Economia de Serviços

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Automação e Desemprego: Aspectos Microeconômicos

A automação crescente da produção e dos serviços tem sido motivo de muita preocupação nos últimos anos. O medo é o de que a computadorização em particular – ou das inovações tecnológicas em geral – desloque imensa quantidade de mão-de-obra para as hostes dos desempregados. A estimativa, feita por Frey & Osborne (2013), do Departamento de Engenharia Elétrica da Oxford University, de que 47% dos empregos nos EUA estariam em risco por causa dos avanços computacionais (robôs e automação) são um exemplo típico do Zeitgeist que aplica uma ótima Estatística a uma péssima Economia.

Essa onda alarmista, no entanto, é velha. No início do século 19, em plena Revolução Industrial, trabalhadores do setor de tecelagem destruíram as máquinas em protesto à substituição técnica. O movimento era liderado por uma personagem fictícia, Ned Ludd, criada pelos revoltosos para dar legitimidade ao movimento, o Luddismo. A gota d’água foi a destruição da tecelagem de William Cartwright em abril de 1812. Apesar da revolta, o mundo progrediu, como depois da invenção da roda, da moeda e dos direitos de propriedade.

Embora a sensação de incerteza quanto ao futuro do trabalho em situação de avanços tecnológicos seja compreensível, o que salta aos olhos é a incapacidade de enxergar o fenômeno sob as lentes da teoria econômica. A tese popular é de que a automação destrói empregos e que, portanto, medidas protetivas devem ser tomadas pelo Estado. Marchant et al (2014) propõem, por exemplo, entre outras coisas, reduzir a taxa de inovação! O que diz, porém, a teoria econômica?

Seria fácil, escreveu Armen Alchian, simplesmente dizer que o progresso tecnológico gera novos empregos em vez de destruí-los. Ele mostra, porém, que essa não é a questão econômica relevante.

Suponhamos que uma inovação tecnológica no setor de têxteis não gere qualquer novo tipo de trabalho, digamos o operador da máquina nova. Segue-se à introdução da máquina a demissão de João, que recebia $100 por semana. Ele será deslocado, por exemplo, para um emprego no setor de manufaturas, que não fora preenchido antes porque o custo de preenchê-los era alto. O benefício marginal de $91 de aumento de produto, por semana, no setor de manufaturas não compensava o custo marginal de contratação de João, cujo custo de oportunidade era $100. Porém, com a inovação no setor têxtil, o trabalho semanal de João passou a valer menos para o setor, digamos $70.

João foi demitido, mas poderia ter permanecido no emprego se aceitasse o salário de $70, com alguma redução de jornada. Ele, porém, não aceita o salário, pois sua oferta de trabalho é dada pelo trade-off entre trabalho e lazer, um termo técnico da Economia para denotar tudo aquilo que o trabalhador sacrifica quando opta pela ação de trabalhar. Ele aceitaria uma redução para $85, seu salário-reserva, mas não $70. Se você acha isso estranho, lembre que trabalhadores do setor automotivo, em momentos de crise, aceitam redução de jornada e salário para evitar a demissão. Quanto ao trade off, pergunte a si mesmo, que ganha R$18.000 por mês como engenheiro e diretor de operações, se aceitaria uma redução de salário para R$200. Certamente não. Há, portanto, algum salário que o deixa indiferente entre trabalhar ou não.

Voltemos a João. Se ele aceitar $90 no setor manufatureiro, será contratado. De fato, vale a pena para a empresa manufatureira contratar João, pois traz um lucro marginal de $1. Para João também, pois $90 é mais que seu salário-reserva, $85. O erro de muitos é não entender quais são as verdadeiras escolhas de João. O salário de $100 no setor têxtil não é mais uma alternativa. Sua escolha agora não é mais entre $100 e $90, mas entre $85 e $90. Não mais entre emprego antigo e novo, mas entre emprego novo e lazer (no sentido técnico). O problema é João e o empresário manufatureiro se encontrarem.

Portanto, mesmo que a inovação não gere um novo tipo de trabalho, ainda assim não é verdade que empregos são destruídos. Pelo contrário, empregos sempre existem. A demora na transição para novos empregos se deve à informação imperfeita, aos custos de busca e de transação, muitas vezes decorrência de restrições institucionais, e aos custos de oportunidade, que são subjetivos. Algumas pessoas reclamam que empregados da Disney recebem pouco e moram em motéis baratos, sendo que em cidades vizinhas há demanda por trabalho a salários “dignos”. Por que esses empregados não se mudam de cidade em busca de novo emprego? Porque o custo de mudança é um custo de transação que eles não estão dispostos a incorrer, talvez porque valorizem a relação com turistas ou porque na outra cidade não há cursos de Economia. Coisas não têm custos: ações têm – e quem age é o ser humano. O mercado é mediado essencialmente pelos custos de oportunidade dos seres humanos na economia.

O problema, então, não é se a inovação destrói ou cria novos empregos. A correlação positiva entre progresso tecnológico e desemprego é um falso problema econômico. O problema real que a Economia identifica é a decisão de quais trabalhos e tarefas executar e quais deixar inativos, além do reconhecimento de que o processo de transição entre empregos enfrenta custos de busca e de transação. Estes, sim, é que deveriam ser o alvo de políticas, nunca absurdos como “redução da taxa de inovação”.

Armen Alchian classifica em três grupos as pessoas afetadas pela inovação. (1) Algumas pessoas receberão maiores salários, em razão de seu capital humano ser mais escasso para as novas técnicas. Elas se beneficiam tanto do salário mais alto como da redução geral de preços e aumento de produto proporcionados pela inovação. (2) Algumas não sofrerão variação de renda, mas se beneficiarão da redução de preços e aumento de produtos. (3) Outras perderão seus empregos e deverão se mudar para empregos que paguem menos. A perda de renda destas pessoas não é compensada pela queda de preços e aumento de produto.

Inovações, de fato, criam novos tipos de trabalho, de forma que o valor do trabalho no resto da economia aumenta, pois as empresas nos outros setores têm agora que competir pelos trabalhadores com suficiente capacidade de ocupar os postos gerados pela inovação. Inovações não só substituem trabalho, mas também substituem bens de capital que obsolescem. Esse capital, então, perde lugar para trabalho e outros bens de capital. Inovações também incrementam trabalhos na cadeia de produção. A máquina nova que é produzida e substitui trabalho é, por sua vez, produzida pela utilização de capital “e” trabalho. A máquina que provocou a demissão de João foi produzida com uma combinação de capital e trabalho, digamos, com José, que foi contratado para a produção da máquina. A produção da nova máquina tem efeito positivo ao longo da cadeia sobre todos os fatores, inclusive trabalho.

Muitos advogam um sistema de compensações aos que perderam seus empregos, sob a alegação de que o incremento de valor gerado pela inovação é maior que as perdas dos trabalhadores demitidos. Essa proposta, no entanto, desconsidera tanto o fato de que a compensação altera os incentivos como o fato de que a identificação de quem perde e quem ganha envolve custos. Como dito, não só o trabalho, mas também o capital existente perde valor no setor que presencia a inovação, de modo que os detentores dos direitos de propriedade sobre esses recursos perdem riqueza. Taxá-los sem consideração dessas perdas é impor deadweight losses ainda maiores.

Que medidas podem ser implementadas para redução dos custos de busca e de transação na transição de empregos? Vejo pelo menos quatro. A primeira e mais óbvia é a eliminação (ou pelo menos a substancial redução) das restrições institucionais no mercado de trabalho, como salário mínimo, encargos trabalhistas, empecilhos à livre negociação e o rent-seeking de sindicatos. A segunda é uma profunda reforma tributária rumo ao IVA. Em terceiro lugar, abertura comercial e livre mercado. Finalmente, a educação, não só especializada, mas principalmente uma educação liberal que dê ao cidadão a capacidade intelectual de atuar em diversas áreas ou de enfrentar menores custos de aquisição de capital humano.

Rodrigo Peñaloza é Professor Associado do Departamento de Economia da Universidade (UnB). É formado em Economia pela UnB, mestre pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) e Ph.D. pela UCLA (University of California at Los Angeles). Sua área de atuação é microeconomia e métodos matemáticos.

 

Referências

Alchian, A. (1964): University Economics. 2nd ed., Wadsworth Publishing Company, Belmont, CA.

Frey & Osborne (2013): “The Future of Employment: How susceptible are jobs to computerisation?” Disponível em:

https://www.oxfordmartin.ox.ac.uk/downloads/academic/The_Future_of_Employment.pdf

Marchant, Y. Stevens & J. Hennessy (2014): “Technology, Unemployment & Policy Options: Navigating the Transition to a Better World”. Journal of Evolution and Technology, 24: 26-44.

 

Os principais desafios das empresas na era da Economia Digital

Uma pesquisa realizada pela Accenture Strategy com o intuito de apresentar a importância e crescimento da Economia Digital no mundo, estima que, em 2015, a economia digital representou 22,5% da economia mundial, valor considerado muito baixo para o que ainda pode ser explorado.  O estudo concluiu que ainda há muito a ser explorado por governos e empresas e que o PIB dos países será maior se os investimentos forem direcionados às suas necessidades.

Um estudo feito pela OCDE (2016) mostra o crescimento do setor de serviços e a adaptação de algumas firmas, apresentando as mudanças dos serviços exigidos em cada época. Nesse estudo foi realizado uma comparação entre as principais empresas baseadas na Internet, por capitalização de mercado, em 1995, e as principais empresas de 2015. No início, a maioria das maiores empresas comercializavam hardwares, softwares ou realizavam serviços de provedores de internet e mídia, enquanto que em 2015 as maiores empresas eram desenvolvedoras e gestoras de plataformas digitais.

As 15 principais empresas de internet por capitalização de mercado em 1995 e 2015

1995 (Dezembro) Produto Principal ou Atividade 2015 (Maio) Produto Principal ou Atividade
Netscape Software Apple Hardware, serviços
Apple Hardware Google Informação (serviços de busca)
Axel Springer Mídia, publicação Alibaba Bens (e-com)
RentPath Mídia, aluguel Facebook Informação (social, P2P)
Web.com Serviços de internet Amazon.com Bens (e-com)
PSINet Internet Service Provider Tencent Informação (social, P2P)
Netcom On-Line Internet Service Provider eBay Bens (e-com, P2P)
IAC / Interactive Mídia Baidu China Informação (serviços de busca)
Copart Leilões de veículos Priceline Group Serviços
Wavo Corporation Mídia Uber Serviços (P2P)
iStar Internet Internet Service Provider Salesforce.com Serviços
Firefox Communications Internet Service Provider JD.com Bens (e-com)
Storage Computer Corp. Software de armazenamento Yahoo! Informação (serviços de busca)
Live Microsystems Hard- e Software Netflix Serviços (mídia)
iLive Mídia Airbnb Serviços (P2P)

   Fonte: Adaptado de OCDE (2016)

Onze das 13 plataformas digitais em 2015 eram mercados para serviços que operam em diversas áreas, se inserindo em diversos mercados, como o de transporte de passageiros (Uber) e serviços de hospedagem Airbnb, por exemplo. Dentre outros, isso sugere a importância da presença do setor de serviços nas economias e como eles foram expressivos nos últimos anos.

Dado que o mercado encontra-se cada vez mais global e as fronteiras estão reduzidas, um dos principais desafios das empresas é se adaptar às novas tendências globais. As firmas necessitam inovar constantemente para que se tornem cada vez mais competitivas. Parece algo simples, pois se o consumidor está sempre esperando que as empresas lancem novos produtos, com novos serviços embutidos, então é só as empresas tentarem inovar e produzir e pronto. Porém, na prática, isso não funciona bem dessa forma. O que as empresas precisam fazer é, isto sim, lançar algo que agrade o consumidor, observando as tendências para, a partir daí, buscar inovar.

Um exemplo de preferência do consumidor por inovação tecnológica é o iPhone. Os consumidores preferem um iPhone, que possui iCloud, iTunes, Apple Music, entre outros aplicativos, do que um celular simples que apenas serve para fazer ligações e enviar SMS, como os aparelhos comercializados na década de 90. Da comparação simples entre esses dois bens se pode perceber o motivo do sucesso de um sobre o outro. Porém, a diferença entre as preferências se encontra, na verdade, na inovação do produto. No caso do iPhone, à medida que o tempo vai passando, o consumidor vai ficando mais exigente e deseja algo que seja mais atrativo do que a versão anterior, como, por exemplo. Cabe à Apple ter a preocupação de inovar para seguir como tendência de mercado.

Do ponto de vista da indústria, atender a essa demanda não é tão simples assim. Na era da economia digital, para uma empresa se tornar competitiva, ela precisa ter a capacidade de criar “O Novo Serviço”. A indústria é direcionada a uma fase de desafios, onde é preciso descobrir um produto industrial novo, com maiores serviços inseridos nesse produto e, quanto mais serviços esse produto possuir, mais caro é o valor final do bem ofertado. Esses são produtos de alto valor agregado e que de fato contribuem para o desenvolvimento econômico dos países. Para ter sucesso na produção, é preciso que o novo modelo de indústria venha acompanhado de criatividade, mão de obra qualificada, investimento em inovação, estratégias de marketing e, principalmente, elevada competitividade.

Além da necessidade de inovar e de produzir bens e serviços de alto valor agregado, os principais desafios das empresas, para que se tornem competitivas na era da economia digital, são:

  1. Possuir mão de obra qualificada: é fundamental que as empresas possuam mão de obra suficientemente qualificada, que auxiliem no desenvolvimento de novos produtos, ampliando a inovação;
  2. Velocidade da evolução tecnológica: embora possa ter toda a estrutura para produzir, se a empresa não acompanhar com rapidez a evolução das tecnologias ela pode não conseguir se manter competitiva;
  3. Burocracias: as empresas, principalmente as que estão entrando no mercado, podem ter que lidar com burocracias como, por exemplo, regras de importação e exportação;
  4. Ataques cibernéticos: esses crimes podem ser caracterizados como uma das consequências geradas pela globalização, que talvez possa ser sanada com a ampliação dos investimentos em tecnologia.

Apesar da disposição e vontade das empresas de se beneficiarem da economia digital para que elas se tornem competitivas, é fundamental que elas consigam vencer as dificuldades acima listadas.

Ser produtivo ou ser inovador?

A economia é um sistema de interconexões produtivas. Cada produto de um determinado setor econômico necessita de insumos de outros setores, e pode ele mesmo ser insumo. Existem, então, conexões “para frente e para trás”, o que demonstra a capacidade de cada setor em gerar demanda e gerar oferta. A ideia de que os setores estão conectados e simultaneamente demandam e ofertam bens e serviços gerou um razoável esforço dos economistas em buscar quais seriam aqueles setores nevrálgicos capazes de provocar mais efeitos dinâmicos no sistema produtivo.

Na tentativa de entender como as interconexões afetam a produção econômica, a importância relativa de cada setor na economia foi analisada a partir do estudo de coeficientes derivados da matriz insumo-produto. Os conceitos de backward linkage e forward linkage foram concebidos para interpretar como um dado setor se relaciona com o resto da economia, seja demandando insumos, seja viabilizando negócios – são os termos técnicos das conexões “para frente e para trás”.

A intuição do forward linkage não é tão óbvia quanto à do backward linkage. Um exemplo hipotético seria pensar que, para cada $ 1,00 de medicamentos produzidos seriam necessários $ 1,5 em insumos diretos e indiretos como energia e produtos químicos – esse é o backward linkage; no entanto, porquê foi produzido $ 1,00 de medicamentos, $ 2,00 em negócios puderam ocorrer, como novos tratamentos e novos exames. O backward linkage seria a capacidade de arrasto produtiva, enquanto o forward linkage seria a capacidade de indução produtiva.

A conexão entre esses dois conceitos possui rebatimentos sobre um terceiro: produtividade. Vale dizer que a produtividade relaciona a necessidade de insumos com a capacidade de produção, então aumentos de produtividade num setor A poderiam reduzir sua interconexão sobre os setor fornecedor de insumo B, uma vez que backward linkage é o requerimento de insumos sobre o setor B para garantir a produção de $ 1,00 do setor A. O conceito de produtividade inserido no debate do desenvolvimento econômico é limitado porque não se trata simplesmente de se buscar meios de reduzir a necessidade de insumos para dar cabo à produção, mas também do quão relevante para a economia e para a sociedade é o resultado final dessa produção.

Imagine que a Olivetti, nos anos 80, realizava um esforço para aumentar a produtividade de suas fábricas para reduzir a quantidade de insumos – e seus custos – para fabricar suas máquinas de escrever; num belo dia, a IBM chega ao mercado e populariza o computador. Então, o que exatamente significa ser mais produtivo na elaboração de algo cada vez menos relevante? Não vamos confundir as coisas: ser eficiente e produtivo é importante, mas o poder da inovação é insuperável.

A inovação é o cerne do sistema capitalista porque ele transforma o modo como a economia mobiliza bens e serviços na forma de insumos e os transforma em indutores de outras atividades econômicas. O potencial inovador de uma economia sinaliza a capacidade de coordenação produtiva de cada setor, na medida em que traduz não o quão eficientemente um determinado conjunto de insumos é combinado para produzir um produto, mas sim o quão surpreendentemente um determinado conjunto de insumos é combinado para inaugurar novas atividades produtivas ou, no mínimo, induzir a atividade produtiva de outros setores.

O mundo é digital: e é pra lá que eu vou

Eu sei, parece que a administração pública do Brasil não percebeu o potencial da tecnologia na melhoria da gestão e da qualidade dos serviços prestados à população. E olha que começamos bem: em 2003, estávamos em 41º no ranking de governo digital da Organização das Nações Unidas e chegamos a 33º em 2005. Infelizmente, nos perdemos em algum lugar pelo caminho e caímos até a 61ª posição em 2010. Em 2016, subimos um pouquinho e chegamos a 51ª, ufa!

Já nós, cidadãos brasileiros, invadimos o mundo digital. Somos o 4o maior país do mundo em número de usuários na internet. Conhecidos como early adopters de redes sociais, não resistimos a uma novidade.

Mas não foi só o governo que ficou para trás nessa história.

A vanguarda ficou do lado de fora da porta do trabalho. Inicialmente, nem o setor público nem o privado deram prioridade para a transformação digital e a inovação. O IBGE já mostrou que somente cerca de 35% das empresas investem em novos bens ou serviços ou na melhoria dos processos no Brasil.

E o mais curioso, eu costumo dizer, é que o desafio da transformação digital não é tecnológico, e sim conseguir reunir os diversos – e muitas vezes repetidos – esforços da sociedade e do governo para que o País esteja melhor preparado para aproveitar as oportunidades que a economia digital vem proporcionando.

Acredito que boa parte dos gestores públicos concordam que a tecnologia se tornou o motor do serviço público e que a transformação digital promove economia e simplificar a vida dos cidadãos brasileiros.

Hoje, entre outras conquistas, destaco o Processo Eletrônico Nacional (PEN), o portal de Serviços, o Login único e o caçula Documento Nacional de Identidade (DNI), ainda em piloto. Estes são componentes da Plataforma de Cidadania Digital, a partir da qual estamos acelerarando a transformação de serviços e de políticas públicas.

Desde o 2o semestre de 2017, lançamos 41 serviços públicos em ambiente digital, que  apresentaram redução da ordem de 90% no custo para o estado e para o cidadão. Parece promissor, mas ainda estamos muito longe de onde queremos e podemos chegar.

Primeiro é preciso ter em mente que a burocracia no setor público acaba por prejudicar as pessoas que mais precisam. O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) fez um levantamento na América Latina e revelou que, em média, um quarto dos serviços públicos requer três ou mais interações, às vezes presenciais, até ser concluído.

Dá para imaginar o tanto de dinheiro, tempo e paciência que os cidadãos perdem por ano porque um serviço não foi modernizado? São passagens de ônibus, combustível, ligações telefônicas, preenchimento de formulários e tempo gasto em filas.

Até o ano passado, os jovens brasileiros de 18 gastavam R$ 118 milhões por ano para fazer o Alistamento Militar Obrigatório. Depois da transformação digital, o alistamento é feito pela Internet, e a presença do jovem só é necessária se ele for realmente servir. Além disto, para o governo, reduzimos a despesa em R$ 180 milhões por ano. Viu como dá para melhorar?

O Censo de Serviços Públicos, realizado pela primeira vez em 2017, revelou que menos de 40% de todos os serviços públicos prestados pelo Governo Federal são digitais. Ou seja, temos mais de mil serviços que devem ser transformados para efetivamente comemorarmos a virada.

Por fim, segundo a Accenture, a cada 1% de crescimento na digitalização do governo, crescerá 0,5% o PIB do país, 0,13 o IDH, 1,9% o comércio internacional entre diversos outros benefícios menos tangíveis. Ou seja, o desafio é grande, mas ainda maior será a recompensa: quem está comigo?

 Luis Felipe Salin Monteiro é Secretário de Tecnologia da Informação e Comunicação do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, responsável pelo processo de transformação digital do governo federal. É Mestre em gestão de tecnologia da informação pela Universidade Católica de Brasília e pela Fundação Getúlio Vargas, com graduação em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Santa Maria.

Patentes e dinamismo econômico

A World Intellectual Property Organization (WIPO) disponibiliza dados internacionais sobre direitos intelectuais, sendo importante fonte de informações sobre as patentes emitidas pelos países-membros desta organização. Os dados disponibilizados por esta fonte podem ser utilizados para se realizar uma comparação entre o número de patentes registradas pelo setor industrial e pelo setor de serviços no período entre 1980 e 2015.

Para isto, as patentes foram classificadas em três categorias, Serviços, Indústria e Outros.  Posteriormente, realizou-se a comparação entre o número de patentes geradas pelos setores no período citado. Esta comparação revela que ocorreu aumento considerável no número de patentes relacionadas ao setor de serviços, em detrimento das patentes industriais. Em 1980, 72% das patentes eram em tecnologias industriais e apenas 28% em serviços. Em 2015, a proporção de patentes relacionadas a tecnologias industriais recuou para 59%, de modo que 41% das patentes geradas eram em tecnologias relacionadas a serviços. Isto é, observou-se crescimento de 47% na proporção de patentes geradas em tecnologias relacionadas ao setor de serviços.

Separando os serviços em finais e intermediários, observa-se o crescimento na proporção de patentes relacionadas a serviços intermediários. Em 1980, apenas 29% das patentes de serviços eram em serviços intermediários e em 2015 esta proporção avança para 79%. Isto é, o setor que apresenta maior crescimento no número de patentes é serviços e, dentro deste setor, se observa avanço das patentes em serviços intermediários.

Estes dados mostram que a dinâmica de inovação mundial está se modificando. As novas tecnologias de comunicação criaram ambiente favorável ao desenvolvimento de inovações organizacionais no setor de serviços. Este setor está sendo profundamente transformado pela emergência destas tecnologias e está se convertendo em uma das principais fontes de inovação. Esta evidência mostra que o crescimento econômico não está associado à presença de um setor específico, mas ao conhecimento e à capacidade de gerar inovações que contribuem para o crescimento econômico.

A análise do número de patentes geradas entre 2000 e 2015 para as tecnologias que mais cresceram no período revela grande concentração nos Estados Unidos e na Ásia. Das patentes registradas em Métodos de TI para gerenciamento, 47% foram registradas nos Estados Unidos, 35% na Ásia; e apenas 10% na Europa. A América Latina e a África geraram quantidade muito baixa de patentes nesta tecnologia, não superior a 1%, como este padrão se repete para as demais tecnologias, estas regiões não serão analisadas.

Gráfico 1 – Proporção de patentes geradas nas tecnologias de serviços que se encontram entre as dez tecnologias com maior crescimento no número de patentes entre 2000 e 2015

Fonte: World Intellectual Property Orgamization

Em Comunicação digital, 50% das patentes foram registradas nos Estados Unidos, 26% na Ásia, e apenas 16% na Europa. Em Tecnologia computacional, 44% das patentes foram geradas nos Estados Unidos, 38% na Ásia e 11% na Europa. Já em tecnologia médica, 35% das patentes registradas foram nos Estados Unidos, 30% na Ásia e 23% na Europa. Assim, existe uma grande concentração nas patentes geradas em serviços nos Estados Unidos e na Ásia, e, em menor escala, na Europa.

A análise do número de patentes geradas revela que a dinâmica de inovação está migrando para o setor de serviços. O setor industrial ainda é o principal responsável por introduzir inovações que provocam modificações na estrutura produtiva e geram crescimento econômico. Porém, cada vez mais, o centro dinâmico gerador de inovações, introdutor de novas atividades econômicas, mudanças na estrutura produtiva e responsável por promover o crescimento econômico é o setor de serviços. Com grande destaque para o surgimento de novas atividades de serviços intermediários, intimamente relacionadas ao surgimento de novas tecnologias de comunicação, que provocam  inovações organizacionais nos processos produtivos e administrativos. Caso esta tendência permaneça, dentro de poucas décadas a transformação de atividades tradicionais de serviços em atividades modernas se transformará no principal vetor de inovações e no principal gerador de novas atividades econômicas, sendo responsável por explicar as mudanças estruturais observadas pelos países.

Os dados de patentes corroboram a argumentação de que o crescimento do setor de serviços nos países desenvolvidos não ocorre através da migração dos trabalhadores para atividades de serviços finais, que possuem baixa produtividade e que resultam em estagnação econômica. Na realidade, o crescimento deste setor está relacionado ao surgimento de atividades inteiramente novas, inovadoras, altamente dinâmicas e introdutoras de progresso técnico. Estas novas tecnologias estão introduzindo mudanças organizacionais que, provavelmente, resultam em crescimento elevado da produtividade do setor de serviços, contribuindo para que a produtividade da indústria e da economia como um todo se eleve significativamente.

Globalização e a escada íngreme da tecnologia

A edição de abril do “World Economic Outlook (WEO)” do FMI trouxe um capítulo sobre como a globalização vem contribuindo para uma difusão de conhecimento pelos líderes tecnológicos mais rápida do que anteriormente. A difusão tecnológica transfronteiriça não só contribuiu para o aumento dos níveis de produtividade doméstica nas economias avançadas e emergentes, mas também facilitou uma reformulação parcial do mapa da inovação tecnológica, com alguns beneficiários se tornando novas fontes significativas de pesquisa e desenvolvimento (P & D) e patentes. Cabe a nós entender o que seria necessário para que essa mudança no cenário da inovação fosse ainda mais ampla.

A globalização difundiu conhecimento e tecnologia …

Maior comércio, investimento estrangeiro direto e uso internacional de patentes disseminaram mais intensamente o conhecimento e a tecnologia através das fronteiras. Um duplo dividendo pode potencialmente ser derivado de tal característica: como a tecnologia é tipicamente “não-rival” em seu uso, sua difusão pode levar a aumentos de resultados médios a custos relativamente baixos; além disso, seu uso múltiplo pode gerar efeitos de rede positivos por meio da polinização cruzada.

Os fluxos de conhecimento do exterior podem ter impacto tanto na produtividade, através da adoção de tecnologias estrangeiras no processo de produção, como – combinados com P & D interna – em inovação (Gráfico 1).

O WEO estima que, nas economias de mercado emergentes, “de 2004 a 2014, o conhecimento estrangeiro foi responsável por cerca de 0,7 ponto percentual do crescimento anual da produtividade do trabalho, ou 40 por cento do crescimento observado da produtividade setorial, comparado com o crescimento anual de 0,4 ponto percentual durante 1995–2003″ (Gráfico 2). Segundo o relatório, esses resultados permanecem robustos mesmo quando a China é excluída, o que indica que os efeitos da produtividade foram amplos entre as economias emergentes.

Além disso, o relatório mostra um quadro de mudança na constelação internacional de fontes de inovação tecnológica, à medida que os gastos com P & D crescem rapidamente na China e os estoques de patentes internacionais se acumulam na Coreia (Gráfico 3). Esses países se juntaram aos líderes tradicionais em setores como equipamentos elétricos e ópticos e, especialmente, na Coreia, em equipamentos de máquinas.

Isso aconteceu mesmo enquanto, desde o início da década de 2000, as economias tradicionais de fronteira passaram por uma desaceleração nos aumentos de produtividade da mão-de-obra e na produtividade total dos fatores, ao mesmo tempo em que houve um crescimento mais lento das patentes e, em certa medida, menor investimento em P&D. Duas linhas de explicação para tal têm sido oferecidas, vale dizer: refletem uma lacuna de tempo na transição entre a terceira e a quarta revoluções industriais ou manifestam um declínio secular nas oportunidades de levar a produtividade adiante. De qualquer maneira, como assinalei em 2010, as prevalentes lacunas de convergência tecnológica e a não-rivalidade no uso de tecnologias existentes ofereceram às economias de mercado emergentes a oportunidade de continuar avançando mesmo com o ritmo desacelerando na fronteira (Canuto, 2010).

O WEO também traz à tona os resultados de um exercício empírico mostrando os efeitos positivos da competição internacional em inovação e difusão tecnológica. Isso poderia ser considerado um canal adicional através do qual a globalização estaria reforçando os incentivos para inovar e adotar tecnologias do exterior.

… Mas existem requisitos locais para subir na escada de capacidades de inovação

Não obstante a melhoria dos fluxos transfronteiriços de conhecimento pela globalização, a simples interconectividade não gera automaticamente os aumentos de produtividade e a inovação local. Qualquer aplicação de tecnologia incorpora um conteúdo “tácito” e localmente específico – idiossincrático – que não pode ser adquirido ou transferido por meio de manuais ou qualquer outra forma codificável de transmissão de conhecimento. Esse conhecimento não pode ser tornado “explícito” em blueprints e, portanto, não pode ser perfeitamente difundido como informação pública ou propriedade privada. Tem de ser desenvolvido localmente (Canuto, 1995).

Há um aumento dos requisitos em termos de conhecimento tácito e idiossincrático e de desenvolvimento local de capacidades quando se pensa em produção, adoção de tecnologia e invenção, como mostrado no Gráfico 4. Pode-se também considerar típica para os retardatários uma evolução que geralmente começa com a produção e a adoção de tecnologia antes da invenção. Esse foi exatamente o caso da Coréia e da China, que empreenderam esforços para desenvolver capacidades de inovação após intenso aprendizado pelo uso e adaptação de tecnologias existentes.

O sucesso em montar e ascender na escada rolante de capacidades depende da presença de um amplo conjunto de complementaridades, na ausência das quais o retorno do investimento no desenvolvimento de capacidades é dificilmente obtido. O acesso a finanças, infraestrutura, mão de obra qualificada e práticas gerenciais e organizacionais importa. Soluções para falhas de mercado que geram desincentivos ao acúmulo de conhecimento também devem estar presentes. Além disso, os custos de transação associados ao ambiente de negócios – comércio internacional, contratação de mão de obra, execução de contratos, etc. – não podem ser muito altos (Canuto, Dutz & Reis, 2010).

Como a presença de tais complementaridades não é fenômeno generalizado, pode-se entender porque a mudança internacional na paisagem da inovação tem sido limitada. Também explica o que Cirera & Maloney (2017), do Banco Mundial, chamaram de paradoxo da inovação: os níveis de investimento relacionados à inovação nas economias em desenvolvimento não são proporcionais aos altos retornos que se espera acompanharem a adoção de tecnologias disponíveis e a convergência tecnológica. A globalização pode disseminar o conhecimento, mas não necessariamente vem com o que é necessário para desfrutar completamente disso.

O papel dos serviços na diversificação econômica: o caso dos Emirados Árabes Unidos

[Ver nota do editor]

Em 1971, quando os Emirados Árabes Unidos (EAU) se tornaram independentes, pela confederação de sete emirados que formavam o protetorado britânico dos Estados da Trégua, o Golfo Árabe era escassamente povoado, com atividade econômica concentrada na pesca e no comércio de pérolas. Com a ascensão da economia petrolífera, a região alterou-se substancialmente. Cerca de 10% das reservas mundiais de petróleo bruto atualmente conhecidas estão localizadas nos Emirados. Nos 40 anos após a independência do país, essas reservas permitiram a expansão real do PIB na ordem de 5,5% por ano.

Desde a década de 1990, o governo dos EAU tem buscado diversificar sua economia e reduzir sua dependência de petróleo. Atualmente, os Emirados são considerados um grande centro econômico no Golfo Árabe, e os investimentos de seus fundos soberanos destacam-se no mundo. A proporção do PIB gerada por setores não petrolíferos superou 69% em 2016, contra 53% em 2000. Embora a participação de setores não relacionada a hidrocarbonetos tenha aumentado no PIB, as receitas de exportação e do governo continuam concentradas em óleo e gás.

Figura: Crescimento do PIB dos EAU – Setor de Petróleo, Outros e Total

Fonte: UAE National Bureau of Statistics

Segundo estudo do FMI, há uma forte correlação entre diversificação e crescimento econômico sustentável, uma vez que economias baseadas em várias fontes de renda são menos vulneráveis a choques e ciclos econômicos. Evidências empíricas, no entanto, também atestam que a maioria das estratégias de diversificação para reduzir dependência do petróleo não foi bem-sucedida, com exceção dos casos da Noruega e do Canadá.

Obstáculos relacionados à “doença holandesa” dificultam a busca de fontes alternativas de renda, em decorrência de fatores como a volatilidade econômica induzida pela instabilidade das receitas do petróleo; efeitos acomodatícios das receitas do petróleo sobre instituições nacionais; e os riscos de as exportações de petróleo ocasionarem taxas de câmbio sobrevalorizadas. Como consequência, o êxito ou o fracasso de uma estratégia de diversificação depende de políticas econômicas que antecipem o futuro declínio nas receitas do petróleo.

O governo emirático tem buscado alcançar a diversificação sustentável pela implementação da UAE Vision 2021, que considera a inovação e o conhecimento como os principais motores da economia no futuro. De acordo com essa estratégia, os Emirados pretendem reduzir a participação das receitas do petróleo no PIB para apenas 5% em 2021, sobretudo por meio de investimentos em alta tecnologia e em serviços com elevado potencial de crescimento.

Significativos investimentos têm sido feitos em áreas como energia solar e logística portuária. Por conta de sua posição geográfica estratégica, entre a Europa e os principais mercados da  Ásia, os EAU também têm se destacado no setor de aviação, que já responde por 15% do PIB do país.

Lançada em 2016, a estratégia de impressão 3D da Dubai Future Foundation visa posicionar o emirado como um dos principais centros de tecnologia de impressão 3D em medicina; bens de consumo; e, especialmente, construção. Novas regulamentações municipais e diversas agências públicas, a exemplo da Dubai Electricity and Water Authority, devem contribuir para que, a partir de 2019,  2% dos edifícios de Dubai sejam total- ou parcialmente construídos por impressoras 3D. Segundo as metas propostas, esse número pode chegar a 25% em 2030, por meio de incentivos públicos e da esperada adesão da iniciativa privada.

Além dos desafios da “doença holandesa” para a diversificação econômica do país, os Emirados precisam superar problemas de produtividade. Apesar das altas taxas de crescimento desde os anos 2000, a produtividade do capital investido não tem crescido, e a produtividade do trabalho tem diminuído no mesmo período. Ainda que as exportações de serviços dos EAU venham aumentando, o saldo líquido de serviços é deficitário desde 1990. O país tem oportunidades e potencial para superar seus desafios pelo emprego de novas tecnologias.

É provável que a economia dos EAU continuará a depender do setor de hidrocarbonetos para impulsionar o crescimento e a diversificação nos próximos anos, mas os setores não petrolíferos poderão ganhar mais destaque, dado que, de fato, os projetos da UAE Vision 2021 deem os resultados esperados. A agregação de valor desses setores, sobretudo dos serviços, dependerá de fatores cuja eficiência se baseia crescentemente em ativos intangíveis, como conhecimento e infraestrutura.

O governo emirático deverá considerar que o conhecimento não é apenas produzido, mas também exportado. Como enfatizado em outros textos neste blog, a exportação de conhecimento decorre de serviços embutidos em produtos tangíveis, como design, royalties, marcas, e outros serviços profissionais e técnicos que agregam valor a bens. Para ter êxito, a estratégia de diversificação dos EAU, consequentemente, deve antecipar-se a tendências futuras e concentrar-se em setores inovadores e serviços que promovem o adensamento de valor nos bens.

Nota do editor: O autor é secretário executivo do Gabinete da Embaixada dos Emirados Árabes Unidos em Brasília.

O Futuro das Aplicações e Serviços Prestados por Drones

As aplicações possibilitadas pela popularização dos drones têm ganhado cada vez mais protagonismo e multiplicidade. Inicialmente, os investimentos se concentravam nas empresas que fabricam aeronaves remotas para fotografia e filmagem aérea (DJI, Yuneec, Ehang). No entanto, temos percebido uma mudança nos últimos anos: as inversões têm sido cada vez mais direcionadas às empresas que apresentam tecnologias de VANT (Veículos Aéreos Não Tripulados) para as áreas de inspeção de infraestruturas (energia eólica, estradas, petróleo e gás, etc.), transporte e entregas.

É provável que nos próximos anos a entrega de mercadorias e o transporte de pessoas possam ser realizados por drones. No caso desta última aplicação, ainda existem limitações técnicas, psicológicas (as pessoas ainda tendem a não confiar em uma aeronave “não pilotada”) e regulatórias (como mencionado em post anterior, por se tratar de uma tecnologia nova, os regulamentos inclinam-se a modelos mais restritivos).

Porém, mesmo diante de todas estas restrições, e já se antecipando a prováveis tendências, a empresa chinesa EHang desenvolveu um protótipo de aeronave autônoma para transporte de passageiros: o EHang 184. Esta aeronave elétrica possui oito hélices e é capaz de carregar uma pessoa adulta. A sua autonomia de voo é de 23 minutos, com velocidade máxima de 100 quilômetros por hora, o suficiente para pequenas e médias distâncias. Como podemos constatar, ainda se trata de um avião muito limitado em autonomia, velocidade e capacidade de transporte; porém, parece representar o início de uma nova era para o setor de aviação civil. Tudo indica que, com o tempo, esta tecnologia poderá ser embarcada em aviões de maior porte e com maior capacidade.

Drone EHang 184

ehang

Créditos: AP Photo/John Locher

Em relação às aplicações de entrega de mercadoria, é amplamente conhecido que a Amazon, por exemplo, tem envidado grandes esforços no sentido de desenvolver tecnologias e elaborar regulamentos que permitam a entrega de mercadorias por VANT. No vídeo deste link temos uma demonstração de como este sistema idealizado pela Amazon poderá funcionar.

O que podemos concluir é que este setor está em ampla ascensão e tem se preocupado em desenvolver novas soluções visando automatizar e facilitar diversas atividades, sejam elas de cunho pessoal, industrial ou comercial. É provável que as previsões atuais sobre o desenvolvimento do setor ainda sejam muito conservadoras, tendo em vista as incertezas sobre as aplicações e tecnologias que serão desenvolvidas e sobre como o ambiente regulatório se comportará diante dessas novidades.  O que já está claro é que, em um futuro próximo, nossas vidas serão impactadas diretamente por estas inovações e novos serviços.

O que o Pokémon Go pode nos ensinar sobre realidade virtual e realidade aumentada?

Desde o início de julho, o lançamento do Pokémon Go pela Nintendo tem movimentado notícias sobre o sucesso do aplicativo.  O jogo, que está disponível para smartphones em 38 países, consiste em um universo em que o usuário deve capturar criaturas virtuais – os pokémons. A localização de tais criaturas é o grande diferencial: elas estão no mundo real e podem ser vistas através da tela do celular. Basta que o usuário ative o GPS do aparelho para que seja possível identificar pokémons próximos à sua localização.

O sucesso do Pokémon Go refletiu no rápido crescimento do valor de mercado da Nintendo Co. logo após o lançamento do app. Mesmo com a declaração de que os lucros com o aplicativo seriam limitados – o que levou a queda das ações da companhia na segunda-feira –, estima-se que as ações da Nintendo Co. estão 60% acima do valor registrado no período anterior ao lançamento do jogo, o que representa um acréscimo de quase US$ 12 bilhões ao valor de mercado da companhia.

Além disso, o aplicativo registrou recordes em downloads. Somente entre os celulares iPhones, o aplicativo contabilizou mais downloads em uma semana do que qualquer outro aplicativo na história.

Um ponto crucial para entender o sucesso do aplicativo reside na diferenciação entre os conceitos de realidade virtual (RV) e realidade aumentada (RA): enquanto a RV trata de um mundo completamente novo, a RA apresenta o mundo real com “melhorias”. Nesse sentido, ao permitir que os jogadores vivenciem o jogo no mundo real, o Pokémon Go extrapola o conceito de RV e incorpora o de RA: isto é, o jogo combina elementos virtuais com o ambiente real de forma interativa e com atualizações quase instantâneas, utilizando uma tecnologia de mapeamento que possibilita a inserção de criaturas virtuais em ambientes reais.

Na verdade, o aplicativo é só mais um exemplo de como a RV e a RA  podem ser incorporadas ao cotidiano das pessoas e trazer ganhos em diversos setores. Na saúde, é possível citar tecnologias de mapeamento cerebral, que permitem a visualização precisa do órgão pelo médico durante uma cirurgia. Por outro lado, em setores como a manufatura, a RV e a RA são utilizadas para o desenvolvimento e o design de produtos, aprimoramentos do processo produtivo, acompanhamento e manutenção de equipamentos, colaboração remota, dentre outras funcionalidades.  E essas são apenas algumas potenciais aplicações da realidade virtual e da realidade aumentada.

Segundo a Statista,  o emprego de softwares associados a esse tipo de tecnologia no dia-a-dia do consumidor e em atividades empresariais e do setor público poderá trazer retornos bilionários no futuro (ver infográfico abaixo).

Imagem – Previsão do tamanho do mercado de realidade virtual (RV) e realidade aumentada (RA) em diferentes setores em 2025

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Fonte: Statista.

Por outro lado, esse tipo de tecnologia demanda uma série de outras tecnologias, como smartphones com maior capacidade de armazenamento, baterias com maior durabilidade, acesso à Internet de qualidade, conectividade entre equipamentos, etc. Em outras palavras, os avanços na área têm o potencial de revolucionar os setores associados à tecnologia digital, como a computação e as indústrias de rede.

O Pokémon Go é apenas um exemplo da virtualização do mundo real. O maior desafio será incorporar tecnologias similares para aumentar o bem-estar da população e tornar economias mais competitivas.

Dados abertos e o seu potencial para serviços

Apesar de parte dos dados gerados diariamente ser de uso privado e sigiloso, há um potencial imenso a ser explorado no que se refere a dados abertos (open data). Utilizando a definição da Open Knowledge Foundation, o termo se refere a dados que podem ser livremente utilizados, reutilizados e redistribuídos. Eles seguem três leis básicas propostas por David Eaves, referência na área:

  • Se o dado não pode ser indexado, isto é, encontrado na web, ele não existe. Isso é bem claro:  se o dado não pode ser encontrado pelo usuário numa busca simples no Google, é como se ele, de fato, não existisse.
  • Se não está em formato compreensível por máquina (por exemplo, se está como imagem), ele não gera engajamento. Isso não significa que documentos em pdf ou formatos semelhantes não forneçam dados de valor. Significa apenas que o usuário não consegue trabalhar esse dado (no excel por exemplo), o que limita bastante o seu uso.
  • Se não é possível replicá-lo por alguma questão legal, ele não “tem/dá poder”. Se não é possível compartilhar o resultado de um trabalho com dados pela existência de licenças para uso, seu potencial para gerar valor é reduzido.

Open Data é o mesmo que Big Data?

Como colocado por Joe Gurin, presidente do Center for Open Data Enterprise, enquanto o big data é definido pelo seu volume, variedade e velocidade, o open data é definido pelo seu uso.[1]  As bases de big data que seguem as leis ditadas acima passam também a serem consideradas dados abertos.

Figura 1 – Tipos de Dados

tipos de dado

                                                                        Fonte: Gurin, J. (2014)

Estudo da Mckinsey Global revela que uma agenda global de dados abertos tem potencial para gerar três trilhões de dólares, em particular nos setores de educação, transporte e saúde. A consultoria Lateral Economics estima que políticas pró-abertura de dados podem resultar em acréscimo de até 1,1% do PIB para as economias do G20.

Dados abertos são um combustível para inovações em serviços e produtos justamente por serem fáceis de encontrar e manipular, com produtos resultantes dessa manipulação que podem ser amplamente compartilhados. Por mais senso comum que isso pareça, é a partir desses dados abertos que vários aplicativos, por exemplo, melhoram diariamente a vida de usuários em diversas áreas, como lazer, segurança e transporte.

Boa parte dos aplicativos mais usados hoje atingiram esse sucesso por conseguirem traduzir, em formato de aplicativo, milhares de dados – abertos – fornecidos pelo governo. Um exemplo disso é o aplicativo sul-coreano Naver, que usa open data do Ministério dos Transportes para gerar um aplicativo capaz de destrinchar o complexo sistema de ônibus do país. No Reino Unido, a plataforma Illustreets coleta informações de diversos departamentos como transporte e educação para construir índices que auxiliam na escolha de regiões para morar. Em Uganda, 80% dos recursos destinados a escolas se perdia pela corrupção. Após a divulgação dos dados abertos sobre a destinação desses recursos, essa cifra reduziu-se para 10%.

Como o Governo pode promover dados abertos?

Diversos são os motivos para que o Governo lidere a agenda de dados abertos. Conforme elencado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), eles contribuem para o aumento da transparência na gestão pública, o surgimento de novos serviços e inovações a partir de seu uso, a melhoria na qualidade dos dados do governo e a viabilização de novos negócios. No Brasil, a Lei de Acesso à Informação e a Instrução Normativa que instituiu a Infraestrutura Nacional de Dados Abertos (INDA) fornecem as diretrizes para todas as iniciativas do Governo nessa área. O Governo também tem papel relevante como promotor da cultura e do uso de dados abertos. Hackathons (maratonas de programação) e desconferências  são iniciativas populares nesse sentido. No Brasil já houve Hackathons organizados pela Câmara dos DeputadosINEP e Ministério da Justiça[1]

Entende-se, claramente, que ainda há muitos desafios a serem enfrentados para o crescimento da disponibilidade de dados abertos no Brasil e no mundo, principalmente no que se refere à segurança da informação e qualidade dos dados. Há custos inerentes de disponibilização e manutenção das bases e necessidade de servidores para sua gestão, para padronização e suporte. Com o crescimento no número de fontes capazes de fornecer bases de dados abertas, sistemas cada vez mais complexos serão necessários para administrar esse volume de informações. A manutenção de uma trajetória firme para disponibilizar cada vez mais dados abertos é importante para garantir que o País não fique ainda mais atrás na corrida de inovação.

[1] Para mais informações sobre dados abertos no Brasil, clique aqui.

 

Agradeço os comentários do economista Rafael Leão durante a elaboração deste post.

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