A oferta de serviços a serem transacionados no mercado internacional é – como de um modo geral ocorre com as mercadorias – fortemente determinada pelas vantagens comparativas de um país. Estas, por sua vez, em geral guardam relação com a disponibilidade de fatores de produção, embora possam ser alteradas ao longo do tempo por medidas de política. A existência de economias de escala em alguns setores ou a existência de estruturas concentradas de mercado são elementos que podem vir a influenciar o grau de especialização de uma economia, na sua inserção internacional.

No entanto, e à diferença do que ocorre com mercadorias, no comércio de serviços a relação de economias de escala com o desempenho exportador não é imediata nem assegurada.

Há casos, por exemplo – à diferença de empresas manufatureiras – em que as empresas produtoras de serviços de fato experimentaram desempenho decrescente, ao tentar se diversificar no mercado internacional. Isso pode ser devido (Capar, Kotabe (2003)) a que: i) diversos países mantêm controle estrito sobre o investimento em diversos setores de serviços, ii) os serviços ofertados por empresas transnacionais aos consumidores locais podem ter de sofrer um grau maior de adaptação do que o que se observa com produtos industrializados, dadas as diferenças linguísticas e culturais ou iii) diversos serviços requerem simultaneidade na produção e consumo, tornando necessário, portanto, que a empresa fornecedora mantenha um unidade local.

Além disso, os serviços frequentemente demandam trabalho específico que demanda habilidades específicas. Isso os torna menos suscetíveis de capturar economias de escala do que, por exemplo, a produção de manufaturas.

Essas peculiaridades da produção e comercialização de serviços, associadas à característica de que as barreiras ao seu comércio são predominantemente associadas a legislações e práticas internas de cada país, fazem com que as transações em serviços possam ser influenciadas por elementos como a migração de fatores produtivos e a produção em cadeias de valor.

Aqui não se trata de considerar os chamados “Modo 3” (presença comercial – oferta de serviços de parte de um profissional estabelecido em um país no território de outro país) ou “Modo 4” (presença de pessoas naturais – serviços ofertados por nacionais de um país no território de outro país) da Organização Mundial do Comércio, mas simplesmente o aumento da disponibilidade de oferta de indivíduos de outros países, que tomaram a decisão de migrar.

Suponha que os profissionais sejam pagos segundo sua produção marginal, num modelo com dois países. Isso pode ser representado como na figura a seguir. Os gráficos mostram a quantidade de trabalho no eixo horizontal e o produto marginal no eixo vertical.

Suponha que o País A tem um estoque inicial de 0LA e o País B um estoque de OLB. 0LA é claramente maior que OLB: o fator mão-de-obra é mais abundante no País A do que em B. O fator trabalho é mais barato em A. Isso é representado pelo nível de remuneração inicial em A, correspondente a wA, mais baixo do que o salário médio wB, pago aos trabalhadores no País B.
Suponha que não existam restrições à migração. A informação relativa a esse diferencial de remunerações motivará os trabalhadores do País A a migrarem para o País B.

À medida em que os trabalhadores migrem do País A para o País B, o número de trabalhadores no País A será reduzido para OL’ A < OLA, ao mesmo tempo em que haverá maior disponibilidade de trabalhadores no País B: sua força de trabalho aumentará de OLB para OL’ B.

Como resultado da menor disponibilidade de trabalhadores no País A, o fator trabalho se tornará mais caro e os ganhos com salário serão elevados de wA para w’ A. Pelo mesmo processo, e em sentido inverso, a maior disponibilidade de trabalhadores no País B tenderá a reduzir o nível de salário médio para w’ B.

É mais provável que nem w’ A nem w’ B sejam atingidos, uma vez que por hipótese não há restrições ao movimento de trabalhadores entre os dois países, e é razoável supor alguma reversão do processo migratório.

Em teoria, haverá algum ponto de equilíbrio intermediário, resultante do movimento em ambas direções. Isso é provável que ocorra quando o estoque de trabalhadores no País A atingir LAE no País A e LBE no País B. De ser assim, as remunerações médias dos trabalhadores em ambos os países tenderão ao nível de wAE no País, semelhante ao nível de wBE no País B.

E o que isso tem a ver com o comércio de serviços?

Mais uma vez, a teoria do comércio de mercadorias pode ajudar. A influência do processo migratório sobre a composição do comércio externo é o foco do chamado Teorema de Rybczynski.

Segundo essa formulação, um aumento exógeno na oferta de um fator de produção, por exemplo, mão-de-obra, numa dada economia, fará com que aumente a produção e a exportação dos produtos em cujo processo produtivo o fator trabalho é empregado de maneira mais intensiva, pelo simples fato de que esse fator terá se tornado mais barato. Essa economia desenvolverá (ou intensificará) vantagem comparativa em produtos intensivos em trabalho.

A mesma lógica se aplica, evidentemente, se em lugar de migração de trabalhadores ocorrer um aumento significativo no influxo de capital: a produção e as exportações do país se tornarão mais intensivas em capital.

Essa lógica pode ser adaptada a um movimento de número expressivo de trabalhadores, de tal modo que isso venha a afetar a estrutura produtiva da economia receptora. Da mesma forma, algo nessa mesma linha pode ser inferido para o caso de movimentos migratórios de trabalhadores com qualificação específica, como advogados ou engenheiros.

Um exemplo de migração com efeito sobre a prestação de serviços é o comércio de atletas. Em alguns países a seleção nacional, por exemplo, de futebol, é composta por indivíduos nascidos em outros países. Em alguns casos, tem sido a presença de jogadores estrangeiros que possibilitou alguns times a adquirirem dimensão internacional. Um exemplo da lógica de Rybczynski.
Trabalhadores migrantes podem substituir trabalhadores nativos no desempenho de atividades no exterior, por exemplo, gerando um efeito de redução de custos que pode contribuir para elevar a produtividade das empresas. Além disso, trabalhadores estrangeiros podem contribuir para reduzir custos comerciais, ao melhorar os fluxos de informação.

No que se refere especificamente à exportação de serviços, essa é uma atividade que pode demandar a superação de barreiras, como um melhor entendimento das idiossincrasias dos países de destino. Nesse sentido, os imigrantes provenientes desses países podem desempenhar um papel importante, ao contribuir para melhorar esse grau de conhecimento. A comercialização de serviços, ao demandar conhecimento do idioma e expressões locais, peculiaridades institucionais e práticas de outro país, pode se beneficiar de maneira expressiva da ajuda de migrantes.

Um estudo feito para o Reino Unido (Ottaviano/ Peri/ Wright (2015)) encontrou evidência empírica de que os imigrantes efetivamente ajudaram a reduzir custos, portanto a elevar a produtividade das empresas exportadoras. Ao proporcionarem conhecimento específico sobre seus países de origem, contribuíram para estimular exportações.

Segue-se, portanto, que o influxo de mão-de-obra numa economia estimula a exportação de serviços que são mais dependentes de custos do trabalho e de atributos específicos que podem ser proporcionados pelos migrantes.

Segundo o modelo de Rybczynski, é razoavelmente previsível que o país que absorve migrantes será beneficiado pela adaptação de sua pauta de exportações, e ganhará com a nova estrutura produtiva.

No caso das transações em serviços, isso se reflete nos menores custos para obter um conjunto de informações importantes para a comercialização. Num ambiente com dois países de tamanho distinto, isso significa que o país maior será mais provavelmente aquele que atrairá mão-de-obra, portanto tenderá a se beneficiar dos novos tipos de serviços que podem ser exportados.

Esta é uma dimensão adicional de análise que considera o diferencial de condições entre os países participantes do mercado internacional de serviços, e com isso enfatiza as diferenças no potencial de competitividade.

 

REFERÊNCIA

Ottaviano, G., Peri, G., Wright, G. (2015), Immigration, Trade and Productivity in Services: Evidence from UK Firms, NBER Working Paper # 21200, May