Economia de Serviços

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Serviços e Comércio Exterior: A Relevância da Importação de Serviços para a Indústria e suas Exportações

Na última década, o comércio mundial em serviços dobrou. Além disso, apesar de responder por menos de um quarto do comércio total, os serviços, como insumos, representam 45% do valor agregado dos bens exportados no mundo.

No Brasil essa tendência também é visível. O país triplicou suas exportações do setor na última década e subiu de 37º maior exportador para 31º no ranking mundial. No entanto, as importações brasileiras de serviços tiveram um incremento ainda maior, de 5 vezes, e o país subiu 13 posições como maior importador, de 30º para 17º. Essa assimetria levou o Brasil a um déficit de US$ 46 bilhões em 2014.

Ranking Brasil como exportador no mundo
  2005 2014
Bens manufaturados 27º 31º
Serviços 37º 31º
 Fonte: OMC

O que fazer com o déficit grande na balança comercial de serviços?

Para responder essa pergunta é preciso levar em conta que os serviços representam cerca de 56% do custo para agregação de valor da produção industrial. Em adição, os serviços sobre o valor agregado dos bens exportados alcança, segundo dados do TiVA da OCDE, o valor de 40%, muito maior do que as exportações contabilizadas como de serviços.

O que se pode afirmar a partir disso é que restringir a importação de serviços não é o caminho mais interessante.

Várias empresas de ponta no Brasil precisam de serviços importados para viabilizar suas exportações, como aluguel de equipamentos para o setor extrativo ou garantia de peças para empresas de caminhões, ônibus e aeronaves. Mais importante, é que muitas vezes esses serviços não competem com serviços ofertados dentro do país, pois são necessariamente consumidos no local de destino das exportações de bens.

Mesmo assim, devido à distorções do sistema tributário brasileiro, qualquer operação de importação de serviços no Brasil encara uma carga tributária que varia entre 41% e 51%.

Competir melhor com suas exportações de bens e inserir se mais e melhor nas cadeias globais de valor demandam do Brasil uma política comercial ativa em serviços e a revisão da tributação nas importações neste setor.

O caminho é promover mais as exportações de serviços do Brasil no exterior e ter uma política industrial ativa para melhorar a oferta interna. Onerar as importações de serviços, muitas vezes, significa onerar as exportações de bens.

Foto FabrizioFabrizio Panzini é Mestre em Economia Política pela PUC-SP e Especialista em Políticas e Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Economia colaborativa (?)

Como discutido previamente em post sobre o Uber, a natureza dos serviços está em constante mutação. Se, antes, serviços como transportes individuais eram considerados non-tradables, hoje, uma empresa estrangeira compete diretamente com taxistas brasileiros. Exemplos similares são o Netflix, que concorre com locadoras (embora se possa contestar se estas já não estariam extintas), AirBnB com hotéis, e o Coursera com empresas de capacitação. Os exemplos não se encerram aí e estão nos mais diversos setores, como indicado por Jeremiah Owyang (ver abaixo).

Nesse contexto, o consumidor se beneficia de maior oferta de serviços e de maior competição, o que leva a mais variedade e a menores preços. Do ponto de vista da oferta, essas plataformas também abrem caminhos para que mais empreendedores e freelancers entrem no mercado, provendo “caronas” pagas, leitos e outros serviços.

Entretanto, o crescimento da chamada “economia colaborativa” incita algumas questões. Como apontado por Olivier Blanchard, essas empresas, em geral, atuam em desigualdade de concorrência com as locais. Por mais que seja conveniente alugar uma casa durante as férias, os imóveis listados no AirBnB não precisam passar pelo mesmo tipo de vistorias e nem pagam os mesmos impostos que as pousadas licenciadas.

Fundamentalmente, as pessoas não estão “colaborando” ou “compartilhando” umas com as outras, mas, sim, vendendo e comprando serviços através de aplicativos. Logo, o que se costuma chamar de “economia colaborativa” ou “economia compartilhada” estaria mais próximo de uma economia de serviços baseada em micropagamentos feitos em grandes plataformas que costumam trespassar regulações. Não se trata, portanto, de uma economia genuinamente colaborativa.

Na velocidade em que as mudanças estão ocorrendo na área de serviços, o Estado deveria ser mais ágil para atualizar marcos regulatórios de forma a não prejudicar nem consumidores, nem prestadores de serviços.

Nesse contexto, o caso do Uber é exemplar. Não se pretende, evidentemente, condenar ideias inovadoras ou novas formas de se fazer negócios, essenciais para o crescimento de longo prazo. A questão fundamental é que, se o serviço de taxi não fosse tão cartelizado e repleto de barreiras de entrada, os taxistas possivelmente estariam em melhores condições de competir com inovações como o Uber.

Portanto, é essencial tornar os mercados de serviços mais competitivos, com empresários e empregados mais capacitados e com diminuição de custos de transação e de barreiras de entrada. Somente assim prestadores de serviços tradicionais terão condições de competir com os “Uber da vida” e os consumidores poderão usufruir dos benefícios das novas tecnologias e formas de prestação de serviços.

Exemplos de empresas da “economia colaborativa”, por áreas (clique na imagem para ver em maior resolução).

Estrutura de qualificação e o setor de serviços no Brasil

Independentemente do tipo de serviço que estejamos falando, não há dúvida de que o aporte de conhecimento é a chave para o processo de inovação e agregação de valor. E quando falamos em conhecimentos, logo vem à mente o tema qualificação.

As estatísticas nacionais disponíveis apresentam a escolaridade como praticamente a única proxy de qualificação. O problema é que ela tem grandes vieses, seja devido à expansão da cobertura da educação básica (efeito escolarização), seja devido à sua baixa qualidade.

Diante disso, utilizando as informações constantes na Classificação Brasileira de Ocupações, pode-se lançar outro olhar sobre como anda a qualificação do setor de serviços no Brasil e, a partir daí, discutir a causalidade (quem causa o que?) entre qualificação e competitividade.

Observando-se o mercado de trabalho formal, notamos que 57% dos vínculos são considerados de baixa qualificação. No caso dos serviços, como esperado, esta proporção é de 47% (RAIS/MTE) (ver gráfico abaixo).

Em outros países esta realidade é bem diferente. Na Coréia do Sul, aquela proporção está abaixo de 30%, na Alemanha, abaixo dos 20% e, no caso dos EUA, está na casa dos 25%.

Os dados da RAIS (2003-2013) do setor de serviços mostram situação de “equilíbrio de baixa qualificação”, uma vez que a estrutura de qualificação se mostrou estável da última década.  Projeções da estrutura de qualificações até 2018 sugerem que não deverá haver grandes mudanças no médio prazo.

Esse quadro reflete a baixa produtividade e competitividade da economia brasileira nos últimos anos e coloca em discussão o caminho a ser trilhado para se viabilizar o desafio da geração de riquezas com o crucial e inevitável apoio dos serviços, sejam eles de custo e/ou de agregação de valor.

É preciso repensar a estrutura de qualificação do país e, principalmente, a dos serviços, tanto pelo lado da oferta, quanto da demanda. Caso contrário, o sonho do aumento da competitividade ficará tão clichê quanto a frase “O Brasil é o país do futuro”.

Estrutura de qualificação dos serviços no Brasil – 2003 a 2018

qualificação de serviços

Fontes: RAIS/MTE (2003-2013). Mapa do Trabalho Industrial/CNI (2014-2018)

 

Márcio Guerra Amorim é Mestre em Economia pela Universidade Católica de Brasília e Gerente de Estudos e Prospectiva da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

 

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