Pare e pense, o que seria de sua vida sem os serviços de transporte. Agora considere a situação de uma indústria ou de um produtor rural. Estimativas baseadas na Matriz Insumo Produto brasileira indicam que o setor de transporte é o segundo mais demandado pela economia (o comércio é o primeiro), mas está longe de apresentar bons resultados no país. Classificado como um dos principais entraves para a realização de negócios em território nacional, segundo o Fórum Econômico Mundial, o transporte, de passageiros e de cargas, coleciona problemas e resultados ruins.

Tabela: Classificação Fórum Econômico Mundial –  Pilar Infraestrutura de Transporte (Países selecionados)

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Nota: A categoria Transporte Geral foi calculada pela Confederação Nacional do Transporte e corresponde à média aritmética das notas dos quatro modais de transporte pesquisados (rodovias, ferrovias, portos e aeroportos)

Fonte: Fórum Econômico Mundial (The Global Competitiveness Report 2015-2016)

O transporte agrega valor de lugar, mas este valor custa cada vez mais por aqui. Estudos do Instituto ILOS apontam que o custo com logística no Brasil é de cerca de 11,6% do PIB ao ano. Achou pouco dada a importância do setor? Nos Estados Unidos a percentagem é de 8,7. Ou seja, se tivéssemos uma estrutura de custos e condições de operação similares a americana, gastaríamos cerca de R$ 160 bilhões a menos para transportar nossos bens[1]. E isso é dinheiro perdido, um peso morto da nossa economia.

Como assim? Se o nosso transporte é mais caro significa que os nossos transportadores têm mais lucro, certo? Não exatamente[2]. O nosso transporte é mais caro porque os nossos custos de deslocamento e de transação são superiores aos percebidos por fornecedores de serviço americanos e isso influencia a nossa produtividade. Parte significativa desses custos está vinculada à elevada regulação do setor (com a existência de monopólios naturais, preços máximos, etc).

Poderíamos, então, argumentar que a saída é o desenvolvimento de estratégias empresariais que melhorem a performance operacional de forma a trazer ganhos de produtividade que se convertam em eficiência para a cadeia logística. Concordo que essas ações ajudam, mas o que faremos com a parte que não depende da empresa? O que faremos com a burocracia e com a inadequação da infraestrutura de transporte?

Apesar de as rodovias serem a infraestrutura mais abundante no país, nossa densidade ainda é muito reduzida[3]. Dos mais de 1,7 milhão de km de estradas brasileiras, pouco mais de 213 mil km são pavimentados e, desses, 57,3% estão em condições inadequadas, segundo avaliação da Confederação Nacional do Transporte, e elevam o custo operacional do transporte de cargas em 25,8%.

Gráfico: Densidade de infraestrutura no Brasil e em países selecionados (em km/1.000 km2)

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Fonte: Dados do IBGE, Dnit e Cia.

Temos poucos aeroportos e, os que temos, precisam de modernização urgente em seus terminais de passageiros e pistas para atenderem melhor a demanda futura (sem falar na urgência da modernização do sistema de controle de tráfego aéreo). As empresas ferroviárias investem milhões em sistemas e em estratégias de consolidação para reduzir as perdas advindas dos pontos críticos[4] que reduzem a velocidade operacional dos comboios e geram custos adicionais. Nos portos, filas de navio. Nas cidades, filas de carros, ônibus parados, metrôs lotados e população desassistida.

Assim, para solucionarmos os problemas que prejudicam nossos deslocamentos precisamos internalizar que modernizar e dinamizar o sistema de transporte não é adquirir um veículo novo, mais moderno ou mais eficiente em termos ambientais, ou implantar um novo sistema de gestão por resultados. Modernizar o transporte é possibilitar que ele seja mais dinâmico, mais integrado, ou seja, sistêmico.

O desafio é grande, mas as oportunidades também. Destravar os entraves do transporte é uma condição necessária, mas não suficiente, para elevar os ganhos de produtividade no país.  Eu ousaria dizer que o investimento em infraestrutura de transporte não é, e nunca foi, a solução para o crescimento econômico do país (afinal, o transporte é atividade meio). Contudo, a não modernização nesse serviço básico, que permite agregação de valor de lugar aos bens e é fundamental para a produção de bens e serviços, tem elevado potencial de inibidor do desenvolvimento nacional.

Priscila SantiagoPriscila Santiago é bacharel em economia pela Universidade de Brasília. Mestre em Gestão Econômica do Meio Ambiente (UnB) , Especialista em Planejamento Tributário (UnB) e em Gestão de Negócios (Fundação Dom Cabral). Atualmente é doutoranda no programa de pós graduação em economia da UnB. Trabalha há mais de seis anos com economia do transporte.

 

[1] Considerou-se o custo logístico do Brasil na situação atual (11,6% do PIB) e na hipotética similar aos EUA (8,7%). A diferença entre elas seria uma potencial economia de recursos que poderiam ser realocados.

[2] Dados do IBGE (Pesquisa Mensal de Serviços) apontam que em 2015 houve queda de 6% no volume de serviços transportados. A variação nominal da receita do setor foi de 2% (lembrando que a inflação foi de 10,67%).

[3] Enquanto os EUA possuem 438,1 km de rodovias para cada 1.000 km2 de área territorial, o Brasil possui 25,0km.

[4] Passagens em nível críticas e invasões de faixa de domínio.