A lógica de compra de empresas por gigantescos grupos corporativos no setor da economia digital, a exemplo da Google, Youtube, Whatsapp, Amazon, Uber, AirBnB, e a emergência de concorrentes chineses, a exemplo do o Goojje, Youtubecn, Wechat, Aliexpress e DiDi Chuxing, revelam uma preocupação legítima da China em relação ao controle acionário de empresas que administram plataformas digitais. A aquisição de empresas por grandes grupos concentra as decisões e aumentaria o poder de mercado de determinado fornecedor. Esse poder é uma falha de mercado que gera ineficiências e conduz à emergência dos oligopólios e monopólios. Conforme a literatura tradicional econômica, o controle do mercado por poucos vendedores (mercado concentrado) traz ineficiência se comparado ao livre mercado. Essa lógica é bastante conhecida pelos economistas, que, em geral, a aplicam para comparar a concorrência perfeita à imperfeita.

O modelo a ser apresentado buscará aplicar a lógica mais elementar do monopólio a uma situação de comércio internacional. Para isso, fará uso do modelo básico que simulará dois monopólios idênticos atuando em dois países também idênticos, em situação de autarquia. Em seguida, utilizando a hipótese de que uma empresa adquiriu a outra, em situação de comércio internacional, sem custos logísticos, buscará analisar as variações dos excedentes sociais e do lucro das empresas.

O modelo a ser apresentado buscará estender o conceito de monopólio apresentado nos livros de economia em situação de comércio internacional (GREEN & MAS-COLLEL, 1995, p.384). O objetivo nesse primeiro exercício é buscar identificar as somas dos excedentes dos produtores e dos consumidores – que juntos compõem o bem-estar social.  O modelo usa uma curva de demanda linear e supõe uma curva de oferta igualmente linear conforme as equações abaixo:

Demanda dos consumidores do País A:

Onde:

QDA: Quantidade demandada do produto no País A

PDA: Preço do produto ofertado no País A

b: Quantidade demandada do produto em caso de preço nulo.

a: coeficiente que expressa a variação na quantidade em função da variação no preço.

Oferta do monopolista do País A:

Onde:

QOA: Quantidade ofertada do produto no País A

POA: Preço do produto ofertado no País A

c: coeficiente que expressa a variação na quantidade em função da variação no preço.

Suporemos, para fins de simplificação, que o País A é idêntico ao País B, o que resulta em curvas de demandas essencialmente idênticas. Ademais, vamos supor que os monopólios são iguais, e tem custos idênticos, o que nos leva à formação de curvas de ofertas iguais.

Demanda dos consumidores do País B:

Oferta do monopolista do País B:

QDB=QDA=Q: Quantidade demandada do produto no País B

PDB=PDA=P: Preço do produto ofertado no País B

b: Quantidade demandada do produto em caso de preço nulo.

a: coeficiente que expressa a variação na quantidade em função da variação no preço.

QOB=QOA: Quantidade ofertada do produto no País A

POB=POA: Preço do produto ofertado no País A

c: coeficiente que expressa a variação na quantidade em função da variação no preço.

Para fins de simplificação dos cálculos algébricos, vamos considerar:

a=c=1

Isso significa que a variação de uma unidade a mais na demanda (ou na oferta) provoca aumento (ou diminuição) de preço de uma unidade.

Em equilíbrio, a oferta se iguala à demanda. Na figura 1, a oferta corresponde à linha vermelha, enquanto a demanda corresponde à linha azul.

Demanda dos consumidores do País A e do País B:      Q =   b – P                     (5)

Oferta do monopolista do País A e do País B:                   P = Q                             (6)

O monopólio irá produzir a quantidade em que a receita marginal se iguala com os custos marginais:  CMg=RMg (GREEN & MAS-COLLEL, 1995, p.384). A Receita da firma no país A (que é a mesma do país B pela similaridade das hipóteses) é dada por: R = Q x P.

A Receita Marginal (RMg) representa a quantidade de receita marginal para uma variação marginal no preço do produto.

Receita marginal do monopólio do País A = País B:

Os custos marginais (CMg) são a própria curva de oferta:

Figura 1 – Os efeitos do monopólio no País A.

 

A perda de bem-estar (DWL) decorrente do monopólio está representada pela área em cinza e equivale a variação do preço e da quantidade em relação a concorrência perfeita:

Agora consideremos a hipótese de que há comércio entre os dois países, sem custos logísticos. Além disso, vamos supor que a empresa – o monopólio – do País A adquiriu a empresa do País B. Uma vez que não há custos logísticos, suporemos, igualmente, que se possa somar as demandas dos dois países. Com isso, poderemos simular que, nessa nova situação, há apenas um monopolista atuando em um país duas vezes maior que o País A.

O resultado indica que agora a demanda é mais elástica (há mais consumidores nesse mercado), sendo duas vezes menos inclinada do que a curva de demanda no País A.

Suporemos também que a aquisição da empresa do País B não gerou nenhuma mudança na estrutura de custos. Assim:

Figura 2 –  Os efeitos de um único monopólio na economia, após a aquisição do monopólio do País B pelo monopólio do país A. Com a agregação das demandas dos países A e B, a curva de demanda total percebida pelo único monopolista é duas vezes menos inclinada (mais elástica) se comparada à situação antes da aquisição.

É possível perceber que haverá perda de bem-estar em uma situação em que um dos monopólios compra o outro. Nesse caso, com a abertura comercial, os monopólios em escala nacional fundem-se para tornar-se um monopólio em escala global, que retira bem-estar da sociedade.

Analisando-se a questão dos lucros, conclui-se que o monopólio em escala global terá lucros maiores se comparado ao monopólio em escala nacional. Uma vez que as empresas maximizam seus lucros, é razoável concluir que as empresas tenderão a preferir a fusão do que a competição. Assim, o modelo parece descrever qual seria a razão para que haja tantas fusões de empresas na atualidade: com as fusões as empresas buscam aumentar seus lucros, maximizando-os. Por outro lado, essas fusões levam à perda de bem-estar social global, prejudicando em grande medida os consumidores.

É bastante razoável supor que, em razão da velocidade de adaptação das empresas que participam da economia digital, esse processo de aquisição ocorra de maneira muito mais rápida. A dinâmica atual no mercado de economia digital parece confirmar essa tendência. Startups que têm certo êxito são rapidamente adquiridas por grandes empresas que controlam as plataformas digitais.

Green, J. R., A. Mas-Colell, and M. Whinston. Microeconomic Theory. New York: Oxford University Press, 1995.