Economia de Serviços

um espaço para debate

Author: Daniela Matos

O setor de serviços tem papel diferenciado na redução da desigualdade de gênero?

A igualdade de gênero é, sem dúvida, um tema que ganhou espaço no debate de comércio internacional. O empoderamento feminino foi objeto de Declaração Ministerial Conjunta na 11ª Conferência Ministerial da OMC realizada em 2017 na Argentina, além de ser o Objetivo #5 da Agenda para Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, negociada em 2015. Ademais, iniciativas relacionadas à importância da participação das mulheres no comércio ganham força, como o #SheTrades do International Trade Center e a rede de GenderChampions das Nações Unidas. Alguns países, como o Canadá, já tomaram a decisão de incluir a questão de maneira horizontal em todos os seus acordos de comércio. No Brasil, o tema também ganhou força e espaços para discussão, como no blog WomenInsideTrade, por exemplo.

O setor de serviços aparece de maneira recorrente nessas discussões como um setor Gender Champion. O argumento é de que, além de ser um setor chave para o desenvolvimento econômico, o setor de serviços é responsável por uma alta parcela do emprego feminino, de maneira que o seu desenvolvimento poderia ter um importante papel na redução da desigualdade de gênero, tanto no comércio internacional, quanto no emprego da força de trabalho doméstica.

De fato, estatísticas indicam alto nível de emprego feminino no setor de serviços, que corresponde a quase 50% do emprego feminino global total[1]. Em economias avançadas, a porcentagem de mulheres trabalhando no setor de serviços chega a 85%. Em países em desenvolvimento, apesar de a maior parte das mulheres estarem empregadas no setor agrícola, a parcela de mulheres que trabalha no setor de serviços aumentou 7,6% entre 1992 e 2012, e tem tendência crescente[2].

Contudo, um olhar mais detalhado sobre esses dados mostra que as mulheres parecem ter uma participação concentrada em determinados subsetores, quando comparadas com os homens. A Figura 1 mostra que os setores “predominantemente femininos” são atacado e varejo, hotéis e restaurantes, educação, saúde e trabalho social. Esses subsetores são, usualmente, caracterizados por pagamentos baixos e arranjos informais de trabalho. A força de trabalho masculina, por outro lado, está mais concentrada em serviços relacionados às atividades de manufatura, construção, agricultura e transportes e comunicações, subsetores usualmente responsáveis pela maior geração de valor agregado e, consequentemente, maiores salários.

Figura 1 – Diferenças na média das participações em subsetores, por sexo (Masculino – Feminino)

Últimos dados disponíveis: 2000

Fonte: The Gender Dimension of Services.

 

Dessa forma, apesar de o setor de serviços de fato empregar mais mulheres que o setor industrial, os dados sugerem que o setor tende a perpetuar a desigualdade de gênero, no sentido de que a força de trabalho feminina está empregada majoritariamente em subsetores de menores salários, menor geração de valor agregado e arranjos de trabalho informais, enquanto os subsetores de alta geração de valor agregado e salários maiores continuam com força de trabalho majoritariamente masculina.

A maneira correta de combater a desigualdade de gênero reside no combate aos motivos que levam as mulheres a atuarem, tanto no setor industrial quanto no setor de serviços, em trabalhos com menor remuneração e menor geração de valor agregado.

Tomemos como exemplo a chegada iminente da Revolução Industrial 4.0. Como se sabe, a Revolução Industrial 4.0 é marcada pela automação da indústria, processos influenciados por inteligência artificial, internet das coisas e intenso fluxo de dados. É, portanto, válido afirmar que carreiras promissoras para o futuro estão relacionadas a tecnologia da informação e comunicação, ciência da computação e engenharia. Um combate eficaz à redução da desigualdade de gênero seria proporcionar a igualdade de participação feminina e masculina desde a formação, para que o resultado se configure no momento de emprego da força de trabalho.

Infelizmente, estatísticas sugerem o contrário. As figuras 2, 3 e 4 apresentam dados de obtenção de diploma em carreiras de humanas e artes (2), tecnologia da informação e comunicação (3) e engenharia, manufatura e construção (4).

Os dados mostram que no Brasil e nos países da OCDE, mais de 80% dos diplomas na área de tecnologia da informação e comunicação são concedidos a homens. Na área de engenharia, manufatura e construção, o valor é similar, atingindo 70%. Os diplomas concedidos às mulheres se concentram, sobretudo, na área de humanas e artes, em que aproximadamente 70% dos diplomas nos países da OCDE, e 60% no Brasil, são concedidos a pessoas do sexo feminino.

Figura 2. Diplomas concedidos a homens e mulheres em carreiras de humanas e artes, 2015

 

Figura 3.  Diplomas concedidos a homens e mulheres em carreiras de tecnologia da informação e comunicação, 2015

Figura 4. Diplomas concedidos a homens e mulheres em carreiras de engenharia, manufatura e construção, 2015

 

Fonte: OCDE

 

Iniciativas que trazem a questão da desigualdade de gênero para o centro do debate são importantes e merecem reconhecimento. É digno de destaque esse importante momento em que a igualdade de gênero tem a atenção dos países, de organismos internacionais e da mídia. É necessário, contudo, olhar a questão com uma lente ajustada para identificar os fatores que levam à desigualdade. Buscar incentivar setores, subsetores ou áreas do comércio que possuem maior participação feminina, sem o devido trabalho de avaliação, pode apenas perpetuar a desigualdade de gênero, sendo ineficaz ou tendo o efeito inverso do esperado.

[1] ILO. Global Employment Trends 2014. Geneva: International Labour Organization, 2014.

[2] ILO. Global Employment Trends for Women 2012. Geneva: International Labour Organization, 2012

Um acordo de e-commerce no Sistema Multilateral de Comércio é possível?

A economia digital tem transformado rápida e radicalmente as formas que as pessoas se relacionam, a maneira como os países comercializam e até mesmo os meios de produção das empresas. A 4ª Revolução Industrial tem como base a economia digital e já está em curso.

Apesar de constantes referências ao tema “Comércio Eletrônico” na Organização Mundial do Comércio (OMC), o tema está longe de ser novo na Organização. Diante das evidências de que o comércio eletrônico se expandia rapidamente e criava novas oportunidades para o comércio internacional, os ministros presentes à 2ª Conferência Ministerial, realizada em Genebra em 1998, adotaram a Declaração sobre o Comércio Eletrônico Global.

Tendo em vista que o assunto, à época, ainda se encontrava em estágio incipiente, foi estabelecido um programa de trabalho (WTO Work Programme on Electronic Commerce), com o objetivo de examinar os aspectos comerciais do tema. As discussões do programa de trabalho levaram a uma definição ampla de comércio eletrônico. A definição, adotada há 20 anos, se aproxima do que hoje se conhece como economia digital: produção, distribuição, marketing, venda ou entrega de bens ou serviços por meio eletrônico.

Ao longo dos 20 anos de discussão, o Grupo de Trabalho gerou poucos resultados significativos, sendo o mais relevante deles a moratória de não imposição de direitos aduaneiros sobre transmissões eletrônicas.

Desde meados de 2015, de certa forma impulsionados pela Declaração Ministerial de Nairóbi, os Membros se engajaram mais ativamente em discussões sobre o tema. A participação ativa das delegações gerou a Declaração Ministerial Conjunta de Comércio Eletrônico, em Buenos Aires, em que 70 Membros concordaram em iniciar trabalhos com vistas a alcançar possíveis futuras negociações em aspectos comerciais do comércio eletrônico.

Panorama do tema e principais players

A falta de avanços na formulação de regras para o tema na OMC, claro sintoma do impasse enfrentado na frente negociadora da Organização, abriu espaço para avanço do rule making na área por parte de Acordos Regionais de Comércio. De acordo com dados do RTA Database da OMC, pelo menos 79 acordos regionais contam com um capítulo dedicado a comércio eletrônico ou artigos dedicados ao tema.

Uma interessante característica dessa proliferação de provisões de comércio eletrônico em acordos regionais é a diferença de profundidade e abordagem do tema. Uma análise didática dessa “e-spaghetti bowl” de acordos regionais e dos interesses por parte dos dispositivos neles incluídos leva a uma separação em três modelos/players principais: Estados Unidos, União Europeia e China.

Os Estados Unidos, país pioneiro no mercado e detentor das principais gigantes da tecnologia (Google, Apple, Facebook, Amazon, Microsoft, Netflix, entre outras) têm o claro interesse de manter o mercado digital aberto, de maneira que suas empresas possam continuar usufruindo cada vez mais dos ganhos de escala característicos desse mercado, já que os custos marginais de clientes adicionais são praticamente zero. Esse interesse se reflete nos acordos regionais firmados pelo país (ou fortemente influenciados, no caso do CPTPP). Dessa maneira, o template de acordos regionais dos EUA conta com profundas regras de comércio digital, como livre fluxo de dados, proibição de exigências de localização de servidores, tratamento de código-fonte e não imposição de direitos aduaneiros em transmissões eletrônicas.

A União Europeia (UE), apesar de partilhar da posição dos EUA com relação ao princípio do livre mercado, tem se destacado na preocupação com a sua regulação doméstica. O bloco tem se dedicado à estratégia do Mercado Único Digital, que busca garantir acesso a atividades online para indivíduos e empresas sob condições de competição justa, ao mesmo tempo em que aborda questões como privacidade de dados, direitos de copyright, tributação de operações realizadas no ambiente digital, etc. Em 2018, uma série de medidas regulatórias no mercado digital europeu entrarão em vigor, entre elas a General Data Protection Regulation, que aborda questões como ampliação do escopo de jurisdição na esfera online, penalidades para plataformas online que não cumpram as regras, disciplinas para portabilidade de dados visando questões concorrenciais, etc. Essa posição é refletida nos acordos firmados pelo bloco que, comparados ao template americano, são muito mais leves com relação a regras ao mercado digital. De uma maneira resumida, os acordos firmados pela UE basicamente consagram a não imposição de direitos aduaneiros sobre transmissões eletrônicas e, no restante do capítulo, colocam mais ênfase no diálogo regulatório entre as partes (como o CETA, por exemplo).

A China, por sua vez, tem defendido soberania sobre o seu cyber espaço e se protegido da abertura do mercado digital por trás da Grande Muralha Digital (The Great Firewall of China). Dessa maneira, e aproveitando-se do enorme mercado doméstico à sua disposição, a China consagrou criar um universo digital paralelo, com empresas chinesas operando no mesmo espaço das conhecidas empresas ocidentais, como AliBaba, Baidu e Tencent (WeChat). A Lei de Segurança Cibernética chinesa, em vigor desde junho de 2017, contém 79 artigos que contêm três posições centrais[1]: (i) dados físicos obrigatoriamente armazenados na China continental; (ii) inspeções obrigatórias de segurança em equipamentos antes de sua instalação; e (iii) regulações de retenção de dados e assistência de law enforcement obrigatória. Apesar de o país ter firmado alguns acordos regionais com disciplinas de comércio eletrônico, tome-se o Acordo entre China e Austrália como exemplo, as obrigações neles contidas não vão muito além das já previstas no âmbito da OMC, o que reflete a estratégia do país.

Desdobramentos recentes na OMC

Após a assinatura da Declaração Ministerial conjunta, as discussões do tema na OMC têm prosperado. Em 2018 já foram realizadas duas reuniões específicas para o tema e já há previsão de outras três nos próximos meses (maio, junho e julho). Ademais, 9 documentos já foram circulados contendo propostas para o futuro das discussões na Organização de autoria dos seguintes países: Argentina, Colômbia, e Costa Rica; Nova Zelândia; Brasil; Japão; Estados Unidos; Singapura; Japão; Rússia; e Taipé Chinês.

As propostas têm conteúdo e mostram apetite dos países. Em especial, a proposta americana é robusta e demonstra engajamento do país para discussão do tema. Levando em consideração as recentes posições do país com demais temas no sistema multilateral, esse posicionamento sugere prestígio do tema.

Contudo, o vale existente entre as posições dos principais players da economia digital, aliado à questão do desenvolvimento e do hiato digital, sugere que não há um caminho óbvio e único a percorrer. De todo modo, é válida a premissa de que, quanto antes os países encararem a discussão, menores serão os custos econômicos envolvidos.

O fato é que a revolução digital já está em curso e não pausará à espera de consenso entre os Membros da OMC. Ademais, a negociação de um acordo ambicioso em comércio eletrônico e economia digital mostraria que a Organização é capaz de se modernizar e apresentar uma resposta aos novos desafios da economia e comércio mundial.

A proposta brasileira traz uma boa abordagem para superar o impasse que pode ser estabelecido diante de posições tão divergentes. Além de buscar organizar todos os temas que merecem ser discutidos na Organização, a proposta apresenta uma divisão do tema em blocos, facilitando a compreensão da vasta gama de assuntos e permitindo flexibilidade na adoção de regras. Dessa forma, os Membros poderiam aceitar compromissos de uma maneira taylor-made: países de menor desenvolvimento relativo, por exemplo, podem participar de todas as discussões, mas optar por adotar apenas compromissos leves de comércio eletrônico, enquanto países que assim desejem podem estabelecer e aderir compromissos profundos relacionados à economia digital.

Dificuldades existem, mas o fato é que os Membros da OMC dispõem de oportunidade, motivo e engajamento para o lançamento de negociações oficiais de comércio eletrônico. Resta saber se haverá consenso para seguir adiante. Ao que tudo indica, saberemos em breve os próximos passos dessas discussões.

[1] “Começaram as guerras no comércio digital: delineando os campos de batalha regulatória”. Dan Ciuriak, Maria Ptashkina. Pontes, volume 14, número 1 – Março 2018.

Acordos de comércio de serviços de fato liberalizam o mercado?

A importância crescente do setor de serviços na participação do PIB e na criação de emprego é uma das grandes tendências da economia mundial. Não surpreendentemente, acordos comerciais de serviços também têm ganhado um aumento expressivo de importância e interesse por parte dos países. Esses acordos buscam a expansão do comércio de serviços e do desenvolvimento econômico por meio da progressiva liberalização comercial. No entanto, uma questão que a princípio parece tautológica, permeia toda essa discussão: os acordos comerciais de serviços de fato promovem a liberalização do mercado de serviços?

O GATS, criado em 1995 durante a Rodada Uruguai, estabeleceu muitas bases sobre as quais hoje são negociados os acordos internacionais de comércio de serviços: a classificação em 4 modos de prestação; o reconhecimento de 12 categorias de setores e 155 subsetores; e as cláusulas de não discriminação: tratamento nacional[1] e acesso a mercados[2]. As negociações do GATS tiveram êxito no estabelecimento da estrutura e dos princípios do Acordo.

Diante da paralisação da Rodada Doha, os países, em especial os desenvolvidos, têm aumentado o nível de importância de acordos regionais em suas políticas comerciais. De acordo com a OMC, em 2011 já haviam sido notificados 87 acordos regionais com compromissos em serviços. Ademais, há os que ainda não estão em vigor, dentre os quais merecem destaque o TPP (que ontem teve sua continuidade posta em dúvida, por conta de decisão dos EUA de sair das negociações), a Aliança do Pacífico e o TiSA.

Alguns trabalhos acadêmicos têm sido feitos com o intuito de analisar se houve liberalização de mercado nas negociações do GATS e de acordos regionais/preferenciais de serviços. Hoekman (1996) fez um esforço empírico e calculou índices que representariam a liberalização de fato de países da União Europeia no GATS. A sua conclusão foi de que a Rodada Uruguai não entregou nenhuma liberalização do setor de serviços[3], apesar de ter gerado algum benefício associado ao travamento das condições de acesso a mercado.

Com relação aos acordos regionais/preferenciais, Sauvé e Shingal (2011) e Mattoo e Sauvé (2010) chegam a conclusões similares: ao invés da entrega de liberalização do setor de serviços, o benefício gerado por esses acordos decorre principalmente do travamento do marco regulatório existente no país. O que de fato os acordos regionais/preferenciais têm logrado em atingir além do GATS é uma consolidação mais atualizada do marco regulatório dos países, decorrente de recentes reformas unilaterais promovidas.

Dada a importância do setor de serviços, por que os acordos comerciais, tanto o GATS quanto os acordos regionais/preferenciais, falham em entregar a liberalização de mercado a que se propõem? A explicação reside em uma característica intrínseca dos serviços: enquanto na negociação de acordos de comércio de bens a moeda de troca são tarifas de importação, em negociações de acordos de comércio de serviços a moeda de troca é a regulação doméstica.

Não obstante, muitos economistas acreditam que acordos de serviços liberalizam o mercado de serviços. Argumentam que, ao ficar de fora dessa nova grande rede de acordos regionais/preferenciais de liberalização do setor de serviços, o Brasil estaria perdendo um grande potencial de inserção no comércio internacional. Na teoria, esse argumento parece fazer sentido: assim como é possível estabelecer diferentes alíquotas do imposto de importação para produtos de origens distintas, por que não seria possível também estabelecer diferentes exigências com relação a prestadores de serviços de acordo com sua origem?

No entanto, quando se pensa na aplicabilidade prática desse argumento, percebe-se como seria difícil (ou até mesmo impraticável) a liberalização do mercado de serviços para apenas algumas origens. Para discriminar prestadores de serviços conforme a origem, seria necessário fazê-lo em sua regulamentação nacional. Tomemos como exemplo a participação de capital estrangeiro em companhias aéreas, hoje em no máximo 20% no Brasil, estabelecido por Lei Ordinária nº 7.565, de 1986. Um eventual compromisso de liberalização do setor aéreo brasileiro em acordo preferencial de serviços exigiria modificação do texto dessa Lei Ordinária. E esse seria apenas um dos muitos compromissos feitos pelo Brasil no acordo. Imaginemos quantos mais compromissos seriam feitos e que gerariam necessidade de alteração da legislação nacional, algumas restrições ainda mais difíceis de mudar, como as constitucionais de propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora (artigo 222 da CF) e de participação de empresas de capital estrangeiro na assistência à saúde (artigo 199 da CF).

A partir do argumento acima se percebe a dificuldade em se liberalizar o mercado de serviços a partir de acordos comerciais, em especial bilaterais/preferenciais. É nesse sentido que a maior parte dos países que fizeram importantes liberalizações no seu setor de serviços o fizeram unilateralmente[4].

Contudo, se por um lado acordos de serviços não liberalizam o mercado de serviços, por outro lado há importantes benefícios que decorrem da negociação desses acordos. Três benefícios imediatos decorrem da assinatura de um acordo de serviços.

O primeiro é o travamento (lock-in) do marco regulatório daquele país. Isto quer dizer que, a partir do momento da assinatura do acordo, aquele país não poderá adotar medidas mais discriminatórias com prestadores de serviços estrangeiros do que aquelas já existentes e inscritas em suas listas. O segundo é o ganho de transparência e segurança jurídica que decorre da adoção de listas negativas. A consolidação do marco regulatório dos países em uma lista padronizada em muito facilita a vida de prestadores de serviços e investidores estrangeiros. Um terceiro benefício que decorre da negociação de um acordo de serviços advém da adoção de um “marco geral”, que estabelece padrões internacionais de conduta para os participantes, além de servir como um “guarda-chuva” para potenciais acordos posteriores de cooperação, facilitação, reconhecimento mútuo, etc.

O Brasil, por exemplo, atualmente ainda negocia acordos de serviços em listas positivas. Um importante próximo passo seria a adoção de listas negativas para negociação, visto que essas são dotadas de maior transparência e segurança jurídica. Ademais, a elaboração da lista negativa brasileira seria uma boa oportunidade para o governo, em contato com seus órgãos reguladores e setor privado, rever todo o seu marco regulatório doméstico, podendo identificar possíveis oportunidades e pontos para liberalização unilateral. Afinal, por que não negociar?

 

*Este post é baseado em texto da mesma autora, publicado no site Brasil, Economia e Governo, que pode ser acessado aqui.

Daniela Ferreira de Matos é Mestre em Economia pela Unb e Analista de Comércio Exterior no Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).

Referências

Francois, Joseph, and Bernard Hoekman. “Services trade and policy.” Journal of Economic Literature 48.3 (2010): 642-692.

Hoekman, Bernard. “Assessing the general agreement on trade in services.” The Uruguay Round and the developing countries 996.1 (1996): 89-90.

Mattoo, Aaditya and Pierre Sauvé. “The Preferential Liberalization of Services Trade”, NCCR Working Paper No 2010/13 (May), Bern: World Trade Institute. (2010), http://www.nccr-trade.org/publication/the-preferential-liberalization-of-services-trade-lessons-from-practice/

Sauvé, Pierre and Shingal Anirudh. “Reflections on the Preferential Liberalization of Services Trade”. World Trade Institute. (2011), https://mpra.ub.uni-muenchen.de/32816/

[1] Tratamento nacional: um compromisso em tratamento nacional implica que um membro não pode adotar medidas discriminatórias que beneficiem prestadores de serviços domésticos frente aos estrangeiros.

[2] Acesso a mercados: o compromisso de acesso a mercados está relacionado a um compromisso de não criar certos tipos de medidas que dificultem ou impeçam o acesso de um prestador de serviço estrangeiro ao mercado doméstico. Os tipos de medidas que os países se comprometem a não adotar estão listadas no inciso 2 do Artigo XVI do GATS.

[3] Aqui é importante deixar clara a exceção de países que aderiram tardiamente a OMC (latecomers). Esses países tiveram que assumir compromissos determinados pelos países integrantes, de maneira que de fato fizeram compromissos de liberalização.

[4] Uma importante exceção à essa regra é a Costa Rica, que aproveitou a assinatura de acordo comercial de serviços para comover o seu congresso e implementar importantes iniciativas liberalizantes no setor de serviços. Maiores detalhes desse caso podem ficar para um próximo post.