A crise pela qual passou a economia brasileira recentemente trouxe ao debate público nacional o tema da abertura econômica como parte da solução para o aumento de sua produtiviade e, consequentemente, de sua capacidade de gerar renda, empregos e bem-estar à sua população de forma sustentada no tempo.
Como a literatura econômica aplicada nas últimas décadas nos confirmou, tecnologia e concorrência são os dois vetores fundamentais de mundança estrutural de uma economia vinculados ao seu processo abertura ao mundo.
Pela tecnologia, o acesso a bens e serviços tecnológicos mais avançados traz consigo um incremento direto à produtividade total dos fatores da economia que se abre. Essa substituição tecnológica, quando observada de forma ampla e espalhada, pode reposicionar uma economia, colocando-a em novos patamares de produção e competitividade.
Pela concorrência, motor primordial da inovação e do desenvolvimento econômico, o processo de ampliação das trocas de uma economia com o mundo traz forte impacto sobre seus níveis de preços, além de empurrá-la em direção a uma modernização de processos de produção e atualização de cestas de bens e serviços produzidos, com efeitos positivos sobre sua produtividade e sua capacidade de realização de crescimento econômico sustentado.
No debate atual brasileiro em torno da agenda de abertura econômica, os custos e benefícios desse processo são comumente analisados tendo em conta o setor privado, as empresas hoje instaladas no país e os efeitos que teriam num contexto de liberalização de trocas do Brasil com mundo. Contudo, é igualmente importante averiguar os efeitos dessa agenda sobre o setor público, especialmente no que concerne às compras governamentais.
Em um contexto de crise fiscal, que deve perdurar por algum tempo, e de patente necessidade de transperência e avaliação de políticas públicas no Brasil, implementar uma agenda pró-ativa de negociações de acordos de compras governamentais deve ser componente basilar de uma estratégia de inserção internacional e de transformação estrutural da economia brasileira, seja no setor privado, seja no setor público.
Pelo vetor tecnologia, uma agenda de abertura com redução de margens de preferências a empresas nacionais em compras públicas funcionaria como catalisador de modernização, com redução de custos para o fucionamento da máquina do Estado brasileiro e estímulos de eficiência em sua gestão.
A ampliação da concerrência, por sua vez, teria função primordial em economizar recursos orcamentários para a manutenção dos serviços públicos, ampliando a transparência e os estímulos ao incremento de eficiência para as empresas domésticas com capacidade de fornecimento de bens e serviços ao Estado.
Cabe destacar que já se inciou esse processo de abertura a partir dos esforços recentes de negociação de acordos de compras governamentais, liderado pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, conjuntamente com o Itamaraty e Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. A própria entrada do Brasil como membro observador no acordo plutilateral de compras governamentais é passo útil e denotativo da vontade de se avançar no aprofundamento de acordos nessa área.
Como mostra a tabela 1, as compras governamentais representaram em média 12,5% do PIB brasileiro entre 2006-2016, tendo as compras da União correspondido a cerca de 50% do mercado de compras governamentais brasileiro nesse período, segundo recente estudo do IPEA feito por Cássio Garcia Ribeiro e Edmundo Inácio Júnior, ainda no prelo.
Nesse contexto, não se pode obviamente esquecer do papel relevante que as compras governamentais podem ter como mecanismo de estímulo a determinados setores da economia doméstica, especialmente por conta da magnitude do mercado de compras governamentais no universo dos gastos do Estado, bem como sua importância econômica para os países. Entretanto, o uso estratégico das compras governamentais como política pública de estímulo econômico ao setor privado deve passar cada vez mais pelo escrutínio técnico e análises de custo-benefícios das ações tomadas nesta área.
Assim, por um lado, não se pode abandonar a capacidade do Estado de usar inteligentemente sua capacidade de demanda de bens e serviços para gerar estímulos setoriais que venham a ser relvantes no quadro do nosso desenvolvimento econômico. Por outro, tampouco se pode perder a opotunidade de usar a política de compras governamentais no Brasil como parte de uma estratégia maior de desenvolvimento que passe por maior integração com o mundo. É do equilíbrio entre esses dois pesos, sustetado em boa avaliação de políticas, que deve sair a renovação e atualização da agenda de compras governamentais no Brasil.
Tabela 1 – Compras governamentais do Brasil, segundo entes da federação
(2006 – 2017), em R$ bilhões – preços correntes |
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Ano | União1 | Estados2 | Municípios2 | Total | PIB | PIB | ||||
Valor | %/ PIB | Valor | %/ PIB | Valor | %/ PIB | R$ | % PIB | |||
2006 | 172 | 7,2 | 59 | 2,5 | 85 | 3,6 | 320 | 13,5 | 2.409 | |
2007 | 192 | 7,0 | 58 | 2,1 | 96 | 3,6 | 347 | 13,0 | 2.720 | |
2008 | 241 | 7,8 | 76 | 2,5 | 117 | 3,9 | 436 | 14,4 | 3.110 | |
2009 | 250 | 7,5 | 88 | 2,6 | 103 | 3,2 | 444 | 13,7 | 3.333 | |
2010 | 301 | 7,7 | 103 | 2,7 | 121 | 3,2 | 529 | 14,0 | 3.886 | |
2011 | 309 | 7,1 | 92 | 2,1 | 141 | 3,4 | 542 | 13,1 | 4.376 | |
2012 | 379 | 7,9 | 91 | 1,9 | 161 | 3,7 | 637 | 14,5 | 4.815 | |
2013 | 406 | 7,6 | 116 | 2,2 | 153 | 2,9 | 675 | 12,7 | 5.332 | |
2014 | 443 | 7,7 | 142 | 2,5 | 173 | 3,0 | 759 | 13,1 | 5.779 | |
2015 | 383 | 6,4 | 113 | 1,9 | 176 | 2,9 | 672 | 11,2 | 5.996 | |
2016 | 322 | 5,1 | 121 | 1,9 | 190 | 3,0 | 633 | 10,1 | 6.259 | |
2017 | 324 | 4,9 | 6.560 | |||||||
3.721 | 6,8 | 1.060 | 2,2 | 1.516 | 3,2 | 5.994 | 12,5 | 54.575 | ||
Total | Média | Total | Média | Total | Média | Total | Média | Total |
Fonte: 1 MPOG (2016 e 2017). Tesouro Gerencial (2006-2017). Total da Tabela 1.
2 FINBRA (2006-2017).
Sobre o autor:
Pesquisador do IPEA, é atualmente Diretor de Estudos Internacionais do instituto. Foi Assessor Especial, chefe do Núcleo Econômico, da Secretaria-Executiva da CAMEX (2016-2017) e Pesquisador Visitante junto à UNCTAD (2010). Tem Doutorado em Administração pela Universidade Federal da Bahia.
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