Economia de Serviços

um espaço para debate

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Boletim de Serviços – Novembro de 2015

Em novembro,   as séries foram revisadas com o intuito de incorporar mudanças recentes nos dados utilizados como fonte para o cálculo dos indicadores. Apesar das alterações, as séries apresentam valores próximos aos calculados anteriormente. Além disso, o Boletim de Serviços de Novembro apresenta novos indicadores calculados com base no Índice de Volume, divulgado recentemente pela Pesquisa Mensal de Serviços (PMS/IBGE).

Volume

Para maiores detalhes, acesse o último número do Boletim de Serviços e consulte as séries históricas no endereço https://economiadeservicos.com/boletim/.

Mudanças disruptivas nas relações entre indústria e serviços nos aguardam

Imagine que você é um designer sentado à frente de uma tela de computador utilizando um software para desenvolver o projeto de um determinado produto. Imagine, agora, uma outra tela, ao lado da primeira, mostrando os impactos de cada alteração no projeto no tempo para lançar o produto no mercado, nos custos de produção em cada elo da cadeia de fornecedores, no consumo de energia, etc. Isso é o que a manufatura digital será capaz de fazer.

O termo manufatura digital (também conhecido como Indústria 4.0) inclui desde avanços na produção de equipamentos, como impressão 3D e robótica; serviços de alto valor agregado, como softwares, design, computação na nuvem, inteligência artificial, simulação e mockups digitais (DMU); produtos inteligentes (conectados por meio da Internet das Coisas), até ferramentas avançadas de análise dos dados fornecidos por cada elo da cadeia produtiva. Assim, busca-se explorar, numa disruptiva relação entre indústria e serviços, a imensa quantidade de dados que a indústria, mais do que qualquer outro setor, é capaz de gerar.

Muitos setores e empresas já analisam dados para aperfeiçoar operações, melhorar o uso de equipamentos e a qualidade dos produtos e reduzir o consumo de energia. As indústrias de defesa e a aeroespacial utilizam ferramentas digitais para integrar sua densa e complexa rede de fornecedores, na qual pequenas mudanças no design de uma turbina a jato, por exemplo, impactam a produção de centenas de componentes.

A partir de ferramentas como computação na nuvem, já é possível compartilhar modelos tridimensionais com a rede de fornecedores, facilitando a troca de informações sobre qualidade, preço e entrega dos produtos e acelerando a capacidade de resposta dos fornecedores a mudanças de design. A Boeing desenvolveu duas fuselagens utilizando ferramentas de manufatura digital, o que reduziu o tempo de entrada em produção (time-to-market) em mais de 50%.

O que se vê, porém, é ainda certa desconexão entre os elos, os quais estão, muitas vezes, em diferentes partes do planeta. Plataformas para colaboração virtual fazem com que os elos absorvam mais informações sobre os demais parceiros, gerando um ambiente de maior colaboração e coordenação. Com isso, melhora-se a qualidade dos produtos e a produtividade e acelera-se o ritmo com o qual as firmas inovam na produção.

Há, porém, um longo caminho até que a manufatura digital se consolide entre as empresas das economias avançadas. Como mostra o gráfico abaixo, pesquisa feita pela Mckinsey&Company indica que apenas 13% das empresas têm alta “capacidade digital” em suas etapas industriais. Apesar disso, o que não se pode perder de vista é que muitos países já têm iniciativas para consolidar a manufatura digital.

A digitalização na manufatura

figura - post 2 Vanessa

Fonte: Mckinsey&Company, 2014

Na Alemanha, o Industrie 4.0 busca colocar o país como líder em soluções para a manufatura avançada. Nos Estados Unidos, a Digital Manufacturing and Design Innovation Iniciative (DMDII), formada pela parceria entre empresas, governo e universidades, é um hub voltado exclusivamente ao desenvolvimento da manufatura digital. A China, em 2015, anunciou a adoção da estratégia “Made in China 2025”, com o objetivo de aumentar a qualidade, a produtividade e a digitalização da sua indústria.

Os países que não conseguirem traçar a sua estratégia na direção da manufatura digital ficarão mais distantes de conseguir explorar seus benefícios em termos de ganhos de produtividade, de geração de valor e de crescimento econômico.

Índices de serviços e a necessidade de novos dados para o setor

Em divulgação recente, o IBGE passou a publicar índices de volume de produção de serviços. Até então, apenas a série de receita nominal era divulgada mensalmente. Esse novo índice é obtido deflacionando-se as séries de índice de receita nominal. Conforme apontado pela nota metodológica do Instituto, para cada grupo de atividade e para cada estado, foram utilizados índices de preços específicos construídos a partir do IPCA. A nota metodológica esclarece, ainda, que para as atividades não abrangidas pelo índice, utilizou-se o IPCA serviços.

Com base nessa metodologia, cabe uma advertência sobre o uso do IPCA para deflacionamento de dados de serviços: o índice em si não captura adequadamente a inflação observada para os serviços consumidos pelas empresas, uma vez que é fundamentalmente construído para avaliar o nível de preços para o consumidor final. Assim, é provável que os preços dos serviços utilizados como intermediários na produção tenham um comportamento distinto daqueles de consumo final, seja pela existência de contratos, capacidade de negociação das empresas ou por outras particularidades dos serviços empresariais.

Desse modo, o IPCA não seria o melhor índice para deflacionamento de categorias que abrangem em grande medida serviços consumidos pelas empresas como, por exemplo, serviços técnicos-profissionais. É claro que nesse ponto cabe destacar que, no momento, inexistem índices de preços que captem a evolução dos preços dos serviços usados como insumo na produção, o que justifica o uso do IPCA.

Não obstante as fragilidades, o novo indicador é fonte de informações relevante para se entender a trajetória do setor, uma vez que a aceleração do nível de preços dos serviços pode afetar as conclusões sobre o seu desempenho econômico. Desse modo, os índices de volume contribuiriam para descrever o comportamento real do setor nos últimos anos.

Nesse sentido, os gráficos abaixo mostram que a inflação, de fato, superestima o desempenho do setor de serviços, uma vez que o índice de receita nominal se distancia do de volume devido à aceleração do IPCA. Complementarmente, é natural que se observe que a receita do setor apresente variações positivas (ainda que cada vez menores), enquanto em termos reais o setor contrai (o que é indicado pela variação negativa do índice de volume acumulada em 12 meses).

Por fim, é importante notar que a melhoria dos dados sobre o setor de serviços tem o potencial de enriquecer o debate. Tal como exposto, é conveniente que se avalie a inflação pertinente aos serviços-insumos, uma vez que esta afeta diretamente a competitividade e a capacidade produtiva da economia. Sob essa ótica, um índice de preços de serviços intermediários traria melhorias importantes para o tratamento de estatísticas sobre o setor.

indice volume

Fonte: PMS/IBGE. Elaboração própria.

TISA: Uma Oportunidade para Ampliar o Comércio Internacional de Serviços?

Em um post anterior havíamos comentado a necessidade de atualizar os acordos de comércio de serviços e as dificuldades para se contabilizar as implicações para os países que podem aderir ao TISA (Trade in Services Agreement), principalmente em decorrência do sigilo dos termos do acordo.

O Governo dos Estados Unidos pretende, ainda em 2015, avançar com o TISA e, para tanto, incluiu essas negociações na Agenda de Comércio do presidente. No dia 22 de Outubro, o Fórum Europeu de Serviços (ESF) se reuniu em Washington para tratar de uma declaração comum que, em suma, destaca que nas últimas semanas de 2015 será possível examinar oportunidades significativas de negociações de serviços direcionadas a modernização das regras relacionadas a serviços em nível regional, multilateral e plurilateral (como o TISA), com a finalidade de dar passos em favor do crescimento econômico, geração de empregos e as escolhas do consumidor.

Isso sugere que os países chamados pela União Europeia de “bons amigos dos Serviços” já estão se movimentando em relação ao TISA. Esses países, participantes do TISA, não se resumem a um grupo fechado de membros da OMC e, sim, a união de todos os países que sentiram a necessidade de avançar nas negociações relacionadas aos serviços. Eles representam uma mistura de países desenvolvidos e países em desenvolvimento que respondem por cerca de dois terços do comércio global de serviços.

As cadeias globais de valor e as tendências do comércio de serviços fazem surgir questionamentos como: o que perderão os países que ficarem fora do TISA? Vale a pena resistir ao acordo e tentar estimular os serviços internos ou é melhor ceder antes que o país acabe excluído dos acordos internacionais?

Wikileaks divulgou uma série de documentos a respeito das negociações do TISA sugerindo que o acordo pretende influenciar as leis comerciais locais, restringindo a autonomia dos governos, que terão seus projetos de leis controlados e precisarão de autorização para serem aprovados. Entretanto, os EUA e a União Europeia divulgaram um comunicado conjunto afirmando que nenhum acordo comercial exige que os governos privatizem seus serviços e que não vão impedi-los de atuar em áreas como educação, saúde, água e serviço social.

De acordo com esse documento divulgado, os países deverão abrir mão de algumas políticas nacionalistas, e inclusive o Brasil poderá ser afetado, já que uma das propostas do acordo veda a “transferência ou acesso de código-fonte de software como condição à prestação de serviços em seu território”, que é justamente o que o Ministério do Planejamento está tentando incluir na regulamentação sobre compras públicas de tecnologias de informação e comunicação.

A decisão de entrar ou não no TISA representa um trade-off  para os países em desenvolvimento: não aderir ao acordo implica em perder a oportunidade de influenciar e negociar em condições mais favoráveis. Não entrar pode levar a um arrependimento futuro e, quando os países resolverem aderir, podem ter perdido o timing e estar muito atrasados, seja tecnologicamente ou produtivamente em relação aos demais países participantes. Porém, entrar desde já implica que terão que praticamente renunciar ao desenvolvimento de vários setores de serviços que serão fonte fundamental de geração de riqueza no século XXI.

Analisemos o Brasil, que é um grande importador de serviços. A ampliação de serviços tecnológicos em nível doméstico, que representa parte significativa das importações, demandaria recursos humanos qualificados e condições para se fazer negócios que não temos no momento. Uma primeira reação mais pragmática seria, então, a de participar de acordos como o TISA. Porém, a decisão de entrar ou não necessita ser cuidadosamente examinada.

Para que possa valer a pena participar de um acordo de comércio de serviços, seja TISA ou qualquer outro com pauta similar, é necessário agir de forma estratégica, pensando nos benefícios e custos que se pode obter. Para tanto, é preciso:

  1. disposição por parte das autoridades para que o acordo beneficie a todos os participantes envolvidos;
  2. que sejam formuladas políticas domésticas para que o resultado das negociações seja eficiente e possa atingir os objetivos econômicos desejados para o país;
  3. que os países discutam as barreiras comerciais por eles enfrentadas nos diversos setores, e também que sejam esclarecidos quais os setores em que há maior pressão de demanda e qual a capacidade de oferta interna desses setores. Isso permitiria verificar se há excesso de demanda interna em algum setor que, eventualmente, não tem oferta nacional correspondente.
  4. observar que o momento da negociação também é um ponto muito importante, pois é preciso que o negociador seja devidamente qualificado e informado sobre os melindres do assunto;
  5. transparência à população a respeito das negociações também deve ser considerada, pois não é possível que países negociem os interesses públicos sem que o próprio público saiba quais decisões estão sendo tomadas, dificultando a avaliação dos resultados do acordo, se foi de fato benéfico ou não.

Por fim, vale uma ressalva: a maior parte do comércio internacional dos serviços já se encontra nas mãos daqueles que negociam o TISA e esse montante pode aumentar ainda mais, fator que deve ser notado, pois exige, a cada dia que se passa, mais atenção dos países não participantes, como o Brasil. O debate sobre o tema não pode ser deixado de lado, bem como um estudo mais aprofundado sobre as suas consequências.

Whatsapp e telefonia: serviços substitutos ou complementares?

Nos últimos meses, empresas de telefonia têm constantemente reclamado de suposta “concorrência desleal” de alguns aplicativos como Whatsapp, iMessenger e Facebook Messenger. O argumento das operadoras é que, por prover serviços de mensagem e de chamadas de voz, esses aplicativos estariam usando a infraestrutura das empresas de telefonia para atuar como operadoras. Logo, esses aplicativos seriam ilegais e deveriam ser proibidos ou regulamentados e taxados.

Reclamação similar já foi feita por operadoras de TV por assinatura (que costumam ofertar, também, internet) com relação ao Netflix. Em resposta às reclamações, o Governo já se manifestou favorável a regulamentar esses serviços “over the top“, de modo a diminuir, nas palavras do Ministro das Comunicações, “assimetrias regulatórias e tributárias”.

De fato, empresas de telecomunicações no Brasil são obrigadas a fazerem investimentos em infraestrutura que nem sempre são os mais interessantes economicamente — as operadoras de telefonia têm que instalar e manter os quase obsoletos orelhões, por exemplo. Por outro lado, o WhatsApp e o Netflix não têm acesso garantido a mercados que são quase oligopólios, como as operadoras.

Na microeconomia, há dois conceitos que ajudam nesta discussão: o de bens substitutos e o de bens complementares. Bens substitutos são aqueles que concorrem diretamente, como margarina e manteiga. Se o preço da margarina subir, ceteris paribus, espera-se que a demanda por manteiga cresça. Já bens complementares são aqueles que, quando o preço de um diminui, a demanda pelo outro aumenta. Carro e gasolina são um exemplo disso: se o preço de automóveis cai, a demanda por gasolina deverá aumentar.

Pelo menos no discurso, as operadoras de TV e telefonia tratam aqueles aplicativos como bens substitutos. Ou seja, concorrentes diretos de seus serviços. Em alguns pontos, elas parecem ter razão: já há registro de queda no uso de chamadas convencionais e os serviços de SMS têm se tornado cada vez mais obsoletos (ver Gráficos 1 e 2 abaixo).

Entretanto, esses serviços “over the top” são, também, complementares aos serviços de TV e telefonia. Hipoteticamente, se uma operadora bloqueasse o acesso ao WhatsApp, é provável que boa parte de seus clientes migrassem para operadoras concorrentes. Indicativo disso é que quase todas as operadoras oferecem acesso gratuito a esses serviços (o que, inclusive, parece constituir uma violação à neutralidade de rede, mas esse é um assunto para outro post). Nos dias de hoje, boa parte da experiência do consumidor com telefonia envolve justamente o uso desses aplicativos.

Logo, o que transparece em toda essa discussão é que, assim como no caso do Uber, a regulação vigente e os modelos de negócio se mostram ultrapassados. A maior revolução que os serviços “over the top” parecem estar promovendo é a mudança no modelo de negócios já estabelecidos pelas operadoras. Se antes elas lucravam principalmente com os serviços de voz e de mensagem de texto, atualmente é a internet móvel que parece ser mais relevante (e as operadoras têm quase que um oligopólio nisso!).

Nesse novo modelo, há espaço para ganhos das operadoras sem necessariamente punir o consumidor. Focar mais no provimento de uma rede de internet móvel mais confiável e rápida e oferecer planos mais atraentes pode ser um caminho.

Fazer mais do mesmo ou limitar o acesso a aplicativos não resolverá a questão nem para operadoras e nem para os reguladores. Para não perderem o bonde do Século XXI, ambos terão que  ser mais flexíveis e ágeis para não punirem nem ideias inovadoras nem os consumidores.

Gráfico 1 – Minutos de Uso mensal por Celular

Gráfico 2 – Receita de SMS da Operadora Vivo

 

PS: O assunto deste post me foi sugerido pelo amigo e também economista João Vítor Rego Costa, a quem agradeço.

Admirável Mundo Novo

A era da informação, da comunicação e das novas tecnologias veio para ficar. E para transformar. Mudanças abundam em todos os cantos, desde no entretenimento em nossas casas, passando pela escola e até pela forma como iniciam e funcionam as empresas. E, ao que parece, é ali que as mudanças talvez venham a ser mais profundas.

De fato, as empresas estão se valendo de recursos tecnológicos que podem alterar, num futuro não distante, o espectro empresarial e até o funcionamento dos mercados.  Empreendedores têm, hoje, acesso a vastos recursos que reduzem a necessidade de capital inicial, de pessoal e até de certas expertises, já que se pode fazer uso de recursos administrativos/produtivos/operacionais on-demand. Se precisar de escritório, contrata-se um já pronto para o período que necessitar. Se precisar de serviços de TI, contratam-se serviços na nuvem. De softwares específicos ou de design, contratam-se profissionais numa das plataformas especializadas na internet. De manufaturar um produto, contrata-se uma empresa terceirizada de produção no Alibaba. De sistemas de pagamento, contrata-se uma das plataformas de pagamento on-line. De entregar produtos, pode-se recorrer aos serviços expressos. Até se precisar de capital, pode-se valer de crowdsourcing. Segundo a The Economist, essas transformações estão ajudando a alterar o conceito daquilo que entendemos como empresa.

Os  serviços hoje disponíveis estão facilitando enormemente a vida das empresas, em especial das startups, que já nascem com essa perspectiva no DNA e se aproveitam como nenhuma empresa madura das plataformas existentes para desenvolverem ideias e modelos de negócios inovadores. É nesse contexto que surgem os Uber, Airbnb e Netflix da vida. E é nesse contexto que empresas com um pequeno punhado de funcionários já nascem mirando o mercado global, algo impensável para a empresa convencional.

Aqueles recursos, juntamente com a mudança de foco e de cultura, liberam os empreendedores de terem que fazer escolhas difíceis acerca da alocação de recursos escassos da empresa – a internet na nuvem, por exemplo, reduz drasticamente a necessidade de pagamento de licenças, aquisição de equipamentos e contratação de pessoal de TI. Liberam, também, o tempo dos empreendedores e gestores para que se concentrem no seu core-business — pense nos casos do aplicativo WhatsApp, que tinha apenas 60 empregados quando foi adquirido pelo Facebook, na empresa de aspirador de pó, a britânica Dyson, que apenas coordena o desenvolvimento de seus produtos, e na Vizio, marca de TV mais vendida nos Estados Unidos em 2010 e que tinha apenas 200 funcionários naquela altura.

É claro que estamos apenas no início de uma longa jornada. Há muito ainda a acontecer. E é claro que esse modelo de organização da produção funciona para alguns, mas não para todos os setores. Mas a rápida mudança do padrão de consumo em favor dos serviços, o encurtamento do ciclo de vida dos produtos e as novas tecnologias de produção e de organização da produção – com robôs, internet das coisas e impressoras 3D – todos concorrem em favor da evolução e do desenvolvimento da “nova empresa”.

Enquanto isso, empresas grandes, com custos elevados e com modelos de negócios maduros tendem a ser menos flexíveis e se beneficiam menos desse admirável mundo novo. Por isto, devem enfrentar desafios pela frente. Os casos da IBM e do Walmart são representativos e os executivos de ambos já enfrentam dores de cabeça. No caso da IBM, por causa da concorrência dos serviços na nuvem, que estão suprimindo a necessidade de softwares corporativos e outros serviços on-site; no caso do Walmart, por causa da concorrência de supermercados que funcionam apenas on-line e de plataformas de venda direta, que eliminam intermediários.

Para empreendedores de países em desenvolvimento como o Brasil, as novas tecnologias e modelos de negócios são uma grande oportunidade e um atalho para se crescer e virar gente grande em tempo relativamente curto.

Glauber Rocha dizia que fazer cinema requeria “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”. No século XXI, empreender vai requerer uma ideia na cabeça e uma batuta de maestro na mão para se orquestrar geração de valor.

Admiravel mundo novo

O Potencial dos Serviços em Nuvem

Em post anterior, foi discutida a rápida expansão recente da Cloud Computing, possibilitando o armazenamento e compartilhamento de informações e softwares via rede. Tal movimento é uma clara resposta à demanda cada vez maior por serviços mais eficientes e de menor custo de tecnologia da informação (TI).

Em pesquisa recente promovida pela KPMG, 49% dos empresários entrevistados reportaram que a nuvem contribui para a transformação do ambiente empresarial por meio de ganhos de eficiência.   Cerca de 70% dos entrevistados apontaram que a migração de parte dos negócios para a nuvem tem contribuído para melhorar a performance das empresas, automatizar serviços, reduzir custos e acessar novas soluções.

Sem título

Fonte: 2014 Cloud Survey Report/KPMG.

A ideia por trás do aumento da produtividade das empresas via adoção de serviços em nuvem é bem simples: enquanto no modelo tradicional de TI é necessário um alto investimento em infraestrutura tecnológica, softwares e contratação de pessoal – em que parte dos recursos se torna rapidamente obsoleta ou subutilizada -, a cloud permite o acesso instantâneo aos mesmos serviços de forma compartilhada e com menor custo. A manutenção, a segurança dos dados e a modernização dos recursos ficam a cargo do prestador do serviço (o “dono” da nuvem), tornando a terceirização das atividades de TI muito mais atraentes. Assim, a migração de parte dos processos dos negócios para a nuvem libera recursos humanos e financeiros para as atividades principais das empresas, tornando-as mais produtivas.

Por outro lado, companhias como Amazon.com, Google e Microsoft têm encontrado nichos de mercado promissores, obtendo receitas significativas com a oferta de soluções tecnológicas no modelo de Cloud Computing. Conforme apontado em artigo da Bloomberg, somente a divisão Amazon Web Services, responsável pelos serviços em nuvem da Amazon, obteve uma receita de US$2,09 bilhões no terceiro trimestre de 2015, o que representa um aumento de 78% em um ano.  Em contrapartida, companhias como IBM, HP, EMC, Oracle, dentre outras vêm apresentando desempenho negativo. A justificativa para tal fato é que produtos e serviços tipicamente comprados dessas companhias por grandes empresas estão sendo substituídos por soluções de menor custo disponíveis na nuvem.

Tal cenário indica a tendência de as empresas aderirem cada vez mais soluções na nuvem como meio para potencializar a sua produtividade, enquanto os grandes provedores desse tipo de serviço ganham força no mercado de tecnologia da informação. Ao mesmo tempo, sobram questionamentos sobre o sigilo dos dados armazenados na nuvem, o que representa uma das principais preocupações para as empresas e um grande desafio para as autoridades quanto à regulação de um modelo de negócios operado via rede e de amplitude internacional.

 

Serviços, Investimento Direto Estrangeiro e Abertura Econômica

Como mostrado anteriormente no blog, o setor de serviços já é o maior receptor de investimento direto estrangeiro (IDE), tendo respondido por 59% do total em 2014. Em 2015, essa participação segue alta, tendo alcançado 56% entre janeiro e agosto.

Os gráficos abaixo, retirados do Boletim de Serviços de outubro, mostram que há uma concentração dos ingressos de IDE em serviços de custo, modernos, profissionais e voltados principalmente para empresas. Destacam-se, sobretudo, os investimentos nos segmentos de telecomunicação (US$ 4,3 bi. de janeiro a agosto de 2015), comércio (US$ 3,5 bi.), atividades imobiliárias (US$ 1,2 bi.), e saúde (US$ 1,1 bi.).

Este último é especialmente emblemático pelo seu crescimento de 2014 para 2015, quando os ingressos passaram de US$ 16 milhões para mais de US$ 1 bi. até agosto. Esse resultado se deve à mudança da legislação ocorrida com a aprovação da Lei 13.097/2015 que, entre outros assuntos, permitiu a participação direta e indireta de capital estrangeiro em empresas do setor de serviços à saúde.

Com o avanço das negociações de acordos multilaterais como o Tratado Trans-Pacífico e o aumento da importância dos serviços, tanto direta, quanto indiretamente, para o comércio internacional, é provável que haja maior pressão para a abertura dos mercados do setor. Com isso, serviços deverão continuar sendo uma importante fonte de IDE e o que ocorreu com o segmento de saúde poderá se repetir em outros setores atualmente protegidos.

Uma maior abertura poderá, em princípio, trazer benefícios para o setor e para os consumidores, sejam eles famílias ou empresas, que poderão ter acesso a uma maior e melhor oferta de serviços. No entanto, há que se considerar que a abertura de mercado deve ser acompanhada de marcos regulatórios que, ao mesmo tempo, fomentem a competição e também a qualidade dos serviços ofertados, a segurança da oferta, investimentos e respeito às leis do país.

Nesse cenário, torna-se ainda mais importante trabalhar para o aumento da competitividade das empresas prestadoras de serviços brasileiras.

 

Os Serviços nas Contas Externas de 2015

O déficit da balança serviços se tornou a principal causa do déficit em transações correntes. Em 2014, o déficit de serviços foi de US$ 48 bilhões, valor correspondente a nada menos que 46,5% do déficit total das contas externas.

No período de janeiro a agosto de 2015, o déficit de serviços foi de US$ 26,4 bilhões, bem menor que os US$ 30,7 bilhões acumulados em igual período do ano passado. No entanto, o déficit de 2015 corresponde a 57,2% do déficit em transações correntes ante 47,1% no mesmo período de 2015 (ver figura abaixo).

Logo, apesar de menor em valor absoluto, a contribuição relativa do déficit dos serviços para o déficit total em transações correntes aumentou significativamente neste ano.

A explicação para tanto é que o ajuste nas contas de serviços tem se mostrado relativamente mais insensível à crise do que o ajuste nas contas de comércio de bens.

De fato, alguns dos principais itens que compõem o déficit de serviços mudaram relativamente pouco ou nada até o momento. As despesas com alugueis de equipamentos (basicamente sondas, plataformas e outros equipamentos para o setor de óleo e gás), principal item do déficit do setor, se mantiveram quase imutáveis. Uma possível explicação disso seria a natureza dos contratos de aluguel, que provavelmente são de médio/longo prazo.

Despesas com viagens, outro item importante para o déficit, também caíram, sobretudo o item de viagens de negócios – as despesas com viagens pessoais caíram menos do que se poderia esperar em razão da crise econômica. Por outro lado, despesas com transportes e seguros caíram significativamente, o que, provavelmente, está associado à queda do movimento do comércio internacional.

O Boletim de Serviços de outubro mostra que, até agora, os maiores ajustes nas contas externas do setor se deram nos serviços de custo e nos serviços tradicionais para empresas. Serviços de agregação de valor, como pagamentos de royalties, e serviços modernos estão se ajustando mais lentamente.

Projeções sugerem que o déficit de serviços de 2015 será entre US$ 39,9 e US$ 41,8 bilhões. Em 2016, o ajuste no setor deverá se acentuar em razão da queda acumulada da renda per capita. É provável, por isto, que o setor de serviços venha a contribuir mais decisivamente para o ajuste nas contas externas.

Serviços nas contas externas

Déficit de serviços nas transacoes correntes

Fonte: Banco Central

Obs.: Déficit de serviços em 2015 – projeção nossa

GATS e TISA: a necessidade de atualizar os acordos de comércio de serviços

O TISA (Trade in Services Agreement) é um acordo comercial que busca a expansão do comércio mundial de serviços. O acordo visa ampliar o comércio de serviços de telecomunicações, como o fornecimento de internet, energia, de tecnologia, de serviços de entrega, entre outros. Ele foi iniciado pelos Estados Unidos e pela Austrália em 2012. Atualmente o acordo já conta com 23 participantes.

Além de expandir o comércio de serviços, um dos objetivos desse acordo é ampliar os postos de emprego e aumentar o crescimento da economia, via exportação de serviços entre os países-membros, ampliando a oferta de serviços e, espera-se, reduzindo o seu preço. Porém, há pouca informação sobre os termos do acordo, já que suas negociações e seus documentos não estão disponíveis para o público.

Atualmente o maior acordo de comércio de serviços é o GATS (Acordo Geral Sobre Comércio de Serviços, que é um acordo da OMC – Organização Mundial do Comércio). Tal acordo entrou em funcionamento em 1995 e, desde então, não houve novos grandes acordos que se adaptassem ao crescimento da demanda por serviços. Por isso, há a necessidade da criação de novos acordos comerciais. No final de 2001, houve tentativa de um novo acordo de liberalização chamado Rodada Doha, mas ela não foi bem-sucedida.

A integração que a globalização tem gerado e as novas tecnologias exigem que o GATS esteja sempre revisando os seus termos de compromisso e atualizando frequentemente as suas provisões, o que nem sempre ocorre. Se de fato o TISA puder lidar com essas atualizações e levar em conta as condições ainda bastante assimétricas entre países no mercado de serviços, então ele poderá ser uma alternativa atrativa para muitas economias.

O Quadro 1 apresenta alguns trabalhos da literatura que destacam a importância das negociações comerciais dos serviços. Dos trabalhos apresentados, apenas Marchetti e Roy (2013) e Gould (2014) trazem alguma abordagem sobre o TISA, os demais trazem propostas para melhorar o GATS ou as negociações comerciais dos serviços em geral.

Em razão do sigilo dos termos do acordo, da aridez e dos fortes interesses envolvidos na agenda do TISA, há dificuldades para se contabilizar ganhos e perdas que os países membros terão ao aderirem ao acordo.

Quadro 1. Literatura sobre as Negociações Comerciais dos Serviços

Autores Do que se trata? Metodologia Empregada Resultados Obtidos
Cuadrado-Roura, Rubalcaba Bermejo e Bryson, (2002). Discute, no contexto do GATS, a importância da participação de serviços da economia mundial e as perspectivas futuras para a liberalização do comércio de serviços. Descreve os principais setores de serviços que são passíveis de liberalização, destacando a importância deles no comércio mundial de serviços. Conclui que as negociações do GATS, que começaram na OMC no início dos anos 2000, foram as mais importantes até então, desde a Rodada do Uruguai em 1994, que os serviços já seriam o grande motor do crescimento das economias e que a liberalização em curso poderia trazer grandes ganhos de bem-estar para a população.
Abugattas (2006) Alerta para o fato da necessidade de conciliar a legislação local aos compromissos assumidos quando da participação nos GATS. Examina a regulação doméstica e as imposições que serão criadas a partir da entrada dos países nos GATS. Argumenta que a falta de clareza quanto ao alcance dos compromissos futuros nos regulamentos internos indica que deveria haver cautela na adoção de compromissos que possam por em risco a futura regulamentação nacional e a autonomia do Estado. Além disso, as negociações deveriam incorporar um tratamento especial para os países em desenvolvimento, levando em conta as suas capacidades institucionais e regulatórias.
Adlung e Mamdouh (2013) O trabalho fornece uma perspectiva sobre o impacto das negociações de serviços e os resultados dos acordos. O artigo levanta ainda algumas falhas no GATS que impedem membros da OMC a avançar nas negociações e liberalização dos serviços. Realiza uma análise da evolução dos serviços, comparando alguns acordos comerciais similares ao GATS em níveis multilaterais e regionais. Traz a reflexão de que o desafio existente para alcançar os resultados esperados nas negociações de serviços encontra-se na vontade política em articular e implementar os propósitos a serem alcançados.
Marchetti e Roy (2013) Apresenta algumas considerações acerca das negociações do TISA, trazendo uma reflexão sobre a importância do acordo. Analisa os fluxos comerciais e a participação nas negociações entre os membros do TISA O TISA pode ter grandes e imprevisíveis implicações para o comércio de serviços, mas é o único desenvolvimento mais significativo que surgiu aos longo dos últimos anos na área das negociações.
Gould, E. (2014) Realiza uma apresentação acerca das propostas do TISA com a finalidade de ajudar a superar o sigilo e a complexidade existente do acordo. Utiliza discurso dos negociadores, revistas especializadas na área e documentos que vazaram a respeitos das negociações. O TISA é um significante passo em relação a Acordos de Serviços e, por isso, os servidores que operam com comércio internacional pressionam para que os reguladores levantem as preocupações sobre os impactos do TISA nos interesses públicos.
Cernat e Kutlina-Dimitrova (2014) Propõe um novo modo de oferta de serviços (Modo 5) para incluir no GATS, que seriam os serviços incorporados aos produtos e que não são contabilizados, principalmente em serviços intensos em tecnologia. Utilizando dados sobre os serviços nos EUA e União Europeia, o autor mede as exportações de serviços que utilizam o “Modo 5” e verifica a importância da sua criação. Os 4 modos que são utilizados pelo GATS não contabilizam de fato os serviços que são utilizados nas transações comerciais realizadas no mundo. Uma forma de mensurar esses serviços seria criar um modo 5, para facilitar o comércio de serviços e torna-lo mais justo quanto às regras aplicadas.

Fonte: Elaboração própria

 

ericaErica Gonzales é graduada em Economia  pela Universidade Federal de Sergipe, possui mestrado em Economia na Universidade Estadual de Maringá e atualmente é doutoranda em Economia na Universidade de Brasília  (UnB).
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