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Os serviços e a baixa participação brasileira nas cadeias globais de valor

Normalmente, quando se fala de comércio exterior, pensa-se apenas nas exportações e importações diretas. Porém, com a maior integração do comércio mundial, fragmentação da produção e o desenvolvimento de complexas cadeias globais de valor, percebe-se a necessidade de olhar para outros indicadores para melhor compreender o comércio entre países.

A notícia boa é que, apesar de ainda ser um movimento incipiente, a disponibilidade de dados sobre comércio exterior dentro de cadeias produtivas tem aumentado. A base TiVA (Trade in Value Added), construída e mantida pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pela Organização Mundial do Comércio (OMC), é uma importante iniciativa nesse sentido.

Por meio da TiVA, é possível ver o quanto cada país adiciona valor nos produtos e serviços finais exportados por outro país. Por exemplo: iPhones são desenhados nos EUA, montados na China e depois distribuídos para o restante do mundo (incluindo os EUA). Digamos que uma montadora chinesa venda o iPhone para o restante do mundo por US$ 200. Suponha que essa montadora tenha comprado US$ 150 em peças e serviços do resto do mundo no processo. Na contabilização convencional, não seria possível saber que esses US$ 150 importados foram utilizados para exportar US$ 200. Pelo método utilizado no TiVA, seria possível saber que, apesar de ter exportado US$ 200, a China contribuiu com apenas US$ 50 do valor. Além disso, seria possível saber quanto cada país contribuiu para que a China exportasse os US$ 200 em um produto final e quanto disso são serviços.

Há uma literatura que aponta que existe uma correlação positiva entre o consumo de serviços como insumos na produção de bens exportados e intensidade exportadora (ver, por exemplo, Berlingieri 2015 e Francois e Woerz 2007). Isso se daria tanto como estratégia de redução de custos, principalmente por meio de serviços voltados para facilitar o processo exportador, quanto como estratégia para agregação de valor aos produtos – com serviços como pesquisa e desenvolvimento, marketing, software etc.

Ao olharmos os dados do Brasil na TiVA, dois fatos ficam claros:

  • as exportações brasileiras apresentam baixa adição de valor de outros países (ver Gráfico 1) e
  • o país exporta – direta e indiretamente – serviços em uma proporção próxima da média da OCDE, mas se utiliza pouco de serviços importados (ver Gráfico 2).

Esses dois fatos indicam que o Brasil é pouco integrado às cadeias globais de valor. Para retomar o crescimento, será necessário ao país se tornar mais competitivo internacionalmente e se integrar mais à economia global. O caminho não será fácil, mas reconhecer a necessidade disso será um passo importante naquela direção.

Gráfico 1 – Percentual de valor adicionado por outros países no total das exportações, por país – 2008, 2009 e 2011 (quadro à direita mostra a evolução do Brasil)

Gráfico 2 – Participação de serviços direta e indireta no total de exportações, por país, 2011.

SNA service export share” representa a exportação direta de serviços. O azul escuro representa a participação do valor adicionado de serviços nacionais no total das exportações de um país. O azul claro, a participação do valor adicionado de serviços importados no total de exportações de um país. A linha mostra a média dos países da OCDE.

Serviços e Comércio Exterior: A Relevância da Importação de Serviços para a Indústria e suas Exportações

Na última década, o comércio mundial em serviços dobrou. Além disso, apesar de responder por menos de um quarto do comércio total, os serviços, como insumos, representam 45% do valor agregado dos bens exportados no mundo.

No Brasil essa tendência também é visível. O país triplicou suas exportações do setor na última década e subiu de 37º maior exportador para 31º no ranking mundial. No entanto, as importações brasileiras de serviços tiveram um incremento ainda maior, de 5 vezes, e o país subiu 13 posições como maior importador, de 30º para 17º. Essa assimetria levou o Brasil a um déficit de US$ 46 bilhões em 2014.

Ranking Brasil como exportador no mundo
  2005 2014
Bens manufaturados 27º 31º
Serviços 37º 31º
 Fonte: OMC

O que fazer com o déficit grande na balança comercial de serviços?

Para responder essa pergunta é preciso levar em conta que os serviços representam cerca de 56% do custo para agregação de valor da produção industrial. Em adição, os serviços sobre o valor agregado dos bens exportados alcança, segundo dados do TiVA da OCDE, o valor de 40%, muito maior do que as exportações contabilizadas como de serviços.

O que se pode afirmar a partir disso é que restringir a importação de serviços não é o caminho mais interessante.

Várias empresas de ponta no Brasil precisam de serviços importados para viabilizar suas exportações, como aluguel de equipamentos para o setor extrativo ou garantia de peças para empresas de caminhões, ônibus e aeronaves. Mais importante, é que muitas vezes esses serviços não competem com serviços ofertados dentro do país, pois são necessariamente consumidos no local de destino das exportações de bens.

Mesmo assim, devido à distorções do sistema tributário brasileiro, qualquer operação de importação de serviços no Brasil encara uma carga tributária que varia entre 41% e 51%.

Competir melhor com suas exportações de bens e inserir se mais e melhor nas cadeias globais de valor demandam do Brasil uma política comercial ativa em serviços e a revisão da tributação nas importações neste setor.

O caminho é promover mais as exportações de serviços do Brasil no exterior e ter uma política industrial ativa para melhorar a oferta interna. Onerar as importações de serviços, muitas vezes, significa onerar as exportações de bens.

Foto FabrizioFabrizio Panzini é Mestre em Economia Política pela PUC-SP e Especialista em Políticas e Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI).