Economia de Serviços

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Fluxos internacionais de dados e a globalização digital

“Na era digital, a moeda forte de troca é a informação, acessível e universal.”

Em 2001, a Revista Superinteressante publicou o texto “Sociedade da Informação”, de onde a frase acima foi retirada. A publicação preconizava a importância da informação em um contexto em que a Internet dava os primeiros sinais de seu potencial como meio de comunicação. O futuro previsto pelo texto apontava que as empresas de informática, eletrônica e comunicação ditariam “a tônica dos novos tempos”, em que o acesso à rede global de computadores seria cada vez mais importante para a sociedade e a economia.

Quinze anos depois, já é possível afirmar que a rápida expansão da Internet de fato consolidou um novo mercado de dados. Nesse contexto, armazenar, transmitir e garantir a segurança da informação se tornou um fator chave para a economia global.

Conforme apresentado em relatório recente da McKinsey, os fluxos globais contribuíram para o crescimento do PIB mundial em 10% em 2014 – um aumento de U$S 7,8 trilhões. Desse total, U$S 2,8 trilhões referem-se apenas ao fluxo internacional de dados (ou cross-border data flows), representando uma participação superior à do fluxo de bens. O ponto central é que, enquanto os fluxos de bens e serviços levaram centenas de anos para se desenvolverem, a expansão dos fluxos de dados ocorreu principalmente nos últimos 15 anos.

Mais ainda, é possível notar que, ao mesmo tempo em que o fluxo de bens e serviços tradicionais perderam momentum, o fluxo de dados – mensurado pelo uso de cross-border bandwidth – cresceu 45 vezes entre 2005 e 2015 (ver figura abaixo). O estudo prevê, ainda, que o fluxo de dados crescerá mais 9 vezes nos próximos cinco anos, se os fluxos de comércio digital, pesquisas, vídeos, comunicações e tráfego entre empresas seguirem o ritmo de expansão atual.

Figura – Expansão do fluxo de dados
Fluxo de dados

Fonte: Mckinsey.

A nova era digital inaugura uma etapa para o processo de globalização – ou globalização digital -, ditada pelos fluxos de dados que mudaram as formas de transmissão de informação e inovação e estabeleceram novos mecanismos de interação entre pessoas e empresas.  Isto significa que “globalization is becoming more about data and less about stuff” (“a globalização está se tornando um fenômeno mais relacionado a dados e menos relacionado a coisas”, em tradução livre), conforme o título da coluna da Harvard Business Review sobre o tema.

No entanto, a figura acima mostra que o fluxo de dados é menor em países periféricos, indicando que a universalização do acesso à rede e o consequente aproveitamento dos fluxos globais de dados ainda encontra obstáculos ao redor do mundo.

Isso significa que, enquanto os países mais desenvolvidos caminham para a maior integração ao fluxo internacional de dados, países menos desenvolvidos apresentam maior dificuldade em embarcar na nova era digital.  Melhorar o acesso à rede e modernizar políticas regulatórias sobre o tema são apenas os passos iniciais para que esses países tenham a chance de ingressar competitivamente em um mercado cada vez mais digitalizado.

O Brasil é um exemplo contundente de uma economia que, apesar de se encontrar entre as 10 maiores do mundo, ainda apresenta baixo acesso à Internet, o que impacta negativamente a participação do país no fluxo digital.

A sociedade da informação traz uma infinidade de oportunidades em um mundo globalizado e digitalizado. Tais oportunidades abrangem o desenvolvimento de uma gama de atividades associadas a serviços em nuvem, Internet das Coisas, e-commerce, dentre outras potencialidades trazidas pela rede. Saber aproveitá-las é o grande desafio para países que, como o Brasil, estão chegando atrasados à revolução digital.

O que é a neutralidade de rede e por que ela importa?

A questão da neutralidade de rede foi bastante debatida durante a discussão e posterior aprovação do chamado “Marco Civil da Internet”. Este é um assunto que vem sendo tratado há pelo menos uma década no restante do mundo e há argumentos razoáveis contra e a favor de se estabelecer normas e leis que garantam essa neutralidade. Mas o que é a “neutralidade de rede” e por que se trata de questão importante?

A neutralidade de rede é o princípio segundo o qual todos os conteúdos, websites, plataformas e aplicativos devem ser tratados de maneira igual pelos provedores de internet, independentemente dos pacotes contratados. Por esse princípio, uma pessoa não deveria ser obrigada a fazer um plano especial com o seu provedor de internet para poder acessar a Wikipédia, o Netflix ou qualquer outro serviço. Sob o mesmo princípio, uma pequena loja online (ou mesmo a Amazon) não deveria ter de pagar aos provedores de internet para que os usuários possam ter acesso aos seus serviços.

O princípio garante, por exemplo, que uma operadora de celular não restrinja o acesso a serviços como o Skype, que concorrem diretamente com os serviços de telefonia da própria operadora. Alternativamente, sem a neutralidade de rede, uma provedora de internet poderia fazer pacotes de acesso para serviços específicos, com diferentes precificações, tal qual as empresas de TV a cabo fazem com os canais de televisão (ver exemplo hipotético na imagem abaixo).

Para seus defensores, a neutralidade de rede é importante para não inibir a entrada de sites e aplicativos inovadores no mercado atualmente aberto da internet. Ao mesmo tempo, a neutralidade assegura a livre navegação por parte dos usuários.

Garantir a neutralidade de rede seria justificado pela natureza oligopolística (e, em alguns casos/regiões, até monopolística) das provedoras de internet fixa e móvel. Em muitas cidades, há apenas uma ou duas empresas provedoras de internet fixa e cobertura de duas ou três operadoras de internet móvel. Esse ambiente de alta concentração poderia, no limite, fazer com que os consumidores só tivessem acesso (ou tivessem acesso preferencial) a conteúdos e aplicativos escolhidos por estas operadoras.

Os contrários à imposição da neutralidade de rede também argumentam que ela pode trazer restrições a discriminações benéficas ao consumidor. Por exemplo, uma operadora poderia fazer um plano básico e barato de internet com acesso limitado a serviços como email, WhatsApp e Facebook para usuários que não utilizam mais que isso,[1] e outro plano mais avançado e rápido para pessoas que usam frequentemente serviços intensivos em banda, como Netflix ou torrents. Nessa situação hipotética, o primeiro usuário se beneficiaria de um plano barato e adequado às suas necessidades, enquanto o segundo poderia ter um acesso mais rápido aos serviços utilizados.

Outro argumento dos que são contrários ao estabelecimento de leis garantindo a neutralidade de rede é que impedir provedoras de internet de fornecer pacotes específicos a preços diferentes para distintos usuários limitaria o retorno dessas empresas, o que, por sua vez, poderia fazer com que elas investissem menos em infraestrutura. Outros argumentam que, mesmo a internet tendo passado décadas sem regras que obrigassem as provedoras a manterem a neutralidade de rede, a neutralidade pouco teria sido violada ou ameaçada. Portanto, impor regras nesse sentido seria desnecessário.

A discussão é relevante para os dias atuais,já que o acesso à internet tornou-se um serviço de utilidade pública e as linhas que dividem as atividades de empresas voltadas para a internet têm se tornado cada vez mais tênues. Grandes empresas de conteúdo, como o Google (através do Project Loon) e o Facebook (por meio do internet.org), estão interessadas em levar internet gratuita ou de baixo custo a áreas pobres e remotas do mundo.

O projeto do Facebook tem sido criticado por fornecer apenas serviços que a companhia escolhe – naturalmente, o próprio Facebook é um desses serviços. Já o Google tem sido criticado pelo seu potencial de direcionar os usuários, podendo, inclusive, decidir eleições acirradas, por meio de seus algoritmos.

Sem dúvida, uma maior cobertura da internet pelo mundo é bem-vinda, mas, como não há almoço grátis, é preciso saber se os benefícios superam os custos (financeiros ou não). Apesar dos argumentos contrários à garantia da neutralidade de rede, manter os princípios da internet aberta, livre e com poucas barreiras de entrada para novos empreendedores ainda é o melhor caminho.

 

Figura – Exemplo hipotético de como as provedoras de internet poderiam cobrar por pacotes específicos de serviços online, sem a exigência de neutralidade de rede

what-is-net-neutrality-isp-package-diagram

Fonte: Le Monde

[1] De certa maneira, algumas operadoras de telefonia brasileira já têm aderido a esse tipo de prática ao não cobrarem de seus clientes o acesso ao Facebook, Whatsapp e Twitter.

As cinco temidas

O jornalista Farhad Manjoo,  do The New York Times, publicou um interessante artigo sobre o que ele chamou de as “cinco grandes temidas da tecnologia”.  Elas seriam a Google, Microsoft, Apple, Facebook e Amazon. Seriam as temidas, pois são cada vez mais dominantes em seus respectivos mercados e estão se consolidando sem ameaças previsíveis.

Farhad argumenta que as gigantes estão se estabelecendo de tal forma no funcionamento dos seus próprios mercados via efeitos de rede e de plataforma que elas são capazes de sufocar, ao menos neste momento,  praticamente quaisquer ataques vindos de potenciais concorrentes.

Não é coincidência que as cinco temidas são do setor de serviços. Afinal, já sabemos que os serviços vieram para dominar em definitivo a economia global. Mas também não é coincidência que essas empresas buscam cada vez mais, de um jeito ou de outro, a sua consolidação através da produção de um blend de serviços e de bens.

A Google, que começou produzindo serviços, se mete de forma crescente na produção de bens industriais, incluindo carros não motorizados, telefones e muitos outros equipamentos. A Amazon encoraja o desenvolvimento de equipamentos, incluindo leitores de livros, drones para entregas e outros. Já a Apple, que se concentrava mais na produção de bens, se tornou uma mega produtora de serviços. Já as “primas”, como a Uber, financia o desenvolvimento de carros não motorizados.

Devemos caracterizar as empresas de tecnologia como sendo do setor de serviços ou industrial? A resposta é de ambos. E isto ocorre porque a geração de valor está no amalgama entre bens e serviços e não apenas em ou outro, o que decorre da relação sinergética e simbiótica entre bens e serviços.

As empresas de tecnologia foram, cada uma a seu modo, entendendo isto a ponto de se tornarem ameaças para  as empresas para quem supostamente elas deveriam fornecer soluções tecnológicas.  Hoje, as fabricantes de carros vêem as empresas de tecnologia como a sua maior ameaça.  Afinal, se os sistemas de navegação, segurança e entretenimento estão se tornando a parte de mais alto valor agregado do carro moderno, então o papel da montadora está se tornando, de certa forma, secundário.  E é este tipo de movimento que tem encorajado as empresas de tecnologia a buscar agregar elas mesmas valor complementar em torno das suas soluções tecnológicas. Isto ajuda a explicar a desesperada busca das montadoras por aquisição de empresas de tecnologia e de parcerias. De uma forma ou outra, o mesmo ocorre em outros segmentos.

É difícil prever o futuro da economia digital em razão da sua própria natureza. Mas é certo que o que quer que venha pela frente terá na relação entre bens e serviços o pilar da criação de riqueza.

 

(Des)Conectados

Os anos 2000 marcaram o avanço do uso da Internet. O lançamento dos smartphones prenunciou uma nova fase em que se manter conectado se tornaria um fator estratégico para empresas e uma exigência cada vez maior da sociedade. Desde BlackBerrys a iPhones, o novo sistema de comunicação passou a incorporar uma infinidade de serviços em que o diferencial seria a capacidade de acessar a Internet a partir de qualquer lugar no planeta.

Ao mesmo tempo, os negócios passaram a incorporar tais funcionalidades e o acesso quase imediato à informação passou a ser fator crucial de competividade. É nesse contexto que surgem oportunidades para o desenvolvimento de soluções inteligentes que demandam o acesso à Internet.

Porém, a oferta e a qualidade dos serviços de Internet são pré-requisitos para que seja possível usufruir das potencialidades da rede.

O mapa abaixo ilustra a discrepância entre regiões e países quanto ao uso da rede. Destacam-se os países desenvolvidos como os grandes usuários da Internet. O gráfico seguinte aponta que, além do baixo acesso, países de menor grau de desenvolvimento apresentam serviços de Internet mais caros. Esses dados revelam a ineficiência do serviço naqueles países e, principalmente, o atraso em relação aos países desenvolvidos.

Mapa – Dispositivos conectados à Internet

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Fonte: Internet Census 2012.

Gráfico: subscrições e preço da Internet, por nível de desenvolvimento dos países

Sem títuloNota: LDCs = least developed countries.

Fonte: International Telecommunication Union.

Olhando para o Brasil no mapa, chama atenção a diferença regional quanto ao acesso à Internet. Segundo dados da PNAD/IBGE referentes ao ano de 2013, mais de 50% da população ainda não têm acesso à rede. Os dados são ainda mais preocupantes ao se considerar a velocidade da conexão. Conforme ranking mundial de velocidade da Internet da Akamai, o Brasil ocupa a 94ª posição, com uma velocidade média de conexão de 3,6 Mb/s, enquanto a média global é de 5,1 Mb/s.  Em países desenvolvidos, a velocidade ultrapassa 10 Mb/s – chegando a 20,5 Mb/s na Coréia do Sul, que ocupa o primeiro lugar no ranking.

A baixa qualidade do serviço de Internet representa um entrave para que países em desenvolvimento possam incorporar soluções para impulsionar o crescimento e a competitividade. A migração para sistemas de produção inteligentes que envolvem, por exemplo, o uso de serviços em nuvem e produtos associados à Internet das Coisas demandam o desenvolvimento de uma estrutura de rede ampla e moderna.

Superar o gargalo da infraestrutura de acesso à Internet talvez seja o grande desafio para países que, como o Brasil, precisam encontrar atalhos para a inserção competitiva nas cadeias globais de valor.

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