Economia de Serviços

um espaço para debate

Author: Débora Albuquerque

Telecomunicações têm a maior receita do setor de serviços – parte II

Em post anterior, mostramos os serviços de telecomunicações se destacando entre os demais serviços na geração de receitas. Neste post, mostraremos eles se destacando em produtividade e em remunerações no país, além da queda, ao longo do tempo, na participação do setor de telecomunicações no setor de serviços. Por último, será mostrado a relevância da inovação tecnológica para o setor seguir crescendo.

Desde a primeira série histórica da Pesquisa Anual de Serviços do IBGE – PAS com os serviços de telecomunicações discriminados (1999), eles ocupam o primeiro lugar entre os serviços de maior geração de receita operacional líquida no país e o primeiro ou segundo lugar entre os serviços de maior produtividade nacional (resultado da divisão de valor adicionado por pessoal ocupado), conforme tabela abaixo.

Tabela 1. Posição dos serviços de telecomunicações em rankings do setor de serviços, de 1999 a 2015.

Fonte: PAS-IBGE. Elaboração própria.

Apesar dos serviços de saúde e de intermediação financeira nunca terem sido incluídos na PAS, ao longo do tempo o número de serviços analisados se ampliou. Até 2006, por exemplo, serviço dutoviário não era abordado. Foi justamente a incorporação desse serviço de 2007 em diante que fez telecomunicações cair da 1ª para a 2ª posição no ranking de serviços com maior produtividade. Isto porque o serviço realizado por meio de dutovias gera alto valor adicionado por causa dos produtos caros transportados como gasolina e minério de ferro e, ao mesmo tempo, emprega pouquíssima mão de obra. Em 2015, por exemplo, o valor adicionado pelas telecomunicações foi 5,4 vezes maior que o valor adicionado pelos serviços dutoviários. Porém, a quantidade de pessoas ocupadas nas telecomunicações era 25 vezes maior, levando este último serviço a ocupar o 2º lugar no ranking de produtividade.

Os ocupados no setor de telecomunicações costumam receber maiores remunerações, comparativamente aos ocupados nos demais serviços no país. Enquanto a remuneração média anual dos primeiros, entre 1999 e 2015, foi de aproximadamente R$ 40.000,00, a dos últimos foi de aproximadamente R$ 14.000,00. Mas a diferença entre esses valores vem apresentando tendência de queda. A proporção percentual do setor de telecomunicações no setor de serviços ao longo do tempo é explorada na tabela abaixo.

Tabela 2. Participação percentual dos serviços de telecomunicações no total do setor de serviços, de 1999 a 2015.

Fonte: PAS-IBGE. Elaboração própria.

Observando a tabela acima percebemos contribuições paulatinamente menores das telecomunicações para os totais nos serviços, ao longo do tempo. Tal fato poderia ser interpretado de acordo com a teoria da commoditização digital, discutida em Arbache (2018): a popularização de uma nova tecnologia faz com que a contribuição dela para a competitividade seja cada vez menor por unidade produzida.

Por exemplo, a implementação da quinta geração de comunicação móvel (5G) numa fábrica resulta em melhor comunicação entre suas máquinas e, dessa forma, a unidade produzida sai em tempo menor comparativamente à mesma unidade produzida nas fábricas convencionais. Dessa forma, a primeira fábrica a implantar a inovativa 5G produzirá maior quantidade em menor tempo e, portanto, ganhará mercado, venderá mais e aumentará seus lucros. Porém, com a adoção da 5G pelas concorrentes, a quantidade ofertada ao mercado será maior e o preço do produto deve cair. Dessa forma, o lucro da primeira fábrica vai diminuindo conforme a popularização da 5G aumenta. Assim, o acesso à 5G vira condição necessária para a sobrevivência no mercado, mas não determina a vitória da competição. Concomitantemente, a disposição das fábricas em pagar pelo serviço da 5G cai com o tempo e, como consequência, assistimos queda dos preços dos serviços de 5G, desaceleração nas receitas dos ofertantes desse serviço de telecomunicação, desaceleração no valor adicionado, provável encolhimento do setor e etc. A relação entre commoditização digital e competitividade também segue na ilustração abaixo.

Figura 1. Relação entre commoditização digital e competitividade

Fonte: Arbache (2017).

Depois de um ponto de inflexão, quanto maior a quantidade de pessoas com acesso aos serviços de telecomunicações, menor se torna a contribuição desses serviços para a geração de riquezas. Dessa forma, a disposição em pagar por tais serviços é decrescente depois de um certo nível e, consequentemente, os preços deles tendem a cair. No Brasil, já devemos ter ultrapassado o ponto de inflexão em várias regiões pois o IBGE revelou crescimento abaixo da inflação dos preços dos serviços de telecomunicações em 2014.

Os preços dos serviços de comunicação, incluindo telefonia celular e banda larga, foram os que menos subiram em 2015 segundo levantamento da Fundação Getúlio Vargas. A instituição mediu a inflação da baixa renda, pelo Índice de Preços ao Consumidor – Classe 1 (IPC-C1), e constatou que a alta média de preços foi de 11,52% no acumulado do ano, enquanto os serviços de comunicação subiram 1,11%. Índices como os de habitação e de transportes, por exemplo, subiram 14,6% e 13,2%, respectivamente. Segundo o Telebrasil, esse índice pode ser explicado pela queda de preço nos serviços ao usuário. “Na telefonia celular, desde 2008, o preço médio do minuto caiu 60%, fruto de uma acirrada competição, redução nas margens de lucro das empresas e aumento dos ganhos de eficiência das prestadoras”, afirma, em nota. A entidade representa as operadoras e concessionárias (TELESÍNTESE).

Conforme resumido no livro “Introdução à Teoria do Crescimento Econômico” do Jones (2000), uma saída para a desaceleração das receitas, apontada por teóricos do crescimento econômico, seria o crescimento de investimentos em P&D indutoras de inovação tecnológica no setor. E as empresas já estão fazendo isso: a Pesquisa de Inovação (PINTEC) do IBGE revela crescimento de 382% no investido em P&D pelo setor de telecomunicações no Brasil entre 2011 e 2014. Ademais, o gasto total em P&D no Brasil em 2014 foi de 0,61% do PIB; sem telecomunicações, esse percentual teria sido de apenas de 0,54%.

Concluindo, desde 1999 os serviços de telecomunicações se destacam em produtividade e em geração de receitas no país. Isso deve se manter caso seja crescente a inovação tecnológica no setor, advinda de crescentes investimentos em P&D. Devido ao processo de commoditização digital, a inovação se mostra crucial no combate à tendência de redução de participação relativa dos indicadores de telecomunicações nos totais dos indicadores do setor de serviços aqui analisados.

Como as TICs têm proporcionado o crescimento de serviços

Conforme vem sendo discutido aqui no Blog, é nítido o crescimento da relevância do setor de serviços para geração de riquezas. A participação dos serviços nas exportações mundiais passou de aproximadamente 9% em 1970 para algo em torno de 20% em 2014. Atualmente, “os serviços já representam 75% das economias da OCDE; nos Estados Unidos, eles já passam dos 80%; e nas economias de renda média, eles já são 54%” (ARBACHE, 2014, p. 6). No Brasil, os serviços são responsáveis por 70% do PIB. Mas não foi sempre assim: o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) tem possibilitado a crescente comercialização a longas distâncias de serviços modernos que independem de presença física entre consumidores e produtores. Esse processo viabiliza a crescente terceirização que tem aumentado o comércio de serviços entre unidades produtivas, intensificando a relação sinérgica e simbiótica dos serviços com a indústria e do Big Data, que proporciona oportunidades de novos serviços e negócios. Tudo isso tem contribuído para o aumento da importância do setor de serviços na geração de riquezas.

Através de análises empíricas, Loungani et al. (2017, p.13) afirmam que a relação entre o crescimento do setor de serviços e o crescimento de toda a economia tem se tornado mais forte. Especificamente, eles encontraram um coeficiente de correlação de 0,6 entre o crescimento de serviços e o crescimento do PIB per capita, versus um coeficiente de correlação de 0,24 entre o crescimento da manufatura e o crescimento do PIB per capita. O (coeficiente de determinação) para a parcela de valor agregado de serviço encontrado foi 0,51; e o R² para a parcela de valor agregado de manufatura, 0,19. A fim de ilustrar o maior espaço ocupado pelos serviços na participação do crescimento das exportações mundiais, os autores prepararam a figura abaixo.

Figura 1. Contribuição das exportações de serviços e manufaturas para o crescimento das exportações mundiais, de 1990 a 2014, em percentual.

Fonte: Manual 6 do Balanço de Pagamentos do Fundo Monetário Internacional (FMI), dados de 2016 da UN COMTRADE e cálculos dos autores que elaboraram o gráfico (LOUNGANI et al., 2017). Tradução própria.

A figura acima evidencia a separação proposta por Loungani et al. (2017) dos serviços em dois grupos: serviços tradicionais e serviços modernos. Os primeiros seriam aqueles que requerem proximidade física entre compradores e vendedores, como serviços de manicure, de cabeleireiro, serviços de transporte, de hotelaria e etc. Os modernos, por sua vez, dispensam proximidade física entre compradores e consumidores: seriam serviços de consultoria, de marketing, design, de pesquisa e desenvolvimento, tecnologia da informação (TI) e etc. Conforme a digitalização e o progresso tecnológico avançam, a diferenciação de tais serviços se tornaria cada vez mais imprecisa pois os tradicionais se tornariam modernos. Um exemplo desse fenômeno poderia ser a consulta médica: a princípio ela é serviço tradicional, mas na medida em que a telemedicina avança, os pacientes podem enviar exames online e serem atendidos remotamente.

Os serviços estariam crescendo em participação no comércio mundial e na renda dos países por quatro motivos principais. O primeiro é fácil de se imaginar: o progresso técnico nas TIC possibilita a crescente troca de dados entre países e, embutidos neles, serviços dantes impossíveis de serem comercializados. Serviços de logística, por exemplo, são hoje oferecidos para vários países pela empresa americana Amazon, através de sua plataforma online; seguros para bens móveis e imóveis podem ser contratados sem sair de casa; créditos podem ser adicionados ao celular com apenas alguns cliques em aplicativos de bancos e serviços de banda larga podem ser contratados através dos sites de provedores.

O segundo motivo para o crescimento do setor de serviços seria sua crescente participação nas cadeias globais de valor. De acordo com Arbache (2015, p. 3), o desenvolvimento e a massificação das TIC, bem como dos serviços de transporte e logística, contribuem para a popularização das tecnologias organizacionais e de produção que possibilitam às firmas focarem nas suas atividades principais, terceirizando as demais funções.

Podemos exemplificar essa ideia do autor com o caso de um fabricante de acessórios de informática no Brasil. Em sua cadeia de suprimento, serviços de telecomunicações são contratados de provedores regionais; empresas de transportes levam os insumos até a fábrica; um restaurante é contratado para servir alimento aos funcionários e a vigilância fica a cargo de uma empresa de segurança. Uma vez que as demais atividades necessárias ao funcionamento fabril são contratadas de terceiros, a fábrica está apta a focar estritamente na produção de acessórios de informática. Como exemplo deste processo, temos o avanço de 10% ao ano da terceirização de serviços de TI no Brasil:

     “O mercado de TICs avança no Brasil apesar da crise, em razoável medida ajudado pela cada vez maior terceirização de serviços de tecnologia da informação. Segundo balanço divulgado pela associação brasileira das empresas de TIC, Brasscom, entre 2010 e 2017, a receita com serviços, BPO e computação em nuvem dobrou de tamanho (…). A receita somada de outsourcing e TI in house passou de R$ 59,6 bilhões para R$ 104,9 bilhões nesse período. Mas enquanto o desenvolvimento interno cresceu 5,9% ao ano, a terceirização andou bem mais acelerada, ao ritmo de 10,5% ao ano. Como resultado, se em 2010 a TI in house chegou a representar 48,6%, em 2017 foi somente 41,2%. No caminho inverso, a terceirização de serviços passou de 51,4% para 58,8%, com receita anual superior a R$ 61 bilhões” (CONVERGÊNCIA DIGITAL, 23/04/2018).

O terceiro motivo para o crescimento do setor de serviços seriam as intensificações das relações sinérgicas e simbióticas deles com os produtos manufaturados. Segundo Arbache (2015), o valor agregado de fabricação aumenta quando a manufatura é combinada com serviços para formar um terceiro produto que não é em si nem um bem manufaturado, nem um serviço convencional. São produtos com alto conteúdo de serviços e vendidos em pacotes, como smartphones – dependentes fortemente de marketing, marcas, design e telecomunicações – e motores a jato para aeronaves cuja comercialização inclui serviços de leasing, seguros, treinamento, engenharia, manutenção e outros serviços pós-venda.

O autor cita o caso do smartphone Nokia N95 como um exemplo da relação moderna entre bens e serviços: nada menos que 81% do preço final do celular se relaciona com o valor acrescentado de serviços como licenças, software, marketing, branding e distribuição, enquanto apenas 19% se relaciona com peças, componentes e funções de montagem. Ademais, essa complementariedade entre produtos manufaturados e serviços também fica evidente em exemplos como telefone celular (manufatura) e serviços de valor adicionado – como os aplicativos: não há como se pensar no uso de aplicativos sem se imaginar o meio físico, a manufatura na qual o serviço se torna disponível.

Por último, a crescente geração de dados através de robôs e máquinas utilizadas no processo produtivo e a geração de dados nas plataformas digitais possibilitam surgimento de novos negócios e serviços. Não à toa, é crescente o interesse na exploração e interpretação de Big Data: os dados podem revelar desperdícios de insumos e consequentes oportunidades de melhoria na eficiência produtiva. Ademais, possibilitam customização de produtos e serviços ao oferecer informações de preferências e características dos consumidores, além de novos modelos de negócios.

Assim, podemos perceber a crescente relevância das TIC para a expansão dos serviços e para a consequente geração de riquezas. As empresas e governos devem se atentar ao desenvolvimento tecnológico das TIC, bem como seu uso para geração de novos serviços e negócios. Só assim serão capazes de desenvolver políticas condizentes com uma eficaz estratégia de crescimento frente à globalização digital.

Telecomunicações têm a maior receita do setor de serviços

Os serviços de telecomunicações continuam ocupando a primeira posição entre os serviços que mais geram receita operacional líquida no Brasil, excetuando os financeiros. É o que aponta a Pesquisa Anual de Serviços – PAS, publicada 22 de setembro deste ano pelo IBGE. Apesar de terem perdido participação de 2007 (18,9%) para 2015 (11,3%), tais serviços devem continuar em posição de destaque na geração de receitas nos próximos anos, principalmente com a chegada da quinta geração de comunicação móvel (5G) e da consequente massificação da internet das coisas (IoT). Crescente em importância na produção e na agregação de valor ao produto final, o setor de telecomunicações apresenta elevada concentração de mercado e poderia ver suas receitas crescendo em ritmo menos acelerado caso uma política mais agressiva de promoção da concorrência fosse aplicada.

A pesquisa revelou para o setor de serviços e de telecomunicações em 2015, respectivamente, 1.286.621 e 7.494 empresas operando, gerando R$ 1,4 trilhão e R$ 162 bilhões de receita operacional líquida, R$ 856 bilhões e R$ 72,2 bilhões de valor adicionado bruto e, ainda, 12,7 milhões e 195 mil pessoas empregadas que receberam R$ 315 bilhões e R$ 9,9 bilhões em salários, retiradas e outras remunerações. Em 2015, enquanto o salário médio mensal em serviços situou-se em R$ 1.911, os maiores salários vieram das empresas de informação e comunicação, com média de R$ 3.831 mensais. A pesquisa também revelou o ranking abaixo.

Os dados acima corroboram com a análise de Arbache (2015); na página 3 o autor afirma que o aumento dos rendimentos dos serviços está conectado aos fatores produtivos e tecnológicos que levam a uma crescente participação dos serviços nas cadeias de suprimentos e no valor agregado dos bens. O desenvolvimento e a massificação das tecnologias da informação e da comunicação (TIC), bem como dos serviços de transporte e logística, contribuíram para a popularização das tecnologias organizacionais e de produção que possibilitam às firmas focarem nas suas atividades principais, terceirizando as demais funções.

Podemos exemplificar essa ideia do autor com o caso de um fabricante de acessórios de informática no Brasil. Em sua cadeia de suprimento, serviços de telecomunicações são demandados na medida em que a sede se comunica com os fornecedores. Empresas de transportes levam os insumos até a fábrica. Um restaurante é contratado para servir alimento aos funcionários e a vigilância fica a cargo de uma empresa de segurança. Uma vez que as demais atividades necessárias ao funcionamento fabril são contratadas de terceiros, a fábrica está apta a focar estritamente na produção de acessórios de informática. Ademais, a tecnologia bluetooth representaria  valor agregado ao teclado — produto final da fábrica — na medida em que a receita advinda da venda do teclado sem fio, apto ao bluetooth, é maior comparativamente a da venda do antigo modelo com fio.

Seguindo esse raciocínio, observe que os serviços de telecomunicações são importantes tanto durante a produção dos bens quanto na agregação de valor aos produtos finais. E essa importância deve crescer com o tempo, pois com o 5G, por exemplo, as máquinas devem estar ainda mais conectadas dentro das fábricas e as cadeias de suprimentos também devem aumentar sua integração. Do ponto de vista da agregação de valor, inovações tecnológicas adicionadoras de serviços de telecomunicações aos dispositivos móveis devem seguir surgindo, como resposta à demanda de consumidores por produtos mais conectados (o smartphone é o maior exemplo disso).

A inserção dos cidadãos nas redes de comunicação de dados seria cada vez mais democrática se houvesse redução dos preços dos serviços de telecomunicações. De acordo com estudo inédito do IPEA em parceria com a Anatel, é grande o potencial atual de expansão da banda larga no país: mais de 50 milhões de residências desejam acesso à web, a grande maioria de baixa renda.

Apesar da PAS revelar mais de 7 mil empresas operando as telecomunicações em 2015, o setor é bem concentrado pois poucas empresas dominam a maior parte do mercado, resultando em preços mais elevados e em qualidade inferior aos predominantes numa eventual concorrência perfeita. Dessa forma, o estímulo à entrada e ao crescimento de empresas até então com menor expressão no mercado é essencial para redução de preços e a consequente inclusão das famílias de baixa renda às redes de comunicação de dados, e para incentivar a melhoria na qualidade do serviço.

A promoção de concorrência no setor poderia até causar uma desaceleração no crescimento das receitas dos serviços de telecomunicações, dado a queda de preços. Ainda assim, as receitas deveriam continuar crescendo. Isso porque, além dos motivos apresentados anteriormente, um estudo recente (2017) organizado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) prevê R$ 155 a R$ 620 bilhões aportados na economia brasileira, até 2025, pela Internet das Coisas. Já no resto do mundo, o valor deve ser de 4 a 11 trilhões de dólares.

A partir do discorrido acima, podemos concluir que os serviços de telecomunicações são crescentes em importância tanto no processo produtivo quanto na agregação de valor aos produtos finais. Não é à toa que eles despontam como os maiores geradores de receita líquida no Brasil, dentre os serviços avaliados pela PAS. De fato, a concentração de mercado contribui para tal resultado, visto que os preços poderiam ser menores com o fortalecimento de operadoras de menor porte e de menor poder de mercado. Porém, é provável que um possível fortalecimento da concorrência não ofereceria queda de receita para as atuais firmas de grande poder de mercado, mas sim uma desaceleração no crescimento de futuras receitas e uma maior democratização no uso do serviço.

O 5G como catalisador de negócios no meio digital

Num mundo onde os dados assumem cada vez maior centralidade na geração de riqueza, as comunicações móveis evoluem para possibilitar maior capacidade, velocidade, segurança, ubiquidade e menor latência nas trocas de informações. Nesse contexto, a quinta geração de sistema sem fio (5G), prevista para 2020 pela União Internacional de Telecomunicações (UIT), pretende ser poderosa e suficientemente flexível para atender aos cenários de tráfego de dados previstos e desconhecidos. Catalisando o surgimento de novos serviços e de novos modelos de negócios, o 5G deve contribuir com a tendência do crescimento da participação do setor de serviços no PIB dos países.

O ciclo da quinta geração deverá ser bem diferente das anteriores por uma razão em especial: os motivos econômicos nunca experimentaram tamanha influência na formação de suas características. Diferentemente da primeira, segunda, terceira e quarta geração de comunicação móvel, voltadas para comunicação entre pessoas, o 5G deve estar voltado para atender serviços, conectar dispositivos e máquinas, ao invés de pessoas. Exemplos: com o 5G, espera-se aumento de pagamentos efetuados online, de uso de aplicativos que aumentem a comunicação do comprador e vendedor, de máquinas interconectadas dentro das fábricas potencializando o just in time e de robôs realizando serviços.

Dessa forma, o 5G acelera o crescimento da internet das coisas (IoT) e desperta interesse de vários agentes: a exemplo da 4.0, a indústria poderá automatizar ainda mais sua linha de produção e estar mais conectada aos distribuidores e consumidores. Já o setor financeiro anseia por aumento de robôs operando nas bolsas de valores e aumento na velocidade de troca de informações, a fim de antecipar acontecimentos e reduzir latência. No mercado financeiro, o ganho de milissegundos pode ser crucial para o sucesso de várias operações financeiras. Donos de plataformas digitais e operadores de comércio eletrônico, por sua vez, pretendem expandir capilaridade, incluir novos usuários e, consequentemente, aumentar a publicidade, as compras e receitas. Também para as operadoras de telefonia, o 5G representa geração de receitas, pois se trata de um novo serviço a ser explorado. Por fim, os usuários das redes observam no 5G a possibilidade de conexão mais veloz e confiável.

Com tantos agentes interessados na evolução do serviço móvel de trocas de dados, duas preocupações são crescentes: o suporte ao uso intensivo da rede e a otimização espectral. Assim, a arquitetura de comunicação necessitará de conexões inteligentes, que recebam e enviem informações aproveitando os melhores canais e caminhos disponíveis no momento. Pela primeira vez na história da rede móvel sem fio, os serviços não estarão limitados a uma banda específica. Em vez disso, devem seguir o melhor espectro disponível no momento da transmissão de dados.

Assim, espera-se maior dinamicidade, adaptação, flexibilidade e reconfiguração automática para a rede. A inteligência para tomada de decisão quanto à conexão será máxima nos dispositivos móveis, robôs, nas antenas e nos servidores.  Ademais, baterias de longa vida devem se tornar foco de pesquisas para o suporte de toda essa inteligência.

Tudo isso permitirá o surgimento de novos serviços dependentes de internet confiável como telemedicina, transporte através de veículos autônomos, pulverização de inseticida através de drones e etc. Imagine o caso de uma cirurgia feita por robôs. Agora pense como ela se tornaria inviável se a internet é passível de falha durante o corte.

Segundo dados da IHS (2017), entre 2020 e 2035 devem ser gerados US$ 12,3 trilhões em bens e serviços através do 5G, e os investimentos médios anuais devem ser da ordem de US$ 200 bilhões em sua cadeia de valor. Tal investimento deve ser capitaneado pelos Estados Unidos (EUA) e China, conforme ilustração abaixo.

Figura 1. Proporção de investimento em bens de capital e em pesquisa e desenvolvimento da cadeia de valor do 5G, em média, por país, entre os anos de 2020 e 2035

Fonte: IHS (2017), adaptado

No Brasil, a primeira demonstração do 5G foi feita em 2016 e, no geral, as empresas de telefonia já começaram a se preparar para oferecer o serviço no país. O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) tem se esforçado para ampliar o montante investido em 5G no território nacional e para estabelecer acordos multilaterais no desenvolvimento da tecnologia, com ações como chamadas de pesquisas conjuntas, fóruns de padronização e eventos anuais para compartilhamento de informações.

O mais recente esforço brasileiro para fomento e construção do ecossistema de quinta geração é o Projeto Brasil 5G, formalizado em fevereiro deste ano. Composto por Abinee, Anatel, Cetuc, CPqD, Ericsson, Fitec, Huawei, Inatel, Informa, NEC, Nokia, Oi, Qualcomm, Sindisat, SindiTelebrasil, Telebrasil, TIM, Trópico e MCTIC, o projeto também visa o preparo do país para as participações nas discussões internacionais. Esse grupo firmou em maio deste ano um acordo de cooperação tecnológica em 5G com a União Europeia, os Estados Unidos, a Coreia do Sul, o Japão e a China para o desenvolvimento da nova tecnologia.

A exemplo das teorias do comércio internacional, essas trocas e parcerias entre instituições brasileiras e grupos internacionais pode ser proveitosa para ambos os envolvidos. Porém, é preciso não perder de vista que o 5G pretende ser um meio pelo qual muita riqueza será gerada e, por isso, é necessário permanente amadurecimento das estratégias nacionais para a maximização de seu uso para o desenvolvimento de negócios no país. Aparentemente, estamos diante de uma nova forma de desenvolvimento e, se o Brasil não investir de forma estratégica nessa área agora, no futuro, a distância dele para os países desenvolvidos tenderá a ser ainda maior.

A importância das telecomunicações para o crescimento econômico

Conforme exposto no post de Giovanini e Arend, o setor de serviços é essencial para o crescimento econômico, na medida em que aumenta a produtividade industrial. Este argumento, similar ao apresentado por Arbache (2016), parece também se aplicar especificamente ao setor de telecomunicações no Brasil, conforme mostrado a seguir.

Ao longo do tempo, como esperado, o aumento do acesso à Internet foi acompanhado de aumento no consumo de bens industriais necessários para se usufruir do serviço de telecomunicações, como os computadores pessoais. Veja a figura abaixo.

Figura 1. Número de Computadores pessoais e Usuários de Internet

Já o aumento da oferta de serviços de comunicações móveis foi acompanhado de inovações de máquinas que se deslocam no espaço, como laptops e tablets. A demanda destes produtos industriais aumentou, substituindo, em parte, a dos antigos PCs. Concomitantemente, o acesso à internet via Banda Larga Móvel cresceu, substituindo o acesso discado. Veja as ilustrações abaixo.

Estimativas da OCDE revelam que conexões à Internet promovem exportações de produtos a preços mais altos em diversos setores de manufatura, principalmente eletrônicos. Além disso, um aumento na densidade de telecomunicações de 10% está associado a preços entre 2% e 4% mais elevados no setor eletrônico e a um aumento no comércio intra-indústria deste setor, entre 7% e 9%.

No Brasil, de acordo com a Telebrasil e Teleco (2016), somente em 2015, o setor de telecomunicações movimentou R$ 232 bilhões, ou 4% do PIB nacional, além de ter sido responsável por R$ 28,6 bilhões investidos no ano, o equivalente a 3% da Formação Bruta de Capital Fixo. Segundo estimativas da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (ABINEE), a indústria de bens de telecomunicação passou a ser, em 2016, a de maior faturamento no setor da indústria eletroeletrônica.

Em comparação com outros países, o Brasil obteve a quinta maior receita mundial de telecomunicações no varejo em 2015, segundo a Ofcom (reguladora de comunicações do Reino Unido). O país está entre os 10 com maior número de linhas de telefones celulares ativas no mundo, sendo a maior parte delas pré-pagas, ou seja, das mais baratas para o consumidor. Em 2015, de acordo com a Anatel, existiam 125 celulares ativos para cada 100 brasileiros, isto é, mais de uma linha para cada pessoa. Esses dados evidenciam a importância das comunicações na vida da população brasileira, que parece priorizar a compra de serviços de telecomunicações, em detrimento de outros gastos.

Tal prioridade é observável em todas as regiões do País, para ambos os sexos e em todas as classes sociais. Ademais, o desenvolvimento das comunicações móveis tem colaborado com a inclusão social e democratização do acesso aos serviços digitais (OCDE, p.36) na medida em que o acesso à Internet realizado exclusivamente por meio do celular é mais frequente entre a população de baixa renda e entre os usuários residentes nas regiões cuja infraestrutura de internet fixa é mais precária, como no Nordeste, Norte e nas zonas rurais, tal como apontado no estudo TIC Domicílos 2015, do Comitê Gestor da Internet (CGI).

Está clara a contribuição do setor de telecomunicações para o PIB, investimentos, inclusão social e bem-estar da população, que só tende a aumentar, considerando a evolução do setor e as preferências do consumidor. Portanto, políticas que incentivem a ampliação do acesso à internet e o desenvolvimento do setor são cruciais para o crescimento sustentado, e o aprimoramento do setor por meio de políticas de organização, fomento e adaptação às características nacionais pode ser uma eficaz estratégia de catch-up.

Débora Albuquerque é economista e mestranda em telecomunicações e redes de comunicação de dados pela Universidade de Brasília (UnB). Especialista em economia e finanças, exerce a profissão no Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC)