 2016, elas valiam US$ 3,36 trilhões, um incremento nominal de 132% — para referência, a inflação em dólar no mesmo período foi de 19%. A supervalorização das marcas é reflexo direto da consolidação e da globalização dos mercados e do aumento da parcela dos serviços na composição do valor final dos bens. É, também, um dos sintomas mais visíveis e mensuráveis das mudanças estruturais por que passam as economias em favor dos serviços.

O que explica o avassalador crescimento do valor das marcas de serviços? São muitas as explicações, mas, dentre elas, estão as mudanças nas preferências dos consumidores em favor de serviços, incluindo tecnologia, telecom e entretenimento, o aumento da participação dos serviços no valor adicionado de outros setores, o encurtamento do ciclo de vida das novas tecnologias, que dá elevado poder de monopólio às “superestrelas”, as novas tecnologias de produção e de gestão da produção, como as cadeias globais de valor, que aumentam a importância de serviços como seguros e logística, a ascensão da economia de plataformas e o caráter cada vez mais comercializável internacionalmente dos serviços. Esses fatores ajudam a garantir o crescimento e consolidar a posição dos serviços na economia mundial.

Ter marcas influentes e valiosas reflete a posição dos países na “cadeia alimentar” e sugere a conformação da estrutura das economias e as perspectivas de crescimento econômico. A China, que está passando por intensa reestruturação em favor de bens e serviços de mais alto valor adicionado e se lançando como competidor global em vários segmentos, já está se estabelecendo como país de marcas globais. Tencent, China Mobile, Alibaba, ICBC, Baidu, CRB e Huawei são algumas das suas marcas mais conhecidas. Hoje, a China já tem quase duas dezenas de marcas dentre as mais valiosas e domina largamente o ranking de marcas da Ásia.

Já o Brasil, ainda não se deu conta da importância e contribuição das marcas como instrumento de geração de emprego e renda e de inserção internacional “pela porta da frente”. Experiência, temos – pense nas sandálias Havaianas. A despeito de sermos, de longe, a maior economia da América Latina, o México tem marcas muito mais valiosas que as nossas. Potencial não falta. O Brasil poderia trabalhar para construir marcas globais em áreas como, por exemplo, cafés, rede de cafés, alimentos processados, alimentos com base em proteínas, moda praia, design, projetos de engenharia, dentre outras áreas em que já temos vantagem comparativa estática e dinâmica revelada. Enfim, precisamos de mais, muitas mais “Havaianas”.

 

Participação nas 100 marcas globais mais valiosas, por categoria (%)

Nem formal, nem informal, o Brasil é semiformal [Parte III – O caso do Carnaval]

[Ver nota do autor]

 

Em um post anterior, apresentamos um exemplo de como a cadeia de produção e consumo indústria globalizada vai se integrando à informalidade e acaba por construir a semiformalidade na economia brasileira. Todavia, esse processo também se desenvolve a partir de um caminho inverso: a semiformalidade também se conforma em uma trajetória que parte do mundo informal em direção ao formal.

Para exemplificar esse processo, observaremos aqui o que talvez seja o caso mais emblemático da imbricação entre setores formais e informais da economia nacional: as escolas de samba. Roberto DaMatta (2000) afirma que o carnaval é o espaço privilegiado capaz que equacionar as contradições entre a “casa” e a “rua”, os dois elementos que, ao se confrontarem, dariam origem ao “dilema brasileiro” e cuja articulação e equalização permitiria o que o autor chama de “atualização” desses supostos dois “brasis” tão diferentes entre si.

Nós, aqui, sugerimos que o carnaval – talvez até mesmo por conta dessa característica apontada pelo autor – é também o espaço privilegiado do equacionamento e atualização do formal com o informal, o que o transforma no processo paradigmático da expressão econômica desse “dilema brasileiro” e de como este se atualiza no contexto da produção e distribuição de riquezas por intermédio da conformação da semiformalidade.

Nascidas nas favelas do Rio de Janeiro[1], as escolas de samba floresceram, em seus primeiros anos, no contexto extralegal que caracteriza tais áreas, no qual predominam as atividades econômicas e moradias informais. Em um dado momento de sua trajetória, por razões cuja descrição foge ao escopo deste post, parte substancial de seu financiamento passou a ser feita pelos banqueiros do Jogo do Bicho. Este consiste em uma loteria privada e é há décadas uma atividade ilegal no país. Junto com o financiamento, o controle administrativo da maioria das escolas de samba passou para a mão desses chamados “bicheiros” ou “banqueiros do bicho”: indivíduos que controlam essa modalidade de jogo (DaMatta e Soáres, 1999). Além de ilegal de per si, o Jogo do Bicho possui também notórias ramificações em diversas atividades do crime organizado.

De início, perseguida pela polícia, essa modalidade de atividade carnavalesca foi, com o passar dos anos, sendo cada vez mais tolerada. A partir do momento em que adquiriu dimensão expressiva no carnaval da cidade, foi incorporada ao calendário de eventos oficiais do carnaval carioca. Desde então, o Estado passou não só a financiar parte dos seus desfiles, como também a estabelecer as regras que disciplinam o desfile e a competição que se realiza entre essas agremiações. O passo seguinte no processo evolutivo foi a aquisição, por parte da grande mídia – especialmente da televisão – dos direitos de transmissão do desfile de escolas de samba, transformando-o em um de seus mais importantes produtos, inclusive para exportação. Ao mesmo tempo, somou-se interesse semelhante e complementar por parte da indústria fonográfica, que explora um rentável mercado de comercialização dos sambas-enredo.

Na continuidade da evolução, os desfiles de escolas de samba se transformaram também no principal produto da indústria de turismo carioca, que chega mesmo a incluir o direito de participação nos desfiles em seus “pacotes”. Esse direito é adquirido por turistas de todo o mundo nas operadoras/agências a valores que chegam a ultrapassar os US$ 500 por pessoa. Dados seus interesses, todos esses setores passaram a influenciar também a própria dinâmica dos desfiles. Paralelamente, à medida que estes foram adquirindo notoriedade, outros setores formais também começaram a ter interesse, como estratégia de marketing, em se incorporar ao evento na condição de patrocinadores. Um dos que merece destaque é o setor de bebidas. Em especial, as grandes cervejarias passaram a disputar ferrenhamente o direito de patrocinar a realização dos desfiles, bem como as transmissões de TV.

O passo final da absorção dos desfiles pelo mundo formal foi a substituição de uma parte do financiamento direto das escolas de samba, até então subsidiado pelos “bicheiros” e pelo governo municipal da cidade, por patrocínios (muitas vezes não explícitos) de diversas das escolas de samba por parte de empresas dos mais diferentes ramos, assim como por governos de administrações públicas de unidades subnacionais da federação em ações para atrair o turismo. Em ambos os casos, os patrocinadores impõem à escola o tema (o “enredo”) que será apresentado pela escola em seu desfile, utilizando-se assim do próprio desfile da escola como mídia de promoção.

Observe-se que foi um processo de aglutinação de interesses e esforços. As comunidades originais, assim como o Jogo do Bicho, não foram alijadas do comando das escolas de samba. Os novos agentes que passaram a participar não foram absorvidos por “substituição”, mas por “incorporação” à dinâmica do evento.

Hoje, parte significativa da produção dos desfiles das escolas de samba continua ocorrendo nos universos informal e semiformal. A confecção de fantasias é feita por costureiras autônomas, geralmente das próprias comunidades nas quais as escolas estão sediadas, e quase sempre à margem do sistema tributário oficial. Situação semelhante se verifica na construção dos carros alegóricos. A organização e preparação de cada escola contam com profissionais contratados formalmente (alguns com remunerações muito elevadas, como no caso dos carnavalescos mais famosos, cujos salários rivalizam com os dos astros do esporte e da música pop), profissionais contratados sem vínculo formal e até mesmo trabalho voluntário realizado por membros das comunidades.

Assim, o desfile de escolas de samba da cidade do Rio de Janeiro movimenta diretamente dezenas de milhões de dólares, emprega milhares de pessoas em contratos permanentes e temporários, parte com contrato formal de trabalho e parte sem, e conta com a participação voluntária de outros tantos milhares.

Em suma, uma parcela da operação dessas agremiações envolve o Estado, outra envolve desde grandes corporações transnacionais até microempresas; outra continua se desenvolvendo no universo informal; e parte ainda é operada pelo Jogo do Bicho. Desse modo, em cada uma dessas agremiações encontram-se operando, conjunta e articuladamente, a informalidade absoluta; a semiformalidade; o crime organizado; o Estado; e empresas formais e semiformais de todos os portes e dos mais variados setores, incluindo grupos transnacionais. E isso tudo dando forma a organizações que fogem consideravelmente ao modelo racional-legal weberiano, mas cuja capacidade de produção se equipara, como demonstra Souza (1989) em sua interessante obra Engrenagens da Fantasia: engenharia, arte e convivência – a produção nas Escolas de Samba, àquela das organizações mais bem estruturadas do ponto de vista das modernas tecnologias de gestão. Isso também pode ser depreendido pelo livro Sem Segredo: estratégia, inovação e criatividade, de Paulo Barros (2013). Este último, por sinal, é um daqueles carnavalescos regiamente remunerados aos quais fizemos referência anteriormente.

DaMatta (2000), em seu estudo sobre o carnaval, chama a atenção para o fato de que se trata de uma festa de “inversão”, na qual tem lugar um processo de catarse social. Ou seja, é um momento no qual os participantes manifestam-se frequentemente por meio de uma troca em seus papéis sociais, por exemplo, a doméstica fantasiada de rainha ao lado do patrão, fantasiado de mendigo. E é justamente por esse processo de inversão que conseguimos constatar na arquitetura organizacional responsável pela construção da festa aquilo que é imanente – mas não assumido – das regras de “operação” da nossa sociedade.

Como afirma Maria Laura Cavalcanti (in Gomes, Barbosa E Drummond, 2001):

O carnaval, “comentário complicado sobre o mundo social brasileiro”, dramatiza e acomoda a tensão entre o princípio hierárquico e o princípio igualitário, ambos cruciais na sociedade nacional. […] A pergunta sobre a nacionalidade […] torna o carnaval símbolo integrador de uma imagem de Brasil na coerência aprisionante de um dilema. Mas esse dilema, feito da superposição dos sistemas de valores hierárquico e igualitário, é sobretudo a fonte do movimento da sociedade brasileira, que se resolve desdobrando-se num sistema ritual e simbólico altamente criativo e original (p. 155).

Assim, não é por acaso que essa fusão dos princípios constituidores da sociedade brasileira se manifesta de forma tão explícita na própria organização do carnaval. Sendo esta a principal manifestação da cultura popular nacional, é nela que o referencial simbólico nacional encontra seu veículo mais poderoso de expressão. E é nela também que encontramos uma representativa síntese da construção do espaço econômico da nação.

Mais um exemplo que merece destaque, e que também ocupa espaço proeminente no contexto cultural brasileiro, é o das feiras e mercados. Estes são, também, um locus privilegiado da manifestação da semiformalidade no qual, por sua abrangência territorial, pela concentração espacial e diversidade das atividades, dos agentes envolvidos e de suas relações, a semiformalidade se desenvolve em sua plenitude. Note-se que estes mercados se constituem essencialmente com operações de serviços.

Em um estudo que teve como objeto a Feira de Caruaru (e sua articulação com a Feira da Sulanca) e o Mercado Ver-o-Peso, de Belém, Souza et al. (2012) deixam visível a articulação e a complementaridade entre os setores formais e informais na construção de um sistema único que se desenvolve nesses espaços. Do ponto de vista da oferta, esses espaços operam como pontos de distribuição de produtos de praticamente todas as espécies, indo desde bens manufaturados por grandes indústrias e branding companies[2] (além, evidentemente, do contrabando, da falsificação e da pirataria desses produtos), até produtos agropecuários originários de estabelecimentos familiares de subsistência. O processo de distribuição envolve desde grandes atacadistas, a fornecimento direto pelo produtor. As operações de venda final ao consumidor envolvem desde empresas com porte razoavelmente grande, que controlam diretamente dezenas de pontos de vendas ou operam por meio de mecanismos de sociedades cruzadas que implicam controle indireto também de dezenas de pontos de venda, até ambulantes que oferecem suas mercadorias pelos corredores desses estabelecimentos.

Essa dinâmica se reproduz por todo o país em feiras e “mercados municipais” que se replicam em diversas capitais e cidades de maior porte, como, por exemplo, além dos citados, os mercados municipais de São Paulo, de Porto Alegre, e o Mercado Modelo, de Salvador; em pequenas feiras e mercados de cidades menores; no “camelódromo” da Rua Uruguaiana e no “Calçadão de Madureira”, no Rio de Janeiro; na Rua Santa Efigênia e no Brás, em São Paulo; na “Feira do Importados”, em Brasília; e em tantos outros locais. Em todos eles o que se observa é um sistema que forma um continuum integrado de produção e distribuição, que envolve desde grandes firmas essencialmente formais, até o autônomo individual essencialmente informal, a produção artesanal ou a agropecuária familiar, até incluir mesmo atividades ilícitas. Do ponto de vista do trabalho, envolve também desde o trabalho formal (com contrato de trabalho), até o trabalho precário, o autônomo e o trabalhador semiformal, que possui contrato de trabalho, mas tem parte significativa de sua remuneração “paga por fora”. E, mais uma vez, atividades ilícitas por envolverem trabalho escravo utilizado na produção de muitos dos bens ali comercializados, como é o conhecido caso da indústria têxtil.

A partir desses exemplos, podemos aquilatar a dimensão ocupada pela semiformalidade no Brasil e seu papel como integrador dos universos formal e informal, complementares e componentes essenciais de um único sistema socioeconômico. Como destaca Cacciamali (2007):

[Há uma] subordinação do “Setor Informal” ao padrão e ao processo de desenvolvimento capitalista a nível nacional e internacional. Tal subordinação ocorre em função do ritmo próprio da dinâmica capitalista, que flui ao toque das grandes firmas e dos grupos oligopolistas que, em países periféricos, se encontram, muitas vezes, vinculados ao capital estrangeiro e, em geral, reforçados pelas políticas de governo (p. 150).

Um último ponto a ser abordado concerne à necessidade de uma segmentação clara entre os espaços da informalidade e semiformalidade e o espaço da criminalidade. A despeito das frequentes ligações que as atividades informais ou semiformais acabam muitas vezes estabelecendo com a criminalidade, é possível separar claramente pela sua natureza as que têm origem na realidade cultural e socioeconômica do país, daquelas que são operadas pelo crime organizado – ou “crime negócio”. Este tem objetivos exclusivamente econômicos, ou seja, a acumulação individual sem nenhum caráter de “compensação social”, como é, por exemplo, o caso do comércio internacional de drogas, que estabelece, conforme descrito por Saviano (2014), uma profunda articulação com a economia formal, com destaque para o mercado financeiro global.

REFERÊNCIAS

BARROS, Paulo. Sem segredo: estratégia, inovação e criatividade. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013.

CABRAL, Sérgio. As escolas de samba do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Ed. Lumiar, 1996.

CACCIAMALI, Maria Cristina. (Pré-)Conceito sobre o setor informal, reflexões parciais embora instigantes. Revista Econômica, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, 2007.

DAMATTA, Roberto. Carnavais, malandros e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.

DAMATTA, Roberto e SOÁREZ, Elena. Águias, burros e borboletas: um estudo antropológico do Jogo do Bicho. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

GOMES, Laura Graziela; BARBOSA, Lívia; DRUMMOND, José Augusto. (Orgs.) O Brasil não é para principiantes: Carnavais, malandros e heróis, 20 anos depois. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2001.

NOGUEIRA, Mauro Oddo.  A construção social da informalidade e da semiformalidade na economia brasileira. Brasília: Ipea, 2016. (Texto para Discussão n. 2237).

ROLLI, Claudia. Marca de luxo é ligada a trabalho degradante. São Paulo: Folha de São Paulo (27/07/2013), 2013. 

SAVIANO, Roberto. Zero Zero Zero. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.

SOUZA, Hamilton Moss de. Engrenagens da fantasia: engenharia, arte e convivência – a produção nas Escolas de Samba. Rio de Janeiro: Ed. Bazar das Ilusões, 1989.

SOUZA, Jessé et al. Os batalhadores brasileiros: nova classe média ou nova classe trabalhadora? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.

Nota do autor: Este texto é excerto de um trabalho publicado como Texto para Discussão (Nogueira, 2016) que apresenta as diversas estimativas da dimensão do setor informal na economia brasileira. Este, por sua vez, integra um projeto de estudo mais amplo sobre o universo dessas empresas: o livro “Um Pirilampo No Porão: um pouco de luz nos dilemas da produtividade das pequenas empresas e da informalidade no Brasil” (no prelo).

As opiniões aqui emitidas são de exclusiva e inteira responsabilidade do autor, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.

[1] A primeira escola de samba do Brasil, a Deixa Falar, foi fundada por Ismael Silva e outros em 1928 no bairro do Estácio (região das favelas do Morro do Estácio e São Carlos). A ela se seguiram a Cada Ano Sai Melhor, o Grêmio Recreativo e Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira e a Vai Como Pode. As duas últimas perduram até hoje – a Vai Como Pode foi depois rebatizada como Grêmio Recreativo e Escola de Samba Portela (G. R. E. S. Portela) – sendo ambas, atualmente, as notórias agremiações do carnaval carioca (Cabral, 1996).

[2] Empresas transnacionais que tem sua marca como “produto principal”. Suas operações se concentram no desenvolvimento de produtos, no marketing e na distribuição, normalmente terceirizando todo o processo de produção e logística. Como principais exemplos podem ser citados as grifes internacionais; os artigos esportivos; computadores e software; e telefones celulares.

Nem formal, nem informal, o Brasil é semiformal [Parte II – Um caso]

[Ver nota do autor]

Vimos, em um post anterior uma descrição conceitual do que chamamos de “semiformalidade”. Agora apresentaremos um exemplo de como esse constructo se desenvolve na realidade do espaço econômico brasileiro. Se observarmos com cuidado as cadeias de produção e de consumo de vários setores da economia nacional, constataremos que a complementaridade entre formal-semiformal-informal se reproduz em muitas delas. No entanto, alguns desses casos podem ser considerados como paradigmáticos. Descreveremos aqui o caso da cadeia de produção e consumo do automóvel, um dos bens de maior “desejo” na sociedade brasileira.

A figura 1 e o quadro 1 apresentam uma representação esquemática da estrutura da cadeia de produção e de consumo que se desenvolve a jusante da indústria do automóvel. No esquema, estão apresentados apenas alguns dos componentes dessa cadeia que, evidentemente, é bem mais complexa do que aquilo que está aqui representado. Além disso, as características atribuídas a cada um dos agentes da cadeia são as que nós consideramos como dominantes; isto é, características que podem ser encontradas com razoável frequência nesses agentes e cuja constatação pode ser feita tanto pela observação direta, quanto por registros da imprensa.

FIGURA 1 – Cadeia de Produção e Consumo a Partir dos Automóveis

Elaboração do autor

QUADRO 1 – Cadeia de Produção e Consumo a Partir dos Automóveis

Elaboração do autor

Nessa cadeia podemos ver, em primeiro lugar, o conjunto de serviços prestados aos proprietários de veículos. Inicialmente, temos os serviços de reparos automotivos [A]. Existem, como prestadores desses serviços, oficinas autorizadas pelos fabricantes, todas elas formais e operando, a princípio, integralmente na formalidade. Existem também as pequenas oficinas independentes; são empresas com existência formal (CNPJ), mas que em muitos casos têm boa parte de suas operações na semiformalidade (isto é, sem Nota Fiscal). Finalmente, temos as oficinas conhecidas como de “fundo de quintal”; oficinas sem existência legal, muitas operando até mesmo nas vias públicas.

As autopeças [B] utilizadas pelas oficinas podem provir de um mercado formal, no qual são comercializadas as chamadas “peças originais”, produzidas por fabricantes “reconhecidos” pelas montadoras de veículos e que possuem autorização para utilizarem suas marcas. Além desse, há também o “mercado paralelo”, caracterizado por autopeças que são cópias das “originais”, mas provenientes de fabricantes não reconhecidos e que possuem variados níveis de qualidade. Além de parte desse mercado operar na semiformalidade, há contendas legais acerca do uso de marcas e desenhos industriais, com destaque para uma disputa no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) entre a Associação Nacional dos Fabricantes de Autopeças (Anfape) e as montadoras Ford, Fiat e Volkswagen que, em 2010, foi decidida em Averiguação Preliminar favoravelmente à primeira (D’Araújo, 2015). Há, ainda, os desmanches de carros (ou “ferros-velhos”), que comercializam peças e componentes usados oriundos, a princípio, de veículos acidentados. Nesse mercado, é possível encontrar empresas com registro legal (CNPJ), mas que, em geral, operam na semiformalidade, e empresas informais, isto é, sem existência legal. Além disso, nesse segmento ocorrem também operações criminosas, nas quais são comercializadas peças de veículos roubados. Estas são realizadas tanto por empresas formais, quanto por organizações informais.

Ainda nos serviços, existem aqueles que são prestados aos proprietários de automóveis nas ruas das cidades [C]. Relacionamos, em primeiro lugar, os serviços de estacionamento. Nesse grupo, podem ser encontradas os concessionários oficiais de estacionamento, que operam dentro da formalidade sob concessão das prefeituras. A esses, somam-se os guardadores autônomos de veículos; categoria essencialmente semiformal, uma vez que são também “legitimados” pelas prefeituras. Há ainda os chamados “flanelinhas”, que são também guardadores autônomos, mas que não são cadastrados (“legitimados”) pelos governos municipais. Finalmente, há um esquema de extorsão travestido de serviço de guarda e estacionamento: são indivíduos que, a partir de uma ameaça velada ou explícita de perpetrarem danos ao veículo, exigem uma determinada quantia para “vigiar” o carro estacionado. É uma prática análoga ao notório “seguro” oferecido pelas diversas “Máfias” aos comerciantes de suas áreas de atuação (Saviano, 2008). Além da guarda, nesta mesma categoria de serviços, há a lavagem de automóveis. Quando executados por empresas formais, é prática corrente a subnotificação fiscal (semiformalidade). Também é um serviço que pode ser encontrado sendo prestado em vias públicas de modo totalmente informal. Por fim, registramos uma prática frequente nas grandes cidades, que é a lavagem de para-brisas de veículos nos sinais de trânsito, oferecida em sua totalidade por menores carentes em troca de algumas moedas.

O segundo elo da cadeia que relacionamos é o de fornecimento de combustíveis (gasolina, álcool, diesel e GLP). Ele é composto, primeiramente, pelo varejo de combustíveis [D]: os postos de abastecimento. Salvo exceções, são empresas formalmente estabelecidas e cuja maior parte das operações comerciais ocorrem dentro das normas legais de registros fiscais. Todavia, é muito comum que essas empresas façam uso de empregados sem contratos formais de trabalho e sem o cumprimento de inúmeras obrigações trabalhistas, caracterizando-se, portanto, como atuando na semiformalidade nesse aspecto específico. Há ainda, e é fato frequentemente registrado nesse mercado, a ocorrências de venda de combustíveis adulterados com a adição de diversas outras substâncias (na maioria dos casos, álcool na gasolina). Nestes casos, ultrapassa-se a extralegalidade para se ingressar no mundo do crime.

Os postos de combustíveis usualmente aceitam como meio de pagamento os cartões de débito e de crédito [E]. As operadoras desses cartões são empresas multinacionais vinculadas às instituições bancárias do país. São, portanto, empresas essencialmente formais e os registros dessas transações, até onde se saiba, se dão dentro do mais estrito cumprimento da legislação fiscal. Porém, todas essas operadoras terceirizam seus serviços de teleatendimento [F]. Jessé de Souza e Ricardo Visse (Souza et al., 2012) descrevem as características de precarização do trabalho formal que se desenvolve nas empresas que prestam esse tipo de serviço. A essa análise, acrescentamos aqui o fato notório de que muitas dessas empresas, visando burlar as obrigações legais trabalhistas, contratam seus operadores de atendimento na forma “contratos de estágio universitário”, o que caracteriza mais um caso de semiformalidade em razão da precarização das relações de trabalho. Essa situação suscitou até mesmo a promulgação de um novo dispositivo legal, a Lei Nº 11.788/2008 (Brasil, 2008), como uma tentativa de coibir tal prática.

Na continuidade dessa cadeia, temos a produção de combustíveis [G], na qual novamente a semiformalidade se manifesta nas relações de trabalho: nas usinas de álcool e fazendas de cana-de-açúcar [H] frequentemente são verificadas condições de trabalho precário, inclusive com registros de exploração de trabalho escravo, o que constitui atividade criminosa. Fazendo parte dessa mesma cadeia, existem as refinarias e empresas e exploração de petróleo [I]. Esse segmento é dominado quase que exclusivamente por uma empresa estatal, que é a maior empresa do país (a Petrobrás), e por grandes corporações transnacionais, caracterizando-se, portanto, por operar – ao menos em tese – na mais estrita formalidade. Complementando esse ramo da cadeia, podemos ver os centros de pesquisa da indústria de petróleo [J], atividade que envolve institutos pesquisa, centros de P&D de empresas, e universidades. Nessas instituições são desenvolvidas tecnologias extremamente sofisticadas, que vão desde técnicas para exploração de petróleo em águas profundas, ao desenvolvimento de combustíveis de alta performance para a Fórmula 1. Ou seja, as atividades mais “nobres” e sofisticadas de todo o complexo econômico. Neste segmento, é comum a existência de serviços de consultoria altamente especializada prestada por indivíduos autônomos, mas que são contratados como se fossem pessoas jurídicas, mascarando assim relações de trabalho sujeitas a regulação específica.

O último ramo da cadeia aqui considerado é o relativo à regulação do uso dos automóveis. Consiste, basicamente, no licenciamento de veículos e na habilitação de condutores [K]. Ambas são atividades privativas do Estado. No entanto, há a possibilidade de intermediação [L]. No caso das habilitações, essa intermediação é obrigatória, uma vez que o candidato à licença de condutor deve necessariamente frequentar um curso de formação oferecido por uma autoescola, que são empresas privadas, homologadas pelo poder público e que tendem a operar na formalidade. No entanto, a existência de um comércio criminoso de carteiras de habilitação (concessão da licença sem que o candidato se submeta aos exames necessários) é fato amplamente conhecido e noticiado. Já para o processo de licenciamento anual (e transferência de propriedade) de veículos, a intermediação não é obrigatória, podendo o cidadão cuidar pessoal e diretamente de todos os trâmites. Entretanto, em face de entraves burocráticos e da frequente precariedade no atendimento, é comum que o proprietário do veículo recorra a um despachante, os quais, comumente, desenvolvem parte de suas operações na informalidade.

A partir desse exemplo – que possui um representativo peso na economia nacional – podemos constatar como, partindo de empresas transnacionais e atividades de altíssimo conteúdo tecnológico, passando pelo Governo, e chegando até a serviços prestados por indivíduos nas vias públicas da cidade, a formalidade e a informalidade, através de um processo de simbiose, se imbricam e se complementam na construção do espaço da semiformalidade.

Outra constatação é o relevante papel do setor de serviços nesse construto, mesmo quando se trata da cadeia de produção e consumo de um produto (um bem) típico da manufatura.

Há, ainda, a possibilidade do caminho inverso, no qual a construção da semiformalidade e seu imbricamento em uma cadeia de produção e consumo se dão a partir de uma trajetória que parte do mundo informal em direção ao formal. Mas este será assunto para um outro post

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei do Estágio. Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre o estágio de estudantes; altera a redação do art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, e a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996; revoga as Leis nos 6.494, de 7 de dezembro de 1977, e 8.859, de 23 de março de 1994, o parágrafo único do art. 82 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e o art. 6o da Medida Provisória no2.164-41, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Brasília, 2008..

DAMATTA, Roberto. Carnavais, malandros e heróis: para uma sociologia do dilema brasileiro. Rio de Janeiro: Rocco, 2000.

D’ARAÚJO, Juliana Rafaela Sara Sales. A interatividade entre direito antitruste e propriedade intelectual: A aplicabilidade do controle concorrencial sobre o exercício de direito industrial e análise do caso Anfape. 2015. Monografia (Especialização) – Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, Universidade de Brasília, Brasília, 2015.

NOGUEIRA, Mauro Oddo.  A construção social da informalidade e da semiformalidade na economia brasileira. Brasília: Ipea, 2016. (Texto para Discussão n. 2237).

SAVIANO, Roberto. Gomorra: a história real de um jornalista infiltrado na violenta máfia napolitana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008.

SOUZA, Jessé et al. Os batalhadores brasileiros: nova classe média ou nova classe trabalhadora? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2012.

 

NOTAS:

Nota do autor: Este texto é excerto de um trabalho publicado como Texto para Discussão (Nogueira, 2016) que apresenta as diversas estimativas da dimensão do setor informal na economia brasileira. Este, por sua vez, integra um projeto de estudo mais amplo sobre o universo dessas empresas: o livro “Um Pirilampo No Porão: um pouco de luz nos dilemas da produtividade das pequenas empresas e da informalidade no Brasil” (no prelo).

As opiniões aqui emitidas são de exclusiva e inteira responsabilidade do autor, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.

Nem formal, nem informal, o Brasil é semiformal [parte I]

Ver nota do autor

Há um fenômeno que permeia todo o espaço econômico da realidade brasileira e que não foi, até hoje, objeto da merecida atenção: a ele damos o nome de “semiformalidade”. É composta, por um lado, por agentes que pertencem ao universo formal, mas que executam parte de suas operações no âmbito da informalidade. Trata-se de empresas que, a despeito de serem formalmente estabelecidas (empresas com CNPJ), não incluem parte de suas operações em seus registros contábeis (transações realizadas sem a emissão do comprovante fiscal, ou Nota Fiscal) e/ou possuem em seus quadros trabalhadores sem contrato formal de trabalho (Carteira de Trabalho assinada). Essa forma de contratação passou a ser reconhecida como “trabalho informal” pela OIT desde 2003 (ILO, 2003). Há, ainda, empresas que remuneram seus trabalhadores em valores efetivos que são superiores àqueles que constam de seus registros contábeis e dos respectivos contratos de trabalho – prática usual no comércio, em que a remuneração variável (comissões de vendas) é paga à margem dos registros oficiais. Esse conjunto de práticas é conhecido pelos nomes de transações por fora ou caixa 2.

Observe-se que tais transações podem se dar tanto em uma relação com outras empresas formais que também atuam na semiformalidade (operações conhecidas como meia nota), quanto com empresas informais, trabalhadores autônomos ou pessoas físicas, sejam atuando como compradores, sejam como fornecedores. Nas grandes cidades brasileiras é sabido que muitos comerciantes “tradicionais”, ou seja, com estabelecimentos comerciais formalmente estabelecidos, empregam vendedores ambulantes (os camelôs), geralmente informais, para venderem suas próprias mercadorias posicionando-os em frente às suas lojas. Seu objetivo não é somente a evasão fiscal, mas também – e principalmente – ocupar uma posição de mercado que, se não fosse ocupada por ele mesmo, seria por um outro qualquer, que concorreria com ele em sua própria porta.

Em que pese não existirem estatísticas que dimensionem com precisão essas operações e seus perfis, a observação da realidade e os “constrangimentos legais” existentes no país nos levam a supor com razoável segurança que sua intensidade é inversamente correlacionada com o porte da empresa. Particularmente no universo das pequenas e microempresas, é um fato notório que, para muitas delas, seus demonstrativos contábeis não têm nenhuma relação com a realidade. Acreditamos ainda que o fenômeno se dá com maior intensidade no setor de serviços, particularmente no comércio.

Outro ponto importante na construção da semiformalidade a ser mencionado relaciona-se com as práticas gerenciais, muitas delas desenvolvidas a partir dos componentes culturais da sociedade: os sistemas informais (até mesmo rudimentares) de controle das operações. Há até uma expressão que designa essa situação como o “controle no papel de pão”, uma metáfora que se refere às firmas que registram suas operações em folhas soltas de papel avulso, alegoricamente o papel usado nos embrulhos de pão. Essa prática não está, necessariamente, associada ao emprego do “caixa 2”, pois os resultados finais apurados nas transações assim registradas podem vir a ser transferidos para os registros contábeis oficiais. Portanto, seu objetivo precípuo não é, necessariamente, a sonegação tributária. É, em grande medida, uma prática de caráter social e que é um componente do arcabouço simbólico do imaginário do povo brasileiro. Essa prática é a tal ponto reconhecida no país que chega mesmo a fazer parte dos atrativos de alguns estabelecimentos. No bar carioca Bip Bip, por exemplo, um dos mais tradicionais da cidade do Rio de Janeiro, as bebidas são servidas pelos próprios clientes, que as retiram pessoalmente da geladeira ou prateleiras e anotam seus nomes e seu consumo diretamente em um caderno colocado sobre uma mesa próxima à entrada do bar; anotação que serve de controle para a cobrança da conta (Silva, 2014).

A semiformalidade é, portanto, construída a partir de atividades formais que, de alguma maneira, conseguem espaços de operação na economia formal. Uma das possibilidades é a existência de agentes informais que transacionam com agentes formais por meio das operações “por fora” descritas acima. Há também os casos em que, a despeito de sua situação de informal, o agente consegue, quando necessário, revestir de “legalidade” algumas de suas operações. Isso se dá principalmente no setor de serviços e o principal instrumento, nesse caso, é a compra de Notas Fiscais emitidas por empresas formais (transação conhecida como barriga de aluguel): a empresa formal emite a Nota Fiscal ou Recibo relativo à transação efetuada pelo agente informal e este assume o pagamento dos impostos correspondentes. Esse pagamento, dependendo da relação existente entre os envolvidos, pode ser com ou sem ágio.

Uma outra situação começou a se tornar mais visível a partir da criação da figura do Microempreendedor Individual, o MEI (Brasil, 2008). Este dispositivo, que entrou em vigor a partir de 01 de Julho de 2009, pretende oferecer condições especiais de legalização (ou formalização) principalmente para o trabalhador autônomo que vem atuando informalmente, sendo este seu alvo principal, porém não exclusivo. O sistema adota um processo de registro extremamente simplificado e que pode ser feito em poucos passos pela Internet, reduzindo sobremaneira os custos de transação para a formalização. Além de oferecer inúmeras vantagens de caráter tributário para o MEI, que visam aprofundar a prevalência do princípio da progressividade na tributação das pessoas jurídicas, o programa tem por objetivo incluir esses trabalhadores no sistema de proteção social por maio da criação de condições especiais de contribuição[2], possibilitando que se integrem ao sistema previdenciário. Espera-se que a possibilidade de operar no mundo formal – possuindo um CNPJ e emitindo Nota Fiscal – seja capaz de melhorar as condições de operação e competitividade desses trabalhadores e, por conseguinte, também sua renda.

No entanto, o programa do MEI é subordinado à Lei Geral das MPEs. Em consequência disso, os MEIs estão submetidos às mesmas exigências que as MPEs em geral. Esta lei não trata apenas de tributos, seu texto também sugere a simplificação e a unificação de licenças (alvará, bombeiros, vigilância sanitária, meio ambiente etc.) e processos para a abertura, manutenção e encerramento das MPEs, visando reduzir os entraves burocráticos e os custos de abertura dessas empresas. A palavra “sugere” não aparece aqui por acaso. O arranjo federativo brasileiro impõe inúmeras barreiras para a universalização da aplicação dos princípios que regem a Lei Geral e o estatuto do MEI, implicando no que chamamos de “formalidade pela metade”. Um exemplo pode ser o de uma van que vende sanduíches nas ruas sem as devidas licenças: o seu proprietário pode possuir o registro como MEI, sendo portanto “formal” do ponto de vista federal; entretanto não possui nem licença da Vigilância Sanitária, nem Alvará de funcionamento, permanecendo, assim, “informal” do ponto de vista estadual e municipal. Esta é mais uma faceta do problema da integração e coordenação vertical das políticas públicas.

O registro da semiformalidade, em certa medida, já havia sido feito por Souza, Feijó e Nascimento e Silva (2006), quando propuseram um sistema de “classificação de níveis” para a informalidade brasileira, sugerindo que os diversos ramos de atividades cobertos pela pesquisa Ecinf 1997 fossem classificados como sendo de Alta Informalidade; Média Informalidade; ou Baixa Informalidade. Essa classificação teria como base caraterísticas observadas no conjunto de empresas de cada ramo no que concerne a seis atributos: 1 – Nível de receita; 2 – Posição do proprietário (conta própria ou empregador); 3 – Local de Funcionamento (domicílio, sem local fixo ou com local fixo); 4 – Mercado Consumidor (pessoas diversas ou clientes fixos); 5 – Controle de Contas (sem nenhum registro, controle pelo proprietário ou existência de contador); 6 – Constituição Jurídica (com ou sem registro formal, isto é, CNPJ). As inúmeras possibilidades de combinação desses seis atributos em seus diversos possíveis graus permitem ter uma ideia da conformação desse espaço que vai desde uma total e completa informalidade até a rigorosa formalidade. Nesse trabalho, os autores destacam que o universo da informalidade, considerado a partir do duplo enfoque propugnado pela OIT, deva ser considerado como parte integrante da estrutura formal, subordinado ao processo de desenvolvimento da economia.

Em outro estudo, Feijó, Nascimento e Silva e Souza (2009, p. 331) assumem como hipótese de trabalho “que, assim como a fronteira entre o trabalho formal e o informal não é bem demarcada, dentro do setor informal também podemos encontrar um continuum de situações em que pressupostos de um trabalho descente estão mais ou menos presentes”. Chamam ainda a atenção para o fato de que a própria OIT considera que “entre a economia formal e a informal não existe um limite claro que as separe”.

Fica evidente que na economia brasileira não há dois espaços “paralelos”: o mundo formal e o informal. Conforme o que está apresentado em maiores detalhes em texto deste autor que trata especificamente da informalidade, estes espaços se imbricam e se complementam na semiformalidade, conformando um único sistema socioeconômico. Essa realidade é análoga àquela descrita por Cacciamali (2001) ao tratar especificamente da questão do trabalho, na qual a autora afirma que os denominados setores formais e informais do mercado de trabalho expressam-se como um continuum de relações existentes nesse mercado, e não como dois setores dicotômicos ou duais.

Assim, entendemos, a semiformalidade como um espaço construído a partir de dois movimentos convergentes e complementares (figura 1).

FIGURA 1 – Representação esquemática da semiformalidade

Elaboração do autor.

Compreender essa realidade é essencial para a compreensão do nosso país, independentemente de quaisquer juízos que se façam dela. O fato é que o Brasil é um país que é o país que é! E é este país que precisa ser mais bem compreendido, assumido como tal e desenvolvido a partir de suas características próprias.

Em um próximo post veremos o papel relevante que o setor de serviços desempenha na conformação desse construto.

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Lei Complementar nº 128, de 19 de dezembro de 2008. Altera a Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, altera as Leis nos 8.212, de 24 de julho de 1991, 8.213, de 24 de julho de 1991, 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, 8.029, de 12 de abril de 1990, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 22 dez. 2008.

CACCIAMALI, Maria Cristina. Padrão de acumulação e processo de informalidade na América Latina: Brasil e México. Pesquisa & Debate, v. 12, n. 1, ano 19. São Paulo: PUC-SP, 2001.

FEIJÓ, Carmem Aparecida; NASCIMENTO E SILVA, Denise Britz do; SOUZA, Augusto Carvalho. Quão heterogêneo é o setor informal brasileiro? Uma proposta de classificação de atividades baseada na Ecinf. Revista de Economia Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, 2009.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Economia informal urbana 1997 – Ecinf. Rio de Janeiro: IBGE, 2003.

ILO – INTERNATIONAL LABOR OFFICE. Seventeenth International Conference for Labor Statisticians. Report of the Conference. Geneve: ILO, 2003.

NOGUEIRA, Mauro Oddo.  A Problemática do Dimensionamento da Informalidade na Economia Brasileira. Brasília: Ipea, 2016. (Texto para Discussão n. 2221).

SILVA, Priscilla. Bar do Bip Bip traz a alma do Rio de Janeiro e se confunde com a história do Brasil. Olhar Conceito, 13 jan. 2014. 

SOUZA, Augusto Carvalho; FEIJÓ, Carmem Aparecida; NASCIMENTO E SILVA, Denise Britz do. Níveis de informalidade na economia brasileira. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 37, n. 3 , 2006.

NOTAS:

Nota do autor: Este texto é excerto de um trabalho publicado como Texto para Discussão (Nogueira, 2016) que apresenta as diversas estimativas da dimensão do setor informal na economia brasileira. Este, por sua vez, integra um projeto de estudo mais amplo sobre o universo dessas empresas: o livro “Um Pirilampo No Porão: um pouco de luz nos dilemas da produtividade das pequenas empresas e da informalidade no Brasil” (no prelo).

As opiniões aqui emitidas são de exclusiva e inteira responsabilidade do autor, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ou do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.

[2] Quando de sua criação, o MEI poderia contribuir para o sistema previdenciário (Instituto Nacional do Seguro Social – INSS) com base em uma alíquota de 11,0% do Salário Mínimo. A partir de 2011 esta alíquota foi reduzida para 5,0%.

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