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Economia da Corrupção (II)

Em um post anterior começamos a discutir a abordagem que a economia faz daquilo que comumente (e muito vagamente) se denomina de “corrupção”. Aceitando provisoriamente uma aproximação intuitiva ao termo (veremos em outros posts a relevância e os problemas que uma definição mais específica introduz no debate) a pergunta que nós devemos colocar é:  por que a economia deveria ter “alguma coisa a dizer” sobre um tema que, em princípio, pareceria circunscrito à ética/moral e a aspectos legais?   Por um lado, a resposta é quase unânime entre economistas:  a corrupção tem desdobramentos em quesitos que fazem a essência de seu objeto de estudo:  crescimento, alocação eficiente de recursos, distribuição de renda, trade-off eficiência/equidade, etc..  Por outro lado, no debate cotidiano a corrupção adquiriu tal relevância que em muitas ocasiões é identificada como a raiz última da estagnação conjuntural e uma variável categórica para explicar o atraso do País.  Não existem elementos que permitam classificar as práticas ilícitas que diariamente são divulgadas como o principal fator do fracasso em matéria econômica.  Contudo, existem resultados encontrados na pesquisa empírica que atestam vínculos entre economia (especialmente crescimento) e corrupção.  Vamos a resenhar alguns deles.

Em um famoso paper, Mauro (1995) conclui que a corrupção tem um impacto negativo sobre o investimento privado e sobre o crescimento.  Explicita a conclusão com um exemplo bem ilustrativo. Se a burocracia estatal de Bangladesh tivesse os níveis de integridade do Uruguai seu investimento poderia se elevar em 5% enquanto o percentual de variação do PIB aumentaria 0,5% ao ano. Weil (1997) chega à conclusão que a corrupção eleva o grau de incerteza nos investimentos estrangeiros em um país, com efeito danoso sobre os mesmos, ensaiando também uma comparação: se Singapura, um dos países que as séries indicam como sendo um dos menos corruptos do mudo, tivesse os níveis de corrupção de México, isso seria equivalente a elevar a carga tributária em 32% sobre os investimentos oriundos do exterior.  Poderíamos nos estender nas citações bibliográficas, mas os nexos serão sempre os mesmos: existiria uma relação negativa entre crescimento e índices de corrupção. Contudo, lembremos que a existência de um nexo deixa em aberto a ordem de causalidade, aspecto que trataremos neste post nos próximos parágrafos.  

A alocação de recursos seria outro dos meandros mediante os quais as práticas de corrupção afetariam o crescimento.  Neste caso as interrelações (corrupção/alocação ineficiente de recursos) são as mais difusas e, muitas vezes, surpreendentes.  Por exemplo, Mauro (1998) encontra robusta evidência empírica sugerindo que quanto maior for o nível de corrupção de um país maior será o investimento público em setores (grandes obras de infraestrutura, por exemplo) nos quais a possibilidade de cobrar propinas seja maior.  Assim, seriam penalizadas áreas como educação, nas quais os espaços para tais práticas seriam mais reduzidos. Dessa forma, a alocação de recursos não teria como prioridade a eficiência, equidade, crescimento, etc., e sim a ampliação das fontes potenciais de cobrança de propinas Sem chegar a esses extremos, mesmo políticas que teriam como objetivo induzir maior taxa de crescimento podem ter como correlato a geração de práticas de corrupção que devem ser tidas como custos que alteram o balanço custos/benefícios.  Ades e Di Tella (1997) estudam o caso das denominadas políticas industriais e a eleição dos “campeões nacionais”.  Uma vez que a corrupção reduz o investimento, as medidas tendem a induzir o mesmo e, simultaneamente, abrem espaço para práxis ilícitas que podem chegar a comprometer boa parte dos ganhos que as políticas  impulsionaram (até 84% segundo os dados desses autores).  Nesse sentido, barreiras protecionistas, cotas de importação, etc. caminhariam na mesma direção, uma vez que, ao facilitar a geração de rendas em nichos específicos, criarão incentivos e disputas em torno da sua apropriação. Apropriação que pode ser disputada tanto por agentes do setor público (mediante propinas) ou como do setor privado (contrabando, mercado negro, etc.) (Kruguer (1974)).

Vemos, assim, que as raízes podem ser as mais variadas, até mesmo nobres, como acelerar o crescimento ou encorajar a industrialização.  Podemos imaginar uma situação na qual se objetiva uma aceleração do crescimento. Assume-se, então, um diagnóstico teórico, é estabelecida uma política pública em consonância e, como correlato, temos um espaço propício para o desenvolvimento de um mercado de propinas. Mesmo assumindo como apropriada a política escolhida (aceleraria a variação do PIB), parte desses ganhos seriam neutralizados pelo impacto negativo que a corrupção teria sobre os níveis de investimento.  Nesse caso, o balanço (positivo ou negativo) fica em aberto.  Mesmo em casos nos quais o objetivo do arcabouço legal consiste na correção de falhas de mercado (externalidades), pode-se quantificar o custo de não pretender corrigir essas falhas e comparar essa magnitude com a perda que representa a formação de uma burocracia imaginada para seu reparo, mas que configura um espaço aberto para a corrupção.  

Uma dinâmica similar pode ser deslanchada quando, no lugar de pretender induzir o crescimento, se pretende corrigir falhas de mercado.  Como salientam Acemoglou e Verdier (2000), impor restrições ou induzir condutas implica em vislumbrar controles com as conseguintes estruturas burocráticas, gerando custos diretos e a possiblidade de propinas.  Reduzir a eventualidade de corrupção pode elevar os custos (por exemplo, levando ao pagamento de salários de eficiência nas estruturas burocráticas), resultando em pesados complexos administrativos que, mesmo pagando elevados salários, não necessariamente eliminarão as possiblidades de pagamento de propinas nem contornarão inexoravelmente as falhas de mercado. 

Um caso bem diferente consiste em escolher setores prioritários ou arcabouços legais com o único propósito de gerar espaços capazes de disponibilizar rendas a serem disputadas. Nesse sentido, encontramos interpretações um tanto extremas, nas quais o objetivo último da maioria das normas legais, controles, etc. estaria associado à procura de geração de espaços nos quais é possível extrair rendas (propinas) por parte de agentes públicos (Cheung (1996)).  A hipótese de um comportamento rent-seeking é levada ao limite, uma vez que os burocratas não se aproveitariam das oportunidades abertas pela legislação para extrair rendas (propinas). Em realidade,  a própria legislação seria criada a fim de gerar rendas das quais posteriormente se assenhorariam. 

Como salientamos no post anterior, contudo, existe literatura sugerindo avaliar a corrupção dentro de um dado contexto.  Assim, em determinadas circunstâncias, o suborno à agentes públicos em âmbitos de regulamentação excessiva e mal desenhada seria benéfico para o desenvolvimento (ver bibliografia e citações no post anterior).  Nas palavras de Gray and Kauman (1998), uma frase poderia resumir esta perspectiva: a corrupção seria “….the “grease” that lubricates the “squeaky wheels” of a rigid administration”.

Contudo, se a corrupção pode afetar o crescimento através de diversos labirintos, seu perfil poderia também acentuar ou atenuar esses efeitos perversos. Assim, por exemplo, podemos estar diante de apenas um agente corrupto, de vários agentes que concorrem entre si ou de vários agentes em conluio.  Os modelos indicam que os resultados são diversos e, paradoxal ou contraintuitivamente, quanto mais caótico (menos centralizado) for o mundo dos agentes corruptos maior será o custo em termos de alocação de recursos.  Nas palavras de Canavesse (s/d): “…nos casos de corrupção estudados pode-se afirmar que o crime organizado é mau, mas o crime desorganizado é pior devido aos seus efeitos sobre a alocação de recursos”.  Um caso mencionado diversas vezes na literatura diz respeito ao desmoronamento dos países  Leste Europeu. Nos antigos regimes comunistas, um governo centralizado e forte “administrava” a corrupção.  A derrocada das estruturas do Estado na transição ampliou os agentes e desarticulou a sua centralização (devido à existência de governos frágeis e transitórios), fato que redundou em um ambiente caótico em termos de corrupção, com custos em termos de investimento (Sheilfer and Vishny (1993)).   Na medida em que as esferas de corrupção se multiplicam e superpõem, os custos de transação se elevam.  O tempo gasto nas negociações em distintas esferas governamentais (permissões, licenças, isenções, etc.)  dilata-se, aumentando custos e reduzindo investimentos.  

Além da diversidade de agentes corruptos (sua dispersão ou centralidade, sua coordenação ou não, etc.), uma outra variável que pode diferenciar a corrupção de um país (ou região) diz respeito à sua incerteza.  Em ambientes cuja corrupção é centralizada e sujeita a regras que são cumpridas, o grau de incerteza se reduz e o suposto impacto negativo da corrupção sobre o investimento é atenuado.  Campos, Lein and Pradham (2006) explicam, ao introduzir a variável incerteza, o aparente paradoxo dos milagres asiáticos.  Nessa região imperariam elevados índices de corrupção que, aparentemente, não impediriam a convivência com surpreendentes indicadores de crescimento e investimento.  Justamente, na medida em que as propinas e as regras do jogo da corrupção são conhecidas, estáveis e respeitadas, estas entram nos cálculos de investimento, elevando os custos, mas com risco reduzido.

Mas o ponto que permeia todos os trabalhos que acabamos de citar nos parágrafos anteriores implicitamente justifica o tratamento econômico da corrupção devido aos vínculos entre esta última e a alocação de recursos, investimento e crescimento.  Por diversos meandros (incerteza, custos, etc.), o pagamento de propinas acabaria reduzindo os níveis de crescimento, seja porque reduz o investimento seja porque induz uma alocação de recursos ineficiente. Nesse sentido, a relação entre os indicadores de corrupção (voltaremos sobre eles em próximos posts) e o nível de desenvolvimento é bem estreito: quanto maior for o nível de desenvolvimento de um país menor será seu grau de corrupção. Contudo, sabemos que correlação não significa ordem de causalidade ou as relações podem ser indiretas.  Assumamos, como hipótese, que o grau de corrupção tem a ver com raízes culturais como religião e existem evidências que sugerem que sociedades com tradição protestante parecem ser menos conivente com corrupção.  Nesse caso, podemos retornar, via corrupção, a Max Weber (religião→cultura→ética→investimento→crescimento). Porém, não podemos descartar, também, relações de causalidade contrárias.  Ou seja, o desenvolvimento econômico pode ter impacto sobre os indicadores de percepção de corrupção, como Treisman (2000) salienta.   Ou seja, sociedades economicamente estagnadas podem (controlando, inclusive, por fatores culturais como religião) induzir à corrupção: “Latin American countries are not significantly more corrupt than their Western European and North American counterparts once one controls for their lower economic development and less stable democracy” (Treisman (2000)).  Ou seja, a corrupção não seria a causa do baixo crescimento, senão o contrário, e existem evidências empíricas que sugerem que a relação de causalidade vai nesse sentido (Bai, Jayachandram, Malesky and Olken (2013)).

Em próximos posts direcionaremos nossas atenções a um aspecto crucial implícito (mas essencial) em todos os trabalhos empíricos: a definição de corrupção e sua medição.

Serviços, leis de Kaldor e eficiência schumpeteriana

A literatura econômica kaldoriana considera a indústria o setor mais dinâmico, responsável pela disseminação do progresso técnico e pela capacidade de geração de crescimento endógeno e autossustentado. Para essa literatura o setor de serviços não apresenta ganhos de produtividade e não é capaz de gerar crescimento econômico persistente (KALDOR, 1966).

No período recente cresceu internacionalmente a literatura que defende a existência de uma relação de interdependência entre o setor de serviços intermediários e a indústria. As evidências encontradas por esta literatura mostram que o crescimento da produção industrial depende do crescimento do setor de serviços intermediários, sendo a expansão deste setor que viabiliza o surgimento de inovações, o crescimento e o aumento da produtividade da indústria. A ideia principal é a de que no processo de mudança estrutural, atividades mais nobres dos setores industriais e de serviços, intensivas em tecnologia e conhecimento, co-evoluem. Na trajetória de desenvolvimento das nações, a partir de determinado momento histórico, faz-se necessária a existência de uma elevada simbiose entre indústria e serviços, na medida em que atividades manufatureiras passam a demandar mais serviços especializados.

No artigo “Contribution of services to economic growth: Kaldor’s fifth law?” Adilson Giovanini e Marcelo Arend (autores deste post) questionam a existência de uma nova lei de Kaldor. Esta lei evidenciaria que à medida que os países se industrializam e passam a fabricar produtos cada vez mais sofisticados, se elevaria a demanda por maior volume de conhecimento. O desenvolvimento de um setor de serviços intermediários, especializado no fornecimento de soluções tecnológicas e gestão deste conhecimento, viabilizaria a fabricação de manufaturas avançadas e complexas.

Esta hipótese foi testada através da estimação de modelos VAR em painel para oito países desenvolvidos (Japão, Estados Unidos, Dinamarca, Espanha, França, Reino Unido, Itália e Holanda) no período 1980-2009. Os resultados estimados corroboraram a hipótese levantada. O crescimento do setor de serviços intermediários contribui para o crescimento da produtividade industrial; do valor adicionado industrial per capita e da complexidade econômica dos países em análise. Com isto, dadas as devidas ressalvas, os resultados apresentam elementos iniciais favoráveis para a defesa de que os serviços avançados também atuam como um “motor do crescimento econômico”.

A partir dessas conclusões é possível explorar em mais detalhes o “espaço-indústria”, desenvolvido por Arbache (2012), com “pitadas teóricas” da literatura schumpeteriana e estruturalista. O espaço-indústria é constituído por quatro quadrantes que mostram diferentes processos de mudanças estruturais. No quadrante R1 a população é predominantemente rural e a agropecuária é o setor dominante. Neste quadrante o país se encontra preso na armadilha da renda baixa (RODRIK, 2014). Em perspectiva schumpeteriana, tal como Dosi, Pavitt e Soete (1993), podemos derivar que países nesse estágio de seu desenvolvimento possuem exclusivamente eficiência ricardiana, pois a alocação de fatores se realiza em perfeita concordância com o princípio das vantagens comparativas estáticas.

Figura 1 – Espaço-Indústria

Fonte: Adaptado de Arbache (2012)

 

 

 

 

 

 

 

O quadrante R2 é caracterizado pela crescente demanda por produtos industriais básicos e pelo desenvolvimento de uma indústria de baixo valor adicionado e serviços gerais. Nessa trilha, muitos países superam a armadilha da pobreza, com crescimento acelerado proporcionado por um processo de industrialização. As clássicas leis de Kaldor explicam perfeitamente o caminho percorrido até o quadrante R2. Também, poderíamos considerar que nesse processo a eficiência keynesiana funcionaria como um “motor” do crescimento da renda per capita. A condição de eficiência keynesiana implica que a estrutura produtiva abarque cada vez mais ramos que tenham elevada elasticidade-renda da demanda. Isso quer dizer que o país está internalizando setores nos quais a demanda e os mercados crescem rapidamente, abrindo, consequentemente, oportunidades de vendas e de lucros maiores (DOSI; PAVITT; SOETE, 1993). Aliada ao processo de industrialização, a diversificação produtiva amplia-se, conforme demonstrado por Imbs e Wacziarg (2003).

A passagem para o quadrante R3 e deste para o R4 é um caminho que poucos países conseguiram fazer. Muitos países entram em relativa estagnação de seu nível de renda per capita nesse estágio (armadilha da renda média), inclusive apresentando regressão de sua estrutura produtiva, fenômeno associado ao processo de desindustrialização prematura.

Ademais, a região R4 representa o estágio mais avançado do desenvolvimento industrial. Neste quadrante, o processo de expansão da densidade industrial continua e é acompanhado pela existência de demanda mais do que proporcional por serviços intensivos em conhecimento, ao passo que a participação da indústria “tradicional” declina (ARBACHE, 2012). No quadrante R4, se encontram os países industrializados, que possuem renda elevada. Seguindo a linha argumentativa de Imbs e Wacziarg (2003), este quadrante também é caracterizado por relativo retorno à especialização produtiva. A demanda por serviços avançados cresce, de modo que estes países se caracterizam pela fabricação de serviços conectados a manufaturas de elevada complexidade econômica. Pode-se defender, a partir das conclusões de Rodrik (2014), que os países que migram para os quadrantes R3 e R4 são aqueles que conseguiram desenvolver as capacitações necessárias para o desenvolvimento do setor de serviços intermediários e produtos complexos. O “segredo” da prosperidade de alguns países em detrimento dos demais se encontraria em capacidades organizacionais, de distribuição do conhecimento entre os trabalhadores e de utilização coletivamente de volumes maiores de conhecimento.

É nesse momento que consideramos que eleva-se a necessidade de maior simbiose entre a indústria e o setor de serviços, conforme exposto no inicio desse artigo. A saída do quadrante R2, em direção ao R3 e R4, pressupõe a conquista da eficiência schumpeteriana. A eficiência schumpeteriana supõe que existam, na estrutura produtiva, setores nos quais o progresso técnico e os ganhos de produtividade são especialmente elevados. A definição de eficiência schumpeteriana prescreve um padrão de especialização baseado na exportação de produtos para os quais se identifique um elevado grau de oportunidade, apropriabilidade e cumulatividade tecnológica (DOSI; PAVITT; SOETE, 1993). Stojkoski et al. (2016) mostram que os países que apresentam maior exportação de serviços apresentam índices mais elevados de complexidade. Ademais, seus resultados mostram que as economias cuja pauta de exportação é baseada em serviços têm estrutura produtiva mais complexa e maior potencial de crescimento no longo prazo.

Sociedades complexas, com estruturas produtivas complexas, possuem eficiência schumpeteriana. São países que enfrentaram seus processos de desindustrialização, porém sem estagnação de seus níveis de renda. Tais processos deram-se com elevação da densidade industrial e crescimento do setor de serviços intermediários. Portanto, as leis de Kaldor também são válidas para economias com elevada participação do setor de serviços no produto e no emprego, desde que possuam estruturas produtivas complexas e com eficiência schumpeteriana.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARBACHE, J. Industrial-Space and Industrial Development [Mimeo]. Departamento de Economia, Universidade de Brasília, 2012.

DOSI, G.; PAVITT, K.; SOETE, L. La economía del cambio técnico y el comercio internacional. México: Consejo Nacional de Ciencia y Tecnología, 1993.

GIOVANINI, AdilsonAREND, Marcelo. CONTRIBUTION OF SERVICES TO ECONOMIC GROWTH: KALDOR’S FIFTH LAW?. RAM, Rev. Adm. Mackenzie [online]. 2017, vol.18, n.4, pp.190-213. ISSN 1678-6971.  http://dx.doi.org/10.1590/1678-69712017/administracao.v18n4p190-213.

IMBS, J. e WACZIARG, R. Stages of diversification. American Economic Review, v. 93; n. 1, p. 63-86, 2003.

KALDOR, Nicholas. Causes of the slow rate of economic growth of the United Kingdom: an inaugural lecture. Cambridge University Press, 1966.

RODRIK, Dani. The past, present, and future of economic growth. Challenge, v. 57, n. 3, p. 5-39, 2014.

STOJKOSKI, Viktor; UTKOVSKI, Zoran; KOCAREV, Ljupco. The Impact of Services on Economic Complexity: Service Sophistication as Route for Economic Growth. PloS one, v. 11, n. 8, 2016.

Os serviços podem substituir as manufaturas como mecanismo de desenvolvimento?

A indústria manufatureira cumpriu papel especial como veículo para a criação de empregos, aumentos de produtividade e crescimento nas economias não avançadas a partir de meados do século passado. Primeiro na América Latina, seguida pela Ásia e pela renovação dos sistemas de produção na Europa Oriental, a expansão dos níveis de produção manufatureira serviu como canal para transferir mão-de-obra de ocupações de baixa produtividade para atividades usando tecnologias mais modernas provenientes do exterior.

A facilidade de transferência através das fronteiras adquirida pelas tecnologias de fabricação, particularmente de segmentos intensivos em mão-de-obra na era recente de fragmentação da produção em cadeias de valor, tornou possível tal processo. Uma vez determinadas condições locais mínimas estivessem presentes, a convergência em direção aos níveis de produtividade nos países da fronteira na origem se dava relativamente mais rápida do que em outros setores.

Duas questões estão agora lançando dúvidas sobre as possibilidades de replicar ou aprofundar esse processo. Primeiro, a mesma natureza “descomprometida” da produção manufatureira também leva a sua alta sensibilidade em relação a pequenas mudanças nos fatores de competitividade, como custos trabalhistas, taxas reais de câmbio, ambiente de negócios, infraestrutura e outros. Ao longo do tempo, isso levou a ondas de relocalização e concentração espacial em países específicos do mundo em desenvolvimento para cada uma das camadas de sofisticação nas cadeias de valor. O gráfico 1 descreve a grande variação de experiências com o emprego e o valor agregado bruto na indústria entre os mercados emergentes.

Em segundo lugar, as mudanças tecnológicas atualmente em curso tendem a reduzir o peso dos custos do trabalho e ameaçam reverter a motivação inicial para a transferência de etapas da fabricação para economias não avançadas (Arbache, 2016) (Canuto, 2017). A experiência histórica recente de uso das exportações de manufaturados como plataforma para sustentar elevado ritmo de crescimento se tornará mais difícil de expandir, sustentar ou iniciar. No mínimo, pode-se dizer que requisitos em termos de infraestrutura, ambiente de negócios, disponibilidade local de trabalhadores qualificados e outros fatores de competitividade estão aumentando.

As atividades baseadas em recursos naturais oferecem oportunidades de atualização tecnológica, aumentos de produtividade, exportações e – volátil, mas positivo – crescimento econômico, mas não a criação maciça de empregos como na atividade fabril. Segue-se a questão sobre a possibilidade de serviços substituírem a manufatura em termos de quantidade e qualidade de criação de emprego nos países em desenvolvimento. As mudanças tecnológicas em curso levariam a uma maior transferibilidade das tecnologias de produção e comercialização dos serviços? Em que medida ter bases locais de produção manufatureira ainda importaria como condição prévia para a produção de serviços? Essas são algumas das questões abordadas por Hallward-Driemeier e Nayyar (2017).

Hallward-Driemeier e Nayyar chamam a atenção para o fato de que avanços nas tecnologias de informação e comunicação (TIC) tornaram alguns serviços – financeiros, de telecomunicações e de negócios – cada vez mais comercializáveis através das fronteiras. Esse processo viabilizou a difusão da tecnologia e a possibilidade de exportar em adição ao atendimento da demanda local.

Também destacam o alto potencial de economias de escala em serviços altamente impactados pelas TIC, especialmente porque os custos marginais incorridos pela adição de unidades à produção são muito baixos. A intensidade de P&D aumentou, podendo-se apontar como exemplo o caso das despesas com serviços empresariais, onde os gastos aumentaram de 6,7% em 1990-95 para níveis próximos de 17% em 2005-10.

Por um lado, como na atividade fabril, as oportunidades de aprendizado tecnológico local e de aumento da produtividade nas economias em desenvolvimento podem ser criadas pelo aumento das possibilidades de transferência de tecnologia e de comerciabilidade internacional. Por outro lado, ao contrário da fabricação intensiva em mão-de-obra, tais serviços não devem servir como fonte abundante de empregos para mão-de-obra não qualificada.

Os serviços de baixo custo que permanecem usuários de mão-de-obra não qualificada são menos propensos a criar oportunidades de ganhos de produtividade. Com exceções – os autores mencionam serviços de construção e turismo – há menos escopo no setor de serviços para produzir simultaneamente altos aumentos de produtividade e criação de emprego para mão-de-obra não qualificada, pelo menos em comparação com o desenvolvimento liderado por produção manufatureira nas décadas anteriores.

E quanto à conexão entre produção manufatureira e serviços? Além dos aumentos da demanda por serviços autônomos com alta elasticidade renda, quais são as perspectivas para a demanda por serviços acompanhando a atual transformação da manufatura? Em que medida a oferta e a demanda desses serviços relacionados à fabricação se beneficiam da presença local de bases manufatureiras?

Hallward-Driemeier e Nayyar chamam a atenção para a crescente “servicização” da fabricação, uma vez que a última está cada vez mais “incorporando” e “embutindo” serviços, enquanto a participação da fabricação de componentes e a montagem final no valor adicionado diminuem (Gráfico 2)

A relevância dos serviços incorporados em produtos manufaturados aumentou como insumos (design, marketing, custos de distribuição, etc.) ou facilitadores de comércio (serviços de logística ou plataformas de comércio eletrônico). Além disso, os serviços também estão crescentemente embutidos, ou seja, fornecidos mediante ou adicionados a produtos manufaturados. Servem de ilustração os aplicativos para dispositivos móveis e soluções de software para fábricas “inteligentes”. Hallward-Driemeier e Nayyar concluem (p.162):

“Embora uma gama de serviços “autônomos” e alguns serviços embutidos possa oferecer oportunidades de crescimento sem um núcleo de fabricação, a servicificação do setor manufatureiro ressalta a crescente interdependência entre os dois setores. Dada essa profunda interdependência, as políticas que melhoram a produtividade em diferentes partes da cadeia de valor resultarão no todo ser maior do que a soma de suas partes. A agenda, portanto, deve ser a de países se prepararem para usar sinergias em todos os setores de modo a participar de toda a cadeia de valor de um produto, além de explorar oportunidades individuais para além da produção manufatureira.”

Em suma, os desafios para alcançar simultaneamente o emprego de trabalhadores não qualificados e aumentos substanciais de produtividade estão se tornando mais altos. Além disso, os fatores horizontais de produtividade e competitividade – incluindo a acumulação local de capacidades, baixos custos de transação, melhoria da infraestrutura, etc. – que foram cruciais em todas as experiências de desenvolvimento industrial amplo e profundo estão agora estendidos aos serviços. Há mais complementaridade do que a substitutibilidade entre fatores de produtividade e competitividade que afetam as manufaturas e os serviços. Não há alternativa senão melhorar o suporte horizontal na economia local se um país em desenvolvimento quiser desfrutar de qualquer um destes como motores de crescimento.

Otaviano Canuto é diretor-executivo no Banco Mundial, para Brasil, Colômbia, Equador, Filipinas, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago. Foi vice-presidente no Banco Mundial e no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e diretor-executivo no Fundo Monetário Internacional (FMI). As opiniões expressas neste artigo são suas.

A transformação econômica da China e os serviços

A China experimenta a mais formidável transformação econômica que se tem registro. De uma economia rural e agrária, a China passou a ser uma economia industrial e voltada à exportação de bens industriais. Reformas políticas combinadas com políticas de realocação da mão-de-obra rural para movimentar fábricas e com políticas vigorosas de expansão do crédito, dos investimentos e das infraestruturas levaram o país à condição de segunda maior economia do globo em menos de duas gerações.

Mas o modelo de export-led strategy fortemente baseado em acumulação de capital e em trabalho barato está chegando ao fim. As taxas anuais de crescimento do PIB passaram da ordem de 10-12% para cerca de 6,5% e deverão caminhar para um patamar de 4,5-6,5% nos próximos anos.

A China está promovendo nova reestruturação da sua economia. Agora, em direção a uma economia com maior participação dos serviços e com maior protagonismo da ciência e da tecnologia. Busca-se organizar e preparar a economia para a etapa mais avançada do desenvolvimento econômico. Ao invés de fábricas de cimento e de aço, fábricas de bens sofisticados com alto conteúdo de inovações embarcadas e produzidos com sistemas avançados de gestão e produção. Ao invés de foco em serviços de consumo, foco em serviços sofisticados de apoio aos setores industrial, agrícola e de mineração que, de um lado, reduzam custos e, de outro, agreguem valor e diferenciem os produtos. Plantas industriais tecnologicamente defasadas, intensivas em mão-de-obra, poluidoras e que consomem muita água estão sendo fechadas ou relocalizadas em outros países. De “fábrica do mundo” a China busca ser produtora de bens e serviços altamente sofisticados e gestora de cadeias globais de valor.

O caminho será longo, mas indicadores já mostram sinais de que a transformação está em curso.

O gráfico abaixo apresenta indicadores selecionados da economia chinesa. A despeito de ligeira queda, a participação da manufatura no PIB segue elevada, por volta dos 30-35%, muito acima do padrão dos países avançados, que é de metade daquele patamar.

Gráfico – China, indicadores selecionados

Notas sobre o gráfico: Densidade industrial: valor adicionado da manufatura per capita (em US$), eixo da esquerda. Fonte: calculado com dados do World Development Indicators.

%Manuf-PIB: participação percentual da manufatura no PIB, eixo da direita. Fonte: World Development Indicators.

%PBS-PIB (professional business services): participação percentual dos serviços comerciais profissionais no PIB; consideram-se os serviços especializados destinados às cadeias de produção tais como correios e telecomunicações, intermediação financeira, atividades imobiliárias comerciais, aluguel de máquinas e equipamentos, TI e atividades correlatas, P&D e outras atividades comerciais profissionais, eixo da direita. Fonte: World Input-Output Database.

%Serviços-PIB: participação percentual dos serviços no PIB, eixo da direita. Fonte: World Development Indicators.

A densidade industrial teve aumento contínuo e absolutamente espetacular. Entre 1979 – ano do início das reformas – e 2014, a densidade aumentou nada menos que 29 vezes, o que mostra uma crescente capacidade da indústria chinesa de se aprimorar e agregar valor.

O aumento da participação do setor de serviços não veio em detrimento da indústria. Pelo contrário, como mostram evidências empíricas (Arbache 2012, 2015, 2016), o aumento da densidade industrial resulta do aumento da relação sinergética e simbiótica da indústria e dos serviços para criar valor. O rápido aumento dos serviços comerciais profissionais (PBS) no PIB, que passou de 12% para 18% entre 2000-2014, é uma expressão desse movimento.

A tendência é que o setor de serviços siga crescendo seu protagonismo na economia chinesa, seja para atender à nova etapa do desenvolvimento econômico, seja para atender à crescente demanda do mercado interno urbano de consumo. É improvável, porém, que o setor de serviços atinja participação no PIB comparável ao dos países avançados, mas é muito provável que o PBS cresça de forma desproporcional.

Multa da Google, rendição da Nike e desenvolvimento econômico: o que há em comum?

Em 27 de junho, o órgão de defesa da concorrência da União Europeia (UE) anunciou uma multa recorde de € 2,42 bilhões para a Google. Trata-se da maior multa já aplicada pela UE para uma empresa por conduta anticompetitiva. A sanção se deveu por abuso de posição dominante em buscas na internet para favorecer o próprio comparador de preços para compras online, o Google Shopping. A Google também responde a dois outros processos na UE. Um relacionado à sua ferramenta de publicidade e outro relacionado ao Android, que já vem com diversos aplicativos próprios pré-instalados. Em ambos, a acusação é a mesma: prática anticompetitiva.

Por anos, a Nike se recusou a vender seus produtos no marketplace da Amazon por entender que este não seria o melhor caminho para a imagem da marca e para o seu modelo de negócios. Recentemente, porém, a Nike jogou a toalha e se associou ao gigante do e-commerce para comercializar os seus produtos.

O que essas duas estórias aparentemente dissociadas têm em comum? A explosiva importância da economia digital para determinar os contornos da economia no século XXI e os meios utilizados pelos grandes operadores para ampliar e manter o seu domínio.

Conforme indicou a UE, a Google usa e abusa de expedientes não competitivos para seguir ampliando a fatia da sua plataforma em vários segmentos da Internet. Ainda que isto possa lhe custar sanções, não é óbvio que a Google abandonará práticas competitivas questionáveis, já que os benefícios podem ser enormes. Já a Amazon, através de uma formidável capacidade de ação, ameaça sem cerimônia o varejo de rua não apenas dos Estados Unidos, mas, também, de outros países.

Há, definitivamente, uma transformação econômica em curso associada à economia digital e empresas com ambições globais sabem que é preciso se preparar para ela sob pena de ficarem pelo caminho. Ou de se tornarem dependentes da plataforma de alguma outra empresa.

Neste momento, observam-se plataformas segmentadas e plataformas mais amplas. Dentre as plataformas segmentadas incluem-se a PayPal, a SAP e outros serviços de propósitos específicos que se tornaram influentes em suas áreas, inclusive contribuindo para determinar padrões e regras.

Já as plataformas amplas atuam em frentes diversas e oferecem cada vez mais um leque de bens e serviços de A a Z . Ali estão as temidas superestrelas, como a Amazon e a Google. Os efeitos-rede e plataforma que essas empresas têm sido capazes de criar são de tal monta que tornou-se quase impossível contestá-las, ao menos no horizonte previsível. Isto explica, ao menos em parte, as práticas não-competitivas ousadas da Google e a capitulação da Nike.

Esse movimento também ajuda a explicar o definhamento dos unicórnios, startups que chegaram a valer US$ 1 bilhão ou mais e que, até recentemente, incomodavam as superestrelas. A PayPal, por exemplo, está perdendo clientes para a Amazon simplesmente porque uma plataforma de pagamentos segmentada tem menos condições de competir com um sistema de pagamentos próprio já “pré-embarcado” numa plataforma geral.

O que está em jogo nem sempre é a melhor prestação de serviços para o consumidor ou mesmo o melhor algoritmo, mas o modelo de negócios mais adaptado ao  agressivo ambiente que se desenrola. Por isto, o futuro da PayPal é incerto.

O que tudo isto tem a ver com o desenvolvimento?

Haverá um acelerado processo de consolidação de vários segmentos que estão direta ou indiretamente expostos à economia digital dando origem a conglomerados sem precedentes com enorme poder de ação e influência global.

A despeito da briga de foice que se trava entre empresas dos Estados Unidos e de outros países avançados pela dominância de mercados digitais, esta estória não é neutra do ponto de vista do desenvolvimento. Afinal, como temos reiterado neste blog, o mundo está sendo dividido entre usuários de um lado, e desenvolvedores, distribuidores e gerenciadores de commodities digitais de outro.  E neste último grupo estão países como Estados Unidos, Alemanha e Japão, e, correndo por fora, a China.

Esse movimento sugere fortemente a necessidade de governos e reguladores se atentarem para o canto da sereia das supostas belezas da convergência regulatória e da liberalização dos mercados digitais sem terem uma estratégia de longo prazo.  Diferentemente de mercados convencionais, como  automóveis, têxteis e produtos químicos, a economia digital não é mais do mesmo. Ao tempo em que é uma grande ameaça para aqueles que ficarem para trás em áreas variadas como perspectivas de crescimento econômico, criação de empregos, carga tributária, privacidade e proteção de dados e segurança nacional, a economia digital ainda oferece enormes oportunidades, justamente em razão da sua natureza tecnológica.

China e Índia já entenderam isto e trabalham com estratégias bem definidas tanto para protegerem seus interesses como para contestarem mercados e se tornarem players globais.

O caminho a seguir é o de desenvolver políticas públicas que identifiquem e removam obstáculos e criem oportunidades para o país participar da economia digital como desenvolvedor, distribuidor e gerenciador de commodities digitais e não apenas como usuário.

Fortalecer o conhecimento das crianças e jovens em matemática, ciências da vida, machine learning, programação e desenvolvimento de algoritmos e línguas estrangeiras; criar um ambiente favorável para o surgimento, crescimento e atração de startups; e colaborar com centros de pesquisa estrangeiros e com empresas multinacionais de economia digital devem ser parte de uma agenda mais extensa e ambiciosa que proteja os interesses do Brasil ao tempo em que otimiza o seu potencial de voos mais altos na economia global.

As cidades no contexto da transformação digital

No cenário de mudança da sociedade para a era da informação, duas forças estão em ação induzindo mudanças estruturais na economia, com potenciais efeitos espaciais. O rápido desenvolvimento das tecnologias digitais e o uso de informação nos processos produtivos estão transformando o mercado de trabalho, os modelos de produção e de negócios. Também, o declínio do crescimento demográfico impactará o crescimento econômico no futuro. Nesse contexto, cabe a pergunta sobre qual o papel do espaço na nova produção do século XXI e o seu impacto no desenvolvimento de cidades, regiões e países.

No fim do século XIX, o progresso tecnológico e a queda dos custos de distância – transportes de bens, informação e interpessoal – intensificou o comércio inter-regional e mundial e também a fragmentação da produção no espaço. Associados ao crescimento demográfico e à abundante oferta de mão de obra, esses fatores induziram o desenvolvimento de grandes cidades e regiões, aproveitando os ganhos de eficiência na produção, nos transportes, nos mercados de trabalho e no intercâmbio de informações, dando forma ao desenvolvimento da sociedade industrial que adquire feições mundiais no século XX.

No século XXI, novas tecnologias de comunicação e processamento de informações e a criação de novos produtos digitais estão redesenhando os sistemas produtivos e a natureza das atividades econômicas. A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) afirma que existem duas tendências de transformação da produção causadas pelas tecnologias digitais: (i) custos decrescentes a partir da sua maior difusão e utilização, e (ii) combinação de diferentes tecnologias da informação e comunicação (TIC) e sua convergência com outras tecnologias.

Nos países avançados, a produção industrial tem se tornado mais complexa, adaptada a um número reduzido de trabalhadores de alta qualificação onde o setor de serviços, especialmente os serviços digitais, adquire mais importância. Hoje interessa não mais o produto em si, mas a solução – ou serviço – a ele integrado. Estamos passando de uma sociedade industrial para uma sociedade informacional, de um consumo em massa de produtos padronizados para um consumo de produtos customizados.

Junto à transformação digital da economia outra questão que se apresenta é a do baixo crescimento demográfico. O crescimento econômico a partir de 1960 em 56 países que sustentaram uma taxa de pelo menos 6% durante uma década ou mais foi acompanhado por um crescimento da força de trabalho – população acima de 15 anos – de 2,7% ao ano. No entanto, observa-se uma queda cada vez mais acentuada do crescimento demográfico na Europa, Japão, Estados Unidos e também nas economias emergentes, indicando um maior envelhecimento da população mundial com potenciais reflexos para o crescimento no longo prazo da força de trabalho mais jovem, do consumo e das cidades.

Gráfico 1 – População mundial (em azul) e seu crescimento (em vermelho), 1750-2100

Fonte: Max Roser and Esteban Ortiz-Ospina (2017) – ‘World Population Growth’. Publicado online em OurWorldInData.org.

Em setores da Indústria 4.0, na qual os processos produtivos são intensivos no fluxo de informações e conhecimento, a proximidade física a matérias primas, oferta abundante de mão-de-obra ou mercados consumidores podem perder importância como forças de aglomeração, pois insumos e produtos podem ser transportados por via remota a custos próximos a zero. Isso implica que empresas e trabalhadores poderiam se dispersar no espaço, buscando áreas com mais amenidades e dotadas de infraestrutura adequada, longe dos grandes centros urbanos congestionados, com alto custo de moradia, poluição e alta criminalidade.

Contudo, na nova economia, as tecnologias digitais e a informação são os fatores críticos para a produtividade e a competição das empresas – devido à sua rápida obsolescência. Mesmo contando com a comunicação remota, empresas e trabalhadores tenderiam a se localizar uns próximos aos outros devido à maior interação física potencializada nas aglomerações, por exemplo, junto a universidades e centros de pesquisa. Devido à demografia e à natureza da economia digital, no entanto, provavelmente, não haverá, no futuro, condições para a formação de cidades muito grandes.

Na medida em que cidades menores podem não oferecer toda a gama de serviços demandados por trabalhadores e empresas tecnológicas, que necessitam de escala para se viabilizarem – serviços financeiros, empresariais (design, marketing, consultorias especializadas, etc.), cultura e lazer –, a proximidade aos grandes centros urbanos ainda será importante.

Embora essas tendências possam sugerir que a formação de grandes cidades poderá perder força nas sociedades informacionais, os sistemas urbanos continuarão a atuar com força no progresso tecnológico e no desenvolvimento das inovações, mas agora sob uma nova ordem. Cidades hiperconectadas e integradas a uma produção centrada em serviços digitais e no intercâmbio de conhecimento estabelecerão uma dinâmica própria, formando redes globais de relacionamentos sem uma coordenação centralizada. Este é um cenário possível. Assim, não é irreal pensar em cidades como entidades discretas que competem e colaboram entre si, independentemente dos Estados a que pertencem.

Paulo C. Avila é Mestre em Planejamento Urbano pela Universidade de Brasília. Professor do Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Brasília. Atualmente é Coordenador do Programa Nacional de Capacitação das Cidades, do Ministério das Cidades.

O processo de industrialização dos serviços

Analisando a demanda do consumidor, verifica-se que há uma mudança no seu padrão de consumo. Cada vez mais, os consumidores direcionam suas preferências aos produtos tecnológicos, e, quanto mais próximo da atualidade (em anos), maior a demanda dos consumidores por serviços sofisticados, corroborando o que foi apresentado em Eichengreen e Gupta (2014).

Esse é um processo natural de evolução da economia, pois, uma vez que a renda dos indivíduos aumenta, as economias tornam-se mais complexas, e a demanda por serviços movidos à informação também aumenta, principalmente a demanda por serviços tecnológicos. Tal alteração nas preferências do consumidor requer que as empresas se adaptem, direcionando a sua produção industrial à fabricação de bens com elevada participação dos serviços. Esse processo de produção aqui será chamado de dPSS (density Product and Service Systems), que é uma extensão do PSS (Product and Service Systems).

Em um post anterior, foi apresentado o espaço-indústria. Nesse modelo, ao se chegar a um certo nível de desenvolvimento, as regiões R3-R4, as economias passam a observar uma relação crescentemente simbiótica e sinergética entre serviços e indústria. Nesse estágio, bens industriais passam a ter desproporcionalmente mais valor por terem muitos serviços “embarcados” na sua composição. Esse processo de “servitização” dos produtos industriais eventualmente evolui para o PSS e, finalmente, para o dPSS.

Figura 1: O processo de dPSS (density Product Service Systems)

 

Fonte: elaboração própria

De acordo com Vandermerwe e Rada (1988), o processo de servitização consiste na oferta de bens pelas indústrias manufatureiras, que buscam aumentar a participação dos serviços nos seus negócios. Os autores justificam que as empresas percebem as mudanças no padrão de demanda do consumidor e buscam agregar valor às suas principais ofertas utilizando os serviços para aumentar a sua competitividade.

O PSS (Product Service System), segundo Goedkoop et al (1999), é uma combinação integrada entre produtos e serviços que, assim como a servitização, engloba uma estratégia competitiva. Mas, além de ser orientado por serviços, o PSS também decorre de uma maior demanda pela sustentabilidade ambiental. O PSS é um caso particular da servitização e é orientada pela funcionalidade do produto gerado e não somente pela oferta do bem. Ou seja, a empresa fabrica o produto e em seguida transfere a responsabilidade de uso para o consumidor final.

Já o dPSS é um caso particular do PSS, pois ele também é um bem industrial com serviços incorporados na sua fabricação. Nesse processo, tanto o produto industrial quanto os serviços são essenciais para a composição do preço final do produto. Dados precisos sobre o dPSS são difíceis de ser obtidos, uma vez que, com raras exceções, não se encontram informações suficientemente desagregadas para se saber ao certo o quanto de serviços está embutido no bem industrial.

O dPSS possui as seguintes características:

  • Assim como o PSS, o dPSS é caracterizado pela servitização dos produtos e produtização dos serviços;
  • Quanto mais serviços forem adicionados ao produto industrial, maior será o seu valor final;
  • Não há uma ordem cronológica do que é criado primeiro, se é o bem tradicionalmente industrial, ou se é o serviço a ser desenvolvido nesse produto, pois o importante é o resultado final da união;
  • Um choque positivo de dPSS direciona a economia ao desenvolvimento econômico;
  • E, o mais importante, o dPSS está diretamente relacionado ao processo descrito pelo espaço-indústria, no sentido de que as economias se desenvolvem passando pelo processo de dPSS mas, para isso, precisam alcançar a região R4, mesmo que por um atalho.

Entender o funcionamento do dPSS pode ser importante para melhor compreender o futuro do crescimento econômico, especialmente para os países que chegarem tarde na competição industrial e precisam buscar um atalho para o desenvolvimento. O fato de a indústria em quase todo o mundo em desenvolvimento e mesmo em muitos países ricos não estar em um estágio avançado de produção não implica que ela tenha perdido importância. O que ocorre é que o próprio conceito de indústria está mudando e o dPSS passará a ser cada vez mais a norma do setor.

Essa crescente demanda por serviços tecnológicos não pode ser desconsiderada. Caso as empresas e os trabalhadores não consigam acompanhar esse movimento, poderá haver, em um futuro próximo, um desequilíbrio de mercado. Tal desequilíbrio poderá gerar uma tendência de aumento do preço relativo dos serviços, pois, com a escassez de mão de obra em um setor altamente demandado, a tendência é que o salário desse setor se eleve e, como o salário sobe, os produtos se tornam mais caros para serem produzidos, implicando potencialmente no problema de Baumol cost disease.

Por uma política nacional voltada para o desenvolvimento de capacidades

Por Adilson Giovanini, Janaína Führ e Marcelo Arend

Schumpeter (1939) mostra que o surgimento de novas combinações resulta na obtenção de lucros extraordinários. Elas retiram a economia do fluxo circular, fazendo-a crescer. Em adição, Perez e Soete (1988, p. 498) argumentam que o modo como as tecnologias evoluem e se difundem pode explicar grande montante das diferenças estruturais observadas entre os países. De forma mais rigorosa, pode-se afirmar que a capacidade de crescimento destes está diretamente ligada à sua capacidade de inovação. Novas combinações, por sua vez, dependem do conjunto de conhecimentos abarcados e sobre os quais os trabalhadores de cada país possuem domínio.

Para a literatura de inovação é clara a relação íntima existente entre o desenvolvimento de inovações e a ocorrência de mudanças estruturais nos países. A ocorrência de mudanças estruturais se deve, em grande monta, ao desenvolvimento de novas tecnologias que emergem na forma de paradigmas tecnológicos (DOSI, 1982). Ademais, a forma como cada paradigma tecnológico surge e se propaga para as demais economias explica a capacidade de realização de catching up dos países e a forma como estes se desenvolvem (PEREZ; SOETE, 1988, p. 498).

Conforme demostrado pela literatura de inovação, o desenvolvimento de novas tecnologias exige o surgimento de novas competências produtivas. Estas são particularmente relacionadas ao surgimento de funções inovadoras. O avanço tecnológico tende a ser cumulativo, favorecendo habilidades específicas.

Neste contexto, o crescimento das tecnologias digitais observado nas últimas décadas exigiu e continuará exigindo o desenvolvimento de novas capacidades entre os trabalhadores. Estas tecnologias provocaram perturbações no mercado de trabalho, que resultaram na necessidade de reestruturação profunda do sistema econômico. Como resultado, surgiu demanda crescente por profissionais com competências até então não demandadas (OCDE, 2012).

Atualmente, o setor de tecnologias da informação e comunicação (TIC) se encontra no meio de uma fase de crescimento e inovação. Este inclui a adoção de diversas tecnologias emergentes, entre as quais se destacam a computação em nuvem; o uso de dispositivos móveis; a análise de “Big Data”; a segurança em TI; a micro e a nano eletrônica; e a adoção de tecnologias sociais em ambientes pessoais e empresariais.

A difusão das tecnologias para novas áreas como software para impressão em protótipos 3D; sistemas “inteligentes” de energia, infraestrutura e transporte, fabricação de novos semicondutores energeticamente eficientes; gerenciamento de dados e serviços de cloud computing deve impulsionar a demanda por novas capacidades entre os trabalhadores.

Nos próximos anos a continuidade do processo de difusão das novas tecnologias de comunicação propiciará a disseminação de todo um novo conjunto de inovações. Conforme enfatizado por estudo da Deloitte (2014), diversas tecnologias estão transformando consideravelmente a indústria e o modo como esta se relaciona com o setor de serviços. Entre estas se destacam robôs inteligentes; drones autônomos; sensores, nanotecnologias e impressoras 3D. A adoção destas novas tecnologias resultará em modificações profundas na indústria.

O termo “indústria 4.0” é utilizado para definir este novo estágio do desenvolvimento industrial, que não se restringe apenas à indústria, englobando a gestão e organização de toda a cadeia de valor. Outros termos utilizados para definir este novo estágio são “internet das coisas” (internet of things), “internet de tudo” (internet of everything) e internet industrial (industrial internet). Eles são utilizados para mostrar que a fabricação industrial está passando por uma transformação digital.

Como resultado da emergência destas tecnologias, os setores que requerem maior quantidade de profissionais com conhecimento em TIC são setores de serviços: TIC, finanças/seguros e serviços profissionais. Ademais, gestores, técnicos e trabalhadores de apoio de escritório necessitam de montante mais elevado de conhecimentos em TIC do que outros grupos ocupacionais.

A demanda por profissionais ocorre, principalmente, nas áreas de programação de software; engenharia e integração; e operações de negócios. A demanda por cientistas de dados que podem extrair informações úteis de grandes conjuntos de dados também é crescente, assim como a demanda por profissionais capazes de desenvolver aplicativos móveis. Esta atividade se encontra entre as que apresentam taxas mais elevadas de crescimento e onde se escondem mais oportunidades. Ela surgiu em 2008 e, e se expande rapidamente (OCDE, 2013).

Paralelo a isto, a Application Developers Alliance mostra quais são as habilidades mais demandadas entre os profissionais que atuam em atividades relacionadas a estas novas tecnologias. Ou seja, quais as habilidades que os países precisam disseminar entre os seus trabalhadores para conseguirem ser competitivos na era digital.

Via de regra, os países desenvolvidos estão adotando políticas para tentar internalizar estas atividades. Em seu artigo Computer programming and coding in schools – an emerging trend, o School Education Gateway mostra que, em 2014, matérias de programação  e codificação já faziam parte do currículo escolar de 12 países europeus (Bulgária, Chipre, República Checa, Dinamarca, Estônia, Grécia, Irlanda, Itália, Lituânia, Polônia, Portugal e Reino Unido). Ademais, outros sete países deste continente também pretendiam integrar o tema em seus currículos no futuro.

Apesar de estar sendo amplamente explorada pelos países desenvolvidos, a janela de oportunidades introduzida pela emergência destas novas tecnologias ainda se encontra aberta. Existem amplos espaços para inserção dos países em desenvolvimento. A adoção de políticas de desenvolvimento das capacidades demandadas por estas novas tecnologias se coloca como condição sine qua non para que estes países consigam ingressar no atual paradigma tecnológico e aumentar a sua participação no comércio global de bens e principalmente de serviços relacionados a estas novas tecnologias.

Kearney (2011) e Stephenson (2012) mostram que a emergência das novas tecnologias de comunicação está resultando em comércio crescente de serviços e gerando novas oportunidades em países que apresentam menor nível de renda. Segundo os autores, nove países latino-americanos são competitivos internacionalmente na produção de serviços offshore: México, Chile, Brasil, Costa Rica, Argentina, Jamaica, Panamá, Uruguai e Colômbia.

Uma das grandes limitações enfrentadas por estes países se refere à ausência das capacidades necessárias entre os trabalhadores. Contudo, a melhoria nos sistemas de comunicação e os menores custos (salários mais baixos) indicam que a adoção de políticas de desenvolvimento das capacidades demandadas, se corretamente adotada, pode resultar em crescimento significativo da participação destes países no comércio internacional de serviços.

Dada esta contextualização, surge a seguinte pergunta: quais são as medidas que o Brasil está efetivamente adotando para ingressar neste novo cenário marcado pela crescente digitalização das economias? Ele está adotando postura proativa e incentivando a aquisição das capacidades demandadas ou está perdendo esta oportunidade?

Infelizmente quando comparado a outros países poucas são as iniciativas, adotadas em território nacional, voltadas para o desenvolvimento das capacidades necessárias entre os trabalhadores. Tome-se como exemplo o Plano Ceibal (Conectividade Educativa de Informática Básica para o Aprendizado Online), iniciativa adotada pelo Uruguai que garante um notebook para cada aluno e que fornece aulas de programação, robótica e edição de vídeos.

Argumenta-se que, em parte, a crise atual enfrentada pelo país deriva da falta de iniciativas voltadas para a disseminação das técnicas produtivas associadas a estas novas tecnologias, o que explica os baixos níveis de integração digital do Brasil e a sua dificuldade em manter a sua indústria competitiva.

Apesar destas limitações, observadas na política econômica implementada em nível nacional, o objetivo deste post é deixar uma mensagem positiva. A crise na qual o país se encontra não é marcada pela falta de alternativas. O incentivo à formação de profissionais com as capacidades demandadas pelo atual paradigma em emergência se coloca como caminho a ser trilhado para o desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Esta política, se corretamente conduzida, pode fazer com que o país volte a observar o crescimento da sua produtividade, retirando-nos da grave crise na qual nos encontramos atualmente.

 

REFERÊNCIAS

DELLOITE Making an impact that matters: 2014 Global Report.

Developer Insights Report: A Global Survey of Today’s Developers.

DOSI, Giovanni. Technological paradigms and technological trajectories. Research Policy, v. 11, p. 147–162, 1982.

KEARNEY, A. T. The A.T. Kearney Global Services Location IndexTM.  Offshoring Opportunities Amid Economic Turbulence. 2011.

OCDE. OECD Economic Outlook, Vol. 2013/1. OECD Publishing. 2013.

OCDE. OECD Skills, Better Jobs, Better Lives A Strategic Approach to Skills Policies. 2012.

PÉREZ, C. and L. Soete (1988): Catching up in technology: Entry barriers and windows of opportunity, in G. Dosi and others (ed.),  Technical Change and Economic Theory , London, Pinter Publishers.

STEPHENSON, SHERRY. Emergence of services, global value chains (GVC) and resulting implications for Latin America. II Inter-American Dialogue Of High-Level MSMEs Authorities Public Policies to Enhance the Competitiveness, Innovation and Internationalization of MSMEs New Orleans, September 10-11, 2012.

SCHUMPETER, Joseph Alois. Business cycles. New York: McGraw-Hill, 1939.

O que a comparação internacional revela sobre o comportamento recente do setor de serviços intermediários do Brasil?

A literatura de serviços e de complexidade econômica mostra que o desenvolvimento do setor de serviços contribui para o aumento da competitividade industrial. Em especial, a emergência das novas tecnologias de comunicação, a partir da década de 1980, resultou no aumento da contribuição deste setor para a competitividade industrial. Paralelo a isto, a literatura que estuda o setor industrial brasileiro mostra que este setor está passando por um intenso processo de desindustrialização. Deste modo, surge o seguinte questionamento: será que o comportamento do setor de serviços explica a ocorrência da desindustrialização?

Respondemos a pergunta a partir da análise do comportamento e evolução do setor de serviços intermediários no período 1980-2009. Para mensurar a trajetória do setor de serviços no Brasil no longo prazo e relativizar seu desempenho com o de outras economias, adaptamos o indicador de Desindustrialização Relativa Internacional (DRI), apresentado por Arend (2014), para criar o indicador de Deservicilização Relativa Internacional (DRS).

Se o DRS for maior (menor) que 1, o crescimento do setor de serviços no país é superior (inferior) ao observado na amostra usada na análise. Isto é, em termos relativos, o país está se servicilizando (deservicilizando).

O Gráfico 1 foi construído a partir de dados disponibilizados pelo Groningen Growth and Development Centre para o período 1980-2009. Ele apresenta a evolução do DRS calculado para o Brasil em relação a seis regiões selecionadas mais os Estados Unidos. Os dados revelam o crescimento inferior do setor de serviços intermediários no Brasil quando comparado às regiões selecionadas. Até mesmo a África subsaariana e a América Latina apresentam maior crescimento relativo deste setor.

A região contra a qual o Brasil se encontra relativamente melhor posicionado é a Ásia. Contudo, no período analisado, o setor de serviços intermediários do Brasil cresceu apenas 76% do crescimento observado por aquela região. Por outro lado, a região contra a qual o Brasil apresenta pior posicionamento é a Europa. No período 1980-2009, o setor de serviços intermediários brasileiro apresentou apenas 47% do crescimento observado naquela região.

Estes dados revelam tendências preocupantes. Dado que o desenvolvimento do setor de serviços intermediários resulta em aumento da competitividade industrial, a diminuição da sua participação relativa pode explicar o processo de desindustrialização observado no Brasil. O não desenvolvimento deste setor pode dificultar a entrada do Brasil nas novas tecnologias de informação que emergiram a partir da década de 1980 o que, por sua vez, pode resultar em menor competitividade industrial e em desindustrialização.

Gráfico 1 – Evolução da Deservicilização Relativa Internacional (DSR)

DRS

Fonte: Elaboração própria a partir dos dados disponibilizados pelo Groningen Growth and Development Centre.

 

Autores:

20160812_094831-2-3Adilson Giovanni é Economista, com graduação pela Universidade Federal de Santa Maria. Tem mestrado e atualmente é doutorando pelo Programa de Pós-graduação em Economia da UFSC.
fotomarceloMarcelo Arend é Pós-doc (Universidad Autónoma de Madrid, 2015-2016), Doutor em Economia (UFRGS, 2009), Mestre em Economia (UFSC, 2004) e Bacharel em Ciências Econômicas (UFSM, 2002). Professor Adjunto da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), no Departamento de Economia e Relações Internacionais.

Referência bibliográfica

AREND, M. A industrialização do Brasil ante a nova divisão internacional do trabalho. In: IPEA. Presente e Futuro: desafios ao desenvolvimentismo brasileiro. IPEA, 2014.

Em que apostar para 2016?

O ano de 2015 está sendo marcado pelo baixo crescimento, aumento do desemprego e inflação acima de patamares históricos recentes. Diante de uma previsão de contração do PIB de 3,7% em 2015 e de 2,8% em 2016, tempos como estes trazem à tona questionamentos sobre como impulsionar a economia nos próximos anos.

Um bom passo é olhar para os setores mais promissores. Atividades associadas à saúde, serviços tecnológicos e finanças estarão entre as mais rentáveis, conforme publicação da Forbes. De acordo com o gráfico abaixo, os serviços destacam-se dentre as atividades mais prósperas, especialmente aqueles associados à tecnologias de informação e serviços que são insumos para outros setores da economia.



Relatório
da Deloitte em parceria com a Exame mostra que, dentre as 200 pequenas e médias empresas (PMEs) que mais crescem em termos de receita líquida, 27% encontram-se em Serviços de Tecnologia da Informação e 15% em Serviços para Empresas.

Gráfico  – Distribuição das PMEs que mais crescem no Brasil, por setor de atuação

Deloitte

Fonte: Deloitte.

A conclusão é que as atividades mais rentáveis para os próximos anos compõem o grupo de serviços tecnológicos e intermediários na produção de outros setores. Por isto, incentivar o desenvolvimento de tais atividades parece ser uma boa aposta para a recuperação e modernização da economia brasileira. Na verdade, não é uma aposta só para 2016. É uma aposta para a recuperação do crescimento sobre uma base voltada para o futuro.

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