Economia de Serviços

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Um Nobel para a Economia de Serviços?

Em outubro deste ano o Prêmio Nobel de Economia foi concedido a Paul Romer (em conjunto com William Nordhaus) “for integrating technological innovations into long-run macroeconomic analysis.”[1] Os modelos de crescimento endógeno introduzidos por Romer na década de 1980 incorporaram explicitamente a decisão de firmas e indivíduos de investir em novas ideias e inovação. Na época, esta aparentemente óbvia contribuição significou um grande avanço sobre os modelos existentes que tratavam mudança tecnológica com algo exógeno. O fato de Paul Romer ser agraciado neste momento com o prêmio máximo na área das Ciências Econômicas pareceria indicar que esta linha de pesquisa está vibrante e repleta de conquistas. No entanto, este não é o caso. A concessão do Prêmio a ele já era esperada a vários anos. Ele conta inclusive que quando recebeu o telefonema na segunda-feira de manhã de 8 de outubro de 2018, achou que era um trote, pois há vários anos nesta época já vinha recebendo este tipo de brincadeira. Certamente a escolha do Sr. Romer é justa e merecida, mas não deve ser interpretada como chancelando a supremacia dos modelos por ele criados. De fato, a revista The Economist, na coluna Free Exchange do dia 13 de outubro analisa da seguinte forma o legado desta linha de pesquisa:

Os modelos de crescimento ‘endógenos’ produzidos pelo Sr. Romer, e por outros influenciados por ele, já foram aclamados como o passo crítico para entender os padrões de crescimento econômico em todo o globo. Estes modelos não atenderam à expectativa: conhecimento pode ser necessário para atingir crescimento, mas claramente não é suficiente. No entanto, as próprias limitações destes modelos têm sido importantes para levantar questões sobre as teimosas disparidades em taxas de crescimento entre países. … Ao provocar tais questões, o trabalho do Sr. Romer identificou uma rica veia para outros pesquisadores explorarem. (The Economist, Oct. 13, 2018, traduzido do inglês)[2]

E não é somente The Economist que pensa assim. Em uma entrevista concedida alguns anos atrás em Hong Kong, o próprio Paul Romer afirmou o seguinte sobre o estado da arte dos modelos de crescimento:

Nós tivemos um estouro de teorias de crescimento nas décadas de 1950 e 1960. Depois, crescimento saiu de moda. Teorias de crescimento endógeno surgiram no começo dos 1980 e perseguiram uma nova direção. Desde os 2000, a área de crescimento tem estado quieta. Há trabalho sendo feito em aplicações empíricas da teoria de crescimento, mas francamente eu acho que muito do que está sendo feito na direção de examinar os fundamentos do crescimento está perseguindo um beco sem saída. Assim, não é necessariamente algo ruim que a área esteja parada por um tempo. (Romer, 2015: 13, traduzido do inglês)[3]

Mais adiante ele deixa claro quais são estes esforços que estão explorando ‘becos sem saída’. Sem medo de controvérsias ele explicitamente critica três linhas de pesquisa proeminentes na área de crescimento, cada uma associada a outros nomes de peso: Jeffrey Sachs e o papel de ajuda internacional, Daron Acemoglu e James Robinson e a economia política do crescimento, e Esther Duflo e Abhijit Banerjee com experimentos randomizados.[4]

Mas se o Sr. Romer não tem mais fé e interesse na área de crescimento econômico, a qual área e temas ele tem dedicado sua mente ainda inquieta? Quando perguntado pelo entrevistador o que ele acha das três linhas de pesquisa mencionadas acima ele deixa claro: “Quer saber, eu não concordo com nenhuma destas três. Eu acho que urbanização é o que devemos estudar” (pg. 14). Ele nota que existe no mundo uma demanda não atendida por oportunidades urbanas para bilhões de pessoas. Muita desta demanda será atendida pelo aumento das cidades já existentes, mas uma parte significativa será, e já vem sendo, provida por novas cidades criadas especificamente com este propósito. Esta possibilidade tem um potencial maior do que praticamente qualquer outra política pública para afetar o bem-estar de enormes contingentes de pessoas no futuro, e por isto deveria ser um tema prioritário para economistas e outros especialistas. Há algum tempo, Paul Romer já vem trabalhando nesta área, não só no nível acadêmico, mas principalmente como ativista e perito, instigando e aconselhando governos. O Urbanization Project que fundou na New York University trabalha tanto com expansão urbana como com a criação de novas cidades, e tem o objetivo de “harness the growth of cities to speed up global progress.”[5]

Uma das principais vias pelas quais Romer vem explorando a noção de urbanização planejada como solução dos problemas econômicos de países e sociedades é através da criação de Charter Cities.[6] Inspiradas no papel que Hong Kong e Zonas Econômicas Especiais tiveram em fomentar a modernização e o crescimento econômico da China, as Charter Cities envolvem a construção de cidades novas a partir do zero em uma área concedida por um país e no qual o governo do país abriria mão de certa soberania permitindo a construção de leis, regras e governança diferentes do resto do país e que visassem criar um ambiente que atraísse voluntariamente investimentos, trabalhadores e moradores. A ideia é que não só o próprio ambiente fomentaria um ciclo virtuoso de migração e atividade econômica para se aproveitar das condições propícias criadas para este fim, mas eventualmente a cidade ‘contaminaria’ virtuosamente o resto da economia com seu exemplo e práticas. Romer esteve pessoalmente envolvido em um empreendimento de Charter City em Honduras, mas, fiel à sua personalidade contenciosa, abandonou o projeto quando sentiu que o governo Hondurenho quebrou sua promessa ao tentar interferir mais diretamente na criação da cidade. Atualmente há diversas outros projetos similares sendo perseguidos em outros países.

A ideia de planejar uma cidade a partir do zero é controversa. Opositores históricos a esta ideia, como Jane Jacobs[7] e James Scott[8] há tempos criticam a pretensão e arrogância embutida na ideia de achar que se pode controlar o sistema complexo que é uma cidade. O sub-título do livro de 1998 de James Scott expressa bem esta crítica: How Certain Schemes to Improve the Human Condition Have Failed. Uma versão atual desta crítica está no livro de Geoffrey West (2018), Scale: The Universal Laws of Life, Growth, and Death in Organisms, Cities and Companies (Penguin Random House). Já uma visão mais simpática à ideia vem de outro economista renomado, Edward Glaser em (2011) Triumph of the City: How Our Greatest Invention Makes Us Richer, Smarter, Greener, Healthier, and Happier (Penguin Random House).

Seja como for, o ponto aqui é que a criação de uma nova cidade a partir de um terreno vazio para uma vibrante rede de infraestrutura, pessoas, firmas e atividades é necessariamente e acima de tudo um exercício em estabelecer e tecer uma gama intensamente diversificada e variada de serviços. É claro que o exercício envolve também criar de maneira pensada e planejada infraestrutura física (bairros, prédios, ruas, viadutos, etc.) e infraestrutura institucional (governo, polícia, tribunais, etc.) Mas, quase tudo que se pode imaginar acontecendo nesta futura cidade irá envolver serviços públicos e privados, que podem ser organizados e providos de maneira mais ou menos eficientes. A cidade precisa prever e prover habitação, transporte, comunicação, comércio, saúde, saneamento, educação, lazer, entre outros milhares de serviços que precisam ser coordenados entre si desde a fase de planejamento. O melhor ou pior funcionamento destes serviços irá afetar crucialmente a capacidade da nova cidade de atrair moradores e investidores, determinando assim a capacidade do empreendimento atingir o objetivo de melhorar a vida de grandes parcelas da população de seus países e de servir de exemplo para outras cidades vizinhas, conforme intenção declarada do projeto de Charter Cities. O tamanho do desafio e o tamanho do que está em jogo neste processo explica talvez por que alguém como Paul Romer teria dado as costas à linha de pesquisa que lhe rendeu tanto reconhecimento para se dedicar a algo ainda tão incipiente.

Bernardo Mueller é professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília e autor dos livros Brazil in Transition: Beliefs, Leadership and Institutional Change (2016) e Institutional and Organizational Analysis: Concepts and Applications (2018).

Referências

  1. https://www.nobelprize.org/prizes/economic-sciences/2018/press-release/
  2. https://www.economist.com/finance-and-economics/2018/10/13/paul-romer-and-william-nordhaus-win-the-economics-nobel .
  3. https://paulromer.net/interview-on-urbanization-charter-cities-and-growth-threory/index.html
  4. Paul Romer é um polemista inveterado. Tem alimentado uma briga acadêmica criticando figurões do nível de Robert Lucas, Ed Prescott e Thomas Piketty por ‘mathiness’, que é o seu termo para o abuso e mal uso de matemática em trabalhos acadêmicos com o intuito de esconder as falhas e premissas duvidosas (veja sua crítica em https://pubs.aeaweb.org/doi/pdfplus/10.1257/aer.p20151066). Mais recentemente, Romer foi despedido do cargo de Economista-chefe do Banco Mundial por brigas com vários membros do staff do banco sobre a qualidade da pesquisa realizada. Romer afirmou por exemplo que: “nunca em minha vida profissional eu encontrei tantos economistas profissionais que dizem tantas coisas que são fáceis e verificar e que acabam não sendo verdade.” (ver https://www.ft.com/content/be72f8e2-0144-11e8-9650-9c0ad2d7c5b5)
  5. http://www.stern.nyu.edu/experience-stern/about/departments-centers-initiatives/centers-of-research/urbanization-project .
  6. Sobre as Charter Cities, ver https://www.cgdev.org/article/charter-cities-qa-paul-romer.
  7. Jacobs, Jane. (1961) The Death and Life of Great American Cities. New York, Random House.
  8. Scott, James C.(1998) Seeing Like a State: How Certain Schemes to Improve the Human Condition Have Failed. Yale University Press.

 

Eles ficam altos? O Impacto do Acesso a Drogas nos Preços da Hospedagem

Poucos assuntos são tão presentes em cada esquina das cidades grandes de hoje em dia e possuem tão pouca pesquisa quanto as drogas. Temas mais convencionais, já consolidados na agenda mainstream, possuem dezenas de trabalhos com réplicas e tréplicas para cada variável, enquanto no que tange às drogas a literatura ainda se encontra no “O que são, o que comem e onde habitam?”

A ilegalidade na qual as drogas se encontram apresenta um grande entrave para a elaboração de estudos robustos e sem achismos, uma vez que informações se tornam praticamente inexistentes. A coleta de dados é bastante complicada, de forma que poucos conseguem fazê-la – como em Venkatesh e Levitt (2000). Isso faz com que as pesquisas fiquem um pouco limitadas, mas não menos interessantes. Até o momento, a maior parte das pesquisas se concentrava nas consequências orçamentárias da legalização (Miron, 2005) ou em questões de saúde e consumo (Bretteville-Jensen e Jacobi, 2011; Jacobi e Sovinsky, 2016; Palali e Van Ours, 2014). A pesquisa a ser tratada no resto deste texto, por exemplo, visa avaliar a existência de influência de Coffee Shops no mercado imobiliário de Amsterdam.

Os recentes movimentos de descriminalização e legalização da maconha têm servido como ótimo cenário para diversas pesquisas na área, tanto por trazerem consigo dados antes não existentes quanto por também proporcionarem grupos de controle e choques exógenos, em meio às mudanças legais. Até o momento, cada país que legalizou a maconha o fez à sua própria maneira, com modelos de legalização bastante heterogêneos. Todos eles têm como base, porém, a noção de que existe uma certa heterogeneidade entre os consumidores de cannabis e que a maior parte dos malefícios sociais vem, na verdade, do próprio fato da droga ser ilegal.

Miron e Zwiebel (1995) lançam um olhar econômico sobre o mercado das drogas. Para eles, pode-se classificar os consumidores em duas categorias, os dependentes químicos e os de uso recreativo. Estes, segundo os autores, respondem às mudanças nos preços das drogas assim como o consumidor mediano responde a mudanças em preços de bens “convencionais”, enquanto aqueles terão uma demanda pela droga muito mais inelástica. Isto é, responderão muito pouco a mudanças de preços, uma vez que o importante é saciar a necessidade química. Do lado da oferta, uma vez que todos os agentes ofertantes estão na ilegalidade, não há como solucionar disputas na justiça, como cobrança de dívidas, por exemplo. Além disso, uma vez na ilegalidade, cometer outro crime possui um custo adicional muito menor e é nessa situação que a violência se torna uma ferramenta factível para quem está no mercado das drogas. A grosso modo, para Miron e Zwiebel (1995), os maiores problemas relacionados às drogas – violência e criminalidade, resumidamente – são, na verdade, consequências de sua proibição, e não do consumo.

Este estudo ilustra de maneira breve o entendimento sobre as drogas que as autoridades responsáveis na Holanda passaram a ter, na década de 70. Durante os anos 70, começou-se a entender que o mais importante não era impedir o consumo de drogas em geral, como se é feito em quase todos os países hoje, mas sim garantir que os usuários e a sociedade como um todo sofressem os menores danos possíveis. Tendo isto em mente, era necessário mudar de um paradigma de guerra às drogas para um de redução de danos, no qual o Estado assiste à população em vez de puni-la.

Para adaptar e organizar as instituições à essa nova política de drogas, primeiro classificou-se as várias substâncias em dois grupos, baseado no nível de risco à sociedade em geral. O grupo I, com drogas tais como cocaína e LSD, por exemplo, contempla as substâncias cujo risco é reconhecido como inaceitável; já o grupo II, que engloba cannabis, seus derivados e alguns analgésicos, é composto pelas substâncias cujo risco é dado como tolerável.

Uma outra maneira que os holandeses encontraram para melhor controlar a forma pela qual o consumo de cannabis no país se daria foi a criação dos Coffee Shops. Os Coffee Shops são, basicamente, lojas que possuem permissão para vender cannabis e seus derivados e devem seguir uma série de restrições, tais como não vender bebidas alcoólicas; não vender para menores de idade e não permitir o consumo de outras drogas dentro do estabelecimento. Segundo as leis do país, o prefeito de cada cidade é quem decide se algum Coffee Shop pode ser aberto ou se algum deve ser fechado, de forma que o estoque de Coffee Shops nas cidades é completamente controlado pelas autoridades.

Desde seu início, a política de drogas é regularmente reavaliada a fim de corrigir aspectos antes não considerados pelas autoridades. Diferentemente de outros lugares onde a maconha foi legalizada, na Holanda até hoje os ganhos econômicos não são o ponto principal da política vigente, mas sim diminuir os danos das drogas e incômodos ao público. Dessa forma, o crescente turismo de drogas que se instalou no país acabou sendo malvisto por muitos políticos, de forma a pressionarem por medidas que aumentassem as restrições às drogas em gerais, principalmente a cannabis.

Junto a esse motivador, alguns grupos entenderam também que era necessário tomar medidas para diminuir a exposição de menores de idade à cannabis e seus derivados – embora exista estudos apontando diminuição do consumo da droga entre jovens (Simons-Morton, 2010). Como consequência dessa pressão, alguns prefeitos julgaram prudente criar cadastros de usuários, para permitir que apenas residentes comprassem na cidade, e outros acreditaram necessário fechar Coffee Shops próximos a escolas.

A cidade de Amsterdam começou a acatar essas mudanças a partir de 2011, sendo que os primeiros fechamentos se deram a partir de 2014. Os fechamentos foram realizados em função da distância que o Coffee Shop se encontrava da escola mais próxima, não podendo ficar a menos de 500m. Essa medida culminou no fechamento de cerca de 20 lojas baseado somente na distância para alguma escola.

O fato de os fechamentos se darem apenas devido ao posicionamento de escolas fez com que o choque no estoque de Coffee Shops da cidade pudesse ser considerado completamente exógeno aos estabelecimentos, isto é, não relacionados a eles.

Na literatura, é comum procurar impactos no mercado imobiliário quando se quer avaliar se determinada amenidade possui externalidades positivas ou negativas. Neste caso, nosso trabalho procurou avaliar se os Coffee Shops exercem alguma influência sobre os preços de imóveis ao seu redor. Para isso, utilizamos dados de aluguel de Airbnb na cidade, de 2014 até 2017, junto com informações espaciais como distância para transporte público; para o centro da cidade; quantidade de atrações turísticas nos arredores; índice de criminalidade da região, entre outras amenidades. A variável de interesse é o fato de ter o Coffee Shop mais próximo ao imóvel fechado ou não. Em outras palavras, temos uma variável binária que é igual a 1 caso o imóvel tenha tido o Coffee shop mais próximo dele fechado e 0 para o caso de o Coffee Shop mais próximo ter permanecido aberto.

Nós utilizamos um modelo de efeitos fixos, como de praxe na literatura de economia urbana, para quando se tem dados em painel, de forma que é possível controlar por fatores não observáveis porém constantes ao longo do tempo. Em um primeiro modelo, utilizamos apenas o fato de o Coffee Shop mais próximo ter fechado ou não. Em seguida, utilizamos essa informação junto com o fato de ele estar a menos de X metros do imóvel – variamos essa distância X de 250m até 1500m. Essa variação nos permite observar como a influência se comporta em distâncias variadas.
Nossos resultados mostram que ter o Coffee Shop mais próximo fechado fez com que os alugueis diminuíssem aproximadamente 2,5%, em média. Como é ilustrado na imagem, o fechamento de um Coffee Shop muito próximo possui uma influência significativamente maior no aluguel do que o fechamento de um Coffee Shop que se apresentava mais distante. O efeito do fechamento diminui de intensidade à medida que a distância aumenta até o ponto no qual deixa de ser significativo estatisticamente, para distâncias maiores de 500m.

Este resultado é bastante interessante pois, ao contrário do que muitos pensavam, é possível que a maconha tenha externalidades positivas em um cenário micro em uma cidade. Obviamente, esta pesquisa possui limitações, pois apenas com ela não é possível saber com certeza como os mercados reagiriam em outras cidades, por exemplo. Além disso, não é claro como imóveis regulares – fora da plataforma Airbnb – reagiriam, uma vez que é discutível se esse resultado é consequência do maior uso do Airbnb por turistas ou não, de forma que seria bastante interessante fazer este exercício com dados de imóveis convencionais.

Mesmo com todas essas limitações, esse estudo contribui para o início da construção de um conhecimento mais robusto sobre as drogas que foge de achismos e se baseia em dados e evidências. Ainda há muito o que se pesquisar sobre o assunto e como os mercados e agentes reagem às mudanças para assim podermos criar políticas que realmente contribuam para um melhor bem-estar da sociedade.

 Igor Koehne é mestrando em Teoria Econômica no Instituto de Pesquisas Econômicas/USP.

Quais são os serviços mais importantes para o comércio no Brasil?

Partindo da hipótese que os serviços mais intensamente utilizados são os mais críticos para a competitividade do setor de comércio no Brasil, as Pesquisas Anuais do Comércio (PAC) do IBGE possuem informações úteis para a reflexão proposta. O comércio, setor que absorve cerca de 20% da mão de obra nacional, ganhou relevância ao longo das últimas duas décadas, passando de cerca de 8% para 14% do PIB[1].

Os segmentos empresariais do comércio são organizados e tabulados em três categorias distintas: comércio de veículos automotores, peças e motocicletas; comércio por atacado; e comércio varejista. Na PAC, essas categorias se desdobram em grupos, classes e subclasses de atividades: até 2007, a pesquisa possuía 15 grupos, 24 classes e 5 subclasses, enquanto, as mais recentes, 17 grupos, 24 classes e 5 subclasses. Entre 1996 e 2007, a estrutura das pesquisas teve como referência a CNAE versão 1.0, e a partir de 2008 foi substituída pela CNAE versão 2.0, dando origem a uma nova série, com maior nível de desagregação das atividades econômicas do que as versões anteriores. A divulgação do ano de referência 2008 apresentou resultados retroativos a 2007 utilizando a CNAE 2.0. Por isso, a junção das pesquisas exige a superação de um problema metodológico: a compatibilização setorial entre as classificações CNAE 1.0 e 2.0. Como não é possível fazer uma junção direta das versões, uma nova classificação foi criada para obter séries temporais mais longas. Feita uma análise das correspondências dos agrupamentos da PAC com seus códigos CNAE correspondentes com a utilização das notas metodológicas das Pesquisas, utilizou-se os dicionários “de-para” do CONCLA (IBGE) para analisar a relação entre os códigos CNAE nas duas versões. Por fim, uma agregação para criação da nova série foi necessária, resultando em uma nova classificação com 20 segmentos, conforme mostrado na tabela abaixo [2].

Em síntese, seguindo a classificação original da PAC, o primeiro segmento compreende a venda por atacado e a varejo de veículos automotores e motocicletas novos e usados e de peças e acessórios para esses veículos, possui cerca de 9% das empresas e do faturamento do setor, e firmas com tamanho médio entre 5 e 10 funcionários (2016). O comércio atacadista em geral é uma etapa intermediária da distribuição e está organizada para vender mercadorias em grandes quantidades a varejistas, a usuários industriais, agrícolas, comerciais, institucionais e profissionais. Na classificação criada, ele contém oito segmentos e o tamanho das firmas é naturalmente superior ao comércio varejista, tendo ambos os segmentos 45% do faturamento, porém o atacado com 8% do número de empresas. O comércio varejista, o último elo da cadeia de distribuição, possui em média firmas menores (com exceção dos supermercados e hipermercados, que possuem mais de 100 funcionários em média) e revende mercadorias novas e usadas principalmente ao público em geral, para consumo ou uso pessoal ou doméstico (tanto em lojas abertas quanto por internet, televisão, etc.).

Adaptando a metodologia de Arbache (2014) para os dados da PAC, foram construídas duas variáveis para entender a importância dos serviços para o setor: Consumo Intermediário (CI) e Consumo Intermediário de Serviços (CIS). O CI refere-se ao consumo de bens e serviços realizado para o funcionamento da atividade comercial, enquanto o CIS compreende apenas os itens de serviços do Cl [3]. A análise da relação entre CIS e CI mostra que o grau de serviços envolvidos no funcionamento das atividades de comércio no Brasil manteve-se relativamente estável no período de 2003 e 2016, com maior relevância dos serviços no comércio varejista (73% em 2016), seguido do comércio de veículos, peças e motocicletas (55%) e atacadista (50%).

As figuras abaixo mostram com mais detalhes a estrutura de serviços consumidos pelos três segmentos do comércio ao longo do tempo, para as empresas com 20 ou mais pessoas ocupadas.

Destaca-se a relevância dos serviços prestados por terceiros, aluguéis e publicidade e propaganda. Em conjunto, esses itens representam mais de 80% do consumo de serviços das empresas comerciais no Brasil. Além disso, de forma geral a estrutura se manteve ao longo do tempo, com destaque para a diminuição relativa dos gastos com correio, fax, telefone, internet, energia elétrica, gás, água e esgoto. Dentre os serviços terceirizados, predominam as despesas com fretes e carretos (distribuição de mercadorias vendidas) e serviços técnicos-profissionais prestados por empresas (serviços de informática, de auditoria, contábeis, jurídicos, consultorias, pesquisas de mercado etc.) em todos os grupos e subgrupos, que tiveram suas participações aumentadas ao longo do tempo.

Por fim, nota-se que o setor é heterogêneo, de modo que não há um modelo comum na distribuição dos principais serviços consumidos em segmentos que possuem padrões tecnológicos e estruturas de mercado diferentes. Por exemplo, no comércio por atacado de matérias primas agrícolas e animais vivos, que comercializa tipicamente commodities, as despesas de propaganda representaram 3% das despesas com serviços em 2016, enquanto que no atacado de produtos farmacêuticos, médicos, odontológicos e veterinários, elas foram de 37%.

Diante do exposto, verifica-se que a pergunta do título deste post não possui resposta singular, uma vez que a composição dos serviços varia no tempo conforme o segmento de comércio. Contudo, é possível afirmar, de modo geral, que a terceirização de serviços é de extrema relevância para o setor, em especial dos serviços técnico-profissionais e transporte rodoviário de cargas.

[1] Ver o post “Breve panorama sobre o setor de comércio no Brasil”, disponível em:  https://economiadeservicos.com/2018/06/12/breve-panorama-sobre-o-setor-de-comercio-no-brasil/.

[2] Nem todas as classes da seção G da CNAE fazem parte da PAC. Nas edições de 1996 a 2007, são excluídos, embora façam parta da seção G da CNAE 1.0, as classes 50.20-2 e 50.42-3; grupo 51.1; e os grupos 52.6 e 52.7.  Ademais, são excluídos do âmbito da PAC a partir de 2008, embora façam parte da seção G da CNAE 2.0, classes 45.20-0 e 45.43-9; e  grupo 47.9. Além disso, embora incluídos, os representantes comerciais foram desconsiderados neste estudo. Na correspondência entre CNAE 1.0 Classe e CNAE 2.0 Classe, os grupos 50.2, 52.6 e 52.7 da CNAE 1.0 possuem correspondência com outras seções da CNAE e com os grupos 45.2 e 47.9 da CNAE 2.0, que não fazem parte da PAC feita no âmbito da CNAE 2.0. Para verificação da compatibilização setorial, foi realizada uma comparação de todos os dados referentes ao ano de 2007, nas duas classificações (CNAE 1.0 e CNAE 2.0), com a versão criada. Embora haja algumas diferenças pontuais em algumas variáveis, as principais não apresentaram diferenças maiores que 5%.  Especificamente para o ano de 2007 foi utilizado a média dos resultados nas versões 1.0 e 2.0, na nova classificação. Ademais, a análise do número de firmas para o ano de 2007 nas duas classificações mostra que influência de efeito composição da mudança do número de firmas sob certa classificação setorial pode ser considerada irrelevante. Ademais, manteve-se a macroestrutura da classificação criada com aquelas originárias da PAC, ou seja, segmentos do mesmo ramo de atividade se mantiveram juntos dentro da nova classificação. A estrutura prévia foi mantida inalterada para três divisões. A atividade de Representantes comerciais e de agentes de comércio, que na CNAE 1.0 estava no âmbito da Pesquisa Anual de Serviços – PAS, passou, na CNAE 2.0, a ser investigada na PAC, porém foi excluída do escopo deste estudo. Por fim, cumpre destacar que o sistema de classificação industrial padrão (Standard Industrial Classification – SIC), no qual a CNAE se baseia, classifica as lojas de varejo e atacado de acordo com os tipos de mercadorias que estão sendo transferidos para o consumidor.

[3] Mais especificamente, “Corresponde à soma de compras de matérias-primas para fabricação própria e sua respectiva variação de estoques; compra de material de embalagem e outros materiais (de reposição, peças etc.) e sua respectiva variação de estoques; aluguéis de imóveis, veículos, máquinas e equipamentos; serviços prestados por terceiros; serviços de comunicação; energia elétrica, gás, água e esgoto e outras despesas operacionais”. Algumas dessas variáveis estão presentes nos resultados desagregados das empresas com mais de 20 pessoas ocupadas, mas outras não. A estratégia usada foi utilizar a soma das despesas totais no ano, exclusive o pagamento de impostos e taxas, mais o custo das matérias-primas e dos materiais de embalagem utilizados na atividade comercial. O detalhamento dos diversos itens de custos e despesas das empresas para estimar o consumo intermediário nos níveis mais detalhados é mostrado abaixo.

Referências Bibliográficas

Arbache, 2014. Confederação Nacional da Indústria. Serviços e Competividade no Brasil / Confederação Nacional da Indústria. – Brasília: CNI, 2014.

IBGE. Pesquisas Anuais de Comércio 1996-2016.

Infraestrutura e serviços de infraestrutura: um breve olhar sobre o caso brasileiro

Tendo em vista a atual conjuntura brasileira de retomada ainda tímida de crescimento e grande restrição fiscal por parte do Estado, num contexto de teto de gastos públicos aprovado para as próximas duas décadas, o setor privado terá papel fundamental na realização de investimentos no país, em especial para os principais setores de infraestrutura, como é o caso dos setores de telecomunicações, energia, transportes e saneamento. Além disso, há ainda muito a melhorar na governança e atuação do setor público, com escolhas economicamente mais racionais de projetos, com a uniformização de práticas e a adoção de avaliações de impacto socioeconômico, por exemplo.

Mas o que é infraestrutura? Infraestrutura é “o conjunto de estruturas de engenharia e instalações – geralmente de longa vida útil – que constituem a base sobre a qual são prestados os serviços considerados necessários para o desenvolvimento produtivo, político, social e pessoal” (BID, 2000). Partindo desse conceito, podemos perceber complementariedade entre os chamados serviços de infraestrutura – que visam satisfazer às necessidades de um indivíduo ou de uma sociedade e são considerados serviços de interesse público; e a própria infraestrutura – que é a base física sobre a qual se dá a prestação destes serviços (IPEA, 2010).

Dessa forma, a infraestrutura seria representada por rodovias, ferrovias, terminais portuários e aeroviários, torres de telecomunicação, cabos de transmissão de energia elétrica (entre outros exemplos) que dão a possibilidade de oferta/prestação de serviços de infraestrutura. Já os serviços de infraestrutura são o frete rodoviário, ferroviário, aquaviário, aeroviário (transporte de mercadorias e/ou pessoas de um ponto a outro do território), o transporte urbano de uma cidade (linhas de ônibus, metrô e trens usados pelos cidadãos), os planos oferecidos por uma operadora de celular, etc. Todos esses exemplos de serviços se utilizam do capital físico instalado.

No setor de transportes, por exemplo, quando uma concessionária ganha uma licitação para a exploração da infraestrutura rodoviária e, portanto, passa a ter direitos e deveres contratuais firmados com o poder concedente (o Estado ou um representante do mesmo), todas as obras de manutenção, restauração e ampliação da capacidade da rodovia estarão incrementando os investimentos em infraestrutura, gerando então potencialmente maior estoque de capital fixo e adicionando estrutura física que será utilizada e usufruída pelos prestadores de serviço daquele setor e seus usuários de modo geral.

O setor de transportes, assim como outras áreas da infraestrutura – transportes, energia, saneamento e telecomunicações – possuem grande impacto no crescimento econômico de um país. Há vasta literatura que comprova que maiores investimentos em infraestrutura (fluxo) e maior estoque de capital fixo no setor (mais rodovias, maior capacidade energética instalada, etc.), ou seja, maior estoque de infraestrutura, levam a maior crescimento do produto e também elevam a produtividade, além de reduzirem a desigualdade de renda (Aschauer, 1989; Calderón e Servén, 2004; Ferreira e Maliagros, 1998).

Ainda, no caso específico do setor de transportes, os impactos são bastante relevantes, com efeitos de encadeamento para frente e para trás, relacionando-se ainda de modo importante com outros setores da economia. Para alguns produtos – como a soja e o milho – o valor final no porto é composto em mais da metade pelo chamado custo logístico. Portanto, mais uma vez, voltamos ao fato de que a infraestrutura física e seus serviços acessórios compõem o preço final dos produtos que produzimos e consumimos, seja para o consumo interno, seja para o consumo externo (por meio de exportações).

Dada a má qualidade média das rodovias brasileiras (comprovada pela série histórica das pesquisas anuais da CNT, com exceção das rodovias concedidas à inciativa privada, em especial as do estado de São Paulo) e sua relativa escassez (baixa densidade rodoviária quando comparada a outros países, com exceção também do estado de São Paulo), fatores esses somados ao fato de que cerca de 60% das cargas no Brasil são transportadas via modo rodoviário, percebemos que ainda temos muito a avançar nessa área.

A questão dos fretes, seu valor, sua rapidez, sua segurança, seu adequado manejo das mercadorias, o cumprimento de prazos, entre outros aspectos, ganhou notoriedade recentemente por conta da “greve dos caminhoneiros”, tendo já sido reportados impactos negativos dessa situação sobre o crescimento econômico do país (que foi revisado para baixo esse ano) e sobre a taxa oficial de inflação (que aumentou e elevou o índice esperado para o ano como um todo).

Isto posto, a infraestrutura (base física) precisa ser ampliada. Isso será feito, provavelmente e em grande parte, com a atuação do setor privado. Os programas de concessões foram intensificados nos últimos anos e muitos avanços foram feitos nos desenhos dos editais, contratos e regulamentos, como é o caso dos modos rodoviário e aeroviário. Aprimoramentos interessantes foram incorporados ao longo do tempo, como os gatilhos de demanda, o fator X, o fluxo de caixa marginal, entre outros. Ademais, maior participação do capital privado estrangeiro também tem sido verificada nos últimos 2 anos, tanto no setor de transportes quanto no setor elétrico. Nesse ponto, o papel maior do Estado daqui em diante seria de proporcionar condições macroeconômicas, institucionais e regulatórias apropriadas, robustas e condizentes com o objetivo de gerar incentivos e apoiar o investidor privado – seja ele de dentro ou de fora do país.

Em relação aos serviços de transporte de carga, em especial no caso dos fretes rodoviários, deveria tratar-se de mercado de livre concorrência, cujos preços deveriam seguir as forças de mercado (oferta e demanda). Por isso o “tabelamento de preços”, sancionado pelo Presidente da República em 09 de agosto de 2018, deve ser analisado de modo bastante crítico. O mais importante nesse caso é tentar ampliar e incentivar ganhos de produtividade no setor. Isso pode ser alcançado por meio de algumas inciativas distintas. A primeira seria aumentando o investimento na base física (melhorando a qualidade das rodovias, equipamentos, etc). A segunda forma seria ampliar a capacitação dos trabalhadores do setor (trabalhadores mais qualificados tendem a errar menos e terem melhores relações com seus clientes e fornecedores). A terceira seria promovendo melhorias institucionais, com ênfase na independência e profissionalização das agências reguladoras, tanto em âmbito federal, quanto estadual. Por fim, o incentivo à inovação permitiria o aumento na capacidade da prestação de serviços e até mesmo a abertura de novos mercados. Em resumo: avancemos na agenda de buscar maior produtividade!

Geovana Lorena Bertussi é Professora Adjunta IV do Departamento de Economia da Universidade de Brasília. Ministra disciplinas nas áreas de Economia Brasileira, Macroeconomia e Economia da Infraestrutura, com ênfase nos setores de transportes e energia elétrica.

 

Carlos Eduardo Véras Neves é formado em Engenharia Civil e Mestre em Geotecnia pela Universidade de Brasília. Possui MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. Atua no setor público federal na área de infraestrutura desde 2009. Atualmente é Especialista em Regulação da Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT. É aluno de Doutorado em Economia Aplicada do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.

Referências

Aschauer, D. (1989) “Is Public Expenditure Productive?” Journal of Monetary Economics, 23, pp. 177-200.

Calderón, C.; Servén, Luis. (2004). The Effects of Infrastructure Development on Growth and Income Distribution. Policy Research Working Paper; No.3400. World Bank, Washington.

Ferreira, P.C. and T. Maliagros (1998) “Impactos Produtivos da InfraEstrutura no Brasil — 1950/95”, Pesquisa e Planejamento Econômico, v.28, n.2, pp.315-338.

IPEA (2010). Infraestrutura Econômica no Brasil: diagnósticos e perspectivas para 2025. Livro 6, Volume 1. Projeto Perspectivas do Desenvolvimento Brasileiro.

Padrões globais de auditoria interna

Quando pensamos em globalização, imediatamente somos remetidos ao comércio de bens entre os países, a diminuição das fronteiras, firmas transnacionais, cadeias globais de valor etc. Nos últimos 60 anos, o crescimento da participação dos serviços no PIB evidenciou um novo marco no processo de globalização. O processo de digitalização remodelou o que entendemos sobre globalização e sobre os fluxos transacionais entre as diversas economias.

Estudo recente do McKinsey Global Institute detalha os principais aspectos dessa nova globalização. Com um mundo cada vez mais interconectado por meio de plataformas digitais, temos acesso facilitado ao conhecimento.

Economias interconectadas pelo conhecimento estão progressivamente se alinhando em indicadores de desempenho, padrões de qualidade, sustentabilidade, responsabilidade sócio-ambiental, compliance e sistema de controle interno. Um dos principais benefícios desse processo é a comparabilidade baseada em parâmetros uniformes.

As auditorias internas das organizações, sejam elas públicas ou privadas, têm importante papel na definição de padrões de controles internos em escala global. Os referenciais teóricos para a prática de auditoria interna dão o respaldo necessário à convergência.

Dentre os referenciais teóricos para a prática de auditoria interna mais difundidos, destacam-se o referencial do COSO, o COBIT e a ISO 31000, que dispõe sobre gerenciamento de riscos. No aspecto de conduta e prática profissional, o padrão mais conhecido — e reconhecido — é o do Instituto dos Auditores Internos (IIA).

Dentre os principais referenciais teóricos difundidos pelo IIA e que viraram padrões para as auditorias internas, destacamos:

  • Definição de auditoria interna;
  • Princípios fundamentais para a prática profissional de auditoria interna;
  • Código de Ética; e
  • Normas internacionais para a prática profissional de auditoria interna.

Para o IIA, a auditoria interna é uma atividade independente e objetiva de garantia e consultoria destinada a agregar valor e melhorar as operações de uma organização. Isso ajuda uma organização a atingir seus objetivos, trazendo uma abordagem sistemática e disciplinada para avaliar e melhorar a eficácia dos processos de gerenciamento, controle e governança de risco.

Os “Princípios Fundamentais” articulam a eficácia da auditoria interna. Para que uma função de auditoria interna seja considerada efetiva, todos os princípios devem estar presentes e operando efetivamente. A realização dos “Princípios Fundamentais” pode ser bastante diferente de organização para organização, mas a falta de cumprimento de qualquer dos princípios implicaria em uma atividade de auditoria interna não tão eficaz quanto poderia ser, segundo a Missão da Auditoria Interna.

O Código de Ética estabelece os princípios e expectativas que regem o comportamento de indivíduos e organizações na condução da auditoria interna. Ele descreve os requisitos mínimos de conduta e expectativas comportamentais ao invés de atividades específicas.

Finalmente, as Normas internacionais para a prática profissional de auditoria interna (Normas), têm como propósito orientar a aderência com os elementos obrigatórios da Estrutura Internacional de Práticas Profissionais (IPPF), fornecer uma estrutura para a execução e a promoção de um amplo espectro de serviços de auditoria interna de valor agregado, estabelecer as bases para a avaliação de desempenho da auditoria interna, e promover a melhoria dos processos e operações organizacionais.

SISTEMA DE CONTROLE INTERNO DO PODER EXECUTIVO FEDERAL BRASILEIRO

As diretrizes para o exercício do controle no âmbito do Poder Executivo Federal remontam à edição do Decreto-Lei nº 200,  de 1967. De lá para cá, outros dispositivos, como a Lei nº 10.180 e o Decreto nº 3.591 trataram de organizar o Sistema de Controle Interno do Executivo.

O Ministério da Transparência e Controladoria Geral da União (CGU) tornou-se o Órgão Central do Sistema de Controle Interno, incumbido da orientação normativa e da supervisão técnica dos órgãos que compõem o Sistema.

Para dar efetividade às suas competêcias, o CGU criou uma série de Instruções Normativas (IN). Dentre as mais recentes e em vigor, destacamos a IN Conjunta MP/CGU nº 1/2016, que dispõe sobre controles internos, gestão de riscos e governança no âmbito do Poder Executivo Federal, e, finalmente, a IN nº 3/2017, que aprova o referencial técnico da atividade de auditoria interna governamental do Poder Executivo Federal.

A seção introdutória da IN nº 3 deixa clara a utilização do referencial teórico internacional para a normatização do Sistema de Controle Interno no âmbito do Poder Executivo Federal:

“Nesse contexto, o presente Referencial Técnico posiciona-se como um instrumento de convergência das práticas de auditoria interna governamental exercidas no âmbito do Poder Executivo Federal com normas, modelos e boas práticas internacionais e com a Instrução Normativa Conjunta MP/CGU nº 1, de 10 de maio de 2016, que determinou a sistematização de práticas relacionadas a governança, gestão de riscos e controles internos no Poder Executivo Federal.”

A definição dos princípios fundamentais para a prática da atividade de auditoria interna governamental da IN nº 3 é muito semelhante aos princípios fundamentais definidos pelo IIA, assim como os componentes para avaliação do sistema de controle interno são os mesmos estabelecidos pelo COSO: ambiente de controle, avaliação de riscos, atividades de controle, informação e comunicação e atividades de monitoramento.

A adoção de padrões globais de auditoria, portanto, faz muito sentido. As normas e os padrões de conduta definidos pelo IIA, por exemplo, são universais, principalmente quando se trata das questões éticas. Muito do que se apregoa tem origem no mais puro bom senso e são apenas desdobramentos da definição de auditoria interna. Quando se define que a auditoria interna é uma atividade independente e objetiva de garantia e consultoria destinada a agregar valor e melhorar as operações de uma organização, ajudando-a a atingir seus objetivos, os “Princípios Fundamentais” se mostram indiscutíveis.

A convergência do referencial aceito internacionalmente e do referencial nacional não é por acaso ou por comodismo. Ao contrário, a convergência demonstra o quão alinhado o país deseja estar dos seus pares na esfera pública no tocante à governança, gestão de riscos e controles internos. Os ganhos da convergência são inúmeros em um cenário de globalização, no qual as relações internacionais, sobretudo as comerciais e financeiras, são respaldadas por uma avaliação da credibilidade de um país. Quão mais similares os parâmetros de avaliação, mais facilitada a análise dos pares e mais fácil a tomada de decisão.

 Rodrigo Madeira é administrador e trabalha em auditoria interna há 6 anos.

Os 10 posts mais lidos de 2017

Neste ano, vimos a discussão sobre a economia de serviços crescer no Brasil, tanto na academia e no setor privado, quanto na imprensa e na política pública. Acreditamos que este Blog colaborou com esse movimento, tal como sugere o crescente número de leitores e de visitas.

Abaixo, listamos os 10 posts mais lidos de 2017 para vocês (re)lerem, discutirem e comentarem.

Obrigado por nos acompanhar em 2017 e esperamos seguir contando com a sua companhia em 2018!

A Equipe do Blog Economia de Serviços

Live: Economia digital e seus impactos para o Brasil

No próximo sábado, 25/11, às 15h, a equipe do Blog Economia de Serviços fará uma Live para discutir como a economia digital pode impactar a economia brasileira. A live vai acontecer aqui no site do Blog e na página do Economia de Serviços no Facebook.

Confirme a sua presença na página do evento!

Com as participações do Professor Jorge Arbache, Secretário de Assuntos Internacionais (SEAIN) do Ministério do Planejamento e Professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB); do economista Rafael Moreira, coordenador do Núcleo de Novos Negócios Digitais do Sebrae Nacional; e da economista Vanessa Santos, doutoranda em economia pela UnB e assessora da SEAIN, serão debatidas questões como:

  • Por que a economia digital é a nova face da globalização?
  • Como ela impacta modelos de negócios e padrões de consumo?
  • Como ela pode impactar a renda e o emprego?
  • Qual o impacto dessas mudanças para o Brasil?

Contamos com a participação de vocês!

A economia da música: o setor de serviços musicais

O setor musical abrange diversos ritmos e estilos que envolvem múltiplos profissionais da área, como os produtores, a indústria fonográfica, show business, empresários, órgãos fiscalizadores, organismos reguladores, empresas de divulgação, empresas de logística, consumidores finais, dentre outros, que caracterizam a cadeia de produção musical. Dados do Sebrae Nacional (2016) apontam que atualmente existem 91.023 pequenos negócios formalizados operando na indústria musical no Brasil. Isso significa que esse setor faz “barulho” sim e ajuda a movimentar a economia do país.

O avanço das tecnologias impactaram fortemente nos serviços musicais e, com a chegada da internet, os consumidores estão cada vez mais conectados a esses serviços. Atualmente, a Apple tem a maior loja de música online do mundo, a iTunes Store. O problema é que esse serviço é pago e, cada vez mais, os consumidores de músicas buscam soluções alternativas em que eles possam acessar o conteúdo desejado sem precisar pagar por ele.

Houve rápida evolução no mercado musical nos últimos anos. De acordo com o Relatório Global da Música, em 2015, as vendas globais de produtos físicos (CD, DVD e Blu-ray) e downloads de músicas reduziram 4,5% e 10,5% respectivamente, em relação ao ano anterior.

A iTunes Store, que até recentemente dominava o mercado de música online, viu sua posição ameaçada por diversos serviços de streaming. Um dos seus principais concorrentes, o Spotify, tem versão gratuita com publicidade entre a execução das músicas. Outro grande concorrente, o Google Play, permite o acesso gratuito por 30 dias, assim como o Groove Music, o TIDAL e o Deezer. Cada um deles dá acesso a mais de 30 milhões de músicas. Para seguir relevante no mercado, a Apple introduziu, em junho de 2015, o Apple Music, serviço de streaming similar aos já citados. Em 2015, esse mercado teve um aumento de seu consumo de 93% e de seu faturamento de 45%.

Dados da ABPD (Associação Brasileira dos Produtores de Discos) mostram que, em 2015, no Brasil, o mercado fonográfico aumentou a sua receita em 10,6% e as receitas com a distribuição de músicas em formato digitais aumentaram 61%. Já as receitas que originaram da distribuição por streaming remunerados por subscrição/assinatura aumentaram 192,4% e o streaming remunerado por publicidade aumentou 30,7%. As duas modalidades de streaming representam, respectivamente, 30,5% e 30,1% do faturamento total com música digital no Brasil.

O gráfico abaixo, retirado de levantamento da Statisa, mostra como os serviços de streaming têm crescido nos EUA nos últimos anos em detrimento das vendas de CDs e músicas e álbuns online.

Crescimento do mercado musical dos EUA por segmentos (primeiro semestre de 2016 vs. mesmo período de 2015)

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Fonte: Statisa.

Ainda de acordo com o Sebrae Nacional, essas tendências do mercado global implicam em diversas mudanças no mercado da música. Nos dias atuais, os músicos dependem cada vez menos das estruturas tradicionais do mercado para criar um produto de qualidade. O acesso às redes sociais permite que haja maior compartilhamento de conhecimento — não é mais necessário ir comprar revistas de cifras da banca de revistas, por exemplo. Com a crescente inovação e melhoria das bandas de internet, é possível ampliar as transferências de conteúdos. Por fim, há maior proximidade entre fornecedor e consumidor, pois a mídia tradicional não será mais tão relevante, dando espaço às mídias conectadas.

Portanto, a competitividade desse mercado exige que os fornecedores se adaptem ao acesso imediato e incorporem medidas tecnológicas, tanto na gravação das músicas, quanto na sua forma de distribuição e transmissão ao consumidor, aprimorando sempre as suas atividades. Além disso, quando se trata de música como bem de consumo final, é necessário, assim como também ocorre em outros mercados, identificar o público-alvo para tornar a oferta mais atrativa para os consumidores.